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Anielle sobre condenação: “era a dor guardada no peito e no coração”

Durante seis anos e sete meses, familiares e amigos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes têm chorado em luto. Hoje, 31 de outubro, o choro pela primeira vez foi de alívio quando eles ouviram a sentença no 4º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro. Os ex-policiais militares Ronnie Lessa e Élcio Queiroz foram condenados pelos assassinatos cometidos no dia 14 de março de 2018.

Assassinos confessos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, os ex-policiais militares Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz foram condenados nesta quinta-feira (31), pelo 4º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro. Ronnie Lessa a 78 anos, 9 meses e 30 dias. Élcio, a 59 anos, 8 meses e 10 dias.  

Irmã de Marielle, a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, resumiu o que representou o longo período de luta para que os assassinos fossem identificados e punidos.

Rio de Janeiro (RJ), 31/10/2024 – Anielle Franco (centro) fala sobre condenação de Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

“A gente não vai parar aqui. Em 2018, eu disse que honraria o sangue e a memória da minha irmã. E isso aqui hoje foi um grito que estava guardado na nossa garganta. Uma dor guardada no peito e no coração de cada homem e mulher que estão aqui. A gente vai lutar, não só pela Marielle e pelo Anderson, mas por um projeto que a gente acredita”, disse a ministra.

“Maior legado da Marielle para esse país é a prova de que mulheres, pessoas negras, faveladas, quando chegam aos seus postos merecem permanecer vivas. Quando assassinaram a minha irmã com quatro tiros na cabeça eles não imaginavam a força com que esse país se levantaria” acrescentou.

Depoimentos arrependidos

A viúva de Anderson, Ághata Arnaus, agradeceu a todos que lutaram pela condenação dos assassinos e disse que não se sensibiliza com os depoimentos arrependidos de Ronnie e Élcio.

Rio de Janeiro (RJ), 31/10/2024 –  Ághata Arnaus (esq), viúva do motorista Anderson. Foto:Tânia Rêgo/Agência Brasil

“Eu ouvi um pedido de perdão de alguém que claramente não tem qualquer arrependimento. E ainda diz que é para aliviar a consciência. Eu digo que quem tem que perdoar é Deus ou qualquer coisa que ele acredite. Eu não perdoo. Nunca. Eu tenho paz na minha vida. Mas não preciso perdoar”, disse Ághata. “Cinquenta, setenta anos, [isso] é pouco. Que eles fiquem lá para sempre. Anderson e Marielle morreram. É para sempre também”, acrescentou.

Mônica Benicio, vereadora e viúva de Marielle, falou sobre os significados das sentenças de hoje para a sociedade brasileira.

“Marielle foi assassinada pelo que defendia, pelo que lutava para derrotar, para defender a democracia. Não há justiça possível que possa trazê-los de volta para nós. Mas esse é um marco para que não aconteça mais. E esse é o principal recado. Como a juíza disse, é o recado para os vários Lessas que estão livres não tenham o sentimento da impunidade”, disse Mônica.

Rio de Janeiro (RJ), 31/10/2024 – Mônica Benicio, Luyara Santos e Marinete Silva, da esquerda para direita. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Marinete Silva e Luyara Santos, mãe e filha de Marielle, respectivamente, destacaram a luta da família ao longo desses anos para que os responsáveis pelo crime fossem punidos.

“Não só eu como mãe, mas o Brasil, o Rio de Janeiro, a sociedade de uma maneira geral há muito esperava por isso. São seis anos e sete meses e 17 dias que nós estamos lutando e nunca paramos de acreditar. A gente sabia que isso um dia aconteceria. E eles, sim, [os criminosos] têm que pagar”, afirmou Marinete.

“Nossa coragem nos trouxe até aqui. É um dia muito difícil, porque eu tenho certeza de que nenhum de nós queria estar aqui hoje. A Ághata queria o Anderson aqui. Eu queria a minha mãe aqui. Mas o dia de hoje entra para a história e para a democracia desse país. E que a gente dê muitos passos pela frente ainda nesse caso como um todo. Esse é o primeiro passo por eles. A gente vai seguir lutando”, disse Luyara.

O pai de Marielle, Antônio Francisco, externou que o dia de hoje foi muito aguardado pela família, mas reforçou que ainda espera pela condenação dos mandantes do crime.

“Isso não acaba aqui. Porque há os mandantes. E agora a pergunta é quando serão condenados os mandantes. Porque aquele choro que eles exibem nas suas oitivas, para mim não é um choro sincero. Choro sincero foi o nosso, porque perdemos a nossa filha, a Ághata perdeu o Anderson e a Mônica perdeu a Marielle. Esse choro nosso é sincero. Naqueles eu não acredito e não vou acreditar nunca”.

 

Rio de Janeiro (RJ), 31/10/2024 – Família de Marielle e Anderson falam com a imprensa após anúncio das condenações de Ronnie e Élcio. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Próximo passos

Os acusados de serem mandantes dos crimes são os irmãos Chiquinho e Domingos Brazão, respectivamente, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) e deputado federal.

O delegado Rivaldo Barbosa, chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro na época do crime, é acusado de ter prejudicado as investigações. Os três estão presos desde 24 de março deste ano.

Por causa do foro, há um processo paralelo no Supremo Tribunal Federal (STF) que julga os irmãos Brazão e o delegado Rivaldo Barbosa. Também são réus no processo o ex-policial militar Robson Calixto, ex-assessor de Domingos Brazão, que teria ajudado a se livrar da arma do crime, e o major Ronald Paulo Alves Pereira, que teria monitorado a rotina de Marielle.

