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Copacabana recebe manifestações pelo fim da fome e para pressionar G20

Quem passou pela Praia de Copacabana na manhã deste sábado (16) se deparou com mais de 700 pratos vazios fincados na areia. O ato que pedia o fim da fome no mundo foi uma das duas manifestações realizadas na orla da praia mais famosa do Rio de Janeiro, às vésperas da reunião de cúpula do G20, grupo formado pelas maiores economias do planeta mais a União Europeia e a União Africana.

O protesto foi iniciativa das organizações não governamentais (ONGs) Rio de Paz e Ação da Cidadania. Segundo o fundador da Rio de Paz, Antonio Carlos Costa, os 733 pratos são referência aos 733 milhões de pessoas que estavam em situação de fome no ano passado, conforme o relatório O Estado da Segurança Alimentar e da Nutrição no Mundo, lançado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

“O que nos deixa indignados é o fato de que hoje, no nosso planeta, há produção insuficiente de alimentos para alimentar todos”, diz Costa.

Junto aos pratos, faixas com a célebre frase do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, fundador da Ação da Cidadania: “Quem tem fome tem pressa”, em português e em inglês (Those who are hungry can’t wait).

“O Rio de Janeiro vai receber pessoas que têm condição de fazer a diferença, de dar fim ao flagelo da fome”, disse Costa, referindo-se ao encontro do G20, na segunda (18) e na terça-feira (19).

“Esperamos, portanto, arrancar dessas lideranças políticas esse compromisso [combate à fome], mas de modo que sejam apresentadas ao mundo metas mensuráveis, cronograma com forte compromisso com prestação de contas, de modo que todos possamos acompanhar o desenvolvimento da implementação dessas políticas públicas, a fim de que lá na ponta não haja um só ser humano na face da Terra perante um prato vazio de comida”, enfatizou.

Aliança Global

A manifestação ocorreu na mesma manhã em que representantes da sociedade civil que participaram do G20 Social, na zona portuária do Rio de Janeiro, entregaram ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, uma carta de prioridades. Uma das recomendações é o combate à fome.

O tema é também uma das prioridades do governo brasileiro, que ocupa até este mês a presidência rotativa anual do G20. Na segunda-feira, o Brasil espera a aprovação pelo grupo de nações dos termos da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, que tem potencial inicial para beneficiar 500 milhões de pessoas no planeta.

O pré-lançamento da Aliança Global, em julho, aconteceu justamente na sede da Ação da Cidadania – instituição referência no combate à fome – na região central do Rio de Janeiro.

O coordenador nacional da ONG, Rodrigo “Kiko” Afonso, destaca que o ato deste sábado foi pensado para ser às vésperas do G20 com o intuito de pressionar os líderes mundiais. “Tentar sensibilizar essas lideranças para a questão da fome, o problema mais fundamental do ser humano”, afirma. “Também sensibilizá-las para aderir à Aliança Global contra a Fome a Pobreza para que possamos, juntos no mundo inteiro, acabar com isso de uma vez por todas”. Ao menos 41 países já se comprometeram com ações relacionadas à aliança, que não se restringe a países do G20.

Contraponto ao G20

Outra manifestação que ocupou a orla de Copacabana neste sábado foi organizada pela Cúpula dos Povos. O coletivo internacional, que traz no nome uma alternativa à cúpula dos líderes, tem origem em 2012, quando realizou, também no Rio de Janeiro, um movimento alternativo de participação social paralelo à Rio+20 (Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável).

O ato questionou o poder de decisão nas mãos dos líderes mundiais. Alguns participantes usaram máscaras de chefes de governo, como o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump; o atual mandatário, Joe Biden; o presidente francês, Emmanuel Macron; e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, que “vestia” um avental branco ensanguentado – uma crítica à ofensiva israelense na Palestina.

O tema Palestina foi um dos destaques da marcha. Os manifestantes pediram o fim da ocupação do território palestino e da agressão militar israelense.

“Uma marcha diversa, colorida, de luta, contundente”, descreveu a economista e integrante da operativa nacional da Cúpula dos Povos, Sandra Quintela. Segundo Sandra, com a força e a articulação dos movimentos sociais e populares, foi possível dar um recado de “Palestina livre” e “fora, imperialismo”, em contraponto ao G20. “Onde a gente sabe que esses assuntos não entram”, disse Sandra, em mensagem enviada à Agência Brasil.

Sandra Quintela classifica o G20 como “instrumento do imperialismo” e reconhece que o Brasil “tenta humanizar” o fórum, referindo-se ao G20 Social, iniciativa da presidência rotativa brasileira que permitiu a articulação entre a sociedade civil organizada ao longo do ano.  “Mas isso [humanização] é praticamente impossível, então acho que a rua hoje mostrou a nossa força.”

