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Enchentes paralisaram 63% das indústrias gaúchas, revela pesquisa

As enchentes no Rio Grande do Sul resultaram em paralisação parcial ou total de 63% das indústrias do estado, revelou pesquisa da Federação das Indústrias do estado (Fiergs). Segundo o levantamento, 93% das interrupções alcançaram até 30 dias.

Ao todo, 81% das indústrias gaúchas foram afetadas pelas inundações do mês passado. Entre os principais prejuízos, os mais listados foram a logística de escoamento da produção ou recebimento de insumos, problemas com pessoal e colaboradores e dificuldades com fornecedores atingidos pelas enchentes. Além disso, 31,3% das que responderam informaram prejuízos em estoques de matérias-primas, 19,6% em máquinas e equipamentos, 19,6% em estabelecimentos físicos e 15,6% em estoques de produtos finais.

Segundo a Fiergs, o efeito das enchentes sobre a economia gaúcha só começará a ser detectado nos próximos meses. A recuperação, ressaltou a entidade, será lenta. Um primeiro sinal é o desabamento da expectativa dos industriais do Rio Grande do Sul.

A pesquisa foi feita com 220 empresas entre 23 de maio e 10 de junho. Os empresários receberam um formulário pela internet com um questionário aberto para aqueles que quisessem responder. O levantamento teve como objetivo entender o perfil das indústrias mais afetadas, avaliar a extensão e os tipos de prejuízos sofridos por elas e captar as perspectivas.

O trabalho foi coordenado pela Unidade de Estudos Econômicos da Fiergs, que elaborou a consulta junto às indústrias. A divulgação Contou teve apoio da Unidade de Desenvolvimento Sindical (Unisind), dos sindicatos filiados à entidade, do Conselho de Articulação Sindical e Empresarial (Conase), da Gerência Técnica e de Suporte aos Conselhos Temáticos (Getec) e do Serviço Social da Indústria (Sesi-RS).

Localização

Apesar do prejuízo com as enchentes, 64,2% das empresas consultadas pela Fiergs não pretendem mudar o local de suas sedes e permanecerão na mesma área de instalação. Já 20,1% ainda não decidiram o que farão com o negócio.

Das indústrias do estado, 52% não tinham cobertura de seguro contra perdas e danos decorrentes das enchentes. Entre as micro, pequenas e médias, 63,4% estavam sem seguro. Entre as grandes, cerca de 70% tinham seguro. Entre as sem seguro, 16% optaram por fechar os negócios ou mudar de localização, em comparação com 13% das seguradas que tomaram decisões semelhantes.

Recuperação

Segundo o levantamento, 60% das indústrias afetadas planejam destinar recursos para a recuperação dos negócios dentro de um mês. As grandes empresas destacam também, como ações governamentais prioritárias para retomada das atividades, a necessidade de melhorias na infraestrutura e medidas específicas para prevenir novos alagamentos. Por outro lado, as pequenas e médias empresas apontam a necessidade de subsídios financeiros e adiamento ou anistia de tributos.

Em postagem na rede social X, antigoTwitter, o ministro extraordinário de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul, Paulo Pimenta, informou que a linha de crédito Pronampe Solidário, criada para socorrer as micro e pequenas empresas gaúchas, emprestou R$ 1,3 bilhão em três semanas. Segundo o ministro, 13 mil empreendedores receberam apoio e R$ 435 mil foram subsidiados pelo governo.

Com juro zero, o Pronampe Solidário tem 40% de subsídio. Dessa forma, o empreendedor que pegou R$ 100 mil emprestados, deve R$ 60 mil. Os R$ 40 mil restantes serão pagos pelo governo. “Isso é compromisso do presidente Lula com a reconstrução do Rio Grande do Sul”, ressaltou Paulo Pimenta na postagem.

Enel confirma a Lula investimento de R$ 20 bi para acabar com apagões

Companhia com a imagem afetada por sucessivos apagões nos últimos meses, a Enel assumiu o compromisso de investir R$ 20 bilhões de 2024 a 2026 nos estados de São Paulo, do Rio de Janeiro e Ceará para reduzir as interrupções de energia. A empresa prometeu o investimento após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva encontrar-se com o diretor-geral da Enel, Flavio Cattaneo, na viagem à Itália.

“A gente está disposto a renovar o acordo se eles assumirem o compromisso de fazer investimento, e eles assumiram o compromisso de ao invés de investirem R$ 11 bilhões, eles vão investir R$ 20 bilhões nos próximos três anos, prometendo que não haverá mais apagão em nenhum lugar em que eles forem responsáveis”, disse Lula em entrevista coletiva após o encontro.

De acordo com o presidente, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, deve apresentar uma proposta na próxima semana que tratará os termos da renovação. “São Paulo, a maior capital, cidade mais importante do país, não pode ficar sem energia”, acrescentou Lula.

No fim de abril, a Enel tinha anunciado o investimento de US$ 3,7 bilhões, em torno de R$ 20 bilhões, para diminuir as interrupções de energia nas áreas onde opera. Recentemente, o governo condicionou a renovação das concessões à companhia à ampliação dos investimentos.

No momento, o Ministério de Minas e Energia e a Casa Civil da Presidência da República discutem os critérios para a renovação de 20 concessões na área de energia que vencem a partir de 2025. Além da Enel, terão os contratos renovados a CPFL Energia, a Neoenergia, a Equatorial e a Energisa, que concentram quase dois terços do mercado de distribuição de energia no país.

