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Crianças do Complexo da Maré relatam violência policial

“Um dia deu correria durante uma festa, minha amiga caiu no chão, eu levantei ela pelo cabelo. Depois a gente riu e depois a gente chorou”. O trecho é do livro Eu devia estar na Escola. A correria é por conta de uma operação policial realizada no Complexo da Maré, complexo de favelas localizado na zona norte do Rio de Janeiro, e quem conta é uma criança.

O livro é uma parceria entre a ONG Redes da Maré e a editora Caixote, reúne depoimentos de crianças e adolescentes da Maré, de situações de violência que viveram no próprio território. “Toda criança pode sentir medo, vai sentir medo e faz parte da vida da criança sentir medo. Mas é diferente sentir medo do monstro debaixo da cama ou de abrir o guarda-roupa à noite e sair de lá uma bruxa, e sentir medo de perder a vida, né? Esse medo de perder a vida elas não deveriam sentir”, diz uma das escribas do livro, Ananda Luz. 

Ananda Luz, uma das escribas do livro por Editora Caixote/Divulgação

Ananda se identifica como escriba porque ela, junto com Isabel Malzoni, organizou os depoimentos e desenhos das crianças e adolescentes. Tanto que quando o livro ficou pronto e elas o apresentaram para as crianças que participaram de todo o processo, logo essas crianças identificaram aquela publicação como sendo também delas.

“Uma delas chegou para mim e falou assim, tia, esse é o nosso livro? Eu parei, sabe aquela coisa de parar dois segundos e falar, era isso. Eu queria que essas crianças falassem, esse é o nosso livro. Eu falei, sim, é o nosso livro. E aí quando eu abro e mostro para ela, ao mesmo tempo que ela lida, e é um assunto difícil, ela fica feliz de ver como ela foi representada, com esse cuidado, com esse carinho, que é expresso desde o processo das falas delas aos desenhos dessas crianças ali”, disse Ananda.

O livro foi elaborado em parceria com a ONG Redes da Maré. A história do livro começa muitos anos antes do lançamento, em 2019, quando a ONG entrega ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro as cartas e os desenhos com depoimentos de crianças sobre a violência que experienciaram. Isabel tem contato com o projeto e imediatamente vê o potencial para se tornar também um livro.

De acordo com dados organizados pela ONG Fogo Cruzado no portal Futuro Exterminado, 642 crianças e adolescentes com idades entre 0 e 17 anos foram baleadas no Grande Rio desde julho de 2016. Isso quer dizer que, em média, a cada quatro dias uma criança ou adolescente é baleado. Dessas, 289 morreram.

Do total, quase metade das crianças ou adolescentes atingidos, o equivalente a 47,6%, foi ferida durante operações policiais. Os dados mostram ainda que um a cada três das crianças e adolescentes alvejados foi vítima de bala perdida. Eles estavam a caminho da escola ou da padaria, brincando no quintal ou correndo com amigos.

Rio de Janeiro (RJ) 12/04/2024 – Livro reúne depoimentos de crianças da Maré sobre violência policial . Foto: Editora Caixote/Divulgação – Editora Caixote/Divulgação

As cartas foram escritas pelas crianças após o assassinato de Marcus Vinicius da Silva, de 14 anos, em 2018. Ele foi morto durante uma operação militar no Complexo da Maré quando estava a caminho da escola.

Elaboração do livro

Ananda diz que seria difícil entrar em contato com as crianças que escreveram as cartas, pois a intenção era proteger a identidade delas. As escribas, com o apoio da Redes da Maré passaram, então, a se reunir com crianças e adolescentes e a coletar novos depoimentos. Ao todo, foram ouvidas mais de 200 que fazem parte de projetos do Redes da Maré. As escribas queriam saber como elas viam as situações de violência que ocorriam na favela.

“A gente nunca escuta as crianças de fato, né, a gente sempre acha que a gente consegue resolver aquelas crianças como adulto e, aí, o livro mostra que elas sabem que elas têm consciência do que atravessam elas e do que pode ser diferente né, então acho que também é um diálogo que é importante a gente trazer”, diz Ananda.

A partir das primeiras escutas, foi formado um grupo menor que passou a ser acompanhado diariamente. Foi desse grupo que saiu o livro. Eu devia estar na Escola reúne desenhos e depoimentos de crianças e adolescentes moradores do Complexo da Maré sobre as violências que ocorrem sobretudo durante as operações policiais.

 Isabel Malzoni  Editora Caixote/Divulgação

“É um livro que traz as vozes delas para falar sobre violência, porque as crianças têm a capacidade de falar sobre o que afeta elas, seja de forma negativa ou seja de forma positiva. Então, também, eu acho que é um convocar que a gente precisa escutar mais as crianças. A gente precisa olhar com horizontalidade para o que ela diz e para que a gente possa também garantir que elas tenham essa cidadania plena garantida”, afirma Ananda.

A capa do livro é envolta por uma segunda capa, na qual estão trechos dos depoimentos das crianças que falam sobre medo. Nela está também um veículo policial blindado, conhecido como caveirão, apontado para as crianças. Quando essa capa é retirada, o cenário muda. As crianças estão felizes jogando bola e brincando.