Na última quinta-feira (14), o coletivo realizou um debate crítico na sede da Associação Brasileira de Imprensa, no centro do Rio, onde tratou de temas como justiça climática, lutas antipatriarcais, antirracistas e anticapitalistas, além de soberania popular.

“A marcha contra o G20 é para dizer em alto e bom som que esta arquitetura do poder internacional não serve aos povos. Que precisamos construir outras relações entre as nações e os povos, baseadas na solidariedade, na busca da igualdade e da liberdade e no direito à autodeterminação dos povos. Associado a isso, o fim de todas as guerras existentes no mundo”, detalha José Antônio Moroni, integrante do coletivo.

Líderes mundiais

O ponto derradeiro da presidência brasileira temporária no G20 será a reunião de chefes de Estado e de governo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva comprometeu-se a levar aos líderes mundiais o documento final do G20 Social, que reflete necessidades e prioridades selecionadas por instituições como movimentos sociais, sindicatos e organizações não governamentais. 

O G20 é composto por 19 países: África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia, além da União Europeia e da União Africana.

 Os integrantes do grupo representam cerca de 85% da economia mundial, mais de 75% do comércio global e cerca de dois terços da população do planeta.

Lula reúne-se no Rio com a prefeita de Paris

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu, neste sábado (16), a prefeita de Paris, Anne Hidalgo, que está no Rio de Janeiro para participar das reuniões paralelas ao G20. O encontro foi realizado no Forte de Copacabana.

De acordo com o Palácio do Planalto, Lula e a prefeita conversaram sobre a situação política no Brasil e na Europa, a reconstrução do papel internacional do Brasil no exterior e sobre as parcerias que envolvem os projetos do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) com municípios brasileiros.

Participaram também do encontro os ministros das Relações Exteriores, Mauro Vieira, e da Fazenda, Fernando Haddad, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, e o assessor especial do presidente da República, Celso Amorim.

Anne Hidalgo participou do Urban 20, encontro de representantes de grandes centros urbanos que antecede a reunião dos chefes de Estado do G20. 

O encontro teve a participação de prefeitos de Barcelona, Johanesburgo, Montreal, Phoenix e Nova Orleans, entre outras cidades, e buscou a ampliação de financiamento para o enfrentamento às mudanças climáticas e a transição energética.

G20 Social pede trabalho decente e soberania alimentar contra fome

O documento elaborado pelas organizações da sociedade civil durante o G20 Social para ser entregue aos líderes das maiores economias do mundo, reunidos na cúpula do G20 no Rio de Janeiro (RJ), defende a adoção da soberania alimentar para combater a fome e pede o fortalecimento do trabalho decente para combater as desigualdades e a pobreza.

Aprovado e divulgado neste sábado (16), o texto de quatro páginas exige dos líderes do G20 uma transição energética justa enfrentando a exclusão social e a pobreza energética; além de exigir “firme compromisso” de redução da emissão de gases de efeito estufa e de proteção das florestas tropicais.

Leia a íntegra do documento

Conforme antecipado pela Agência Brasil, a declaração ainda defende reformas “inadiáveis” nas instituições internacionais, como Nações Unidas (ONU) e Fundo Monetário Internacional (FMI), e a taxação dos super ricos.  

“Senhores e senhoras líderes do G20, é hora de assumirmos a responsabilidade de liderar uma transformação que seja efetivamente profunda e duradoura. Compromissos ambiciosos são essenciais para fortalecer as instituições internacionais, combater a fome e a desigualdade, mitigar os impactos das mudanças do clima e proteger nossos ecossistemas”, afirma o documento coletivo do G20 Social que será entregue pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva aos líderes das maiores economias do planeta.

Soberania alimentar

Para combater a fome, a declaração do G20 Social defende a construção da soberania alimentar. “Os povos devem ter reconhecido o direito de acesso democrático à terra e à água, de controlar sua própria produção e distribuição de alimentos, com ênfase em práticas agroecológicas e de preservação do meio ambiente”, diz o documento.

Diferentemente do conceito de segurança alimentar, que enfatiza o acesso aos alimentos, o conceito de soberania alimentar enfatiza a produção desses alimentos, priorizando o mercado interno com o controle social da produção. O conceito surge a partir da Via Campesina, organização que reúne movimentos do campo de todo o mundo.

A dirigente nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Cássia Bechara, presente no G20 Social, destacou que a soberania alimentar é parte central do projeto de reforma agrária do MST para enfrentar a fome, a crise climática e transformar a matriz produtiva do país.   