Multas e CPI

Após os apagões que atingiram a região metropolitana de São Paulo em novembro, a Enel foi multada duas vezes. Em fevereiro, a Aneel multou a companhia em R$ 168,5 milhões. Em abril, o Procon SP aplicou uma multa de R$ 12,9 milhões, por falhas no serviço de energia no centro da capital paulista.

Nesta semana, a Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça e Segurança Pública multou a filial da Enel no Rio de Janeiro em R$ 13,067 milhões. Os motivos foram a frequência de interrupção dos serviços e a demora por parte da concessionária em restabelecer o fornecimento.

Em São Paulo, a Enel foi alvo de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara Municipal que pediu o fim do contrato com a companhia e cobrou investimentos de R$ 6,2 bilhões na rede de energia da capital paulista. Em abril, a 22ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve liminar que obriga a companhia a reduzir a falta de luz no estado.

Lula classifica de insanidade proposta que equipara aborto a homicídio

No Continente Europeu desde quinta-feira (13), onde participou como convidado da Cúpula do G7, que reúne os países mais ricos do mundo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comentou o Projeto de Lei 1.904/24, que propõe tornar homicídio aborto realizado acima de 22 semanas de gestação, em qualquer situação, inclusive em caso de estupro.

“Eu, Luiz Inácio, sou contra o aborto. Mas, como o aborto é uma realidade, precisamos tratar como uma questão de saúde pública. Eu acho que é insanidade alguém querer punir uma mulher em uma pena maior do que o criminoso que fez o estupro”, declarou em uma entrevista coletiva concedida a jornalistas em Puglia, na Itália.

O presidente afirmou que não acompanhou ativamente o debate sobre o projeto de lei no Brasil, mas que tomará ciência assim que retornar neste sábado (15). “Eu tenho certeza de que o que está previsto na lei já garante que a gente aja de forma civilizada para tratar com rigor o estuprador e para tratar com respeito a vítima” reforçou.

O tema também foi tratado pelos líderes das maiores economias na Itália. À frente da presidência do G7, a primeira-ministra Giorgia Meloni liderou uma mudança na declaração final de 2024, que removeu um trecho presente no documento do ano anterior anterior, que tratava do acesso e cuidados para o aborto legal seguro.

Desoneração

Na entrevista coletiva, Lula comentou ainda o impasse em relação à desoneração da folha de 17 setores, que têm pressionado o governo pela desvinculação dos gastos com a saúde e a educação, para manter a proposta. O presidente afirmou que o setor é que deverá apontar uma solução para que as contas fechem dentro do prazo estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para que a liminar concedida pelo ministro Cristiano Zanin, que barrou a medida, não prevaleça.

“A gente não vai fazer ajuste em cima dos pobres, porque os que ficam criticando o déficit fiscal, os que ficam criticando os gastos do governo são os mesmos que foram para o Senado aprovar a desoneração de 17 grupos empresariais e que ficaram de fazer uma compensação para suprir o dinheiro da desoneração e não quiseram fazer”, afirmou.

O presidente afirmou que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem avançado na política econômica brasileira. “Nós já fizemos a regulação do marco fiscal, nos já aprovamos a reforma tributária, nós estamos demonstrando a nossa seriedade de garantir estabilidade jurídica, estabilidade política, estabilidade fiscal, estabilidade econômica e estabilidade social, isso está garantido.”

Lula disse que o ministro jamais ficará enfraquecido. Segundo o presidente, todo corte que Haddad julgar necessário será feito. “Nós vamos chegar à sexta economia do mundo. Chegamos em 2011, depois caímos para 12ª e eu já trouxe de volta para a oitava posição. Até o final do meu mandato, vamos voltar à sexta.”, afirmou.

Futuro da área onde viveu “Índio do Buraco” é alvo de disputa judicial

O espólio de um homem que viveu quase sem nenhum bem material está no centro de uma disputa judicial, em Rondônia. Indígenas, Ministério Público Federal (MPF) e um grupo de pessoas não indígenas esperam que a Justiça Federal decida o destino de uma extensa área de 8.070 hectares onde, até 2022, vivia um único indivíduo, conhecido como Tanaru, ou o “Índio do Buraco”.

Tanaru viveu ao menos 26 anos em isolamento voluntário, evitando o contato com outros seres humanos, incluindo indígenas que habitam as redondezas da área equivalente a 8 mil campos de futebol, nas cidades de Chupinguaia, Corumbiara, Parecis e Pimenteiras do Oeste.

Segundo a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), cujos servidores o monitoravam a distância desde 1996, quando o avistaram pela primeira vez, Tanaru era o “único sobrevivente de sua comunidade, de etnia desconhecida”. Para o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), com a morte dela, “desapareceu mais uma cultura milenar”.

Em agosto de 2022, indigenistas que realizavam uma ronda de vigilância encontraram Tanaru morto, deitado em uma rede, no interior da última das muitas palhoças que o indígena construiu ao longo dos anos – a Funai tem registros de ao menos 53 delas. O corpo estava preservado e paramentado com adereços como um colar no pescoço, um chapéu e enfeites de penas. Nenhum ferimento ou indício da passagem de outra pessoa pelo local foi identificado. Os poucos utensílios que Tanaru carregava consigo a cada vez que se mudava para uma nova palhoça foram todos encontrados.