“O livro tem esse esperançar, porque a gente via isso na criança que estava conversando com a gente, nos adolescentes, via que existia e existe possibilidade de mudança, eles mesmos apontavam. A Maré é um lugar legal pra se viver, eles apontavam isso pra gente. Aqui tem o melhor açaí do mundo, eu ouvi isso de uma criança. A outra falou, eu amo jogar futebol na rua. E elas iam contando as coisas boas que tinham na Maré”, diz.

O livro está à venda pela editora Caixote

AGU envia ao STF parecer sobre ação contra acordo da Braskem

A Advocacia-Geral da União (AGU) enviou nesta quinta-feira (11) ao Supremo Tribunal Federal (STF) parecer sobre a ação na qual o governo de Alagoas contesta a legalidade do acordo feito entre a prefeitura de Maceió e a mineradora Braskem para ressarcimento do R$ 1,7 bilhão pelos prejuízos causados pela extração de sal-gema na capital alagoana.

Apesar de opinar pela rejeição da ação por motivos processuais, a AGU defende que o acordo deve garantir que entidades e pessoas prejudicadas pelo desastre ambiental e que não participaram do acordo podem reivindicar seus direitos na Justiça.

O parecer também sustenta que a mineradora não pode obter ganhos financeiros com os imóveis danificados pelo desastre e que foram transferidos a partir do acordo.

“A leitura conjugada das cláusulas impugnadas nesta ação direta com o arcabouço antes referido leve à conclusão de que não houve quitação ampla, geral ou irrestrita dos danos provocados pela Braskem, assim também que a transferência de propriedade não lhe franqueou, em nenhum momento, a exploração lucrativa dos imóveis”, argumentou a AGU.

O governo de Alagoas alega que o acordo impede a integral reparação dos afetados pela mineração de sal-gema no estado. Além disso, o governo questiona trechos que autorizam a empresa a se tornar proprietária de terrenos e continuar a explorar a região devastada.

Os acordos foram assinados pela Braskem em 2019, 2020 e 2022 com os seguintes órgãos: Ministério Público Federal, Ministério Público de Alagoas, Defensoria Pública da União, Defensoria Pública de Alagoas e prefeitura de Maceió.

Consórcio Infraestrutura MG vence leilão de relicitação da BR-040

O Consórcio Infraestrutura MG venceu o leilão de relicitação da BR-040, no trecho que liga Belo Horizonte a Juiz de Fora, em Minas Gerais. O leilão foi realizado na tarde de hoje (11) na sede da B3, em São Paulo, e contou com a presença do ministro dos Transportes, Renan Filho.

O consórcio ofereceu o maior valor de desconto para o pedágio, com a proposta de desconto de 11,21% sobre a tarifa base. Também participaram do certame o Consórcio Vetor Norte, que ofereceu desconto de 0%, e a CCR, com a proposta de 1% de desconto. Uma quarta empresa havia manifestado interesse em participar do leilão, mas foi desclassificada por não estar em conformidade com as cláusulas do edital.

“O resultado nos traz forte motivação e estamos muito preparados para a implementação dessa nova concessionária. A continuidade do programa federal do programa de concessão de rodovias, com mais esse evento hoje, é de fundamental relevância para o Brasil e deverá prover benefícios permanentes aos usuários da BR-040 entre Belo Horizonte e Juiz de Fora”, disse José Carlos Cassaniga, presidente do grupo EPR, que integra o consórcio vencedor.

Segundo a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), responsável pelo leilão, este foi o certame mais concorrido desde 2018. Foi também a primeira relicitação realizada pela ANTT, já que este trecho havia sido concedido à iniciativa privada, mas foi devolvido ao poder público em 2017.

Atualmente, o trecho é administrado pela concessionária Via 040. Desde 2014, ela responde pela rodovia na extensão que vai de Juiz de Fora até Brasília. O contrato firmado previa, entre outras coisas, que fossem duplicados mais 714,5 km da rodovia nos primeiros cinco anos. Segundo um relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), até 2020, houve obras de duplicação em apenas pouco mais de 70 km.

Em 2017, a Via 040 alegou dificuldades financeiras e manifestou o desejo de devolver a concessão. Dois anos depois, um pedido para relicitação do trecho sob sua responsabilidade foi aprovado pela ANTT.

Na B3, o ministro Renan Filho, disse que a BR-040 é uma das mais importantes do país e foi aberta ainda no Brasil Império. “É uma das mais representativas do país pela sua história, pelas regiões que ela corta [Distrito Federal, Minas Gerais e Rio de Janeiro] e pela importância econômica que possui. Para nós todos do ministério esse é um dia feliz e exitoso. Essa é a primeira relicitação que chega ao final”, afirmou.

Segundo o ministro, neste ano ainda serão realizados mais cinco leilões de rodovias mineiras e a meta do governo federal é realizar 35 novos leilões em todo o país. “Oito deles [propostas de leilões] já estão no TCU [em avaliação pelo Tribunal de Contas da União], em fase final.”

A concessão

A concessão é pelo período de 30 anos e engloba um trecho de 232,1 km da BR-040/MG. O projeto prevê investimentos de cerca de R$ 8,7 bilhões, abrangendo 163,9 km de duplicações, 42 km de faixas adicionais, 15,3 km de vias marginais, 14,2 km de ciclovias, oito passarelas, 57 pontos de ônibus, cinco postos da Polícia Rodoviária Federal (PRF) e um ponto de parada e descanso para motoristas profissionais.