A motivação do assassinato de Marielle Franco, segundo investigadores, envolve questões fundiárias e grupos de milícia. Havia divergência entre Marielle e o grupo político do então vereador Chiquinho Brazão sobre o Projeto de Lei (PL) 174/2016, que buscava formalizar um condomínio na Zona Oeste do Rio de Janeiro.

Veja integra da sentença que condena assassinos de Marielle e Anderson

Ao ler a sentença da condenação de Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, a juíza Lúcia Glioche, do 4º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro, reconheceu que o sistema judiciário brasileiro é lento, mas que quem comete crimes no país em algum momento vai ser punido. 

“A Justiça por vezes é lenta, é cega, é burra, é injusta, é errada, é torta, mas ela chega. A Justiça chega mesmo para aqueles que, como os acusados, acham que jamais vão ser atingidos pela Justiça. Com toda dificuldade de ser interpretada e vivida pelas vítimas, a Justiça chega aos culpados e tira deles o bem mais importante depois da vida, que é a liberdade.”

Ela destacou as dificuldades de se investigar um crime e falou ainda sobre os anos de sofrimento pelo qual as famílias de Marielle Franco e de Anderson Gomes passaram em busca de respostas para o crime. 

No início da noite de hoje, os assassinos confessos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, os ex-policiais militares Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz foram condenados. Ronnie Lessa foi condenado a 78 anos, 9 meses e 30 dias. Élcio, a 59 anos, 8 meses e 10 dias.

Veja a íntegra da sentença:

“O júri é uma democracia. Democracia esta que Marielle Franco defendia.

Aqui prevalece a vontade do povo em maioria. Aqueles que atuam como os jurados nada recebem; prestam um serviço voluntário, gratuito, representando a vontade do povo no ato de julgar o semelhante, que é acusado de ter praticado um crime tão grave que é querer tirar a vida da outra pessoa.

Portanto, senhores jurados, obrigada em nome do Poder Judiciário. Obrigada em nome da população da cidade do Rio de Janeiro.

A sentença que será lida, agora, talvez não traga aquilo que se espera da Justiça. Talvez justiça que tanto se falou aqui fosse que o dia de hoje jamais tivesse ocorrido. Talvez justiça fosse Marielle e Anderson presentes. Como se justiça tivesse o condão de trazer o morto de volta.

Então dizemos que vítimas do crime de homicídio são aqueles que ficam vivos, precisando sobreviver no esgoto que é o vazio de permanecer vivo sem a vida daquele que foi arrancado do seu cotidiano.

A sentença não serve para tranquilizar as vítimas, que são Marinete, mãe de Marielle; Anielle, irmã de Marielle; Mônica, esposa de Marielle; Luyara, filha de Marielle; Ágatha, esposa de Anderson, e Arthur, filho de Anderson.

Homicídio é um crime traumatizante — finca no peito uma dor que sangra todo dia, uns dias mais, uns dias menos, mas todos os dias.

A pessoa que é assassinada deixa uma falta, uma carência, um vácuo. Que palavra nenhuma descreve. Toda a minha solidariedade e do Poder Judiciário às vítimas.

A sentença que será dada agora talvez também não responda à pergunta que ecoou pelas ruas da cidade do Rio de Janeiro, do Brasil e do mundo: Quem matou Marielle e Anderson?

Talvez ela não responda aos questionamentos dos 46.502 eleitores cariocas que fizeram de Marielle Franco a 5ª vereadora mais votada na cidade do Rio de Janeiro nas eleições municipais de 2016 — e que tiveram seu direito de representação ceifado no dia 14 de março de 2018.

Todavia, a sentença que será lida agora se dirige aos acusados aqui presentes. E mais: ela se dirige aos vários Ronnies e vários Élcios que existem na cidade do Rio de Janeiro — livres por aí.

Eu digo sempre que nesses 31 anos que eu sirvo ao sistema de Justiça, nenhum de nós do povo nunca saberá o que se passou no dia de um crime. Quem não estava na cena do crime, não participou dele, nunca sabe o que aconteceu.

Mesmo assim, o Poder Judiciário e hoje os jurados precisam julgar o crime com as provas que o processo apresenta, e trazer às provas para o processo, para os jurados é árduo.

Porém, com todas as dificuldades e todas as mazelas de investigar um crime, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro denunciou os acusados. Eles foram processados e tiveram garantido o seu direito de defesa — e foram julgados.

Por anos exercendo a plenitude do direito constitucional de autodefesa, os acusados juraram inocência, pondo a todo o tempo em dúvida a prova trazida contra eles. Até que um dia, no ano passado, 2023, por motivos que de verdade a gente jamais vai saber, o acusado Élcio fez a colaboração premiada. Depois o acusado Ronnie a fez também.

Os acusados confessaram a execução e a participação no assassinato da vereadora Marielle Franco.

Por isso, fica aqui para os acusados presentes e serve para os vários Ronnies e vários Élcios que existem por aí, soltos, a seguinte mensagem:

A Justiça por vezes é lenta, é cega, é burra, é injusta, é errada, é torta, mas ela chega.

A Justiça chega mesmo para aqueles que, como os acusados, acham que jamais vão ser atingidos pela Justiça. Com toda dificuldade de ser interpretada e vivida pelas vítimas, a Justiça chega aos culpados e tira deles o bem mais importante depois da vida, que é a liberdade.