Funai monitorava Tanaru a distância desde 1996 – Acervo/Funai

Tanaru morreu sem que sua etnia tivesse sido identificada sem margem para dúvidas. Ninguém nunca soube ao certo que idioma ele falava ou qual era sua idade aproximada. Da mesma forma, resta o mistério de como ele terminou sozinho, em uma área florestal cercada por fazendas cuja vegetação original foi quase toda eliminada. A hipótese mais provável é que ele era o último representante de um povo dizimado em meio à intensificação da colonização de Rondônia, na segunda metade do século passado, quando dezenas de povos indígenas habitavam a região.

Ele recebeu o apelido de servidores da Funai, em referência ao rio que corta a região. O outro, devido ao costume de cavar um buraco profundo, uma espécie de cova, no interior de cada nova maloca. Arredio, flechou um servidor da Funai que tentou se aproximar, em 2005. Na maior parte do tempo, contudo, não demonstrava temer as pessoas, chegando a construir algumas de suas palhoças perto dos limites entre a área que a União destinou ao seu usufruto exclusivo e as fazendas ao redor. Além disso, em determinado período, aceitava os objetos (machados, facões etc.) e as sementes que servidores da Funai lhe deixavam com o intuito de estimulá-lo a plantar alguns alimentos para consumo próprio.

As dúvidas quanto à origem de Tanaru deram margem a especulações. Há, na região, quem até hoje sustente que ele não era indígena, assim como há quem garanta que, embora indígena, ele pertencia a um povo de outra região e foi levado por indigenistas, de avião, para ocupar a área hoje em disputa.

Os restos mortais de Tanaru só foram enterrados no início de novembro de 2022, mais de dois meses após sua morte. Para isso, o MPF teve que ingressar com uma primeira ação na Justiça Federal, pedindo que a Funai fosse obrigada a sepultar o indígena no mesmo local onde seu corpo foi encontrado e seguindo as tradições indígenas regionais. Sob o comando da gestão do presidente Jair Bolsonaro, a Funai alegava não ter a obrigação legal de sepultar o indígena, cujo corpo permanecia acondicionado na unidade da Polícia Federal em Vilhena (RO), onde tinha sido submetido a autópsia.

Em dezembro de 2022, o MPF voltou a recorrer à Justiça contra a União e a Funai. Desta vez para obrigar os órgãos federais a transformarem o território em que Tanaru viveu em uma área pública, de proteção socioambiental. Apesar da presença indígena na região, incluindo alguns grupos de recente contato, como os kanoé e akuntsú, a Funai nunca promoveu os estudos antropológicos necessários à delimitação e reconhecimento da terra indígena. A Justiça Federal em Rondônia agendou para a segunda quinzena de julho uma audiência de conciliação entre as partes.

Durante os 26 anos em que monitorou Tanaru, a fundação limitou-se a, de tempos em tempos, renovar suas portarias de restrição de uso, interditando o aceso de não indígenas à área – que a Funai denominou Terra Indígena Tanaru “para fins de controle administrativo”. A portaria atualmente em vigor é de 2015 e tem validade de dez anos.

“Este território já devia ter sido demarcado há muito tempo, e a morte do Tanaru não muda o fato de que essas terras eram ocupadas por indígenas desde tempos imemoriais e, portanto, pertencem à União”, afirmou à Agência Brasil o procurador da República Daniel Luis Dalberto, autor da ação junto com o procurador Leonardo Caberlon.

Detalhes de imagens anexadas no processo do caso “Índio do Buraco – buracos cavados por Tanaru – Ministério Público-RO/Divulgação

“Como se trata de um bem da União em relação ao qual não podemos transigir [ceder], pedimos ao Poder Judiciário que determine a obrigação da União, da Funai, de demarcá-la para então decidirmos, coletivamente, junto com os indígenas do entorno, o destino mais apropriado à área. A finalidade é proteger a área, seja na forma de um memorial dedicado a Tanaru e à resistência dos povos indígenas, seja como uma área de proteção e destinação socioambiental”, acrescentou o procurador.

De acordo com Dalberto, a atual disputa em torno da área é resultado da colonização desordenada da região. Segundo o procurador, para incentivar a colonização e o estabelecimento de empreendimentos agrícolas, o próprio Estado loteou as terras e entregou títulos de propriedades a pessoas vindas de outras localidades, ignorando a presença indígena e de outras populações.

“O governo militar sabia que toda aquela região era amplamente ocupada por indígenas. E, segundo as resoluções em vigor na época, tais áreas não poderiam ser disponibilizadas para qualquer outro fim [que não o usufruto exclusivo indígena]. O Estado brasileiro ignorou este fato, o que acabou por estimular situações muito violentas. Muitos grupos indígenas tiveram que fugir; outros foram exterminados. Há, inclusive, registros históricos de fazendeiros usando tratores para tentar esconder as evidências da presença indígena”, concluiu o procurador, para quem Tanaru é um sobrevivente e um exemplo da resistência dos povos originários.

“Um único integrante de uma civilização conseguiu viver sozinho, sem ajuda de ninguém, por ao menos três décadas, em um pequeno pedaço de floresta, sem destruí-la. Isto é a máxima expressão de autonomia e sustentabilidade. […] Em parte, graças a essa única pessoa, temos, na região, uma ilha de biodiversidade. Ou seja, Tanaru não só levou adiante sua civilização, como, com sua presença, manteve parte de bioma único”, destacou Dalberto.