“Soberania alimentar é quando os camponeses dos países têm condições de decidir o que plantar e como plantar no sentido de abastecer o mercado interno como prioridade, sem depender do pacote verde de insumos estrangeiros, de toda essa dependência do pacote tecnológico. O conceito de soberania é bem diferente do de segurança alimentar, que é botar qualquer bolacha só para não morrer de inanição, não interessando o que está comendo, muito menos como esse alimento é produzido”, explicou Cássia.

Os movimentos sociais e organizações da sociedade civil que elaboraram o documento pedem ainda que os países, “em caráter de urgência e prioridade máxima”, façam a adesão a iniciativa do Brasil da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, que prevê um fundo para financiar políticas e programas de combate à fome. 

Trabalho decente

A declaração dos grupos reunidos no G20 Social ainda afirma a “centralidade do trabalho decente, conforme os padrões da OIT [Organização Internacional do Trabalho], como elemento essencial na superação da pobreza e das desigualdades”. A declaração aprovada pede o combate ao trabalho escravo, ao trabalho infantil, ao tráfico humano e demais formas de exploração e precarização do trabalho.

“Enfatizamos a defesa da formalização do mercado de trabalho e de economia inclusivas e contra-hegemônicas, como a economia popular e solidária, cooperativas, cozinhas solidárias e o reconhecimento e valorização da economia de cuidados”, afirmam os movimentos. 

Por fim, pedem que todos tenham acesso a empregos dignos, sistemas de seguridade e proteção social e exigem a ampliação dos direitos sindicais. A pauta é apresentada em momento de intensa mobilização da sociedade contra a jornada de 6 dias de trabalho e 1 de folga, com manifestações realizadas em várias cidades nessa sexta-feira (15).   

Transição Justa

O documento afirma que a maioria dos países desenvolvidos e suas elites não têm compromisso com o enfrentamento das mudanças climáticas, provocadas pela queima de combustíveis fósseis, que causam o aquecimento da terra.

A declaração pede que seja respeitado o Acordo de Paris e destaca a importância das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC), que são os compromissos de cada país com a redução dos gases do efeito estufa. O Brasil foi o segundo país a apresentar a atualização da sua NDC, definindo uma redução de 59% a 67% dos gases até 2035.  

“É uma exigência ética que os líderes mundiais assumam um compromisso firme com a redução de emissões de gases do efeito estufa e do desmatamento, bem como a proteção dos oceanos, condições essenciais para limitar o aquecimento global a 1,5ºC e evitar danos irreversíveis ao planeta”, afirma o texto.

A declaração que será entregue aos líderes das maiores potências do mundo defende ainda que a transição energética precisa ser justa, substituindo o modelo de produção baseado em combustíveis fósseis por uma economia de baixo carbono.

“Essa transformação precisa enfrentar a exclusão social, a pobreza energética e o racismo ambiental, e garantir condições equitativas para trabalhadores e trabalhadoras, pessoas negras e comunidades vulneráveis”, acrescenta o documento.

Por fim, os movimentos sociais pedem que os países protejam as florestas tropicais por meio da criação do Fundo Floresta Tropical para Sempre (TFFF). A proposta do fundo é uma sugestão do Brasil para financiar a proteção das florestas tropicais, essenciais para a captura de carbono na atmosfera.

Reforma ONU e taxação ricos

O terceiro grande tema da declaração do G20 Social pede a reforma da governança global, com maior participação dos países menos desenvolvidos em instâncias como o Conselho de Segurança da ONU e o FMI.

A declaração também pede a taxação dos super ricos como forma de financiar as políticas sociais, ambientais e culturais que os povos necessitam. De acordo com o texto, os recursos arrecadados devem ser destinados a fundos nacionais e internacionais. 

 

Leia a declaração final do G20 Social

A pluralidade de vozes que construiu o G20 Social ao longo da presidência brasileira do G20 divulgou na manhã deste sábado (16) o documento final do encontro, que traz propostas aos líderes mundiais nas áreas de combate à fome, sustentabilidade e reforma da governança global.

As propostas foram sistematizadas e definidas por consenso entre os participantes para serem entregues ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva no encerramento da Cúpula Social, neste sábado. O presidente brasileiro vai repassar as demandas aos líderes do G20, grupo que reúne as 19 maiores economias do planeta, mais a União Europeia e a União Africana.