A concessão prevê ainda o Desconto para Usuários Frequentes (DUF) e a opção de pagamento automático para motoristas, com o uso de TAG’s. Os usuários frequentes são aqueles que utilizam apenas trechos da rodovia várias vezes por mês, como ocorrem com cidadãos que moram e trabalham em cidades próximas.

Justiça revoga prisão de suspeitos de ajudar em fuga de penitenciária

A 8ª Vara da Justiça Federal em Mossoró (RN) revogou, nesta quarta-feira (10), as prisões de cinco suspeitos detidos preventivamente, suspeitos de terem colaborado para que dois detentos fugissem da Penitenciária Federal em Mossoró, em 14 de fevereiro.

Como o processo está sob sigilo, nem o nome do juiz que determinou a imediata soltura dos suspeitos, nem os nomes dos cinco detentos beneficiados pela sentença foram divulgados até a publicação desta notícia.

Segundo a assessoria da seção judiciária federal no Rio Grande do Norte, além de revogar as prisões, o mesmo magistrado anulou os efeitos de outros dois mandados de prisão ainda não cumpridos e cujos alvos eram considerados foragidos.

Deibson Cabral Nascimento e Rogério da Silva Mendonça escaparam da penitenciária de segurança máxima na última Quarta-Feira de Cinzas. A unidade potiguar estava passando por uma reforma interna e, segundo investigações preliminares, Nascimento e Mendonça teriam usado ferramentas que encontraram largadas dentro do presídio para abrir o buraco por onde fugiram de suas celas individuais.

A fuga foi a primeira registrada no sistema penitenciário federal desde que este foi criado, em 2006, com o objetivo de isolar lideranças de organizações criminosas e presos de alta periculosidade.

Após 50 dias em fuga, Nascimento e Mendonça foram detidos, no último dia 4, em Marabá, a cerca de 1,6 mil quilômetros de distância da penitenciária federal. Mais de 500 agentes de forças de segurança federais e estaduais participaram das buscas que resultaram na prisão de 14 pessoas, incluindo os dois fugitivos e quatro criminosos que os acompanhavam no momento da detenção.

Professores da UnB aprovam greve a partir de 15 de abril

Os professores da Universidade de Brasília (UnB) aprovaram greve a partir da próxima segunda-feira (15). A decisão foi tomada em assembleia geral extraordinária da categoria, na tarde desta segunda-feira (8). Foram 257 votos favoráveis e 213 contrários. Cerca de 600 educadores participaram da assembleia. Representantes do Sindicato dos Servidores Técnico-Administrativos (Sintfub), que estão em greve desde o dia 11 de março, e do Diretório Central dos Estudantes (DCE/UnB) também participaram da assembleia e manifestaram apoio à greve docente.

Em pauta nacional unificada, os docentes das universidades federais pedem reajuste de 22,71%, dividido em três parcelas iguais de 7,06% em 2024, 2025 e 2026. Já o governo federal propõe reajuste zero este ano, e dois reajustes de 4,5% em 2025 e 2026.

Os professores também cobram a equiparação dos benefícios e auxílios com os dos servidores do Legislativo e do Judiciário.

Segundo a seção sindical do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN), os serviços essenciais serão mantidos durante a greve. A categoria ainda encaminhou a formação de um comando local de greve, que será composto pela diretoria da seção sindical, conselho de representantes e a comissão de mobilização da campanha salarial.

Em nota, a Reitoria da UnB informou que respeita o movimento de paralisação dos professores. “A greve é um direito constitucional garantido aos trabalhadores. A Universidade de Brasília (UnB) tem acompanhado as reivindicações das docentes e dos docentes junto ao governo federal. A UnB respeita e valoriza seus professores, que, juntamente com os servidores técnicos-administrativos, desempenham papel estratégico para que a instituição continue desenvolvendo ensino, pesquisa e extensão de excelência e com compromisso social”.

Greve nacional

A construção da greve nacional unificada está mobilizando professores de instituições federais de ensino de todo o país. Além da UnB, docentes de outras universidades e institutos federais já aprovaram a deflagração de greves, como na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e no Instituto Federal do Sul de Minas Gerais. Pelo menos uma dezena de outras instituições já aprovou indicativo de greve, ainda sem definição de data, que podem ser marcadas em assembleias a serem realizadas ao longo da semana.    

O Ministério da Educação (MEC), também em nota, destacou que “vem envidando todos os esforços para buscar alternativas de valorização dos servidores da educação, atento ao diálogo franco e respeitoso com as categorias”. A pasta ainda destacou o reajuste concedido pelo governo federal aos servidores públicos, em 2023.

“No ano passado, o governo federal promoveu reajuste de 9% para todos servidores. Equipes da pasta vêm participando da mesa nacional de negociação e das mesas específicas de técnicos e docentes instituídas pelo MGI [Ministério da Gestão e Inovação dos Serviços Públicos] e, ainda nessa semana, conduzirão reunião da mesa setorial que trata de condições de trabalho”.

“Máquinas ao chão”: a silenciosa resistência da imprensa à ditadura

Câmeras no chão e os olhares ficaram fixos à cena. Um gesto de ousadia feito há mais de 40 anos por um grupo de fotógrafos no pé da rampa do Palácio do Planalto entrou para a história da cobertura política durante a ditadura no Brasil. Neste domingo (7), Dia do Jornalista, episódios de resistência como esse, conhecido como “Máquinas ao chão”, costumam ser lembrados.