Favorável à iniciativa do MPF, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) pediu à Justiça Federal para integrar a ação, como amicus curiae, ou seja, para fornecer subsídios ao órgão julgador. Para os advogados da entidade, cabe à União reconhecer a área em que Tanaru viveu e morreu como um território tradicional indígena, destinando-a para fins de proteção e promoção socioambiental e protegendo-a.

“A Coiab reforça a necessidade de demarcação [das terras] com fundamento, dentre outros, no direito constitucional à memória […] e com a finalidade de garantir o direito à existência dos povos indígenas, inclusive com a previsão da memória como parte do patrimônio cultural brasileiro, abrangendo também os povos isolados e seus territórios”, sustenta a entidade em nota enviada à reportagem.

Objetos usados pelo “Índio do Buraco” – Ministério Público-RO/Divulgação

“O território Tanaru carrega em si interesses nas áreas de arqueologia, antropologia, linguística, cultural, ambiental, histórica e botânica”, reforça a entidade, insistindo que a homologação da Terra Indígena Tanaru está em conformidade com a legislação, “sendo juridicamente irrelevante a não presença, na área, da etnia específica [à qual Tanaru pertencia]”.

“Além disso, o caso lança a atenção pública e do Estado para outros diversos casos de genocídio de populações indígenas em curso no país […] Afinal, o massacre que matou quase todos os indígenas desse território [Rondônia] foi deliberadamente escondido e esquecido e a demarcação seria uma forma de resguardar a memória e reforçar a ideia de que a sociedade não deve repetir tamanha violação de direitos humanos”, finaliza a Coiab.

Particulares

Contrário à iniciativa do MPF, 11 pessoas (nove delas pertencente a três famílias) reivindicam, na Justiça, a propriedade da terra. Representante do grupo, o advogado Sandro Ricardo Salonski Martins sustenta que seus clientes são os legítimos donos da totalidade dos imóveis atingidos pela restrição de uso imposta ao território que Tanaru ocupava.

“A área em questão não pertence à União e não existe nenhuma afetação por ocupação tradicional indígena. Trata-se de propriedades particulares devidamente tituladas há muitos anos, desde antes da [entrada em vigor da] Constituição Federal de 1988”, afirma o advogado, sustentando que, pelo tempo em que Tanaru ocupou a área e foi monitorado a distância por servidores da Funai, seus clientes “respeitaram sua presença”.

“O falecimento do indígena extinguiu o usufruto que tinha sobre a área. Logo, a razão de ser das portarias de interdição há muito se extinguiu, transformando-se em um instrumento abusivo por parte do poder público. Além disso, discutir a demarcação de uma área desprovida de população indígena é inteiramente injustificável e não está previsto em nossa Constituição Federal”, finaliza o advogado, destacando que a União nunca tomou nenhuma providência prática para demarcar e homologar a área.

Uma das pessoas representadas na ação é Gutemberg Ermita, pecuarista hoje com 81 anos. Ele e seus irmãos se estabeleceram na região em 1973. Naturais de Colatina (ES) e filhos de pequenos produtores rurais, eles buscavam uma nova área onde pudessem criar gado.

“Morávamos em uma propriedade pequena”, contou à Agência Brasil o filho do pecuarista, Gutemberg Ermita Filho. “Meu pai e seus três irmãos decidiram vir conhecer Rondônia. E chegaram até esta área trazidos por um indígena cuja tribo vivia próximo a Chupinguaia – que, na época, ainda se chamava Viradouro, porque aqui não tinha nada. A cidade tinha duas ruas apenas”, acrescentou Filho ao lembrar que, em 1982, quando ele próprio se mudou para a propriedade da família, já não encontrou indígenas morando nas proximidades.

“Meu pai e meus tios trabalharam muito. Desbravaram a área junto com outras famílias atraídas para a região. Meu pai, inclusive, chegou a atuar como procurador de mais de 60 pessoas que estavam se estabelecendo na região, abrindo [suas propriedades], conforme exigência do próprio  Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária]. Ele viajava para Brasília atrás da burocracia, da escritura do imóvel dele e de outras pessoas. Demorou alguns anos para ele, enfim, receber a papelada. Ou seja, se havia algo de errado com a destinação destas terras, o governo teve tempo para identificar isso já lá atrás, há 50 anos. Pelo contrário. Na época, o próprio Estado incentivou as pessoas a virem para a região”, argumentou Filho.

“Agora, não vai ser fácil solucionar esta situação. Nossa proposta é que parte da área seja transformada em um parque arqueológico ou algo do tipo, em que ninguém mexa. Não somos contra um memorial para o indígena, mas propomos que ele ocupe um espaço menor. Para que 8 mil hectares para um memorial, para uma terra indígena onde já não há um índio?”, finalizou Gutemberg Ermita Filho.

Procurada pela Agência Brasil, a Funai informou que “por se tratar de caso inédito pós-Constituição de 1988”, ainda estuda a correta destinação para a área. “[Enquanto isso], a Procuradoria Federal Especializada realizou e continua a realizar diversas ações para garantir a proteção do território.”