Os 13 grupos de engajamento que fazem parte do G20 Social são: C20 (sociedade civil); T20 (think tanks); Y20 (juventude); W20 (mulheres); L20 (trabalho); U20 (cidades); B20 (business); S20 (ciências); Startup20 (startups); P20 (parlamentos); SAI20 (tribunais de contas); e os mais novos J20 (cortes supremas) e O20 (oceanos).

Além das atividades desenvolvidas pelos 13 grupos de engajamento, o G20 Social também incluiu pela primeira vez encontros entre as trilhas política (Trilha de Sherpas), financeira (Trilha de Finanças) e os grupos de engajamento.

Leia na íntegra o documento divulgado pelo grupo

Trump deve ficar isolado com negacionismo climático, diz Pimenta

A postura do presidente eleito dos Estados Unidos (EUA), Donald Trump, de negar a crise climática e defender a expansão do uso dos combustíveis fósseis – responsáveis pelo aquecimento da terra – deve isolar o novo mandatário da Casa Branca do resto do mundo, avaliou o ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Paulo Pimenta.

“O mundo hoje está muito multilateral. Nós temos o Sul Global, temos outros países com força, como a Índia, como a própria China, que não tinha essa força há algumas décadas. O Brics passa a ser outro vetor importante desta geopolítica internacional. Então, se os Estados Unidos acabar, em função do Trump, para essas pautas específicas, fugindo desse esforço internacional, se a Argentina eventualmente optar por também seguir esse caminho, eu tendo a achar que eles ficarão numa posição de isolamento”, explicou Pimenta, que avalia que a Argentina pode seguir a posição dos EUA.

O combate à crise climática é uma das prioridades do Brasil no plano internacional e foi selecionado pelo governo como um dos grandes temas do debate da cúpula do G20, que começa nesta segunda-feira (18), no Rio de Janeiro (RJ). O ministro Pimenta comentou o tema em entrevista ao programa Giro Social, da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), com participação da Agência Brasil.

Pimenta citou alguns desastres climáticos recentes, como o do Rio Grande do Sul (RS), o de Valência, na Espanha, e da chuva atípica no deserto do Saara, na África, o que torna difícil até para Trump negar a crise climática.

“O aumento da temperatura global, o aumento da temperatura dos oceanos, não é mais um tema de natureza acadêmica. Não é mais uma hipótese futura. Ela é uma realidade presente que diz respeito à vida de todas as pessoas”, comentou, acrescentando que o mercado vem exigindo adaptações para enfrentar as mudanças climáticas.

“Independentemente do Trump, você acha que os grandes grupos econômicos americanos vão ignorar essas exigências do mercado para garantir que seus produtos possam ser vendidos na Europa ou em outras regiões do planeta? Evidente que não”, disse. 

Para o ministro, mesmo que Trump não participe presencialmente desses debates e fóruns internacionais sobre clima, “o mundo vai caminhar e não vai ficar refém dos Estados Unidos ou de condutas negacionistas de ninguém. E o Brasil cada vez mais tem um papel, um protagonismo, uma importância nesse cenário”.

Financiamento climático

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem cobrado os países ricos para que financiem a adaptação e mitigação das mudanças climáticas nos países mais pobres, uma vez que os países desenvolvidos, ao liderarem Revolução Industrial, foram os que mais emitiram gases do efeito estufa.

No Acordo de Paris, em 2015, foi prometida a criação de um fundo com o aporte de US$ 100 bilhões por ano, que seria financiado pelas principais potências para financiar a transição energética e a adaptação à mudança climática. Porém, esse financiamento nunca ocorreu.  

Para o ministro Pimenta, um acordo para financiar a transição energética e a adaptação e mitigação das mudanças climáticas pode ser um dos legados do G20 no Brasil.  

“Ao longo dos últimos meses, foram inúmeras agendas realizadas com esse objetivo. E eu não vejo outra forma de financiar políticas públicas de combate à fome, à desigualdade no mundo e também com relação à questão das mudanças climáticas, sem que aqueles que mais ganharam com isso, sem que os países mais ricos possam, de alguma forma, pagar a maior parte dessa conta”, finalizou o ministro.

 

G20: Negociadores de alto nível estendem debate sobre questões globais

A reunião final dos sherpas do G20 foi estendida em mais um dia no Rio de Janeiro, e continua neste sábado (16). Os sherpas são os negociadores de alto nível de cada país no grupo e trabalham para costurar os consensos que produzem o documento final do encontro.

O encontro era previsto para ocorrer entre 12 e 15 de novembro, mas os representantes dos países-membros precisaram de mais um dia para fechar os acordos sobre as questões globais que serão tratadas pelos chefes de seus Estados.