A Justiça chegou para os senhores Ronnie Lessa e Elcio de Queiroz. Os senhores foram condenados pelos jurados do 4º tribunal do júri da capital:

a 78 anos e 9 meses de reclusão e 30 dias-multa para o acusado Ronnie;

a 59 anos de prisão e 8 meses de reclusão e 10 dias-multa para o acusado Élcio.

Saem os 2 condenados a pagar até os 24 anos do filho de Anderson, Arthur, uma pensão.

Ficam os 2 condenados a pagar, juntos, R$ 706 mil de indenização por dano moral para cada uma das vítimas — Arthur, Ághata, Luyara, Mônica e Marinete.

Condeno os acusados a pagarem as custas do processo e mantenho a prisão preventiva deles, negando o direito de recorrer em liberdade.

Agradeço as partes, a Defensoria Pública, às defesas dos 2 acusados. Agradeço aos serventuários da Justiça, aos policiais militares. Renovo o agradecimento aos jurados.

Encerro a sessão de julgamento e quebro a incomunicabilidade.

Tenham todos uma boa noite”.

Ronnie e Élcio são condenados por assassinar Marielle e Anderson

Assassinos confessos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, os ex-policiais militares Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz foram condenados nesta quinta-feira (31), pelo 4º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro. Ronnie Lessa foi condenado a 78 anos, 9 meses e 30 dias. Élcio, a 59 anos, 8 meses e 10 dias.

O júri entendeu que eles são culpados de três crimes: duplo homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, emboscada e recurso que dificultou a defesa da vítima), tentativa de homicídio contra Fernanda Chaves (assessora de Marielle) e receptação do veículo usado no crime. Marielle e Anderson foram assassinados em 14 de março de 2018. 

Ronnie e Élcio estão presos desde 12 de março de 2019. Eles fecharam acordo de delação premiada.  Os acusados de serem mandantes dos crimes são os irmãos Chiquinho e Domingos Brazão, respectivamente, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) e deputado federal. O delegado Rivaldo Barbosa, chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro na época do crime, é acusado de ter prejudicado as investigações. Os três estão presos desde 24 de março deste ano.

Por causa do foro, há um processo paralelo no Supremo Tribunal Federal (STF) que julga os irmãos Brazão e o delegado Rivaldo Barbosa. Também são réus no processo o ex-policial militar Robson Calixto, ex-assessor de Domingos Brazão, que teria ajudado a se livrar da arma do crime, e o major Ronald Paulo Alves Pereira, que teria monitorado a rotina de Marielle.

A motivação do assassinato de Marielle Franco, segundo os investigadores, envolve questões fundiárias e grupos de milícia. Havia divergência entre Marielle e o grupo político do então vereador Chiquinho Brazão sobre o Projeto de Lei (PL) 174/2016, que buscava formalizar um condomínio na Zona Oeste da capital fluminense.

Segundo dia de julgamento

Antes da decisão, os promotores de Justiça e os advogados dos réus fizeram a sustentacão oral perante o júri.

Os promotores defenderam que Ronnie e Élcio mataram Marielle por dinheiro e que quiseram assassinar também Anderson e Fernanda Chaves para não deixar testemunhas. Eles sustentaram que Élcio, motorista do carro usado no crime, teve a mesma culpa nos homicídios que Ronnie, que efetuou os disparos. De acordo com os promotores, ambos sabiam que a morte de Marielle tinha sido encomendada por ela ser vereadora e em razão de suas causas políticas.

O Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) disse que eles não se arrependeram e só fecharam acordo de delação premiada porque sabiam que seriam condenados. E que a condenação dos dois não foi pedida apenas por causa da delação, mas porque há provas contundentes contra eles.

Na apresentação, o MPRJ mostrou que Ronnie Lessa começou a se preparar desde o ano anterior, ao fazer buscas sobre a arma usada no crime, sobre como não ter sua movimentação rastreada e sobre a vida de Marielle. Segundo as investigações, Élcio também teria feito buscas sobre políticos aliados da vereadora.

Os promotores afirmaram que, apesar do acordo de delação, eles passarão bastante tempo na cadeia. A defensora pública Daniele Silva, que atuou como assistente de acusação, destacou o lado racial do crime, uma vez que Marielle era uma mulher negra que incomodou e “mexeu com as estruturas”. Já o MPRJ salientou que, apesar de o júri ser formado por sete homens brancos, e não ter nenhuma mulher negra, bastava o jurado ser uma “pessoa com valores dentro de si”.

Defesas

A defesa de Ronnie Lessa disse que, sem a confissão e a colaboração de seu cliente, seria difícil condená-lo apenas com as outras provas. Segundo o advogado Saulo Carvalho, ele colaborou porque quis e não por se sentir “encurralado”. Ele pediu a condenação de seu cliente, “mas que fosse justa, no limite da culpabilidade dele”, negando a qualificação de motivo torpe e por motivos políticos. Tampouco que o crime tenha sido um assassinato que dificultou a defesa das vítimas, apesar de reconhecer que foi uma emboscada. Além disso, disse que a intenção de Lessa era apenas matar a vereadora e não outros passageiros do carro dela.

A defesa de Élcio Queiroz também pediu uma condenação dentro dos limites da culpabilidade e disse que ele participou do crime, mas não conhecia Marielle nem tinha motivos para matá-la. A advogada Ana Paula Cordeiro afirmou que Élcio participou de uma emboscada, mas que a defesa da vítima não foi dificultada. Além disso, Élcio não sabia que Lessa mataria Anderson nem que acertaria Fernanda, porque acreditava que seu parceiro era um “exímio atirador”.

