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Quase 4 bilhões de pessoas correm risco de infecção pelo Aedes

Quase quatro bilhões de pessoas em todo o mundo estão sob risco de infecções transmitidas por infecções do tipo Aedes – seja o Aedes aegypi ou o Aedes albopictus que, juntos, respondem por doenças como dengue, zika, chikungunya e febre amarela. O alerta é da líder da equipe sobre arbovírus da Organização Mundial da Saúde (OMS), Diana Rojas Alvarez. 

Ao participar – por videoconferência – de encontro na sede da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) em Brasília, Diana destacou que a estimativa é que esse número – quatro bilhões – aumente em mais um bilhão ao longo das próximas décadas, sobretudo, por conta de fatores como o aquecimento global e a adaptação do Aedes a grandes altitudes. O mosquito, segundo ela, já pode ser encontrado, por exemplo, em montanhas do Nepal e da Colômbia, além de países da região andina. 

Surtos

A OMS monitora ativamente surtos e epidemias de dengue em pelo menos 23 países, sendo 17 nas Américas – incluindo o Brasil.

Segundo Diana, os casos da doença aumentaram consistentemente ao longo das últimas quatro décadas. Em 2023, entretanto, houve o que ela chamou de aumento muito significativo tanto de casos como de mortes pela doença.

“Um novo recorde”, disse, ao citar mais de seis milhões de casos reportados e mais de sete mil mortes por dengue em 80 países. 

Para Diana, a expansão de casos se deve a fatores ambientais como o aumento das chuvas e, consequentemente, da umidade, o que favorece a proliferação do mosquito, além da alta das temperaturas globais, ambos fenômenos provocados pelas chamadas mudanças climáticas.

Ela disse, ainda, que é imprescindível melhorar a comunicação de casos e os sistemas de vigilância dos países em relação a arboviroses para ampliar ações de prevenção e combate em saúde pública.

Indígenas Zoró denunciam aumento de ameaças com chegada de garimpeiros

Lideranças indígenas zoró denunciam o aumento de ameaças e violências em seu território, localizado próximo ao município de Rondolândia (MT). As agressões teriam se intensificado desde que a Agência Nacional de Mineração (ANM) autorizou a entrada de garimpeiros no local, em janeiro deste ano. Os indígenas já sofriam com a exploração de madeira ilegal e, agora, veem o aumento do número de não indígenas à procura de ouro e diamante como um novo desafio a ser enfrentado. 

De acordo com a ANM, os garimpeiros começaram a circular pelo território em 15 de março deste ano. Contudo, os próprios indígenas já tinham denunciado a presença deles em dezembro de 2023.

Conforme apurou a Agência Brasil, o alvará de pesquisa – documento concedido pela ANM para a realização de trabalhos para definir uma jazida – foi apresentado em 2021 e foi aprovado somente em janeiro deste ano. Com validade até janeiro de 2027 (podendo ser prorrogado por mais quatro anos), o alvará foi concedido à Quiuqui Mineração Ltda, registrada como atuante no ramo de extração de areia e cascalho e atualmente com CNPJ baixado, ou seja, que indica encerramento de atividades. A autorização libera o livre trânsito de garimpeiros por 195 hectares do território. A Terra Indígena Zoró tem 356 mil hectares de área total.  

O documento foi concedido pelo gerente da ANM no estado, Levi Saliés Filho – designado ao cargo em novembro de 2021, pouco antes de o requerimento para obtenção do alvará de pesquisa ser apresentado.

Em 2022, o governo de Jair Bolsonaro modificou a legislação e estendeu a validade de autorizações como o alvará de pesquisa. A alteração foi feita pela Lei nº 14.514, que garantiu concessões de quatro anos aos garimpeiros e mineradoras, prorrogáveis por igual período. A norma alterou diversos aspectos do chamado Código de Mineração.

Operações sem efeito 

Os zoró pangyjej tem, atualmente, uma população de cerca de 700 pessoas, que vivem em 32 aldeias. Lideranças denunciam aumento do grau de tensão com a chegada de garimpeiros e madeireiros que têm invadido áreas de usufruto exclusivo dos indígena. Para o enfrentamento às atividades ilegais e a retirada de invasores, eles afirmam depender de um esquema que considere as terras indígenas adjacentes, como as dos cinta larga e surui paiter.

Um problema adicional, no caso dos zoró, é o aliciamento de membros das aldeias por garimpeiros e madeireiros. 

O coordenador regional da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em Ji-Paraná, Leandro Mangã Arara, confirma que esse é um dos principais obstáculos. 

Segundo ele, com frequência, os zoró conectados com os invasores vazam informações sobre as operações das forças de segurança, como a que a Polícia Federal e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) realizaram em meados de fevereiro deste ano.  Em nota, divulgada à época da operação, a PF afirmou que “durante a incursão foram verificados diversos pontos de desmatamento, com corte raso e queimada, porém, não foram encontradas extração ilegal de madeira ou atividade de garimpo no momento da operação”. 

“A gente sabe que é muito complexa a situação e que não vale a pena só ir lá e voltar e, sim, fazer uma operação que venha de fato a surtir efeito”, afirma Mangã Arara.

O coordenador da Funai destaca ainda o desfalque de pessoal como um problema a ser solucionado. “A gente está com falta de servidor e isso acaba dificultando nosso trabalho. O transporte também tem limitado muito nosso serviço. Mas a gente está aqui para tentar reverter essa situação e tentar resolver, para que nosso trabalho consiga surtir efeitos, principalmente lá na TI Zoró, que é muito grande e tem se intensificado mais ao longo dos anos”, pontua, revelando que tem improvisado soluções como puxar para seu quadro funcional servidores de outros órgãos e instituições públicas. 

“Não é de agora essa situação [no território zoró], é de longa data, só tem se agravado. A gente tem recebido informações deles [os líderes zoró] e tentado acionar as autoridades competentes, para que consiga resolver ou pelo menos minimizar a situação”, emenda.

Com um alvo no corpo

Diversas lideranças zoró que denunciam o que se passa em seu território continuam sob a mira de madeireiros e garimpeiros. Um dos líderes zoró teve o carro incendiado pelos invasores, no dia 29 de março. 

Líder zoró teve o carro incendiado em março deste ano. Foto: Divulgação

Os indígenas relatam que o automóvel parou de funcionar quando o líder fazia o trajeto até a zona urbana para fazer compras. Ele se deslocava à noite e, com a pane, acabou pegando carona depois de abandonar o automóvel a muitos quilômetros de sua aldeia. Pela manhã, recebeu de amigos mensagens com fotos de seu carro destruído pelas chamas. 

No dia seguinte, dois homens armados foram à aldeia procurando pelo líder. 

“A gente precisa de um posicionamento dos órgãos competentes sobre o que está acontecendo ultimamente. A situação está ficando cada vez mais difícil”, afirmou uma das lideranças ouvidas pela reportagem e que pediu para não ser identificada. 

Uma das sugestões dos zoró é a instalação de, pelo menos, duas bases de vigilância permanente na TI, nos moldes das existentes na Terra Indígena Sararé, também situada no estado de Mato Grosso. Uma proposta nesse sentido foi encaminhada à Funai, mas não foi acatada pela autarquia. 