O sherpa indicado pelo governo brasileiro é o embaixador Mauricio Lyrio, secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do Ministério das Relações Exteriores (MRE). Como o país está na presidência do grupo, Lyrio é o coordenador das discussões. 

Este encontro final é essencial para consolidar os compromissos e pontos-chave da agenda que será apresentada aos chefes de Estado, nos dias 18 e 19 de novembro, no Museu de Arte Moderna (MAM), também na capital fluminense.

Nesta fase, os sherpas revisam e ajustam documentos fundamentais que abordarão desafios globais e regionais, com destaque para mudanças do clima, desenvolvimento sustentável e recuperação econômica pós-pandemia.

O Brasil tem defendido uma recuperação econômica inclusiva, com foco em diminuir desigualdades, especialmente nos países em desenvolvimento.

 

MST denuncia agronegócio, imperialismo e acordo UE-Mercosul no G20

Cerca de mil militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) de várias partes do país estão no G20 Social, no Rio de Janeiro, e denunciam no evento os “crimes” do imperialismo, por meio de um tribunal popular, o papel do agronegócio na crise climática e o acordo entre Mercosul e União Europeia. Além disso, promovem ato em defesa da Palestina.

Na avaliação do MST, o documento elaborado por representantes dos movimentos participantes no G20 Social, que será entregue ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no sábado (16), não é o mais importante do encontro, uma vez que os países do G20 – que reúne as 19 maiores economias do planeta, além da União Europeia e da União Africana – não têm qualquer obrigação de adotar, ou mesmo considerar, as propostas da sociedade civil.

“A nossa presença aqui é a mensagem que queremos passar e envolve os três  temas selecionados pelo Brasil para o G20: combate à fome; reforma da governança global e crise climática”, afirmou Cássia Bechara, da direção nacional do MST e coordenadora do setor de internacionalismo do movimento.

Para Cássia, não há como falar de combate à fome sem falar de reforma agrária, nem falar de crise climática sem discutir o papel do agronegócio em países como o Brasil.

“Só se combate à fome com reforma agrária, não se combate à fome investindo no agronegócio para produzir soja ou outras commodities. Não vamos conseguir enfrentar a crise ambiental se não enfrentarmos o modelo agrícola implementado nos países do Sul Global”, destacou Cássia. Sul Global é o termo usado para se referir aos países pobres ou emergentes que, em sua maioria, estão no Hemisfério Sul do planeta.

Diferentemente do que ocorre nos países mais ricos, no Brasil, o desmatamento e a agricultura são os maiores emissores de gases do efeito estufa. O país é o quinto maior emissor de poluentes do planeta.

“Não podemos enfrentar a crise climática sem debater o papel do agronegócio na exploração dos bens naturais, na poluição das águas e dos solos a partir dos agrotóxicos, na emissão de gases a partir do monocultivo e da pecuária extensiva, na promoção das queimadas para a expansão da fronteira agrícola. O agronegócio está no centro da crise ambiental dos países do Sul Global”, acrescentou a dirigente do MST.

Economia Verde

Uma das especialistas convidadas pelo MST para discutir a crise climática no G20 Social foi a advogada socioambiental Larissa Packer, da organização não governamental ONG) Grain, que fez uma crítica do modelo de economia verde promovido por bancos e fundos de investimento para combater a crise climática por meio de mercado de créditos de carbono ou da venda de “títulos verdes” para financiar dívidas dos países.

“É uma proposta encaminhada por corporações e setores financeiros que geraram a crise. Isso para manter o modo de produção e consumo da forma como está, além da manutenção do estado mínimo, delegando para o mercado financeiro a solução da crise que eles mesmo criaram”, destacou Larissa.

Tribunal

Entre as várias atividades realizadas pelo MST durante o G20 Social, no Rio de Janeiro, o movimento promove nesta sexta-feira (15), em conjunto com outros movimentos sociais, o Tribunal Popular O Imperialismo no Banco dos Réus, em que será feito um julgamento simbólico de “crimes” do imperialismo, conceito muito usado nas relações internacionais.

Segundo o sociólogo Raphael Seabra, professor do Departamento de Estudos Latinos Americanos da Universidade de Brasília (UnB), o conceito de imperialismo é usado para situações em que “um país central se vale de seu maior poderio econômico, político e militar para subordinar e influenciar/pressionar países periféricos de acordo com seus próprios interesses comerciais, políticos e diplomáticos”.

Entre os casos analisados, estão a guerra na Faixa de Gaza, considerado um genocídio; o caso do Haiti, considerado uma violação à soberania e à autodeterminação dos povos; os efeitos nocivos do acordo Mercosul e União Europeia; o bloqueio de 60 anos contra Cuba; a destruição ambiental provocada pelo rompimento das barragens de Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais, e o chamado extermínio dos povos negros e originários no Brasil.