No período da tarde, o Ministério Público fez uso do direito à réplica e reforçou os argumentos para a condenação dos réus por cerca de duas horas. A defesa de Ronnie e de Élcio teve direito à tréplica e usou cerca de 10 minutos das duas horas a que tinha direito.

Justiça de São Paulo suspende leilão de concessão de escolas estaduais

A Justiça do estado de São Paulo suspendeu o leilão de concessão administrativa de 33 escolas estaduais, divididas em dois lotes: Oeste e Leste. Em ambos, o edital prevê a construção e a gestão administrativa das unidades escolares, incluindo serviços de manutenção e conservação, com prazo de concessão de 25 anos, e valores estimados em R$ 2,1 bilhões.

O leilão do Lote Oeste aconteceu na última terça-feira (29) e contempla a construção de 17 unidades escolares distribuídas em municípios da região oeste do Estado. 

A ação na Justiça foi movida pelo Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (APEOESP), que alega que o edital desconsidera o princípio constitucional da gestão democrática da educação, desrespeitando a integração necessária entre a administração do espaço físico escolar e as funções pedagógicas, resultando em uma terceirização indevida de atividades essenciais ao serviço público de educação.

“A educação, quando prestada pelo Poder Público, qualifica-se como serviço público essencial que se constitui dever do Estado, conforme definido nos artigos 6º, 24, inciso IX, e 205 da Constituição Federal que enfatizam a educação como direito social e de competência concorrente entre os entes federativos. Dessa forma, cabe ao Poder Público garantir o acesso e a qualidade ao ensino público e proporcionar a participação ativa de todos os envolvidos na comunidade escolar”, afirmou na decisão o juiz da 3ª Vara de Fazenda Pública, Luis Manuel Fonseca Pires.

Na liminar, Pires argumenta que a gestão democrática transcende a atividade pedagógica em sala de aula, pois envolve a maneira pela qual o espaço escolar é ocupado e vivenciado, muito além da “gestão” em sentido orçamentário, de edificação e preservação estrutural dos prédios. 

“A gestão democrática da escola envolve a direção pedagógica, a participação direta de professores, estudantes, pais e mães e comunidade local, na forma como se pensam e relacionam-se os espaços que vão além da sala de aula – corredores, quadras, jardins, refeitórios etc.”.

A decisão alega que o uso e destino de todo o ambiente escolar dizem respeito também ao que se idealiza e pratica-se no programa pedagógico. Segundo o juiz, as possibilidades de deliberar de modo colegiado e participativo por todos os atores envolvidos na educação não podem ser subtraídas da comunidade escolar com a transferência a uma empresa privada que teria o monopólio de gestão por 25 anos. Pires diz que o que fazer com os espaços da escola para alunas e alunos do ensino infantil é diferente das necessidades das crianças no ensino fundamental e dos adolescentes no ensino médio. 

O governo estadual ainda poderá recorrer da decisão. Em nota, o governo informou que ainda não foi notificado da decisão. “Assim que isso ocorrer, analisará o caso e adotará as medidas recursais cabíveis”, diz a nota.

Leilão 

O vencedor do leilão do Lote Oeste foi o Consórcio Novas Escolas Oeste SP, que ofereceu um desconto de 21,43% em relação ao valor de referência do leilão, que era de R$ 15,8 milhões mensais. Os pagamentos serão iniciados quando as escolas estiverem prontas. A empresa será responsável por merenda, internet, segurança, infraestrutura e limpeza das escolas.

O consórcio tem como empresa líder a Engeform Engenharia, uma das empresas que compõem a Consolare, que administra sete cemitérios na cidade de São Paulo: Consolação, Quarta Parada, Santana, Tremembé, Vila Formosa I e II e Vila Mariana. Sob seu comando, o preço cobrado para a realização de enterros multiplicou por cinco.

Já o Lote Leste tem a licitação agendada para o dia 4 de novembro e abrange 16 unidades construídas nas cidades de Aguaí, Arujá, Atibaia, Campinas, Carapicuíba, Diadema, Guarulhos, Itapetininga, Leme, Limeira, Peruíbe, Salto de Pirapora, São João da Boa Vista, São José dos Campos, Sorocaba e Suzano.

AGU: propor anistia a condenados do 8 de janeiro é inconstitucional

O ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, disse que é inconstitucional qualquer projeto de lei que proponha a concessão de anistia às pessoas condenadas judicialmente por envolvimento nos atos golpistas do dia 8 de janeiro de 2023.

“Na minha leitura, como jurista, isso é inconstitucional. Não se pode dar anistia a praticantes de crimes que tentem abolir o Estado de Direito, a democracia”, afirmou o ministro ao participar, nesta quinta-feira (30), do programa Bom Dia, Ministro, do Canal Gov e transmitido pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

Segundo Messias, a AGU foi a primeira instituição governamental a pedir a prisão dos envolvidos na depredação do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e da sede do Supremo Tribunal Federal (STF). Justamente, por entender que o que houve foi uma “grave tentativa golpista”.

“Essas pessoas não foram [à Praça dos Três Poderes, em Brasilia] brincar. Elas não foram levar a família para passear. Foram tentar dar um golpe de Estado”, acrescentou o ministro ao questionar a postura de quem defende a anistia.

“Falar em anistia, neste momento, é uma agressão à população brasileira. Temos que falar é em punição dos golpistas. E não só [punição] criminalmente, como também pelos danos que eles causaram”, declarou Messias, explicando que a AGU já pediu à Justiça Federal que determine o bloqueio de ao menos R$ 100 milhões em bens de envolvidos nos ataques de 8 de janeiro a fim de garantir o ressarcimento dos danos causados ao patrimônio público.