O dia 24 de janeiro de 1984, pouco menos de 20 anos depois do golpe de 1964 e na reta final do regime ditatorial, ficou conhecido porque os profissionais da imagem se negaram a fotografar o então presidente João Figueiredo. O gesto ocorreu após uma sequência de atritos entre o general e os fotojornalistas.

“Sorrio quando quiser”

O repórter fotográfico Sérgio Marques, com 25 anos de idade na época, relembra que entre os problemas estavam as reclamações diárias dos profissionais a respeito do tratamento do presidente Figueiredo para com eles. Em um dos conflitos anteriores, o presidente recebeu o deputado federal Paulo Maluf, futuro candidato à presidência.

“O Maluf visitou o presidente Figueiredo e, quando nós da imprensa entramos, ele olhou para o presidente e sugeriu um sorriso. O presidente olhou para ele e disse: ‘estou na minha casa. Sorrio quando quiser’”, recorda.

Em outro episódio, no mês de dezembro de 1983, Figueiredo havia sofrido um acidente de cavalo, se machucou e estava com o braço engessado. Mesmo assim, colocou paletó. O fotógrafo Wilson Pedrosa, então no Correio Braziliense, registrou o presidente na hora em que ele foi coçar o rosto. O episódio elevou a tensão entre os profissionais e o general.

Essa tensão se agravou quando os profissionais de imagem, únicos que entravam no gabinete para registrar as reuniões do presidente, relataram o teor de um encontro aos repórteres de texto, cuja entrada era proibida. A partir de então, Figueiredo passou a impedir o acesso dos fotógrafos ao seu gabinete.

“Imagine você trabalhar todos os dias no Palácio do Planalto para cobrir as audiências e não ter acesso ao gabinete. Nós começamos a reclamar com a assessoria, mas não adiantou”, recorda Sérgio Marques. Até que, na tarde do dia 24 de janeiro de 1984, uma terça-feira, diante de tantas limitações, os fotógrafos credenciados resolveram colocar as câmeras no chão assim que o presidente desceu a rampa.

Marques explica que depois daquele dia não foi advertido ou ouviu comentários do presidente Figueiredo. Os fotógrafos voltaram a ser chamados para eventos. Em um deles, o general falou para os profissionais deixarem as máquinas e servirem-se em um coquetel. O fotógrafo recorda que concordou e deixou a câmera no chão. “Ele me olhou. Coloquei sobre a mesa. Aí ele deu um sorriso e falou, ‘eu não gostei daquele dia’”, lembra-se.

Filme

O episódio de ousadia foi registrado no documentário “A Culpa é da foto”, de André Dusek, Eraldo Peres e Joédson Alves, lançado em 2015. “Foi o único protesto que teve de jornalistas credenciados do Palácio do Planalto contra um ditador”, ressalta Alves, que foi responsável pela pesquisa para o filme.

O documentário, de aproximadamente 15 minutos de duração, está disponível no YouTube.

O diretor entende que esse acontecimento se tornou um símbolo para os jornalistas brasileiros e não poderia cair no esquecimento. Em 1984, Joédson, que hoje é da equipe da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), nem sonhava trabalhar com fotografia. Afinal, tinha apenas 13 anos de idade. No entanto, assim que se tornou profissional, com mais de 20 anos, soube da história dos veteranos.

Dentre os profissionais que participaram do episódio, estavam Moreira Mariz (Folha de São Paulo), Cláudio Alves (Jornal de Brasília), Sérgio Marques (Revista Veja), Júlio Fernandes (Jornal de Brasília), Francisco Gualberto (Correio Braziliense), Beth Cruz (Agência Ágil), Élder Miranda (Rede Globo), Antonio Dorgivan (Jornal do Brasil), Adão Nascimento (Estado de São Paulo), Célson Franco (Correio Braziliense), Carlos Zarur (EBN), Sérgio Borges (Estado de São Paulo) e Vicente Fonseca (Rede Globo).

Para o fotojornalista Joédson Alves, diretor do filme, foi um ato de bravura. “Muito emocionante. É algo para ter como referência para minha profissão. Eu tenho um respeito muito grande por todos eles. Já tivemos situações muito graves [ao longo dos anos] contra a impresa e nunca houve nenhum tipo de ação ou movimento para fazer algum protesto”.

Máquinas ao chão: a silenciosa resistência dos jornalistas à ditadura

Câmeras no chão e os olhares ficaram fixos à cena. Um gesto de ousadia feito há mais de 40 anos por um grupo de fotógrafos no pé da rampa do Palácio do Planalto entrou para a história da cobertura política durante a ditadura no Brasil. Neste domingo (7), Dia do Jornalista, episódios de resistência como esse, conhecido como “Máquinas ao chão”, costumam ser lembrados.

O dia 24 de janeiro de 1984, pouco menos de 20 anos depois do golpe de 1964 e na reta final do regime ditatorial, ficou conhecido porque os profissionais da imagem se negaram a fotografar o então presidente João Figueiredo. O gesto ocorreu após uma sequência de atritos entre o general e os fotojornalistas.

“Sorrio quando quiser”

O repórter fotográfico Sérgio Marques, com 25 anos de idade na época, relembra que entre os problemas estavam as reclamações diárias dos profissionais a respeito do tratamento do presidente Figueiredo para com eles. Em um dos conflitos anteriores, o presidente recebeu o deputado federal Paulo Maluf, futuro candidato à presidência.