Filha de Che

A cubana Aleida Guevara questiona modelo de democracia existente nos países capitalistas – Priscila Ramos/MST

A filha mais velha de Ernesto Che Guevara, um dos principais líderes da Revolução Cubana, veio de Havana à convite do MST para participar do G20 Social e falar sobre os impactos do bloqueio contra a ilha. Aleida Guevara, que tinha 4 anos quando o pai foi morto na Bolívia, disse à Agência Brasil que o mundo mudou pouco nas últimas seis décadas.

“O mundo segue com um poder dominante que economicamente esmaga os demais. Esses Estados Unidos (EUA) fazem o que querem com a Europa. Provocaram uma guerra entre dois países que foram irmãos, Ucrânia e Rússia, e se beneficiam disso porque o gás russo era muito mais barato para a Europa. Agora, a Europa tem que pagar mais pela energia vinda dos EUA”, afirmou.

Ao falar para o público no G20, a filha de Che questionou o modelo de democracia que existe nos países capitalistas. “Que democracia é essa em que as multinacionais levam toda a riqueza e em que a terra está nas mãos de poucas famílias?”, perguntou, lembrando que a origem da palavra democracia vem do grego e significa governo do povo.

“Enquanto o dinheiro segue para os bancos dos Estados Unidos, eles têm o poder de vetar o que eles quiserem. Não podemos continuar assim. Fazem falta muitas mudanças, mas sobretudo falta poder do povo. Levar à prática essa famosa democracia e tomar o poder que nos corresponde como povo”, defendeu a filha mais velha do líder da Revolução Cubana.

União Europeia

Uma das principais críticas trazidas pelo MST para o G20 Social é o acordo que vem sendo costurado entre Mercosul e União Europeia. No entendimento do movimento, esse projeto de acordo de livre comércio reforça a posição do Brasil de exportador de matérias-primas e importador de produtos industrializados.

“É um acordo que vai potencializar a desindustrialização dos países do Sul Global”, destacou Cássia Bechara. Especialistas ouvidos pela Agência Brasil entendem que a proposta pode inibir a indústria brasileira.

Palestina

Outro foco do MST é a denúncia do que ocorre atualmente na Faixa de Gaza, que o movimento considera um genocídio contra o povo palestino. Um ato foi convocado para este sábado (16), em Copacabana, para denunciar as ações de Israel.

“Os maiores financiadores do genocídio estão aqui, no G20. Sejam os financiadores de armamentos e de recurso, como os Estados Unidos e países da União Europeia, sejam os financiadores políticos do Estado de Israel”, destacou Cássia Bechara. Para a dirigente do MST, o discurso do governo brasileiro contra Israel é importante, mas é preciso ainda que o país rompa relações comerciais com Tel-Aviv.

Mais um voo da FAB com 237 repatriados do Líbano chega a SP

O décimo primeiro voo da Força Aérea Brasileira (FAB) que resgatou brasileiros do Líbano pousou às 4h45 desta quinta-feira (14) na Base Aérea de São Paulo (BASP), em Guarulhos. Estavam a bordo 237 repatriados e cinco animais de estimação, no voo que integra a Operação “Raízes do Cedro”, iniciada em 2 de outubro e coordenada pelo governo federal.

A operação atingiu a marca de 2.309 brasileiros e 29 animais de estimação repatriados. A aeronave KC-30 é utilizada nas repatriações.

A logística de repatriação envolve o uso de aeronave, de servidores da Força Aérea Brasileira e um intenso trabalho de articulação do Itamaraty. Segundo o governo federal, a comunidade brasileira no Líbano tem cerca de 20 mil pessoas.

As ações de repatriação foram determinadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva desde o agravamento do conflito no país, com bombardeios aéreos massivos de Israel contra cidades libanesas. Os bombardeios são desdobramento da campanha militar israelense na Faixa de Gaza, território palestino ocupado por Tel Aviv. 

Assim como as milícias do Iêmen e do Iraque têm lançado ataques contra Israel ou aliados de Tel Aviv em represália aos bombardeios em Gaza, a chamada resistência libanesa – coalizão de sete grupos político-militares liderados pelo Hezbollah – tem promovido ataques contra Israel desde o dia 7 de outubro, também em solidariedade a Gaza.