Vítimas da atividade minerária

Somente em 2022, o Brasil registrou 932 conflitos por mineração, segundo o relatório do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente à Mineração, divulgado em dezembro de 2023. Os indígenas estão entre os grupos mais afetados (15,1%). Naquele ano, pelo menos 155.983 indígenas sofreram as consequências dos conflitos gerados pela mineração, estando envolvidos em 141 ocorrências, sendo mais da metade delas (55%) travadas com garimpeiros.  

Outro lado

A Agência Brasil tentou contato com o gerente da ANM no Mato Grosso, Levi Saliès Filho, e com a empresa mineradoraa, mas não teve retorno de nenhum deles. A reportagem também procurou a Funai, o Ministério da Justiça e Segurança Pública e o Ministério dos Povos Indígenas, mas ainda não obteve retorno. 

Teste para HTLV passa a ser indicado para gestantes durante pré-natal

O Ministério da Saúde ampliou o uso de testes para diagnóstico do vírus Linfotrópico de Células T Humanas (HTLV) na rede pública. A tecnologia, a partir de agora, passa a ser utilizada também em gestantes, durante o pré-natal.

A incorporação do teste para gestantes foi recomendada pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec). A proposta é reduzir a transmissão vertical (de mãe para filho) do vírus durante a amamentação.

A comissão considerou que o procedimento, feito por meio de exame de sangue, é eficaz e seguro e que a implementação no Sistema Único de Saúde (SUS) utilizaria recursos já disponíveis, uma vez que os testes já são realizados fora do programa de triagem pré-natal.

Em nota, o ministério informou que as áreas técnicas terão prazo máximo de 180 dias para efetivar a oferta na rede pública.

Notificação compulsória

Desde fevereiro, infecções por HTLV em gestantes, parturientes, puérperas e crianças expostas ao risco de transmissão vertical passaram a ser de notificação compulsória no Brasil. Isso significa que profissionais de saúde de serviços público e privado devem comunicar obrigatoriamente os casos ao ministério.

À época, a pasta informou que a inclusão do HTLV na lista nacional de notificação compulsória de doenças, agravos e eventos de saúde pública permite estimar o número de pessoas com o vírus e a quantidade de insumos necessários, além de qualificar a rede de atenção para atendimento dessa população.

Vírus

O HTLV, da mesma família do HIV, foi descoberto na década de 1980. O vírus infecta principalmente as células do sistema imunológico e possui a capacidade de fazer com que percam sua função de defender o organismo.

A infecção está associada a doenças inflamatórias crônicas como leucemia, linfoma de células T do adulto (ATLL) e mielopatia associada ao HTLV-1 (HAM). Outras manifestações como a dermatite infecciosa, uveíte, síndrome de sicca, ceratite intersticial, síndrome de Sjögren, tireoidite de Hashimoto, miosite e artrite, embora de menor gravidade, também são associadas ao vírus.

O tratamento é direcionado de acordo com a doença relacionada ao HTLV. O paciente deve ser acompanhado nos serviços de saúde e, quando necessário, receber seguimento em serviços especializados para diagnóstico e tratamento precoce de doenças associadas ao vírus.

Números

A estimativa do governo federal é que mais de 800 mil pessoas estejam infectadas pelo HTLV no Brasil. O vírus pode ser transmitido durante relações sexuais sem o uso de preservativo e pelo compartilhamento de seringas e agulhas.

O HTLV também pode ser transmitido verticalmente, de mãe para filho, sobretudo via amamentação e, de forma mais rara, durante a gestação e no momento do parto.

O ministério tem como meta eliminar a transmissão vertical do HTLV até 2030, objetivo alinhado às diretrizes da Organização Mundial de Saúde (OMS), da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas).

Artigo em destaque: mulheres cambojanas enfrentam julgamento social e depressão após o divórcio

Relógio

Esta notícia foi programada
para 20 de abril de 2024
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20 de abril de 2024

 

Agência VOA

“Ele usou violência brutal contra mim. Ele me acertou. Ele agarrou meu pescoço. Eu realmente passei por momentos difíceis quando estava com ele e minha saúde mental estava muito instável”. Quando Thach Chanty, uma mulher de 35 anos da província de Kampong Cham, no sudeste do Camboja, relembra a vida com seu ex-marido, “minhas lágrimas quase caem”. Chanty, que trabalha como confeccionista, agora luta para sustentar seus dois filhos após um casamento que ela descreve como marcado pela negligência e pela violência.

Escapar à brutalidade deixou-a sozinha numa sociedade que continua a julgar as mulheres divorciadas como tendo falhado no seu papel social primário de esposa e mãe. Chanty encontrou consolo no apoio de sua família. “Senti pena dos meus dois filhos depois que me divorciei do meu marido”, disse ela. “Muitas pessoas me julgam por ser divorciada, mas felizmente meus pais e minha irmã estiveram lá para me apoiar”.

Um relatório recente intitulado Separate Ways, lançado no final de 2023 pela pequena organização sem fins lucrativos Klahaan, lança luz sobre as lutas enfrentadas pelas mulheres divorciadas do Camboja. Além de suportarem vergonha e julgamento social significativo, o relatório diz que as mulheres divorciadas são mais propensas a enfrentar problemas financeiros e mentais em comparação com os seus ex-maridos.

O relatório também conclui que pouco mudou desde que um estudo de Novembro de 2015 realizado pelo ministério de estatísticas do Camboja em conjunto com uma agência da ONU concluiu que aproximadamente 20% das mulheres cambojanas enfrentaram violência física e/ou sexual por parte de um parceiro íntimo durante relacionamentos, incluindo o casamento. O relatório também concluiu que o abuso emocional afectava um terço das mulheres, a violência ocorria frequentemente na presença de crianças e poucas vítimas procuravam assistência.

Disparidades de gênero após o divórcio

Realizado online, o estudo Klahaan envolveu 40 participantes do sexo feminino e masculino de Phnom Penh, a capital, e de áreas remotas, incluindo as províncias de Ratanakiri e Kep. Entre as participantes, 22 mulheres relataram ter se divorciaod.

O estudo revelou disparidades significativas de gênero após o divórcio. A maioria dos participantes — 87% — afirmou que as mulheres suportam um fardo mais pesado de vergonha ou estigma após o divórcio, enquanto apenas 1% considerou os homens mais afetados do que os seus parceiros. O relatório também destacou diferenças regionais: 48% dos entrevistados acreditam que as mulheres rurais sofrem efeitos mais pronunciados após o divórcio, em comparação com 8% que consideram que as mulheres urbanas enfrentam estigma e julgamento social.

O Diretor Executivo da Klahaan, Mao Map, disse à VOA Khmer que o novo estudo, que se baseia na metodologia FPAR, visa abordar a controversa escolha do divórcio tanto para mulheres como para homens.

De acordo com Mao Map, a crença predominante no Camboja é que as mulheres só podem casar uma vez na vida – uma noção que influencia a percepção do divórcio. Para apoiar as mulheres, Mao Map está a pressionar o governo a estabelecer políticas que agilizem o processo de divórcio, diminuindo a necessidade de mediação judicial e aumentando a prote ção da saúde das mulheres, eliminando a culpabilização das vítimas pelas autoridades.

Sar Sineth, porta-voz do Ministério dos Assuntos da Mulher do Camboja, enfatizou o compromisso do governo em ajudar mulheres e meninas que sofreram violência, especialmente aquelas que enfrentam o divórcio e lidam com transtorno de estresse pós-traumático. Ela disse que o ministério coordena estreitamente com o governo e o sistema jurídico para fornecer apoio rápido. “Estamos trabalhando duro para agilizar o processo… na prestação de assistência jurídica às vítimas de… divórcio devido à violência crônica”, disse ela. “E com esta disponibilização de advogados, o Conselho Nacional de Acção da Mulher assinou um memorando de entendimento com a Ordem dos Advogados para apoiar as vítimas e prestar serviços atempados.”