“O Maluf visitou o presidente Figueiredo e, quando nós da imprensa entramos, ele olhou para o presidente e sugeriu um sorriso. O presidente olhou para ele e disse: ‘estou na minha casa. Sorrio quando quiser’”, recorda.

Em outro episódio, no mês de dezembro de 1983, Figueiredo havia sofrido um acidente de cavalo, se machucou e estava com o braço engessado. Mesmo assim, colocou paletó. O fotógrafo Wilson Pedrosa, então no Correio Braziliense, registrou o presidente na hora em que ele foi coçar o rosto. O episódio elevou a tensão entre os profissionais e o general.

Essa tensão se agravou quando os profissionais de imagem, únicos que entravam no gabinete para registrar as reuniões do presidente, relataram o teor de um encontro aos repórteres de texto, cuja entrada era proibida. A partir de então, Figueiredo passou a impedir o acesso dos fotógrafos ao seu gabinete.

“Imagine você trabalhar todos os dias no Palácio do Planalto para cobrir as audiências e não ter acesso ao gabinete. Nós começamos a reclamar com a assessoria, mas não adiantou”, recorda Sérgio Marques. Até que, na tarde do dia 24 de janeiro de 1984, uma terça-feira, diante de tantas limitações, os fotógrafos credenciados resolveram colocar as câmeras no chão assim que o presidente desceu a rampa.

Marques explica que depois daquele dia não foi advertido ou ouviu comentários do presidente Figueiredo. Os fotógrafos voltaram a ser chamados para eventos. Em um deles, o general falou para os profissionais deixarem as máquinas e servirem-se em um coquetel. O fotógrafo recorda que concordou e deixou a câmera no chão. “Ele me olhou. Coloquei sobre a mesa. Aí ele deu um sorriso e falou, ‘eu não gostei daquele dia’”, lembra-se.

Filme

O episódio de ousadia foi registrado no documentário “A Culpa é da foto”, de André Dusek, Eraldo Peres e Joédson Alves, lançado em 2015. “Foi o único protesto que teve de jornalistas credenciados do Palácio do Planalto contra um ditador”, ressalta Alves, que foi responsável pela pesquisa para o filme.

O documentário, de aproximadamente 15 minutos de duração, está disponível no YouTube.

O diretor entende que esse acontecimento se tornou um símbolo para os jornalistas brasileiros e não poderia cair no esquecimento. Em 1984, Joédson, que hoje é da equipe da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), nem sonhava trabalhar com fotografia. Afinal, tinha apenas 13 anos de idade. No entanto, assim que se tornou profissional, com mais de 20 anos, soube da história dos veteranos.

Dentre os profissionais que participaram do episódio, estavam Moreira Mariz (Folha de São Paulo), Cláudio Alves (Jornal de Brasília), Sérgio Marques (Revista Veja), Júlio Fernandes (Jornal de Brasília), Francisco Gualberto (Correio Braziliense), Beth Cruz (Agência Ágil), Élder Miranda (Rede Globo), Antonio Dorgivan (Jornal do Brasil), Adão Nascimento (Estado de São Paulo), Célson Franco (Correio Braziliense), Carlos Zarur (EBN), Sérgio Borges (Estado de São Paulo) e Vicente Fonseca (Rede Globo).

Para o fotojornalista Joédson Alves, diretor do filme, foi um ato de bravura. “Muito emocionante. É algo para ter como referência para minha profissão. Eu tenho um respeito muito grande por todos eles. Já tivemos situações muito graves [ao longo dos anos] contra a impresa e nunca houve nenhum tipo de ação ou movimento para fazer algum protesto”.

Ailton Krenak toma posse na ABL e diz representar pluralidade indígena

O ambientalista, filósofo e poeta Ailton Krenak tomou posse nesta sexta-feira (5) na Academia Brasileira de Letras, em cerimônia realizada na sede da organização no Rio de Janeiro. Ele herdou a Cadeira 5, que pertencia antes ao historiador José Murilo de Carvalho, morto em agosto de 2023.

Participaram do evento os ministros dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, e da Cultura, Margareth Menezes. E tiveram destaque nos ritos de posse, os membros da ABL Heloísa Teixeira, Arnaldo Niskier, Fernanda Montenegro e Antonio Carlos Secchin. A comissão de entrada foi formada por Edmar Lisboa Bacha, Joaquim Falcão e Ruy Castro. A comissão de saída por Ana Maria Machado, Geraldo Carneiro e Antônio Torres.

Krenak falou da pluralidade indígena que ele representa ao tomar posse na instituição.

“Desde que me convidaram ou me animaram para ocupar essa cadeira número cinco, eu me perguntava: ‘Será que nessa cadeira cabem 300?’. Como dizia Mario de Andrade, eu sou 300. Olha que pretensão. Eu não sou mais do que um, mas eu posso invocar mais do que 300. Nesse caso, 305 povos, que nos últimos 30 anos do nosso país, passaram a ter a disposição de dizer: ‘Estou aqui’. Sou guarani, sou xavante, sou caiapó, sou yanomami, sou terena”, disse Krenak.

Ailton Alves Lacerda Krenak nasceu em Itabirinha, Minas Gerais, em 1953, na região do vale do Rio Doce. Aos 17 anos, mudou-se com a família para o Paraná, onde trabalhou como produtor gráfico e jornalista.