Grupos sociais vão entregar carta aos líderes do G20 sobre Haiti

O C20, o L20 e o W20 – grupos de engajamento do G20 Social que mobilizam diferentes organizações da sociedade civil, trabalhadores e mulheres – se uniram para redigir uma carta direcionada aos líderes dos países do grupo, na qual expressam preocupações com a violência e a instabilidade política no Haiti.

O texto chama atenção para os impactos suportados pela população haitiana e cobra da comunidade internacional um compromisso com um futuro pacífico no país caribenho, onde prevaleça o respeito aos direitos humanos.

O documento, apresentado nesta quarta-feira (13) durante o último dia da programação da Cúpula do C20, lembra a destruição causada pelo furacão de 2010 e lamenta a escalada de violência registrada desde março deste ano no país. Aponta ainda que o deslocamento de 700 mil haitianos é acompanhado de crises que ameaçam o direito à vida. Menciona-se também preocupações com violações aos direitos à saúde sexual e reprodutiva de mulheres e meninas.

“De acordo com a Organização Internacional para as Migrações (OIM), de seus 11,5 milhões de habitantes, pelo menos 35.000 fugiram de suas casas até o início de 2024. O Haiti, que vem sofrendo severamente com os impactos das mudanças climáticas, particularmente desde a tragédia de 2010, também está sofrendo outro grande desafio, pois o nível mais alto de insegurança alimentar nem sempre é visível”, acrescenta o texto.

O Brasil é o atual presidente do G20 e ocupa o posto pela primeira vez desde 2008, quando foi implantado o atual formato do grupo, composto pelas 19 maiores economias do mundo, bem como a União Europeia e mais recentemente a União Africana. Com a aproximação da Cúpula os Líderes do G20, que acontecerá nos dias 18 e 19 de novembro no Rio de Janeiro, diversos chefes de Estado irão desembarcar no país.

Nas presidências anteriores, a sociedade civil costumava se reunir em iniciativas paralelas à programação oficial. Uma inovação da presidência brasileira foi integrar à agenda oficial a programação do chamado G20 Social. O objetivo é estimular um maior diálogo entre os governos e as organizações sociais.

O ápice dessa programação será a Cúpula do G20 Social, que ocorrerá entre quinta-feira (14) e sábado (16), quando estarão reunidos os diversos grupos de engajamento, a exemplo do C20 (sociedade civil), do L20 (trabalhadores) e do W20 (mulheres).

A carta cobra os líderes do G20 por uma manifestação a favor da reestruturação do Haiti e tolerância zero com qualquer forma de violência sexual e de gênero, exigindo proteção imediata de mulheres e crianças. “Neste momento de múltiplas crises globais e de intensificação das guerras, não podemos esquecer que a pobreza e a instabilidade do Haiti foram moldadas por décadas de colonialismo e vulnerabilidades climáticas. A comunidade internacional deve ao Haiti um compromisso inabalável com um futuro pacífico, onde os direitos humanos, econômicos e ambientais sejam respeitados e protegidos, e ninguém seja deixado para trás”, reiteram os signatários.

Mauro Vieira: retirada de embaixador da Venezuela não é definitiva

O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, disse hoje (13) que a retirada do embaixador venezuelano no Brasil, Manuel Vadell, para prestar esclarecimentos ao governo de Nicolás Maduro, não é definitiva. Vieira disse que o procedimento é comum na diplomacia.

“Ele [o embaixador] foi chamado para consultas. E quando ocorre isso é por um período”, disse. “Não ha indicação que a partida do embaixador seja definitiva”, completou o chanceler, que participou nesta quarta-feira (13) de audiência na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados para tratar da Venezuela.

No dia 30 de outubro, a Venezuela convocou o seu embaixador no Brasil para consultas como manifestação de repúdio a declarações feitas por porta-vozes brasileiros, citando especificamente o assessor especial da Presidência da República, embaixador Celso Amorim.

“Ainda que as circunstâncias imponham uma inevitável diminuição do dinamismo do relacionamento bilateral, isso não significa de forma alguma que o Brasil deva romper relações ou algo dessa natureza com a Venezuela. Pelo contrário, diálogo e negociação e não isolamento são a chave para a construção de qualquer solução pacífica e duradoura na Venezuela”, avaliou.

O chanceler disse ainda que a crise política na Venezuela não deve ser resolvida com sanções e isolamento impostas de fora. Vieira defendeu que a resolução da crise no país vizinho, após a eleição presidencial do dia 28 de julho, que resultou na reeleição ao presidente Nicolás Maduro, seja resolvida através do diálogo pelos próprios venezuelanos.