Sar Sineth não respondeu quando a VOA Khmer pediu detalhes sobre como as mulheres poderiam aceder a esses serviços.

Infidelidade leva ao divórcio

O estudo revelou que a infidelidade é um fator significativo que influencia as decisões das mulheres de se divorciarem, com 81% dos entrevistados identificando “traições e casos” como uma causa provável para as mulheres escolherem o divórcio. Em contraste, apenas 68% selecionaram a mesma resposta para os homens.

Uma participante disse que embora o marido tenha começado a traí-la logo após o casamento, depois que os filhos nasceram “ele foi longe demais – levou-a para dormir na casa que construímos juntos. No final, decidi vender aquela casa e me divorciar”.

Thach Chanty disse que não se importa mais com a forma como os outros a julgam por se divorciar para escapar da violência e se concentrar nos filhos. “Inicialmente, quando pensei em me divorciar, chorei e às vezes até pensei em acabar com minha vida, mas agora deixei de lado esses pensamentos e estou vivendo minha vida normal, movido pelo desejo de fazer tudo pelos meus filhos”, disse ela.

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Maioria dos brasileiros não tem boas condições de conectividade

Apenas 22% dos brasileiros com mais de 10 anos de idade têm condições satisfatórias de conectividade, apesar de o acesso à internet estar perto da universalização no país. Outros 33% da população estão no nível mais baixo do índice que mede a conectividade significativa no país (de 0 a 2 pontos) e 24% ocupam a faixa de 3 a 4 pontos. 

Os índices são mais baixos entre pretos e pardos, nas classes D e E, nas regiões Norte e Nordeste e nas cidades menores. 

Os dados estão no estudo inédito Conectividade Significativa: propostas para medição e o retrato da população no Brasil, lançado nesta terça-feira (16) pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), braço executivo do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br). O estudo mediu a qualidade e efetividade do acesso da população às tecnologias digitais a partir de variáveis como custo da conexão, uso diversificado de dispositivos, tipo e velocidade de conexão e frequência de uso da internet.  

A partir dessas variáveis, foram estabelecidos diferentes níveis de conectividade significativa, o que resultou numa escala de 0 a 9, na qual o score zero indica ausência de todas as características aferidas, enquanto o nove denota a presença de todas elas. 

Apesar de 84% da população do Brasil já ser usuária de internet, as condições desse acesso são bastante desiguais, na avaliação de Graziela Castello, coordenadora de estudos setoriais no Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br/NIC.br), e responsável pelo levantamento.

“Um jovem, por exemplo, que tem acesso apenas pelo celular, com um pacote de dados que termina antes do final do mês e sem conexão em casa, de saída já tem barreiras muito maiores para o aproveitamento das oportunidades da internet para sua formação e desenvolvimento profissional, quando comparado a outro jovem que consegue se conectar quando e onde quiser e que tem acesso a diferentes tipos de dispositivos, por exemplo”, explica. 

 

Raça, classe social e região

A análise dos dados com base na autodeclaração de cor ou raça dos participantes mostra que, entre os brancos, 32% estão na faixa mais alta de conectividade significativa (score entre 7 e 9). Já entre pretos e pardos, a porcentagem cai para 18%.

A distância também é verificada na comparação entre estratos sociais. Na classe A, a maioria (83%) está na melhor faixa de pontuação e apenas 1%, na pior. Por outro lado, entre as pessoas nas classes D e E, apenas 1% delas está na melhor faixa e a maioria (64%), na pior.

As regiões Norte e Nordeste têm as piores condições de conectividade significativa. No Norte, apenas 11% estão na faixa entre 7 e 9 pontos e 44% estão na faixa de 0 a 2 pontos. No Nordeste, os percentuais são de 10% e 48%, respectivamente. Por outro lado, as regiões Sul e Sudeste têm os melhores índices de usuários na faixa entre 7 e 9 pontos, com 27% e 31%, respectivamente.  

Nas cidades com até 50 mil habitantes, 44% da população encontram-se na pior faixa da escala e nas com mais de 500 mil habitantes, a proporção negativa cai quase pela metade (24%). Em relação à área, enquanto 30% dos habitantes das localidades urbanas estão no grupo de pior faixa (até 2 pontos), 54% dos moradores de zonas rurais encontram-se nessa condição.

Gênero e faixa etária

O estudo mostrou que os entrevistados do sexo masculino apresentaram melhores índices de conectividade significativa, com 28% na faixa entre 7 e 9 pontos e 31% entre 0 e 2 pontos. Já as mulheres tiveram 17% na melhor faixa e 35% na faixa mais baixa. 

Segundo a pesquisa, apesar de indicadores como a prevalência de usuários de internet no Brasil não mostrar distâncias significativas entre homens e mulheres, a análise combinada de indicadores revela condições de conectividade mais precárias para a população feminina, “sublinhando barreiras pré-existentes para sua inclusão produtiva, equiparação em renda, incidência pública e participação na vida social, política e econômica do país”.

No recorte de faixa etária, o levantamento confirma a maior vulnerabilidade à exclusão digital dos idosos: 61% dos brasileiros com 60 anos ou mais apresentam scores mais baixos (até 2 pontos) de conectividade significativa. 

Por outro lado, somente 16% e 24% dos usuários com idades entre 10 e 15 anos e 16 e 24 anos, respectivamente, estão na faixa mais alta (entre 7 e 9 pontos), contrariando a ideia de que os mais jovens apresentariam melhores indicadores no mesmo quesito. Os níveis mais elevados ocorrem justamente entre os grupos etários de maior incidência no mercado de trabalho (entre 25 e 44 anos).

“O estudo questiona a ideia de que os gargalos para inclusão digital seriam sanados por uma possível transição geracional, uma vez que os jovens já seriam super conectados. Quando olhamos para os usuários de internet de maneira geral, isso se confirma, mas ao complexificar a análise e entendermos a conectividade como um todo, fica claro que uma parcela importante desse grupo possui condições precárias de conectividade e vai ingressar no mercado de trabalho com uma desvantagem grande”, alerta Graziela Castello.

Redução da Disparidade

Ao analisar dados de anos anteriores, o estudo identificou uma redução na disparidade entre os grupos que ocupam os extremos da escala de conectividade significativa. Em 2017, 48% da população tinham score entre 0 e 2 e apenas 10% estavam na faixa de 7 a 9 pontos – uma distância de 38 pontos percentuais. Em 2023, a diferença entre eles recuou para 11 pontos percentuais.

Segundo Graziela, essa melhora progressiva, com a redução do grupo populacional com pior nível de conectividade e aumento do grupo com melhor nível, pode ser explicada por fatores como o crescimento da oferta de planos de conexão com maior velocidade pelas operadoras, mudanças nas formas e locais de uso pela população, que se intensificaram durante a pandemia. 

“Até o aumento natural da frequência de uso da internet, que assumiu e assume cada vez mais centralidade em nossas vidas. Mas esse progresso, em parte também por melhorias de infraestrutura, parece ainda em velocidade bastante inferior às reais necessidades da população”, diz. 