É ambientalista, filósofo, poeta, escritor e doutor honoris causa pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade de Brasília (UnB) e Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Tem trajetória marcada pelo ativismo socioambiental e de defesa dos direitos dos povos indígenas. Participou da fundação da Aliança dos Povos da Floresta e da União das Nações Indígenas (UNI).

Entre 2003 e 2010, Ailton Krenak foi assessor especial do governo de Minas Gerais para assuntos indígenas, nas gestões de Aécio Neves e António Anastasia. Em 2014, foi palestrante do seminário internacional Os Mil Nomes de Gaia, realizado no Rio de Janeiro.

Tem mais de 15 livros publicados, dentre os quais: A vida não é útil (2020), Futuro ancestral (2022) e Ideias para adiar o fim do mundo (2019). Alguns deles foram traduzidos para mais de 13 países. Conquistou o Prêmio Juca Pato de Intelectual do Ano, da União Brasileira dos Escritores (UBE), em 2020. Atualmente, vive na Reserva Indígena Krenak, no município de Resplendor, em Minas Gerais.

Presidente do parlamento sul-africano renuncia acusada de corrupção

5 de abril de 2024

 

A ex-presidente do parlamento da África do Sul foi presa quinta-feira e acusada de múltiplas acusações de corrupção, um dia depois de ter renunciado ao cargo.

A prisão de Nosiviwe Mapisa-Nqakula é mais um golpe para a reputação do partido governante Congresso Nacional Africano, ou ANC, à medida que se prepara para eleição.

Mapisa-Nqakula, uma veterana de 67 anos da luta anti-apartheid, renunciou ao cargo de presidente da Câmara na noite de quarta-feira e entregou-se numa esquadra de polícia na quinta-feira.

Ela foi acusada em tribunal de 12 acusações de corrupção e uma de lavagem de dinheiro, decorrentes de seu período como ministra da Defesa. Ela é acusada de ter aceitado subornos no valor de cerca de US$ 120 mil de um ex-empreiteiro militar para garantir um contrato.

Mapisa-Nqakula foi libertada sob fiança depois de comparecer em tribunal, onde negou qualquer irregularidade, mas disse que se demitiu para proteger o seu partido.

Num comunicado, a porta-voz do ANC, Mahlengi Bhengu-Motsiri, agradeceu-lhe por se afastar. “Agradecemos a todos aqueles que participaram no processo de escrutínio e continuamos a dizer que o Estado de direito vem em primeiro lugar”, disse ela.

 

60 anos do golpe: como Estados Unidos apoiaram os militares

“Espero que você esteja tão feliz em relação ao Brasil quanto eu estou”, sugeriu Thomas Mann, ao telefone.
 
“Eu estou”, respondeu  Lyndon  Johnson, do outro lado da linha.
 
“Creio que essa seja a coisa mais importante que aconteceu no hemisfério em três anos”, destacou Mann.
 
“Espero que eles nos deem algum crédito em vez de inferno”, devolveu Johnson.
 
A conversa telefônica aconteceu no dia 3 de abril de 1964. De um lado da linha estava o subsecretário de Estado para Assuntos Interamericanos dos Estados Unidos, Thomas Mann. Do outro, ninguém menos que o presidente norte-americano, Lyndon Johnson.

O assunto, como dá para inferir pela data em que ocorreu a ligação, era o golpe civil-militar que havia ocorrido poucos dias antes, no Brasil. O diálogo demonstra, ao mesmo tempo, a satisfação da administração norte-americana com a derrubada do governo de João Goulart e a implícita ideia de que os EUA participaram do golpe.

Autor de um livro sobre o papel dos EUA na desestabilização do governo Jango, o professor da Universidade de São Paulo (USP) Felipe Pereira Loureiro lembra que, na época, o mundo vivia a Guerra Fria, um embate ideológico entre o bloco capitalista, liderado pelos norte-americanos, e o bloco comunista, capitaneado pela União Soviética, hoje extinta.

O modelo soviético tinha recentemente fincado pé na América Latina, região historicamente influenciada pelos Estados Unidos, através da revolução cubana, em 1959. E os norte-americanos temiam a expansão dos ideais comunistas para o resto do continente. 

O destino do Brasil, maior país da América Latina, era, portanto, uma preocupação da administração norte-americana.

“O governo João Goulart era um governo que se colocava como reformista. Mas havia uma dúvida dentro do governo Kennedy, e isso vai se manter no governo Johnson, sobre até que ponto esse reformismo do governo Goulart poderia se transformar, com o tempo, em algo mais radical, que saísse do controle”, explica Loureiro.

João Goulart havia sido vice-presidente nos governos Juscelino Kubitschek e Jânio Quadros e assumiu a presidência em 1961, depois da renúncia de Quadros. Apesar de ser um empresário do ramo agropecuário, Jango não era bem visto pela cúpula militar, devido a suas ligações passadas com Getúlio Vargas e a suas propostas de reformas sociais.

Goulart propunha, entre outras medidas, a reforma agrária, a subordinação de instituições financeiras a um Banco Central, a reforma tributária e a permissão do voto aos analfabetos e militares de baixa patente.