A fundação lembrou que, em novembro de 2022, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou à União que apresentasse, em 60 dias, um plano de ação para proteger os territórios destinados a povos indígenas isolados e de recente contato, incluindo a TI Tanaru. O órgão reafirmou que a restrição de uso e ingresso de não indígenas na área, aplicada a partir de 1996, foi estabelecida em função da confirmação da presença indígena na área.

“Logo se confirmou que se tratava de um único sobrevivente. Havia evidências claras de que, pouco tempo antes, um grupo [indígena] tinha sido expulso de sua aldeia, por homens agindo a serviço do ‘proprietário’ da fazenda”, destacou. “O indígena isolado [Tanaru] não correspondeu [às tentativas] de diálogos de povos do entorno e acabou sendo considerado pertencente a uma etnia ou grupo desconhecido”, acrescentou a fundação, garantindo que, desde então, “manteve atividades de monitoramento, tendo levantado informações e produzido inúmeros relatórios sobre o modo de vida e forma de ocupação do território”.

A Agência Brasil também procurou a prefeitura de Corumbiara, mas não recebeu resposta. Cerca de 30% da área que o MPF pede que seja transformada em uma unidade de conservação estão localizados no município. Outros 50% ficam em Pimenteiras do Oeste, cuja prefeita, Valéria Garcia (PP), disse, por mensagem de áudio, que “nunca ouviu falar” sobre a polêmica envolvendo a área.

Enem estende até dia 21 inscrições para estudantes gaúchos

O ministro da Educação, Camilo Santana, anunciou neste sábado (15), em suas redes sociais, que o sistema de inscrições para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) será reaberto para os estudantes gaúchos. O novo prazo começa neste domingo (16) e vai até a próxima sexta-feira (21).

As inscrições haviam se encerrado na sexta-feira (14). Segundo dados divulgados pelo ministro, foram contabilizadas 5.055.699 inscrições, das quais 4.050.810 já concluíram todos os procedimentos necessários para confirmar a participação. Os números são superiores aos registrados no ano passado.

Enem 2024 supera os 5 milhões de inscritos!

O sistema encerrou com 5.055.699 inscrições. Já são 4.050.810 inscritos confirmados para fazer a prova, superando o ano passado.

E atenção! Vamos reabrir as inscrições amanhã, às 9h, para o estado do Rio Grande do Sul, para que os…

— Camilo Santana (@CamiloSantanaCE) June 15, 2024

A abertura de um novo prazo para os estudantes gaúchos ocorre em meio às dificuldades enfrentadas pela população do Rio Grande do Sul com os eventos climáticos. O grande volume de chuvas registrado ano estado do partir do fim de abril deste ano deixou diversas cidades submersas, forçando mais de 600 mil pessoas a sair de suas casas e causando mais de 170 mortes.

A tragédia gerou restrições na mobilidade e dificuldades de garantia de serviços básicos como energia e atendimento de saúde.

As provas do Enem serão aplicadas nos dias 3 e 10 de novembro em todo o país. O exame, que avalia o desempenho escolar dos estudantes ao término da educação básica, foi adotado como principal porta de entrada para os cursos superiores no Brasil, já que é usado na seleção de novos ingressantes em boa parte das instituições de ensino públicas e privadas.

Brasil está pronto para acordo Mercosul e União Europeia, diz Lula

No último dia da visita oficial à Itália, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou, em uma entrevista coletiva à imprensa neste sábado (15), que o Brasil está pronto para assinar o acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia. Segundo ele, o acordo agora só depende de o bloco europeu passar pelo período de eleições da Assembleia Nacional na França, antecipadas para o final de junho, após a dissolução do Parlamento pelo presidente Emmanuel Macron.

“Estamos certos de que o acordo será benéfico para a América do Sul, Mercosul e para os empresários e os governos da União Europeia.”

O tema foi tratado com a presidenta da Comissão Europeia, Ursula Gertrud von der Leyen, durante a estada do presidente Lula na região da Puglia, onde participou da cúpula do G7, grupo dos países mais ricos.

Taxação dos super-ricos

O presidente também disse que voltou a tratar com as lideranças europeias sobre a proposta de taxação dos super-ricos, que cria uma taxa global mínima de 2% sobre a riqueza dos bilionários, que atingiria apenas cerca de 3 mil pessoas no mundo. “Eu convidei todos para entrarem na briga contra a desigualdade, contra a fome e contra a pobreza, não é possível que você tenha meia dúzia de pessoas que tenha mais fortuna que o PIB [Produto Interno Bruto] da Inglaterra, da Espanha, de Portugal e da Alemanha juntos.”

Governança

Lula também voltou a defender uma reforma na governança global, que tem marcado a atual presidência no G20, baseada na inclusão social e na luta contra a fome e a pobreza mundial. Ele convidou os lideres a participarem do lançamento do Programa Nacional de Combate à Fome e a Pobreza, em julho, no Rio de Janeiro.

De acordo com o presidente, é necessário que os empresários europeus aumentem o comércio exterior para melhorar o fluxo na balança comercial. “É preciso aumentar a rentabilidade de cada país, o comércio exterior, o fluxo na balança comercial e quem trata disso é empresário, não é governo. O governo só abre a porta, mas quem vai fazer negócio são os empresários”, afirmou.