 

Estudo

O estudo foi feito a partir do processamento de indicadores da pesquisa TIC Domicílios, para compreensão da qualidade de acesso às tecnologias digitais no país. A TIC Domicílios, realizada pelo Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (Cetic.br), é a mais abrangente pesquisa amostral domiciliar especializada em tecnologias da informação e comunicação feita no país.

A ideia de “conectividade significativa” é um conceito em construção apoiado no entendimento de que a conexão deveria permitir utilização satisfatória de vários serviços na internet, possibilitando o aproveitamento das oportunidades no ambiente online. 

De acordo com Graziela, as políticas públicas para resolver os gargalos desse setor devem ser orientadas pelas quatro dimensões utilizadas para medir a conectividade significativa: custo acessível, acesso a dispositivos, qualidade da conexão e ambientes de uso (frequência e locais de uso). 

“As políticas devem ser orientadas para que todos os cidadãos e cidadãs tenham acesso a conexões intermitentes e de qualidade, em múltiplos lugares, com acesso a dispositivos adequados às necessidades e atividades que se pretenda desenvolver, a um custo compatível com a renda da população. Mas se deve levar em conta também as particulares sociais, econômicas e territoriais, para que as políticas atendam de maneira efetiva às diferentes realidades que compõem nosso país”, avalia a coordenadora. 

Apenas 22% dos brasileiros têm boas condições de conectividade

Apenas 22% dos brasileiros com mais de 10 anos de idade têm condições satisfatórias de conectividade, apesar de o acesso à internet estar perto da universalização no país. Outros 33% da população estão no nível mais baixo do índice que mede a conectividade significativa no país (de 0 a 2 pontos) e 24% ocupam a faixa de 3 a 4 pontos. 

Os índices são mais baixos entre pretos e pardos, nas classes D e E, nas regiões Norte e Nordeste e nas cidades menores. 

Os dados estão no estudo inédito Conectividade Significativa: propostas para medição e o retrato da população no Brasil, lançado nesta terça-feira (16) pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), braço executivo do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br). O estudo mediu a qualidade e efetividade do acesso da população às tecnologias digitais a partir de variáveis como custo da conexão, uso diversificado de dispositivos, tipo e velocidade de conexão e frequência de uso da internet.  

A partir dessas variáveis, foram estabelecidos diferentes níveis de conectividade significativa, o que resultou numa escala de 0 a 9, na qual o score zero indica ausência de todas as características aferidas, enquanto o nove denota a presença de todas elas. 

Apesar de 84% da população do Brasil já ser usuária de internet, as condições desse acesso são bastante desiguais, na avaliação de Graziela Castello, coordenadora de estudos setoriais no Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br/NIC.br), e responsável pelo levantamento.

“Um jovem, por exemplo, que tem acesso apenas pelo celular, com um pacote de dados que termina antes do final do mês e sem conexão em casa, de saída já tem barreiras muito maiores para o aproveitamento das oportunidades da internet para sua formação e desenvolvimento profissional, quando comparado a outro jovem que consegue se conectar quando e onde quiser e que tem acesso a diferentes tipos de dispositivos, por exemplo”, explica. 

 

Raça, classe social e região

A análise dos dados com base na autodeclaração de cor ou raça dos participantes mostra que, entre os brancos, 32% estão na faixa mais alta de conectividade significativa (score entre 7 e 9). Já entre pretos e pardos, a porcentagem cai para 18%.

A distância também é verificada na comparação entre estratos sociais. Na classe A, a maioria (83%) está na melhor faixa de pontuação e apenas 1%, na pior. Por outro lado, entre as pessoas nas classes D e E, apenas 1% delas está na melhor faixa e a maioria (64%), na pior.

As regiões Norte e Nordeste têm as piores condições de conectividade significativa. No Norte, apenas 11% estão na faixa entre 7 e 9 pontos e 44% estão na faixa de 0 a 2 pontos. No Nordeste, os percentuais são de 10% e 48%, respectivamente. Por outro lado, as regiões Sul e Sudeste têm os melhores índices de usuários na faixa entre 7 e 9 pontos, com 27% e 31%, respectivamente.  

Nas cidades com até 50 mil habitantes, 44% da população encontram-se na pior faixa da escala e nas com mais de 500 mil habitantes, a proporção negativa cai quase pela metade (24%). Em relação à área, enquanto 30% dos habitantes das localidades urbanas estão no grupo de pior faixa (até 2 pontos), 54% dos moradores de zonas rurais encontram-se nessa condição.

Gênero e faixa etária

O estudo mostrou que os entrevistados do sexo masculino apresentaram melhores índices de conectividade significativa, com 28% na faixa entre 7 e 9 pontos e 31% entre 0 e 2 pontos. Já as mulheres tiveram 17% na melhor faixa e 35% na faixa mais baixa. 

Segundo a pesquisa, apesar de indicadores como a prevalência de usuários de internet no Brasil não mostrar distâncias significativas entre homens e mulheres, a análise combinada de indicadores revela condições de conectividade mais precárias para a população feminina, “sublinhando barreiras pré-existentes para sua inclusão produtiva, equiparação em renda, incidência pública e participação na vida social, política e econômica do país”.

No recorte de faixa etária, o levantamento confirma a maior vulnerabilidade à exclusão digital dos idosos: 61% dos brasileiros com 60 anos ou mais apresentam scores mais baixos (até 2 pontos) de conectividade significativa. 

Por outro lado, somente 16% e 24% dos usuários com idades entre 10 e 15 anos e 16 e 24 anos, respectivamente, estão na faixa mais alta (entre 7 e 9 pontos), contrariando a ideia de que os mais jovens apresentariam melhores indicadores no mesmo quesito. Os níveis mais elevados ocorrem justamente entre os grupos etários de maior incidência no mercado de trabalho (entre 25 e 44 anos).

“O estudo questiona a ideia de que os gargalos para inclusão digital seriam sanados por uma possível transição geracional, uma vez que os jovens já seriam super conectados. Quando olhamos para os usuários de internet de maneira geral, isso se confirma, mas ao complexificar a análise e entendermos a conectividade como um todo, fica claro que uma parcela importante desse grupo possui condições precárias de conectividade e vai ingressar no mercado de trabalho com uma desvantagem grande”, alerta Graziela Castello.

Redução da Disparidade

Ao analisar dados de anos anteriores, o estudo identificou uma redução na disparidade entre os grupos que ocupam os extremos da escala de conectividade significativa. Em 2017, 48% da população tinham score entre 0 e 2 e apenas 10% estavam na faixa de 7 a 9 pontos – uma distância de 38 pontos percentuais. Em 2023, a diferença entre eles recuou para 11 pontos percentuais.

Segundo Graziela, essa melhora progressiva, com a redução do grupo populacional com pior nível de conectividade e aumento do grupo com melhor nível, pode ser explicada por fatores como o crescimento da oferta de planos de conexão com maior velocidade pelas operadoras, mudanças nas formas e locais de uso pela população, que se intensificaram durante a pandemia. 

“Até o aumento natural da frequência de uso da internet, que assumiu e assume cada vez mais centralidade em nossas vidas. Mas esse progresso, em parte também por melhorias de infraestrutura, parece ainda em velocidade bastante inferior às reais necessidades da população”, diz. 

 

Estudo

O estudo foi feito a partir do processamento de indicadores da pesquisa TIC Domicílios, para compreensão da qualidade de acesso às tecnologias digitais no país. A TIC Domicílios, realizada pelo Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (Cetic.br), é a mais abrangente pesquisa amostral domiciliar especializada em tecnologias da informação e comunicação feita no país.