“A solução precisa ser construída pelos próprios venezuelanos e não imposta de fora com mais sanções e isolamentos. Isso nós já vimos que não funciona. Não podemos cometer os erros que cometemos na época da autoproclamação de Juan Guaidó como presidente”, disse o ministro durante audiência na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados para tratar da Venezuela.

Na avaliação do ministro, a relação com o país vizinho, que compartilha cerca de 2200 km de fronteiras terrestres, com o Brasil, a maior fronteira compartilhada depois da Bolívia e do Peru, foi esvaziada a partir de 2017.

Naquele ano, após 53 dias de protestos violentos, o presidente Nicolás Maduro convocou a eleição de uma assembleia constituinte que funcionou de forma paralela à Assembleia Nacional, o parlamento daquele país, então dominada pela oposição. A tensão política permaneceu no ano seguinte, com o boicote da oposição às eleições presidenciais de 2018, culminando com a autoproclamação de Guaidó, que presidia o parlamento, como presidente interino do país em 2019.

“Ao longo desse período, o governo brasileiro tinha outro direcionamento político e estimulou apenas um dos lados, em detrimento do diálogo”, avaliou Vieira, afirmando que, atualmente, a diplomacia brasileira tem como princípios a defesa da democracia, a não ingerência em assuntos internos e a resolução pacífica de controvérsias.

Aos deputados, Vieira lembrou que a defesa do diálogo já havia sido expressa pelo embaixador Celso Amorim, assessor especial da Presidência da República, em outra audiência no colegiado. Na ocasião, Amorim disse ser necessário que o Brasil permaneça como um interlocutor junto à Venezuela, apesar dos atritos diplomáticos ocorridos após a eleição presidencial.

Ainda de acordo com o ministro, o interesse do governo brasileiro sobre o processo eleitoral venezuelano decorre, entre outros fatores, da condição de testemunha dos Acordos de Barbados, para o qual o Brasil foi convidado, assim como para o acompanhamento do pleito de 28 de julho.

Atritos 

A eleição da Venezuela foi contestada pela oposição, por organismos internacionais e países, entre eles, o Brasil, pelo fato de os dados eleitorais por mesa de votação não terem sido apresentados.

No final de outubro, Venezuela acusou o Brasil de vetar a participação dela no Brics, que deve convidar 13 novos países como membros associados. A Venezuela, apesar de querer entrar no bloco, ficou de fora da nova lista, anunciada durante a 16ª cúpula do grupo, realizado em Kazan, na Rússia. O Itamaraty, no entanto, sustenta que o grupo apenas definiu os critérios e princípios para novas adesões.

Israel

Durante a audiência, o ministro também abordou o conflito no Oriente Médio, envolvendo Israel e o Hamas. Veira criticou os ataques do grupo terrorista Hamas que, em outubro do ano passado, mas disse que a reação de Israel é desproporcional. Os ataques do Hamas levaram à morte 1.163 pessoas e 251 foram tomadas como reféns, das quais, segundo o ministro, 100 pessoas ainda são mantidas em cativeiro.

“O que se assiste é uma reação desproporcional que busca ganhos geopolíticos concretos, que nada têm a ver com mera defesa nacional”, criticou. “O que começou como uma ação de terroristas contra civis israelenses inocentes tornou-se punição coletiva de todo o povo palestino com, indícios plausíveis de constituir a prática de genocídio, segundo decisão preliminar da Corte Internacional de Justiça”, afirmou.

Vieira disse que a reação israelense tornou a região de Gaza “um lugar inabitável” e lembrou que Israel já matou mais de 42 mil pessoas, das quais 70% são mulheres e crianças, além de promover incursões na Cisjordânia.

“Hoje Gaza é um lugar inabitável, 66% dos edifícios foram destruídos ou danificados; 85% de suas escolas foram destruídas e 96% de sua população passa fome, incluindo 50 mil crianças em situação de desnutrição aguda. Na Cisjordânia Israel passou a empregar, cada vez mais, a truculência utilizada em Gaza, com o número cada vez maior de assentamentos ilegais, condenados pelo direito internacional e pela comunidade internacional”, lamentou o chanceler que citou ainda a expansão da ofensiva israelense no Líbano, país que abriga a maior comunidade brasileira no Oriente Médio.

“Hoje já se contam 3.189 mortos no país, incluindo dois adolescentes brasileiros e um bebê de 14 meses que embarcaria no dia seguinte em um dos voos de repatriamento para o Brasil. Além disso, há 14.079 feridos e cerca de 1,2 milhão de pessoas deslocadas”, disse. “O Brasil alertava, desde o princípio, contra o risco do alastramento regional do conflito. Infelizmente, esse triste prognóstico se confirmou”, afirmou o ministro.