Lula disse que os líderes europeus se mostraram flexíveis sobre a necessidade de mudanças na governança internacional, inclusive com a retomada da Organização Mundial do Comércio (OMC) e a inserção da China no grupo. “Nós nunca andamos tanto no caminho certo como estamos andando agora sobre a necessidade de mudança na governança mundial, em todos os aspectos, desde a modificação do Conselho de Segurança e a participação de vários continentes, até a questão do funcionamento das Instituições da Bretton Woods.”

Economia mundial

Outro tema alinhado ao debate sobre transição energética, que também é prioritário para o Brasil, segundo Lula, é a utilização dos mateiras críticos, na produção de minerais. O presidente destacou que os países mais ricos estão dispostos a ajudar os países que têm esses minerais, para que o beneficiamento seja feito no país de origem, para eles comprarem pagando o valor agregado. “É uma inovação muito grande e isso é unânime no G7. Vai ajudar muito o Brasil, que tem um território muito grande e muitos minerais e, sobretudo, os países africanos, porque terão que financiar um processo de industrialização”, disse.

Guerra

Embora não tenha tratado em discurso sobre a guerra entre Israel e o Hamas, durante a coletiva o presidente falou que a inflexibilidade do governo israelense dificulta o diálogo pela paz. “O primeiro-ministro de Israel [Benjamin Netanyahu] não quer resolver o problema, ele quer aniquilar os palestinos.”

O presidente reiterou a defesa brasileira por uma mudança no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). “Só será resolvido o conflito no Oriente Médio, entre o governo de Israel e o povo palestino o dia que a ONU tiver força para implementar a decisão que marcou o território em 1967 e deixar os palestinos construírem a sua pátria livremente e viver harmonicamente com o povo judeu.”

Lula também reforçou em reunião com a presidenta da Suíça, Viola Amherd, que não iria participar de uma reunião neste final de semana para tratar sobre uma solução para a guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Segundo o presidente, o governo brasileiro e o presidente da República Popular da China, Xi Jinping, trabalham em uma proposta de conciliação pela paz. “Estamos propondo que haja uma negociação efetiva, que a gente coloque a Rússia e o [Volodymyr] Zelensky na mesa e vamos ver se é possível convencê-los de que a paz trará melhor resultado do que a guerra.”

Conselho de Segurança

Sobre o papel das Nações Unidas, o presidente afirmou que considera que a ONU tem demonstrado fragilidade com os cenários de guerra na Ucrânia e na Faixa de Gaza, mas não acredita que haja uma mudança imediata no Conselho de Segurança até, por exemplo, a cúpula do G20, em novembro, no Brasil. “É aquele negócio, quem chegou primeiro na festa quer ficar e não quer dar o lugar para o outro.”

Itália

O presidente falou ainda sobre o encontro com a primeira-ministra da Itália Giorgia Meloni, anfitriã da cúpula dos países mais ricos, no qual destacou a relação entre os dois países e a convidou a visitar o país com maior número de italianos fora da Itália. “Eu tentei mostrar para ela o histórico da relação entre Brasil e Itália e a importância de ela ter contato com os quase 230 mil italianos que moram no Brasil, são quase 1,4 mil empresas que investem no Brasil e geram mais 150 mil empregos”, destacou.

Indígenas Tupinambá cobram declaração de terra paralisada no governo

Os indígenas da etnia Tupinambá, no sul da Bahia, intensificaram a pressão sobre o governo federal esta semana em busca de avanço no processo de demarcação de suas terras, paralisado há aproximadamente 15 anos. Cerca de 20 lideranças da comunidade tradicional cumpriram uma série de agendas em Brasília, com reuniões na Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), no Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), na Procuradoria-Geral da República (PGR), entre outros órgãos, para destravar a portaria declaratória, pendente de assinatura pelo menos desde 2009, quando foi emitido o relatório de identificação e delimitação.

Três anos mais tarde, em 2012, todas as contestações sobre a ocupação foram superadas por pareceres jurídicos do próprio governo.

O grupo também realizou um ato na Praça dos Três Poderes, na última quarta-feira (12), contra a tese do chamado marco temporal, aprovada em lei pelo Congresso Nacional, mesmo após veto do presidente da República e de ser considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que deverá invalidar o texto legal em novo julgamento.

De acordo com a legislação, a portaria declaratória deve ser editada pelo ministro da Justiça. Trata-se da segunda de cinco etapas formais do processo de demarcação, e ocorre após a elaboração do Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID), produzido pela Funai, que apontou, no caso dos Tupinambá, a ocupação centenária na região.

“Não tem mais nenhum impedimento jurídico para que seja assinada a portaria declaratória, porém, a gente percebe que há um problema político muito maior que tem atrapalhado a continuidade e a celeridade desse processo, por parte do governo”, afirma Jaborandy Tupinambá, coordenador do Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas da Bahia (Mupoíba).

A Lei 14.701/2023, que estabeleceu o marco temporal, também não tem poder de travar o prosseguimento da demarcação da Terra Indígena (TI) Tupinambá de Olivença, segundo a assessoria jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), já que a tradicionalidade da ocupação indígena da área já foi reconhecida por meio do procedimento de identificação e delimitação do território. “Os indígenas sempre ocuparam porções de terras em toda a extensão do território. Inclusive, as áreas estavam registradas em nome de famílias pertencentes ao Povo. Essas famílias são conhecidas como ‘mourões’. Grupos familiares que nunca saíram do território e que o esbulho intensificado no meado do século passado não conseguiu afastá-los daquelas terras”, diz o trecho de uma nota técnica elaborada pela entidade.