A ideia de “conectividade significativa” é um conceito em construção apoiado no entendimento de que a conexão deveria permitir utilização satisfatória de vários serviços na internet, possibilitando o aproveitamento das oportunidades no ambiente online. 

De acordo com Graziela, as políticas públicas para resolver os gargalos desse setor devem ser orientadas pelas quatro dimensões utilizadas para medir a conectividade significativa: custo acessível, acesso a dispositivos, qualidade da conexão e ambientes de uso (frequência e locais de uso). 

“As políticas devem ser orientadas para que todos os cidadãos e cidadãs tenham acesso a conexões intermitentes e de qualidade, em múltiplos lugares, com acesso a dispositivos adequados às necessidades e atividades que se pretenda desenvolver, a um custo compatível com a renda da população. Mas se deve levar em conta também as particulares sociais, econômicas e territoriais, para que as políticas atendam de maneira efetiva às diferentes realidades que compõem nosso país”, avalia a coordenadora. 

“Vamos continuar existindo”, afirma demógrafa sobre futuro indígena

O número de brasileiros que se identificam como indígenas cresceu quase seis vezes nos últimos 30 anos. Em 1991, eles eram pouco mais de 294 mil, conforme revelou o Censo Demográfico feito à época. Em 2022, chegavam a 1,694 milhão, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O instituto atribui parte considerável deste aumento a mudanças na forma como o levantamento é feito a cada dez anos. Inovações que vêm sendo implementadas desde 1991, quando foi introduzida a opção “indígena” na pergunta sobre raça e cor do entrevistado. Para muitos pesquisadores e instituições governamentais e não governamentais, 1991 é como um marco da presença do indígena no Censo Demográfico, pois é quando passam a ser recenseados sem serem alocados em outras categorias, como, por exemplo, os pardos. O próprio IBGE, contudo, também destaca que “alguns povos indígenas vêm revelando aumento [populacional] significativo em função de altas taxas de fecundidade”.

“A principal conclusão é que vamos continuar existindo”, sentencia a demógrafa Rosa Colman. Graduada em geografia e doutora em demografia, a professora da Faculdade Intercultural Indígena da Universidade da Grande Dourados (UFGD) é a primeira e, possivelmente, a única especialista em estudos populacionais a se autodeclarar indígena no Brasil. Hipótese confirmada pela Associação Brasileira de Estudos Populacionais (Abep).

“Acho que, em breve, devem aparecer outros por aí”, aposta Rosa, para quem as políticas de cotas “têm motivado as pessoas, encorajando-as a se autodeclarem indígenas”, contribuindo com as estratégias de autoafirmação dos povos originários.

Nascida em Sanga Puitã, distrito de Ponta Porã (MS), na fronteira com o Paraguai, Rosa, que é da etnia aché (também conhecida pelo termo pejorativo guayaki), já foi alvo da discriminação e do mesmo descaso que ainda hoje levam muitos indígenas a negarem suas identidades. “O preconceito era muito forte e eu, na infância, fui muito chamada de bugrinha e ridicularizada por falar mal o português”, relembra a professora que, nos primeiros anos de vida, só se comunicava com os pais e com pessoas próximas em guarani. Hoje, ela se revela otimista. “Apesar de tudo, a situação vem melhorando […] e as pessoas querem se reafirmar como povo, como um grupo étnico.”

Leia, a seguir, trechos da entrevista que Rosa Colman concedeu para a série especial sobre o futuro dos povos indígenas que a Agência Brasil publica a partir desta terça-feira (16), por ocasião do Dia dos Povos Indígenas, lembrado na sexta-feira (19). Nos próximos dias, a Agência Brasil publicará as entrevistas com a escritora Eliane Potiguara, o filósofo Daniel Munduruku e a ministra Sonia Guajajara.

Agência Brasil: Desde o censo demográfico de 1991, o número de pessoas que se declaram indígenas vem aumentando. Para a senhora, o que explica esse aumento?
Rosa Colman: Além do crescimento natural da população indígena, houve uma melhora na metodologia de coleta dos dados sociodemográficos. Isso é algo bem evidente.

Agência Brasil: E o que esse aumento sugere sobre o futuro dos povos indígenas?
Rosa: Prevejo que a presença indígena nos centros urbanos, já bastante perceptível, vai continuar aumentando. Principalmente pela busca de estudo e trabalho. Da mesma forma, a questão da mobilidade, ou melhor, da múltipla localidade, de pessoas que vivem entre a cidade e a aldeia. A autoafirmação também tende a continuar aumentando conforme o contexto melhora. Acho que a principal conclusão é que vamos continuar existindo.

Agência Brasil: Por quais motivos mais pessoas passaram a se autodeclarar indígenas nas últimas três décadas e por que a senhora acredita que a autoafirmação tende a continuar aumentando?
Rosa: Apesar de tudo, a situação indígena vem melhorando em comparação a algumas décadas. Isso aparece nos dados e se torna mais forte a partir dos anos 2000. No geral, houve alguma melhora nas condições de saúde, de alimentação. As políticas de cotas, por exemplo, têm motivado as pessoas, encorajando-as a se autodeclararem indígenas. Aqui mesmo, na UFGD, só considerando indivíduos kaiowá e guarani, identificamos em torno de 50 pessoas cursando a pós-graduação. Isto já é um fenômeno. Embora ainda haja muito medo e preconceitos, principalmente em contextos de disputas por terras, no qual muitos preferem se esconder.

Agência Brasil: Na sua tese de doutorado, de 2015, a senhora já aponta que a alta taxa de crescimento populacional registrada entre os guarani, nos 70 anos anteriores, é resultado de uma “política populacional étnica voltada para garantir a sobrevivência física e cultural”. Que estratégia é ou era essa?
Rosa: São políticas mais internas, de crescimento físico e cultural. As pessoas querem se reafirmar como povo, como um grupo étnico. Então, eles falam que também é importante ter filhos para continuarem existindo e resistindo.

Agência Brasil: Essa percepção de que os guarani e, eventualmente, outros povos, compreendem que ter filhos é algo importante para a sobrevivência cultural de seu povo é objeto de estudos acadêmicos?
Rosa: Pesquisa acadêmica eu desconheço, mas é o que percebemos a partir das nossas experiências no convívio e contato com os guarani, que reclamam quando alguém, ou mesmo o Estado, sugere que, sendo pobres, eles não deveriam ter tantos filhos. A gente escuta muitos relatos desse tipo. Inclusive de jovens estudantes indígenas que se sentem incomodados. Em termos acadêmicos, essa percepção é reforçada pela taxa de fecundidade indígena, maior que as registradas entre não indígenas. No Censo 2010, enquanto a taxa de fecundidade entre a população não indígena era de 1,5 filho por mulher, entre indígenas chegava a 3,8. O que ajuda a explicar, em parte, o crescimento populacional.

Agência Brasil: Na sua tese, a senhora também afirmou que o país não estava preparado para responder adequadamente a esse aumento populacional. De lá para cá, isso mudou?
Rosa: Ainda há muitas demandas por uma educação e uma saúde indígena de mais qualidade. Além disso, a falta de estrutura, de condições básicas, ainda motiva muitas reclamações – e muitas dessas queixas estão relacionadas a casos de preconceito e discriminação nos serviços públicos.