Quadros renunciou em 1961, enquanto Goulart estava em viagem oficial ao exterior. Os ministros militares não queriam que Jango assumisse a presidência, o que gerou um impasse e um racha nas Forças Armadas. A solução foi a implantação de um regime parlamentarista no Brasil, para que o novo presidente fosse aceito.

O historiador norte-americano James Green, da Universidade Brown, coordena o projeto Opening the Archives, que busca documentar as relações entre Brasil e EUA entre as décadas de 60 e 80. Segundo ele, houve um erro de leitura do Departamento de Estado americano em relação às intenções de Goulart.

60 anos do golpe: Jango (a direita) e o embaixador dos Estados Unidos, Lincoln Gordon – Foto: Arquivo Nacional

“O embaixador [dos EUA no Brasil na época] Lincoln Gordon chegou em 61, justamente na transição de governo entre Jânio Quadros e João Goulart, com a missão de acompanhar, no Brasil, entre o Departamento de Estado e as pessoas que acompanham a América Latina, de que o Brasil poderia ser a próxima Cuba, de que poderia haver uma revolução socialista que levasse ao comunismo e um governo contra os Estados Unidos”, afirma Green.

Havia, dentro do Departamento de Estado norte-americano, uma preocupação que João Goulart se aproximasse dos comunistas e desse um golpe de Estado. “Então Lincoln Gordon tinha a clara indicação de evitar uma possível revolução socialista, uma mudança radical no governo”.

Goulart mantinha boas relações com Cuba e havia se posicionado de forma contrária ao embargo econômico ao regime de Fidel Castro. Além disso, algumas expropriações de empresas americanas no Brasil desagradaram a Washington.

A transcrição de um encontro de Gordon com Kennedy, em julho de 1962, mostra que os EUA já temiam os rumos que seriam tomados pelo governo Jango e cogitavam reduzir os poderes do presidente brasileiro ou até mesmo retirá-lo da presidência. Também já havia planos de fortalecer o poder dos militares. Havia conversas para investir US$ 1 milhão nas eleições parlamentares brasileiras daquele ano para apoiar candidatos opositores de Goulart.

Nessa mesma reunião, definiu-se que Gordon contaria com a ajuda de Vernon Walters para estabelecer uma boa relação com os militares brasileiros. Walters havia servido como homem de ligação entre as Forças Expedicionárias Brasileiras (FEB) e o Comando do Exército americano na campanha da Itália, durante a Segunda Guerra Mundial, e seria apontado como adido militar na embaixada dos EUA no Brasil.

“Walters foi chamado por Gordon para assessorá-lo nas relações com as Forças Armadas brasileiras. A missão de Walters era juntar as várias conspirações que já estavam fervendo dentro das Forças Armadas [brasileiras] e uni-las em uma conspiração única. Ele foi muito importante em dar unidade nas Forças Armadas brasileiras e de mostrar que os americanos iam apoiar o golpe”, afirma Green.

Pelo menos desde 1974, quando os primeiros documentos secretos foram tornados públicos, já se sabia do papel dos Estados Unidos no golpe.

“Os EUA ajudaram a orquestrar toda uma operação não declarada de desestabilização do governo João Goulart, sob a forma de financiamento da oposição nas eleições de 1962, no suporte a governadores críticos ao governo e fomentando a propaganda política oposicionista. Houve contribuição efetiva, portanto, na conspiração para derrubar o governo. Além disso, já ocorriam, há anos, programas de treinamento de forças policiais e militares nos EUA, ou no Brasil, por oficiais estadunidenses”, explica a pesquisadora da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) Mariana Joffily.

Além de estimular manifestações contrárias a Jango, havia um plano pronto para ser executado, caso os militares brasileiros não conseguissem derrubar o presidente. Chamado de operação Brother Sam, o plano previa o uso de apoio militar norte-americano aos golpistas para garantir que um novo regime fosse implantado.

Em 27 de março de 1964, o embaixador Lincoln Gordon enviou um telegrama a diversas autoridades americanas solicitando o envio imediato de embarcações, para garantir, aos oposicionistas de Jango, combustível e suprimentos. No mesmo documento, Gordon sugere a entrega clandestina de armas aos golpistas.

60 anos do Golpe – João Goulart e Lincoln Gordon. Foto: Arquivo Nacional

Segundo o embaixador, o golpe estava próximo de ocorrer. Documentos da Agência Central de Inteligência (CIA) americana também informam a iminência da movimentação dos militares.

“Havia um temor muito grande de que comunistas pudessem ter se infiltrado em postos estratégicos na Petrobras e que, sem combustível, tanques, caminhões, veículos militares não teriam como circular pelo país. Então, havia uma preocupação muito grande com o petróleo. Portanto, há uma promessa efetiva da embaixada norte-americana às principais lideranças golpistas, de apoio logístico, sobretudo petróleo”, explica Felipe Loureiro.

O pesquisador ressalta que a chegada de uma força naval também teria um efeito psicológico, ainda que ela não atacasse necessariamente as facções resistentes ao golpe. Os americanos, àquela altura, esperavam uma dissidência nas Forças Armadas e, portanto, uma guerra civil.

No dia 31 de março, um telegrama enviado pelo secretário de Estado norte-americano Dean Rusk a Gordon informava sobre a mobilização de um navio-tanque, de um porta-aviões, quatro destroieres, além de 110 toneladas de armas, dez aviões de carga e seis caças.