Proteção ameaçada

Localizada nos municípios de Ilhéus, Una e Buerarema, a Terra Indígena Tupinambá de Olivença tem cerca de 47,3 mil hectares, divididos em 23 comunidades, onde vivem cerca de 8 mil indígenas. O território ajuda a preservar uma porção importante de Mata Atlântica original nessa região da Bahia, mas, segundo os seus ocupantes originários, é alvo histórico da cobiça de setores agrícolas.

“São cidades que foram construídas pelos coronéis do cacau, desde uma época em que eram tudo, e continuam sendo os políticos, prefeitos, vereadores, juízes e delegados que julgam nossa presença no território”, afirma Jaborandy Tupinambá.

Respostas

Procurado, o Ministério dos Povos Indígenas informou que “acompanha com interesse o desfecho e definição da emissão da Portaria Declaratória da TI Tupinambá de Olivença”. A pasta reconheceu que a demanda se arrasta 15 anos, e ressaltou que só a demarcação será capaz de pacificar os perigos de conflitos fundiários na região.

“A situação das lideranças indígenas da TI Tupinambá é complexa e preocupante. Há um histórico de ameaças e violência, principalmente relacionadas à demarcação de suas terras. Uma demarcação de TI reduz os conflitos e os riscos à segurança dos povos indígenas. A TI foi identificada e delimitada pela Funai em 2009 e o processo de demarcação tramita na justiça”, destacou a pasta.

Já o Ministério da Justiça, responsável formal pela publicação da portaria declaratória, não respondeu ao pedido de manifestação da reportagem, até o momento.

A velocidade no andamento dos processos de reconhecimento das terras indígenas tem sido alvo de críticas do movimento indígena desde o início do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Apesar de a política de demarcação ter sido retomada, com a homologação de dez áreas desde 2023 – quase o mesmo número que nos dez anos anteriores (11) –, a expectativa era que pelo menos 14 áreas, que dependem apenas do decreto presidencial, já pudessem ter sido oficializadas. Essa foi a principal cobrança durante a última edição do Acampamento Terra Livre (ATL), em abril, que reuniu 10 mil indígenas em Brasília.

STF tem maioria para tornar Janones réu por postagens contra Bolsonaro

A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou nesta sexta-feira (14) para tornar réu o deputado federal André Janones (Avante-MG) pelo crime de injúria contra o ex-presidente Jair Bolsonaro.

A Corte julga em plenário virtual uma queixa-crime apresentada pela defesa de Bolsonaro contra postagens feitas por Janones nas redes sociais.

Em uma publicação no dia 31 de março de 2023, Janones chamou Bolsonaro de “miliciano” e “ladrão de joias”. Em 5 de abril, o parlamentar se referiu ao ex-presidente como “assassino que matou milhares na pandemia”.

Ao analisar o caso, a ministra Cármen Lucia, relatora do caso, entendeu que as falas de Janones não podem ser consideradas como imunidade parlamentar. Pelo Artigo 53 da Constituição, os parlamentares são invioláveis civil e penalmente por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.

“As afirmações feitas pelo querelado e tidas como ofensivas pelo querelante não foram feitas em razão do exercício do mandato parlamentar, nem têm com ele pertinência”, escreveu a ministra.

O voto de Cármen Lúcia foi seguido pelos ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Flávio Dino, Gilmar Mendes, Nunes Marques e Luís Roberto Barroso.

Os ministros Cristiano Zanin, Dias Toffoli e André Mendonça votaram pela rejeição da queixa-crime por entenderem que as declarações de Janones estão acobertadas pela imunidade parlamentar.

Para Mendonça, cabe ao Congresso analisar a eventual quebra de decoro de Janones.

“O afastamento da imunidade exige que as falas do parlamentar não guardem absolutamente qualquer relação com seu mandato e que, além disso, também não tenham sido proferidas em razão dele”, afirmou Mendonça.

Defesa

Na defesa apresentada no processo, os advogados de Janones defenderam a rejeição da queixa-crime e afirmaram que as declarações do deputado tiveram somente a intenção de criticar e ironizar, não se tratando de conduta ofensiva. Além disso, a defesa alegou que as declarações estão acobertadas pela imunidade parlamentar.

“Certamente as declarações feitas pelo querelado relacionadas aos termos ladrão de joias, ladrãozinho de joias e bandido fujão correspondem exatamente a todos esses acontecimentos envolvendo o querelante, num tom extremamente jocoso, com o intento de criticar as condutas ilícitas praticadas pelo ex-presidente da República”, afirmou a defesa.

A Agência Brasil entrou em contato com gabinete de Janones e aguarda retorno. 

Padilha: “Não contem com governo pra mudança na legislação de aborto”

O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, disse nesta sexta-feira (14) que o governo não apoia o Projeto de Lei 1.904/2024, que equipara aborto ao homicídio simples, quando cometido após a 22ª semana de gestação. A proposta tramita na Câmara dos Deputados, onde a urgência para análise foi aprovada na última quarta-feira (12). 

“Não contem com o governo pra qualquer mudança na legislação atual de aborto no país”, disse Padilha, em vídeo divulgado nas redes sociais. 