Agência Brasil: Como o IBGE é responsável por realizar o Censo Demográfico, consultamos o instituto para saber se há, entre os colaboradores, algum geógrafo ou demógrafo indígena e não há. A Abep também nos informou que desconhece outro profissional autodeclarado indígena além da senhora. A senhora conhece algum outro indígena que atue nesta área?
Rosa: Não. Indígena, só uma, mas ela é do México. Estudou na Unicamp, mas atua no México. E há um colega, da etnia guarani, que atua bastante nesse campo, mas com estatísticas e que vem de outra área de formação.

Agência Brasil: Como a senhora mesmo lembrou, há cada vez mais estudantes indígenas nos cursos de graduação e pós-graduação e esse campo em que a senhora atua é tão caro para as comunidades indígenas e sempre presente nos debates acerca dos problemas que os povos originários enfrentam. Por que a senhora escolheu primeiro a geografia e, depois, decidiu se especializar em demografia?
Rosa: Eu gostava de geografia. Acho que porque tive professores muito carismáticos que me incentivaram a fazer esse curso. Algumas colegas chegaram a sugerir que eu fizesse letras, já que falo guarani, mas, na época, só havia turmas diurnas e eu acabei optando por geografia também porque havia a opção de estudar à noite. Já no mestrado, conheci a professora [e ex-presidenta da Funai] Marta [Maria do Amaral] Azevedo, minha orientadora, e a convite dela fui fazer demografia na Universidade Estadual de Campinas [Unicamp]. Acho que há poucos indígenas atuando nessa área porque, até recentemente, só havia cursos de demografia nos grandes centros urbanos; em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais… Mas acho que agora já há estudantes indígenas na graduação, de repente, na pós-graduação, e, futuramente, devem aparecer outros profissionais indígenas.

Agência Brasil: Para finalizar, levando em conta a diversidade étnica e cultural das mais de 300 etnias que coabitam o território brasileiro, como a senhora imagina o futuro das comunidades indígenas?
Rosa: Acho que vamos seguir muito mais diversos e firmes. Muitos estarão morando em cidades, mas muitos seguirão vivendo em terras indígenas. Acredito que vamos conseguir demarcar mais terras e, assim, proporcionar segurança territorial a essas comunidades. E acho que, qualquer que seja o contexto, teremos muito mais acesso e domínio das inovações tecnológicas, pois, hoje, já observamos muitos jovens indígenas que as dominam.

“Vamos continuar existindo”, diz demógrafa sobre futuro indígena

O número de brasileiros que se identificam como indígenas cresceu quase seis vezes nos últimos 30 anos. Em 1991, eles eram pouco mais de 294 mil, conforme revelou o Censo Demográfico feito à época. Em 2022, chegavam a 1,694 milhão, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O instituto atribui parte considerável deste aumento a mudanças na forma como o levantamento é feito a cada dez anos. Inovações que vêm sendo implementadas desde 1991, quando foi introduzida a opção “indígena” na pergunta sobre raça e cor do entrevistado. Para muitos pesquisadores e instituições governamentais e não governamentais, 1991 é como um marco da presença do indígena no Censo Demográfico, pois é quando passam a ser recenseados sem serem alocados em outras categorias, como, por exemplo, os pardos. O próprio IBGE, contudo, também destaca que “alguns povos indígenas vêm revelando aumento [populacional] significativo em função de altas taxas de fecundidade”.

“A principal conclusão é que vamos continuar existindo”, sentencia a demógrafa Rosa Colman. Graduada em geografia e doutora em demografia, a professora da Faculdade Intercultural Indígena da Universidade da Grande Dourados (UFGD) é a primeira e, possivelmente, a única especialista em estudos populacionais a se autodeclarar indígena no Brasil. Hipótese confirmada pela Associação Brasileira de Estudos Populacionais (Abep).

“Acho que, em breve, devem aparecer outros por aí”, aposta Rosa, para quem as políticas de cotas “têm motivado as pessoas, encorajando-as a se autodeclarem indígenas”, contribuindo com as estratégias de autoafirmação dos povos originários.

Nascida em Sanga Puitã, distrito de Ponta Porã (MS), na fronteira com o Paraguai, Rosa, que é da etnia aché (também conhecida pelo termo pejorativo guayaki), já foi alvo da discriminação e do mesmo descaso que ainda hoje levam muitos indígenas a negarem suas identidades. “O preconceito era muito forte e eu, na infância, fui muito chamada de bugrinha e ridicularizada por falar mal o português”, relembra a professora que, nos primeiros anos de vida, só se comunicava com os pais e com pessoas próximas em guarani. Hoje, ela se revela otimista. “Apesar de tudo, a situação vem melhorando […] e as pessoas querem se reafirmar como povo, como um grupo étnico.”

Leia, a seguir, trechos da entrevista que Rosa Colman concedeu para a série especial sobre o futuro dos povos indígenas que a Agência Brasil publica a partir desta terça-feira (16), por ocasião do Dia dos Povos Indígenas, lembrado na sexta-feira (19). Nos próximos dias, a Agência Brasil publicará as entrevistas com a escritora Eliane Potiguara, o filósofo Daniel Munduruku e a ministra Sonia Guajajara.

Agência Brasil: Desde o censo demográfico de 1991, o número de pessoas que se declaram indígenas vem aumentando. Para a senhora, o que explica esse aumento?
Rosa Colman: Além do crescimento natural da população indígena, houve uma melhora na metodologia de coleta dos dados sociodemográficos. Isso é algo bem evidente.

Agência Brasil: E o que esse aumento sugere sobre o futuro dos povos indígenas?
Rosa: Prevejo que a presença indígena nos centros urbanos, já bastante perceptível, vai continuar aumentando. Principalmente pela busca de estudo e trabalho. Da mesma forma, a questão da mobilidade, ou melhor, da múltipla localidade, de pessoas que vivem entre a cidade e a aldeia. A autoafirmação também tende a continuar aumentando conforme o contexto melhora. Acho que a principal conclusão é que vamos continuar existindo.

Agência Brasil: Por quais motivos mais pessoas passaram a se autodeclarar indígenas nas últimas três décadas e por que a senhora acredita que a autoafirmação tende a continuar aumentando?
Rosa: Apesar de tudo, a situação indígena vem melhorando em comparação a algumas décadas. Isso aparece nos dados e se torna mais forte a partir dos anos 2000. No geral, houve alguma melhora nas condições de saúde, de alimentação. As políticas de cotas, por exemplo, têm motivado as pessoas, encorajando-as a se autodeclararem indígenas. Aqui mesmo, na UFGD, só considerando indivíduos kaiowá e guarani, identificamos em torno de 50 pessoas cursando a pós-graduação. Isto já é um fenômeno. Embora ainda haja muito medo e preconceitos, principalmente em contextos de disputas por terras, no qual muitos preferem se esconder.

Agência Brasil: Na sua tese de doutorado, de 2015, a senhora já aponta que a alta taxa de crescimento populacional registrada entre os guarani, nos 70 anos anteriores, é resultado de uma “política populacional étnica voltada para garantir a sobrevivência física e cultural”. Que estratégia é ou era essa?
Rosa: São políticas mais internas, de crescimento físico e cultural. As pessoas querem se reafirmar como povo, como um grupo étnico. Então, eles falam que também é importante ter filhos para continuarem existindo e resistindo.