“Além de cumprirem pena na cadeia, [os envolvidos] têm que pagar cada obra que quebraram, cada cadeira, cada lâmpada. Quero perguntar a todas as pessoas envolvidas nessa discussão [sobre uma eventual anistia aos condenados] o que elas viram [em Brasília] no dia seguinte? Como elas encontraram a Câmara dos Deputados, o Senado, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal?  Acho que a sociedade espera uma outra perspectiva de todos nós, agentes públicos”, finalizou o ministro.

Na última terça-feira (29), o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP/AL) anunciou a criação de uma comissão especial para analisar o Projeto de Lei nº 2.858/22 , que concede anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.O PL propõe que os condenados pelos atos golpistas sejam perdoados, incluindo os financiadores, incentivadores e organizadores. Para especialistas em direito ouvidos pela Agência Brasil, embora a Constituição não vete textualmente a iniciativa, há elementos constitucionais que, por coerência à lei, inviabilizam a anistia.

STF: União e Rio têm 30 dias para conciliação sobre dívida pública

O Supremo Tribunal Federal (STF) fixou nesta quarta-feira (30) prazo de 30 dias para o governo do Rio de Janeiro e a União apresentarem propostas de conciliação sobre o pagamento da dívida pública do estado.

O prazo foi definido durante uma audiência de conciliação convocada pelo ministro Dias Toffoli, relator da ação que trata do caso.

A conciliação foi determinada após a suspensão da multa aplicada pela União ao governo estadual pela inadimplência no pagamento de parcelas da dívida oriunda do Regime de Recuperação Fiscal (RRF), assinado em 2021.

Após participar da audiência, o governador Claudio Castro disse que quer discutir os juros que foram pagos pelo Rio e a possibilidade de desconto no pagamento da dívida.

Segundo Castro, ao longo dos anos, o estado foi prejudicado por leis federais que causaram impacto negativo nas contas estaduais. A dívida atual é de R$ 196 bilhões.

“Toda vez que se faz um alongamento da dívida volta aos primeiros anos, que são prejudiciais ao devedor.  Então, o Rio sempre acabou sofrendo porque nunca sai dos anos iniciais para ir para os anos médios e finais, que são os anos que a parcela começa em um valor razoável. O Rio só pagou juros”, afirmou.

O governador também afirmou que não quer o perdão da dívida, mas o pagamento justo das parcelas.

“Eu poderia pedir o cancelamento total da dívida, mas eu acho um sinal muito ruim. O devedor tem que pagar sua dívida, mas pagar de uma maneira justa. O que a gente está cobrando aqui é que esse pagamento seja justo e da maneira equilibrada”, completou.

Recuperação

O Regime de Recuperação Fiscal, criado pela Lei Complementar 159 de 2017, permite que estados em situação de desequilíbrio fiscal tenham benefícios, como a flexibilização de regras fiscais, concessão de operações de crédito e a possibilidade de suspensão do pagamento da dívida.

Em contrapartida, as unidades da federação devem adotar reformas institucionais que permitam a reestruturação do equilíbrio fiscal, como a aprovação de um teto de gastos, a criação de previdência complementar e a equiparação das regras do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), no que couber, às regras dos servidores da União.

O estado do Rio de Janeiro solicitou ingresso no regime ainda em 2017.

Um novo RRF foi criado pela União em janeiro de 2021. O Rio de Janeiro, sem conseguir equilibrar suas contas no RRF anterior, entrou com pedido de adesão ao novo regime em maio daquele ano, mas seu plano só seria aprovado em junho do ano passado.

Familiares de Marielle e Anderson relatam impactos das mortes

Familiares da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, mortos em 14 de março de 2018, prestaram depoimento nesta quarta-feira (30) no primeiro dia de julgamento de Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, assassinos confessos da vereadora, no 4º Tribunal de Júri, no Rio de Janeiro.

Marinete Silva, mãe de Marielle; Mônica Benício, viúva da vereadora, e Ágatha Arnaus, viúva de Anderson Gomes, relataram o quanto os assassinatos impactaram a vida das famílias nesses seis anos e sete meses.

Os réus respondem pelos crimes de duplo homicídio triplamente qualificado – motivo torpe, emboscada e recurso que dificultou a defesa da vítima -, tentativa de homicídio contra Fernanda Chaves, assessora de Marielle e receptação do veículo usado no crime.

Os dois acusados estão acompanhando os depoimentos por videoconferência diretamente das unidades onde estão presos. Ronnie Lessa está na Penitenciária de Tremembé, no interior de São Paulo, e Élcio está no Centro de Inclusão e Reabilitação, em Brasília.

São esperadas nove testemunhas no total, sendo sete indicadas pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro e duas pela defesa de Ronnie Lessa. A defesa de Élcio Queiroz desistiu de ouvir as testemunhas que havia requerido anteriormente.

Depoimentos

A primeira testemunha ouvida foi Fernanda Chaves, que estava no carro com a vereadora Marielle Franco e com o motorista Anderson Gomes no momento do crime. Na sequência, falaram Marinete Silva, Mônica Benício e Ágatha Arnaus.

Inquirida pelo Ministério Público e pelos advogados assistentes de acusação, Marinete Silva, mãe de Marielle, não se opôs a que os réus acompanhassem seu depoimento. Ela classificou como crueldade o assassinato e disse esperar uma condenação justa pelo que aconteceu com sua filha.