“Ainda mais um projeto que estabelece uma pena para a mulher e para a menina que foi estuprada, que muitas vezes é estuprada sem nem saber o que é aquilo, que descobre tardiamente que ficou grávida porque nem sabe o que é a gravidez ou tem que esconder do estuprador, que às vezes é um parente que está na própria casa”, completou. 

O projeto também prevê que meninas e mulheres que fizerem o procedimento após 22 semanas de gestação, inclusive quando forem vítimas de estupro, terão penas de seis a 20 anos de reclusão. A punição é maior do que a prevista para quem comete crime de estupro de vulnerável (de oito a 15 anos de reclusão). 

“Não contem com o governo para ser favorável a um projeto que estabelece uma pena para menina e para a mulher estuprada que pode ser até duas vezes  maior que para o estuprador”, reforçou o ministro.

Atualmente, o aborto é permitido no Brasil apenas em casos de gravidez ocasionada por estupro, se a gravidez representa risco à vida da mulher e em caso de anencefalia do feto. A legislação brasileira não prevê um limite máximo para interromper a gravidez de forma legal.

A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, disse que, apesar de ser contra o aborto, considera o tema complexo e muito delicado na sociedade brasileira. 

“Eu pessoalmente sou contra o aborto, mas acho que é uma atitude altamente desrespeitosa, desumana com as mulheres, achar que o estuprador deve ter uma pena menor do que a mulher que foi estuprada e que não teve condição de ter acesso dentro do tempo para fazer o uso da lei que lhe assegura o direito ao aborto legal”, disse a ministra em entrevista à imprensa.

CNBB pede aprovação de projeto que equipara aborto a homicídio

Após dias de silêncio, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) manifestou-se favorável ao projeto de lei que equipara aborto a homicídio. Em nota, a entidade pediu a aprovação da proposta, sob o argumento de defesa de duas vidas, da mãe e do bebê.

“A Igreja Católica neste momento considera importante a aprovação do PL 1904/2024, mas continua no aguardo da tramitação de outros projetos de lei que garantam todos os direitos do nascituro e da gestante”, afirmou a conferência, em nota assinada pelo presidente da entidade, Dom Jaime Spengler. arcebispo de Porto Alegre.

Para a CNBB, o texto coíbe a morte provocada por bebês por meio do que chamou de “cruel prática de assistolia fetal”, ao equiparar o aborto após às 22 semanas de gestação ao homicídio. Atualmente, a retirada do feto depois desse prazo é autorizada em caso de estupro.

A conferência ressaltou que a assistolia fetal é proibida pelo Conselho Federal de Medicina e está liberada por limitar concedida pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). No fim de maio, um pedido de vista do ministro Nunes Marques interrompeu o julgamento.

“Cabe ressaltar que as 22 semanas não correspondem a um marco arbitrário. A partir dessa idade gestacional, realizado o parto, muitos bebês sobrevivem. Então, por que matá-los? Por que este desejo de morte? Por que não evitar o trauma do aborto e no desaguar do nascimento, se a mãe assim o desejar, entregar legalmente a criança ao amor e cuidados de uma família adotiva? Permitamos viver a mulher e o bebê”, afirma a nota da CNBB.

Em relação ao “crime hediondo do estupro”, a CNBB pede que a identificação dos agressores e rigor e eficácia na punição. “É ilusão pensar que matar o bebê seja uma solução. O aborto também traz para a gestante grande sofrimento físico, mental e espiritual. Algumas vezes até a morte”, destaca a entidade. O comunicado, no entanto, não cita os danos psicológicos de uma vítima de estupro obrigada a prosseguir com a gravidez nem a condenação a uma pena maior que a do estuprador.

O texto também é assinado pelo primeiro vice-presidente, Dom João Justino de Medeiros Silva, arcebispo de Goiânia; pelo segundo vice-presidente, Dom Paulo Jackson Nóbrega de Sousa, arcebispo de Olinda e Recife; e pelo secretário-geral da CNBB, Dom Ricardo Hoepers, bispo auxiliar de Brasília.

Críticas

A organização Católicas pelo Direito de Decidir, grupo existente desde 1993 que luta pela laicidade do Estado na criação e na condução de políticas públicas, classificou a posição da CNBB de “misógina, hierárquica e racista”.

“A nota da CNBB não traz qualquer novidade. Reitera uma posição tradicional de uma instituição: misógina, hierárquica e racista, conformada exclusivamente por homens em sua cúpula de onde emanam o poder e os documentos oficiais”, criticou, por meio de nota, a presidenta do grupo, a socióloga Maria José Rosado Nunes.

“Nessa posição não se pode reconhecer o que muitas teólogas e teólogos dizem sobre as possibilidades de se encontrar na mesma tradição cristã, elementos que apoiam decisões informadas pela consciência, como o recurso à própria consciência como o reduto legítimo ética e religiosamente, para se tomar decisões. Diante de uma situação de difícil escolha, opta-se pelo mal menor, ou pelo bem maior”, acrescentou Maria José, doutora em Ciências Sociais pela École des Hautes Études em Sciences Sociales, em Paris.

“Por isso, a Católicas pelo Direito de Decidir posicionou-se sempre, publicamente, a favor de que as mulheres – meninas e pessoas que gestam – possam decidir sobre uma realidade que acontece em seus corpos. Nossa realidade material, nossa corporeidade é sagrada e só nós mesm@s podemos decidir sobre o que se pode ou não fazer no que diz respeito a ela”, concluiu a presidenta da organização.