Agência Brasil: Essa percepção de que os guarani e, eventualmente, outros povos, compreendem que ter filhos é algo importante para a sobrevivência cultural de seu povo é objeto de estudos acadêmicos?
Rosa: Pesquisa acadêmica eu desconheço, mas é o que percebemos a partir das nossas experiências no convívio e contato com os guarani, que reclamam quando alguém, ou mesmo o Estado, sugere que, sendo pobres, eles não deveriam ter tantos filhos. A gente escuta muitos relatos desse tipo. Inclusive de jovens estudantes indígenas que se sentem incomodados. Em termos acadêmicos, essa percepção é reforçada pela taxa de fecundidade indígena, maior que as registradas entre não indígenas. No Censo 2010, enquanto a taxa de fecundidade entre a população não indígena era de 1,5 filho por mulher, entre indígenas chegava a 3,8. O que ajuda a explicar, em parte, o crescimento populacional.

Agência Brasil: Na sua tese, a senhora também afirmou que o país não estava preparado para responder adequadamente a esse aumento populacional. De lá para cá, isso mudou?
Rosa: Ainda há muitas demandas por uma educação e uma saúde indígena de mais qualidade. Além disso, a falta de estrutura, de condições básicas, ainda motiva muitas reclamações – e muitas dessas queixas estão relacionadas a casos de preconceito e discriminação nos serviços públicos.

Agência Brasil: Como o IBGE é responsável por realizar o Censo Demográfico, consultamos o instituto para saber se há, entre os colaboradores, algum geógrafo ou demógrafo indígena e não há. A Abep também nos informou que desconhece outro profissional autodeclarado indígena além da senhora. A senhora conhece algum outro indígena que atue nesta área?
Rosa: Não. Indígena, só uma, mas ela é do México. Estudou na Unicamp, mas atua no México. E há um colega, da etnia guarani, que atua bastante nesse campo, mas com estatísticas e que vem de outra área de formação.

Agência Brasil: Como a senhora mesmo lembrou, há cada vez mais estudantes indígenas nos cursos de graduação e pós-graduação e esse campo em que a senhora atua é tão caro para as comunidades indígenas e sempre presente nos debates acerca dos problemas que os povos originários enfrentam. Por que a senhora escolheu primeiro a geografia e, depois, decidiu se especializar em demografia?
Rosa: Eu gostava de geografia. Acho que porque tive professores muito carismáticos que me incentivaram a fazer esse curso. Algumas colegas chegaram a sugerir que eu fizesse letras, já que falo guarani, mas, na época, só havia turmas diurnas e eu acabei optando por geografia também porque havia a opção de estudar à noite. Já no mestrado, conheci a professora [e ex-presidenta da Funai] Marta [Maria do Amaral] Azevedo, minha orientadora, e a convite dela fui fazer demografia na Universidade Estadual de Campinas [Unicamp]. Acho que há poucos indígenas atuando nessa área porque, até recentemente, só havia cursos de demografia nos grandes centros urbanos; em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais… Mas acho que agora já há estudantes indígenas na graduação, de repente, na pós-graduação, e, futuramente, devem aparecer outros profissionais indígenas.

Agência Brasil: Para finalizar, levando em conta a diversidade étnica e cultural das mais de 300 etnias que coabitam o território brasileiro, como a senhora imagina o futuro das comunidades indígenas?
Rosa: Acho que vamos seguir muito mais diversos e firmes. Muitos estarão morando em cidades, mas muitos seguirão vivendo em terras indígenas. Acredito que vamos conseguir demarcar mais terras e, assim, proporcionar segurança territorial a essas comunidades. E acho que, qualquer que seja o contexto, teremos muito mais acesso e domínio das inovações tecnológicas, pois, hoje, já observamos muitos jovens indígenas que as dominam.

Governo anuncia plano para assentar 295 mil famílias até 2026

O governo federal anunciou nesta segunda-feira (15) uma nova estratégia para a destinação de terras para a reforma agrária no país. O programa Terra da Gente, regulamentado em decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante cerimônia no Palácio do Planalto, sistematiza alternativas legais de obtenção de terras para a reforma agrária, além das formas tradicionais, como a desapropriação de áreas improdutivas e a regularização de terras públicas.

Entre as novidades, está a adjudicação (transferência de propriedade) de terras oriundas de grandes devedores da União e a possibilidade de negociação com bancos, empresas públicas e governos estaduais para a transferência de imóveis rurais também em troca do abatimento de dívidas ou permutas (encontro de contas).

“É uma forma nova da gente enfrentar um velho problema. Eu pedi ao [ministro] Paulo Teixeira que fizesse um levantamento, com a ajuda dos governadores, das secretarias que cuidam das terras em cada estado, com o pessoal do Incra nos estados, para gente ter noção de todas as terras que podiam ser disponibilizadas para assentamento nesse país”, afirmou o presidente Lula, durante o evento de anúncio do programa. Segundo ele, a ideia é agilizar a reforma agrária também por meios não conflituosos.

“Isso não invalida a continuidade da luta pela reforma agrária, mas o que nós queremos fazer, aos olhos do Brasil, o que a gente pode utilizar sem muita briga. Isso sem querer pedir para ninguém deixar de brigar”, acrescentou o presidente, que lembrou o histórico de concentração fundiária no Brasil desde as capitanias hereditárias, ainda no período colonial.

Segundo números do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), no Brasil, 89 mil imóveis rurais possuem mais de 1.000 hectares e ocupam 60,63% do território rural do país. Já 2,5 milhões de imóveis, com até dez hectares, ocupam 1,5% do território rural, enquanto 5 milhões de imóveis rurais com até 50 hectares representam uma área de 9% do território rural nacional.

Brasília (DF) – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva no lançamento do Programa Terra da Gente. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Metas do programa

A meta anunciada, entre 2023 e 2026, é incorporar pelo menos 295 mil novas famílias ao Programa Nacional de Reforma Agrária, incluindo todas as modalidades de obtenção de terra existentes.

Brasília (DF) – O ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, participa do lançamento do Programa Terra da Gente. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

“Isso é um piso, um mínimo. A nossa dinâmica de arrecadação está aberta. Vamos receber dos estados, terras de grandes devedores, orçamento público, isso pode ampliar as metas”, afirmou o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira.

Pelas contas do governo, serão 73,2 mil famílias assentadas este ano, 81 mil no ano que vem e 90,5 mil em 2026, último ano da atual gestão. A esses números somam-se as 50,9 mil famílias incluídas na reforma agrária ao longo do ano passado. Desse total assentado em 2023, quase metade (24,7 mil) foi de famílias que receberam lotes vazios de assentamentos já existentes.

O Incra também contabiliza no programa as famílias assentadas em áreas criadas por órgãos de terras estaduais e as que vivem em unidades de conservação mantidas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que no ano passado somaram 15,1 mil. Já a criação de novos assentamentos e titulação de áreas quilombolas somaram 10,9 mil em 2023. A marca, segundo o governo, é 60% maior do que a registrada entre 2017 e 2022, durantes os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro.      

Desapropriação e compra

Para a destinação de terras por meio da desapropriação ou compra direta, o Incra tem um orçamento, em 2024, de R$ 520 milhões, sendo R$ 383 milhões para trabalhadores sem terra e outros R$ 183 milhões para a titulação de terras quilombolas. O foco desses recursos, segundo o presidente do Incra, César Aldrighi, será para obtenção de áreas em conflito.