“Era minha primogênita, minha primeira filha. Era uma filha que eu me dediquei a vida inteira para criar, com muito sacrifício. Tiraram um pedaço de mim. A gente quer e precisa de uma condenação justa para minha filha. Espero essa condenação e a sociedade espera essa condenação”, declarou Marinete.

Marinete disse que não concordava com a vontade da filha de se eleger vereadora, mas que não podia impedir. “Eu fui contra. Eu não sentia uma coisa boa no meu coração em relação a um mandato partidário. Isso me preocupou bastante, mas quem era eu naquela época para contrariar aquela mulher com quase 38 anos?”, disse.

Mônica Benício

A vereadora Mônica Benício, viúva de Marielle, chorou em diversos momentos do depoimento, e disse precisar de remédios e tratamento psicológico até hoje para lidar com a perda. 

Questionada pela promotoria sobre o engajamento de Marielle em questões fundiárias, uma das possíveis causas para o assassinato, Mônica confirmou que eram pautas prioritárias na atuação política da vereadora.

“Eu sou arquiteta e urbanista de formação, então essa pauta sempre me interessava e acompanhava, ouvindo um pouco mais de perto. Marielle tinha uma companheira arquiteta e urbanista, e ela estava no mandato justamente para discutir o direito à cidade, de maneira interseccional. E Marielle também defendia o direito à moradia digna na perspectiva da favela e da periferia”, disse Mônica.

A viúva de Marielle reforçou o quanto ela era atuante como vereadora e que o assassinato interrompeu uma trajetória em ascensão no campo político.

“Marielle estava no momento mais feliz da vida dela. Isso ela mesmo reconhecia na vida profissional. Não tinha dúvida nenhuma. Quem acompanhou a campanha, o início do mandato de Marielle a viu, um ano e três meses depois, a viu se transformar em uma figura enorme. Fosse pelas falas, pela postura, fosse pela segurança, reconhecimento pessoal do que queria. Ela era uma figura em ascensão política no partido, isso era notório”, disse Mônica.

Sobre a expectativa em relação ao julgamento, Mônica comentou a importância das condenações para a sociedade. Mas disse que, no campo pessoal, uma justiça plena é impossível.

“A única justiça possível seria não precisar estar aqui e ter a Marielle e o Anderson vivos. Mas para além disso, dentro do que é possível, eu espero que se faça a justiça que o Brasil e o mundo esperam há seis anos e sete meses. Porque isso é importante também. Não só para o símbolo, mas para Marielle Franco, defensora de direitos humanos, para o Anderson, pai do Arthur e marido da Ághata, enquanto pessoas, para que a gente possa dar o exemplo de crimes como esses não podem voltar a acontecer”, disse Mônica.

Ágatha Arnaus

A viúva de Anderson Gomes, Ágatha Arnaus, foi a quarta a depor nesta quarta-feira. Além da dor causada pela perda do marido, ela comentou o impacto sobre os cuidados do filho Arthur, que tem uma condição rara de saúde, e tinha um ano e oito meses na época do assassinato. Ela tem certeza de que o filho teve atrasos de desenvolvimento por causa da morte do pai.

“Eu tenho certeza que sim, porque desde a barriga quando o Anderson falava, o Arthur se mexia. A primeira coisa que o Arthur falou foi papai. Uma criança que sempre esteve com os dois. E aí, depois, por não ter pai, a mãe ficou saindo o tempo todo para ir à delegacia, para ir em caminhadas, para voltar a trabalhar”, disse Ágatha.

“O Arthur passava mal todo dia 13 ou 14 do mês, depois da morte do Anderson. Acho que muito também por ver na televisão e pelo jeito que eu chegava em casa. Ele já tinha perdido o pai. Eu estava resolvendo outras coisas também relacionadas à morte. Momento que ele ficou sem o pai e sem a mãe, porque muitas vezes eu estava na rua resolvendo outras coisas”, complementou.

Ter de lidar com todas as questões de saúde do filho sem Anderson a levaram ao limite, revelou. “O pior momento foi seis meses depois do assassinato, quando Arthur precisou passar por uma cirurgia. Os médicos chegaram a falar que ele não aguentaria, que eu deveria estar preparada. Foi a única vez que eu achei que ele não aguentaria. E eu passei a achar naquele momento, sem o Anderson, que eu também perderia o Arthur, que eu ficaria sozinha, e que minha família tinha acabado”.

A viúva disse que está na expectativa para que os acusados sejam finalmente responsabilizados pelo crime.

“Eu espero que as pessoas que me tiraram o Anderson, o pai do Arthur, paguem pelo o que elas fizeram. Eu não tenho como repor de forma alguma, eu não substituo o Anderson de forma alguma para o Arthur”, disse ao encerrar o depoimento.

STF faz audiência de conciliação sobre dívida do Rio com a União

O Supremo Tribunal Federal (STF) realiza nesta quarta-feira (30) uma audiência de conciliação sobre a dívida do estado do Rio de Janeiro com o governo federal.

A conciliação foi determinada pelo relator do caso, ministro Dias Toffoli, após a suspensão da multa aplicada pela União ao governo estadual pela inadimplência no pagamento de parcelas da dívida oriunda do Regime de Recuperação Fiscal (RRF), assinado em 2021.

Na abertura da audiência, Toffoli defendeu o modelo de mediação para resolver os conflitos fiscais entre os estados e União. Ele também defendeu uma repactuação nacional das dívidas.

Segundo o ministro, as duas partes apresentaram razões pertinentes sobre o pagamento da dívida.

“O juiz vê razões de ambos os lados. O ideal realmente é a mediação, é que os entes da federação possam compartilhar os devidos entendimentos”, afirmou.