As forças golpistas brasileiras, chamadas de “forças amigas” por Gordon, acabaram colocando seu plano em movimento naquele mesmo dia, com a mobilização de tropas em um quartel de Juiz de Fora (MG) pelo general Olímpio Mourão Filho.

Na tarde de 31 de março, o subsecretário de Estado dos EUA, George Ball, e Thomas Mann ligaram para o presidente Lyndon Johnson, e falaram sobre o golpe em andamento em Minas Gerais. Eles reforçaram a necessidade de garantir apoio logístico aos golpistas, mas ainda se mostravam indecisos, sob que rumo a revolta contra Goulart tomaria.

“Penso que devemos dar todos os passos que pudermos, estar preparados para fazer tudo o que for necessário, tal como fizemos no Panamá, se isso for viável”, Lyndon Johnson orientou.

Novo Governo

No dia 1º, parte da ajuda americana já estava a caminho do Brasil. Naquele dia, o golpe ganharia força com o passar das horas e, à noite, Jango deixaria Brasília rumo a Porto Alegre. Os EUA ainda se mantinham cautelosos, evitando se expor para não dar, a Jango, um pretexto “anti-yankee” para angariar apoio.

No dia 2 de abril, a força naval continuava a caminho do Brasil, devido ao receio de que o deputado federal Leonel Brizola, cunhado de Jango, liderasse uma resistência no Rio Grande do Sul e que as refinarias como a Reduc (Duque de Caxias) permanecessem controladas pelos “commies” (gíria americana para “comunistas”).

O presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazzilli, havia assumido a presidência da República temporariamente, depois de o Senado ter declarado a vacância do cargo, mesmo com Jango ainda em território nacional. Os EUA esperavam que o Congresso ou a Suprema Corte brasileiros legitimassem a autoridade de Mazzilli, por isso ainda se mantinham cautelosos em reconhecer o novo governo.

A transcrição de um encontro do Conselho de Segurança Nacional norte-americano, ao meio-dia de 2 de abril, mostra um Lyndon Johnson preocupado com a situação de Mazzilli, já que ele ainda possuía minoria no Congresso para reconhecê-lo como presidente.

O secretário de Estado Dean Rusk responde, então, que o embaixador Gordon estava usando os recursos à sua disposição para encorajar os deputados brasileiros a reconhecer Mazzilli como presidente da República.

Mais tarde, chegam informações, incorretas, de que Jango havia deixado o Brasil rumo ao Uruguai. Naquele mesmo dia, mesmo sem ter a certeza de que Goulart havia saído do Brasil ou os deputados votarem a favor de Mazzilli, os norte-americanos decidiram reconhecer o governo dos golpistas, sob orientação do embaixador Gordon.

Lyndon Johnson então autoriza o envio de um telegrama em que ele deseja sucesso a Mazzilli e parabeniza a “comunidade brasileira” por resolver as dificuldades políticas e econômicas que o Brasil “vinha enfrentando” de acordo com “a democracia constitucional e sem conflitos civis”. A operação Brother Sam, portanto, não chega a ser colocada em prática e os navios retornam ao porto, no Caribe.

Golpe sem EUA

A historiadora Mariana Jofilly diz que é difícil afirmar se o golpe ocorreria mesmo sem o apoio dos EUA, mas afirma que receber o aval de uma grande potência foi importante para que os golpistas levassem, à frente, seu plano de derrubar Jango.

“Não foi apenas o Brasil que se certificou do apoio dos EUA antes de partir para a derrubada de um presidente democraticamente eleito. Isso aconteceu também no Chile e na Argentina. Na época, fazia parte da agenda golpista a obtenção do apoio dos EUA. A garantia de que o novo governo seria reconhecido e legitimado pela grande potência e que o novo poder instituído seguiria recebendo financiamento estadunidense não era um item do qual se pudesse abrir mão”, pondera Mariana Joffily.

James Green diz que os brasileiros seriam capazes de derrubar Jango mesmo sem o apoio dos EUA e que outros golpes de Estado já haviam ocorrido no Brasil antes de 1964, mesmo sem a ajuda norte-americana.

“Os brasileiros são muito capazes de dar golpes de Estado. Pode-se dizer que haviam americanos envolvidos [no golpe de 64], mas a questão principal foram as Forças Armadas brasileiras e a elite brasileira, que queriam manter controle sobre a situação político-social que estava fugindo de seu controle. O apoio americano deu mais determinação, foi fundamental para a luz verde”, afirma o brasilianista.

Procurada pela Agência Brasil, a Embaixada dos Estados Unidos, por meio da assessoria de imprensa, afirmou que o presidente norte-americano Joe Biden tem expressado, publicamente e em conversas privadas, o apoio do país às instituições democráticas brasileiras, incluindo “o sistema eleitoral, a transferência pacífica de poder e a autoridade civil sobre as Forças Armadas”. 

“Ambas as nações reconhecem a importância de se posicionar contra o extremismo político, a violência, o discurso de ódio e a desinformação que possam prosperar em sociedades democráticas”, destacou a representação diplomática norte-americana.  

Em junho de 2014, Joe Biden, então vice-presidente na gestão Barack Obama, entregou ao governo brasileiro 43 documentos produzidos por autoridades norte-americanas entre os anos de 1967 e 1977. Os relatórios detalham informações sobre censura, tortura e assassinatos cometidos pelo regime militar no Brasil.