“Os conflitos mais agudos foram identificados, a Ouvidoria do Incra e do MDA foram até esses acampamentos, havia interesse dos proprietários em vender as áreas. Os R$ 520 milhões estão sendo utilizados, já gastamos boa parte desse recurso empenhando [reservando] áreas para a segunda prateleira, que chamamos de terras em pacificação de conflitos. O orçamento deste ano, há que se dizer que o passado a gente não tinha nada para a obtenção de terras, então R$ 520 milhões é algo significativo”, afirmou.

Desde o ano passado, o Incra criou 37 novos assentamentos, para 1,4 mil famílias. São processos que estavam paralisados de gestões anteriores e foram retomados. A autarquia fundiária também retomou, em 2023, o cadastro de famílias acampadas em situação de vulnerabilidade social que havia sido descontinuado no governo anterior. Segundo estimativas do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), há cerca de 100 mil famílias acampadas à beira de estradas e em áreas ocupadas e ainda não destinadas à reforma agrária. Desde 2017, segundo o governo, foram registrados 780 conflitos por terra no país.

Em relação às áreas de empresas públicas e bancos, o Incra assinou termos de confidencialidade com as instituições financeiras para analisar terras rurais em estoque e verificar a possibilidade de aquisição por compra ou na forma de abatimento de dívidas com a União. O decreto que regulamenta o Terra da Gente deve ser publicado em edição regular do Diário Oficial da União desta terça-feira (16).

Repercussão

Representantes de movimentos populares de luta pela terra presentes ao Palácio do Planalto ressaltaram a importância de resolver os conflitos agrários no país, o que só pode ocorrer com a distribuição de terras.

“A paz no campo tem nome: reforma agrária”, afirmou Ceres Hadich, que classificou o anúncio do programa como uma retomada dessa política pública, mas que precisa ser com orçamento garantido. “Mais do que um bom programa e planejamento, é fundamental que tenhamos orçamento, estruturas do Estado e servidores fortalecidos, valorizados e motivados a cumprir essa grandiosa missão de fortalecimento da democracia. O anúncio da retomada massiva da criação de projetos de assentamento no Brasil, nesse momento, vem ao encontro às duas grandes prioridades do governo Lula e o cumprimento da função social da terra, que são o enfrentamento à fome e os cuidados com o meio ambiente”, acrescentou.

Os movimentos sociais também pediram mais infraestrutura para as comunidades rurais como acesso a água, educação e saúde, além de estímulo à produção sustentável.

“Não só basta dizer que o acesso à terra é suficiente. é necessário avançar ainda mais para que possamos promover o combate à fome. Temos que impulsionar massivamente a transição para a agroecologia, descarbonizando os sistemas alimentares”, disse Anderson Gomes, do Movimento de Pequenos Agricultores (MPA).

Escritora presa no Vietnã será reconhecida com prêmio internacional

Logotipo sem fins lucrativos da PEN America

16 de abril de 2024

 

Uma escritora e jornalista vietnamita que cumpre uma pena de nove anos de prisão pelo seu trabalho foi reconhecida com um prémio literário internacional.

O grupo de direitos humanos PEN America anunciou que Pham Doan Trang receberá o prêmio PEN/Barbey Freedom to Write Award de 2024. A homenagem é concedida anualmente a um escritor preso por seu trabalho.

Trang é conhecida no Vietnã por seu blog e livros sobre liberdades civis. Ela criou um blog em 2006 como forma de criar espaço para debate independente. Desde então, o escritor lançou revistas online, abriu uma editora e escreveu livros sobre política, direitos humanos e o sistema jurídico vietnamita.

Seus livros incluem Resistência Não-Violenta, Política para as Pessoas Comuns, Um Manual para Combatentes pela Liberdade e Política de um Estado Policial.

A escrita chamou a atenção de Trang para as autoridades vietnamitas. Os seus livros foram confiscados e as pessoas que compram ou possuem cópias correm o risco de serem acusadas de espalhar propaganda anti-Estado, de acordo com o PEN.

Em 2020, o Vietname prendeu Trang sob acusações de espalhar “propaganda anti-Estado” e, num julgamento de um dia em 2021, um tribunal condenou-a a nove anos de prisão.

A escritora está cumprindo pena em uma prisão remota, a 1.400 quilômetros de sua cidade natal, o que significa que a família só pode visitá-la ocasionalmente.

“Trang galvanizou o povo vietnamita através dos seus escritos sobre democracia, direitos humanos, degradação ambiental e empoderamento das mulheres. O governo vietnamita perseguiu e prendeu Trang num esforço para acalmar a sua voz”, disse Suzanne Nossel, chefe do PEN America, num comunicado.

“Ela sacrificou sua saúde e liberdade na busca por justiça. Apesar da repressão do governo à dissidência e ao activismo, as suas palavras poderosas continuam a inspirar pessoas em todo o Vietname e em todo o mundo.”

A PEN America disse que a prisão de Trang contradiz o direito internacional dos direitos humanos e viola o seu direito à liberdade de expressão.

Nem o Ministério dos Negócios Estrangeiros do Vietname nem a sua embaixada em Washington responderam aos pedidos de comentários da VOA.

Trang é um dos 19 jornalistas presos por seu trabalho no Vietnã, o que faz do país um dos principais carcereiros de trabalhadores da mídia, segundo o Comitê para a Proteção dos Jornalistas.

Um dos advogados de Trang receberá o prêmio em nome do escritor em uma gala em Nova York, em maio, junto com um amigo do escritor, afirma o PEN.

A advogada, Dang Dinh Manh, disse que Trang “merece completamente todas as honras” que reconhecem o seu trabalho e o sacrifício que fez para se manifestar.

“Como advogada de defesa de Trang, compreendo o seu compromisso em lutar pelos valores universais, juntamente com o preço muito elevado que ela teve de fazer compensações: a sua saúde, a sua juventude, a sua liberdade”, disse Manh à VOA.

a advogada, que fugiu do Vietnã para os EUA por causa de assédio relacionado ao seu trabalho jurídico, acrescentou: “Ela merece todas as honras”.

O prémio envia uma mensagem ao governo vietnamita de que “a supressão da liberdade das pessoas não é bem-vinda e é até condenada em todo o lado”, disse Manh.

O amigo de Trang, Quynh-Vi Tran, também viajará a Nova York para a cerimônia de premiação.

“A PEN America concedeu esses prêmios a pessoas que eles acreditam serem escritores que inspiram e que usam seus escritos para inspirar outros a fazerem coisas melhores na sociedade”, disse Tran, que mora em Taiwan, à VOA.

Tran, que é cofundador e diretor executivo da Legal Initiatives for Vietnam, agradeceu ao PEN por “defender a liberdade de Trang” e aumentar a conscientização sobre os desafios à liberdade de expressão no Vietnã.

“O Vietname deve compreender e seguir os padrões legais dos direitos humanos no mundo. Dado que o Vietname é membro do Conselho dos Direitos Humanos, não pode dizer que tem uma definição de direitos humanos diferente da do resto do mundo. Certo?” Tran disse.

A PEN America apelou à libertação de Trang da prisão e à revogação da lei ao abrigo da qual Trang está presa, entre outras leis que infringem a liberdade de expressão.

Os vencedores anteriores do PEN/Barbey Freedom to Write incluem o ativista iraniano Narges Mohammadi e o jornalista freelance ucraniano Vladyslav Yesypenko.

Fonte