Dias Toffoli que o governador Cláudio Castro informou ao Supremo que a dívida do estado com a União subiu 13% no período de um ano, entre 2022 e 2023, saindo de R$ 138,8 bilhões para R$ 156,8 bilhões.

Por outro lado, o governo federal alegou que o Rio aumentou em 30% os gastos com pessoal, entre 2021 e 2023.

A audiência prosseguirá até o final da tarde, quando uma proposta de conciliação deve ser apresentada pelas partes.

Recuperação

O Regime de Recuperação Fiscal, criado pela Lei Complementar 159 de 2017, permite que estados em situação de desequilíbrio fiscal tenham benefícios, como a flexibilização de regras fiscais, concessão de operações de crédito e a possibilidade de suspensão do pagamento da dívida.

Em contrapartida, as unidades da federação devem adotar reformas institucionais que permitam a reestruturação do equilíbrio fiscal, como a aprovação de um teto de gastos, a criação de previdência complementar e a equiparação das regras do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), no que couber, às regras dos servidores da União.

O estado do Rio de Janeiro solicitou ingresso no regime ainda em 2017.

Um novo RRF foi criado pela União em janeiro de 2021. O Rio de Janeiro, sem conseguir equilibrar suas contas no RRF anterior, entrou com pedido de adesão ao novo regime em maio daquele ano, mas seu plano só seria aprovado em junho do ano passado.

Após morte de torcedor, federação proíbe Mancha Alvi Verde em estádios

Após a morte de um torcedor do Cruzeiro no último domingo, a Federação Paulista de Futebol (FPF) decidiu proibir a entrada da Mancha Alvi Verde – principal torcida organizada do Palmeiras – em jogos realizados nos estádios e arenas do estado de São Paulo.

A medida havia sido recomendada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MPESP), que abriu investigação sobre o caso.

Para o MP, o ocorrido demonstrou que as torcidas organizadas agem como “facções criminosas”. “O enfrentamento de grupos formados por pretensos torcedores da Sociedade Esportiva Palmeiras e do Cruzeiro Esporte Clube resultou, infelizmente, em um saldo trágico, deixando diversos feridos e um morto. Tal episódio é inaceitável e representa uma grave afronta à segurança pública e à convivência pacífica em nossa sociedade”, escreveu o procurador-geral de Justiça, Paulo Sérgio de Oliveira e Costa.

Um torcedor do Cruzeiro, de 30 anos, morreu no último domingo após um ônibus da torcida organizada Máfia Azul ter sido interceptado por torcedores da Mancha Alvi Verde, do Palmeiras, na Rodovia Fernão Dias, perto da cidade de Mairiporã, na região metropolitana de São Paulo. De acordo com a Polícia Civil, que também investiga o caso, houve uma emboscada.

Envolvidos identificados

Hoje (30), a Delegacia de Polícia de Repressão aos Delitos de Intolerância Esportiva (Drade) informou que parte dos envolvidos nessa emboscada aos torcedores do Cruzeiro já foi identificada. “A autoridade policial segue empenhada no esclarecimento dos fatos”, acrescentou.

Em nota divulgada no domingo (27), a Federação Paulista de Futebol havia lamentado o ocorrido. “O atentado, promovido por bandidos que usam indumentárias alusivas ao futebol e a clubes, é mais um triste episódio que deve ser severamente punido pelas autoridades competentes. O futebol jamais pode ser usado como pretexto para que indivíduos cometam crimes, e a FPF atuará sempre para que o esporte seja um ambiente de paz, entretenimento e transformação social positiva”, informou a federação.

A Mancha Alvi Verde ainda não se manifestou sobre a decisão. Mas negou que tenha sido responsável pelo ocorrido. “Lamentamos profundamente mais esse triste acontecimento e manifestamos nossa solidariedade e demonstramos nossa consternação aos familiares da vítima, repudiando com veemência tais atos de violência. Queremos, desde já, deixar claro que a Mancha Alvi Verde não organizou, participou ou incentivou qualquer ação relacionada a esse incidente. Com mais de 45 mil associados, nossa torcida não pode ser responsabilizada por ações isoladas de cerca de 50 torcedores, que desrespeitam os princípios de paz que promovemos e defendemos”, diz a nota.

Defesa de bandeiras de Marielle continua após sua morte, diz assessora

“Nem quando morreu, ela parou”. A frase é a explicação de Fernanda Chaves, ex-assessora da vereadora Marielle Franco (Psol), sobre como era a presença da parlamentar por onde ela passava, durante o julgamento dos ex-policiais Ronnie Lessa e Élcio Queiroz, que começou na manhã desta quarta-feira (30) no 4º Tribunal do Júri do Rio, no centro da cidade.

Fernanda, sobrevivente no ataque, que resultou nos assassinatos de Marielle e do motorista Anderson Gomes, no dia 14 de março de 2018, contou que se os que promoveram o ataque pensaram que a morte da parlamentar acabaria com a defesa das suas bandeiras, se enganaram”.

“É difícil ver nessas manifestações. Quando a gente tem que dizer ‘Marielle Vive’ eu sinto um negócio atravessado e quase não consigo dizer, porque ela não está aqui, não posso abraçá-la, não consigo sentir o cheiro dela. É dolorido demais, mas, ao mesmo tempo, o que a Marielle significa. O que ela é de essência, está inteiro. Essas pessoas que pensaram e desejaram interromper Marielle, elas não conseguiram interromper. Elas tiraram Marielle da gente, mas não conseguiram interromper o que significa Marielle. Vão passar o resto das vidas delas infelizes tendo que ouvir Marielle Vive, tendo que se deparar com leis pensadas pelo mandato dela e por ela, tendo que ver a cara dela em muros pelo mundo afora, placas de rua. Não interromperam Marielle”, afirmou respondendo a uma representante da assistência de acusação.

A jornalista Fernanda Chaves, foi a primeira testemunha a depor no julgamento. A juíza Lucia Glioche, titular do 4º Tribunal do Júri do Rio, disse logo de início que diante da qualidade de vítima não pediria a ela que fizesse o compromisso de falar a verdade e a orientou: “O que não souber, diga que não sabe; o que não quiser responder, diga que não quer responder; o que não se lembrar, diga que não se lembra”, pontuou a juíza.

Além do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), puderam fazer perguntas à testemunha, representantes de assistentes de acusação e da defesa dos réus.

A primeira pergunta que respondeu foi sobre o como passou o dia dos assassinatos. Fernanda lembrou que aquele 14 de março de 2018 começou como um dia normal de trabalho. Por volta das 18h a vereadora saiu para o compromisso na Casa das Pretas, na Lapa, centro do Rio, onde participaria de uma roda de conversa com mulheres. Fernanda foi se encontrar mais tarde com Marielle lá e saiu no carro dirigido por Anderson com a vereadora, que tinha urgência de chegar em casa. A jornalista contou que costumava pegar carona porque eram vizinhas no bairro da Tijuca, zona norte da cidade.

Diferente do que costumava acontecer, Marielle preferiu ficar no banco de trás porque estava cansada. No caminho conversavam e ficaram lendo mensagens no celular. Marielle pediu para ouvir o jogo do Flamengo. Quando passavam pelo bairro do Estácio, na zona norte, Fernanda revelou que ouviram uma rajada de tiros, sem entender o que estava ocorrendo, em um ato de reflexo se curvou atrás do banco onde estava o motorista e de lá pôde ver quando ele abaixou o braço direito e reclamou de dor. Ao lado dela, Marielle não esboçava reação. “Marielle estava imóvel, senti o braço dela por cima de mim, o peso do corpo dela. Eu estava sem cinto, por isso consegui me abaixar atrás do banco”, relatou.

“Eu acreditava que tinha acabado de passar pelo meio de um tiroteio, até porque infelizmente isso é o Rio de Janeiro, então, na minha cabeça precisava sair do carro para pedir ajuda”, completou, acrescentando que em seguida, algumas pessoas que estavam na calçada em frente começaram a se aproximar. Ainda confusa com a situação pediu ajuda para chamar uma ambulância ao local.

A testemunha contou que teve a sua vida transformada pelos assassinatos e até hoje passados quase 7 anos do ataque não conseguiu voltar ao gabinete onde Marielle exercia o mandato. Logo após o atentado recebeu o apoio da Anistia Internacional e se mudou para Madri, na Espanha, na condição de proteção de testemunha. Foi junto com o marido Marcelo e a filha de seis anos na época Rosa, afilhada de Marielle. Todos tiveram suas atividades alteradas. O marido precisou fechar o escritório e a filha deixou a escola. Na volta ao Brasil foi morar fora do Rio e ainda com dificuldade de encontrar um emprego na área que atua como assessora política. Entrou em um programa de proteção dos direitos humanos. “Março de 2018 nunca saiu de dentro da gente”,disse.

Como amiga de Marielle, que também era madrinha de seu casamento, Fernanda sente a tristeza de não ter podido estar no velório e no enterro. “Foi muito doloroso para mim. Eu fui obrigada a não participar dos ritos da Marielle. Marielle era madrinha da minha filha, não pude ir para o velório, não pude ir para o enterro, eu fui impedida. As pessoas acham glamuroso estar fora do Brasil, mas eu sequer conseguia desfazer as minhas malas” revelou.

A jornalista comentou que o mandato de Marielle era muito voltado às questões de direitos humanos e que a parlamentar se preocupava com a situação de moradia, além da questão de gênero, que era uma paixão dela. “Para falar em moradia tem que falar da questão das mulheres, que em geral estão à frente das famílias”, observou.

“No parlamento ela também tinha esse envolvimento de agregar acolhendo todas as demandas ainda que não fossem as que levaram ela aos 46 mil votos [recebidos por Marielle na sua eleição]”

Fernanda Chaves respondeu ainda ao MP como era a Marielle do conjunto de favelas da Maré. “Tinha orgulho de dizer que o pai era um dos primeiros moradores da maré e que tinha memória das palafitas [antes da urbanização as casas dessa comunidade eram construídas sobre palafitas]”.

“É difícil descrever a Marielle, porque ela era muita coisa. Marielle tinha muito amor. Marielle queria viver muito e tudo. Queria experenciar tudo que fosse possível. Eu falei para ela em vida nas discussões de como vai ser, como vai ser a eleição. Na época, ventilava-se que deveria ser senadora. Eu pude dizer para ela, porque acredito nisso, que ela ia ser o que quisesse. O dia que ela cismasse ser presidenta, seria desde que ela quisesse. Ela foi sempre para onde queria. Sempre conseguiu realizar o que queria mesmo que o mundo tentasse atrapalhar, como atrapalha a trajetória de pessoas negras, de mulheres, de mulheres faveladas e periféricas, LGBTQI”, comentou.

No fim do depoimento, a juíza questionou se algum jurado queria fazer pergunta, mas ninguém quis. Como também o representante da defesa de Élcio Queiroz.