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No Senado, chanceler diz que Israel viola direito internacional

O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, afirmou no Senado nesta quinta-feira (14) que Israel viola o direito humanitário internacional ao não permitir a entrada de suprimentos e alimentos na Faixa de Gaza.

“Sem sombra de dúvida, o bloqueio à ajuda humanitária no contexto atual de fome e falta de insumos médicos em Gaza consiste em uma violação do direito internacional”, afirmou o chanceler brasileiro, acrescentando que “o governo do primeiro-ministro de Israel [Benjamin Netanyahu] continua dificultando sistematicamente a entrada de caminhões com ajuda humanitária nas fronteiras com Gaza”. 

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), crianças estão morrendo de fome no norte do enclave

Mauro Vieira foi ao Senado a convite do presidente da Comissão de Relações Exteriores, senador Renan Calheiros (MDB-AL), para falar sobre a relação entre Brasil e Israel, abaladas após as declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que o governo de Tel Aviv pratica um genocídio contra o povo palestino. As relações pioraram depois que Lula comparou às ações em Gaza aquelas de Hitler na 2ª Guerra Mundial.

Na fala inicial à comissão, o ministro disse que estima-se que mais de 15 mil toneladas de suprimentos de ajuda humanitária internacional aguardam aprovação do governo de Israel para entrar em Gaza, sendo mais da metade dessa carga de alimentos.

“O que podemos fazer, e continuaremos a fazer na nossa linha atual, é denunciar a decisão unilateral israelense de bloquear recorrentemente a entrada de ajuda humanitária e seguir trabalhando com os países vizinhos e os organismos internacionais em favor da abertura de corredores humanitários”, disse.

Mauro Vieira confirmou que parte da ajuda humanitária enviada pelo Brasil para Gaza, composta 30 por purificadores de água, foi retida pelas forças israelenses. Ele disse que não sabe o motivo da proibição da entrada desses purificadores. “Há indicações informais de que [o motivo] decorreria do fato de que os purificadores de água sejam movidos à energia solar e contarem com kits voltaicos”.

Fala de Lula

O ministro Mauro Vieira também comentou a fala do presidente Lula, que teve ampla repercussão no Brasil, quando ele comparou, em viagem à Etiópia, a ação militar em Gaza ao Holocausto contra os judeus praticado pela Alemanha nazista. Segundo ele, a fala foi em um contexto de destruição de Gaza, com seus mais de 31 mil mortos, sendo 70% de mulheres e crianças, e de violações do direito internacional.

“É nesse contexto de profunda indignação que se inserem as declarações do presidente Lula. São palavras que expressam a sinceridade de quem busca preservar e valorizar o valor supremo que é a vida humana”, afirmou.

Mauro Vieira ainda lamentou que a diplomacia de Israel “tenha se dirigido de forma desrespeitosa a um chefe de Estado de um país amigo” e que as autoridades de Tel Aviv foram informados que o Brasil “reagirá com diplomacia sempre, mas com toda a firmeza a qualquer ataque que receber, agora e sempre”, acrescentando que está “seguro de que as relações do Brasil com Israel e nossa amizade com o povo israelense sobreviverão ao comportamento do atual governo de Israel”.

O ministro Mauro Vieira lembrou ainda que o Brasil condenou o ataque do Hamas contra Israel, considerada uma ação terrorista pelo governo brasileiro, mas acrescentou que Israel faz uso desproporcional da força.

“Israel tem o direito de defender sua população, mas isso tem de ser feito dentro de regras do direito internacional. A cada dia que passa, no entanto, resta claro que a reação de Israel ao ataque sofrido tem sido extremamente desproporcional e não tem como alvo somente aqueles responsáveis pelo ataque, mas todo o povo palestino”, disse.

Conflito colonial

O ministro das Relações Exteriores ainda fez um balanço do conflito entre Israel e a Palestina, argumentando que esse pode ser considerado o “último grande conflito colonial não resolvido após quase 70 anos de discussões, guerras, acordos negociados, muitos dos quais jamais implementados”.

Mauro Vieira destacou que a tensão entre as partes vem escalando ao longo dos anos, tornando-se insustentável e sem avanços concretos. Ele citou o avanço dos assentamentos ilegais de Israel na Palestina ocupada, o aumento da violência dos colonos israelenses contra palestinos, a segregação no acesso à serviços básicos e as violações israelenses ao status sagrado de Jerusalém, em especial na Esplanada das Mesquitas.

Em relação ao atual conflito, o ministro destacou que o Brasil defende a solução de dois estados, com fronteiras reconhecidas internacionalmente, e que, por isso, lamenta declarações recentes de autoridades de Tel Aviv.

“Declarações cada vez mais recorrentes de altas autoridades do atual governo de Israel que passaram a falar abertamente de ocupação de Gaza, deslocamento forçado de sua população e que jamais aceitarão a constituição de um Estado palestino”, destacou.

O ministro também citou a preocupação com a decisão de Israel, divulgada na semana passada, de aumentar em cerca de 3,5 mil novos assentamentos israelenses em terras palestinas.

“Como um país amigo do Estado de Israel e do Estado da Palestina, e como um país que abriga de forma harmônica comunidades de origem árabe e judaica, a posição do Brasil tem sido, e continua a ser, em favor do diálogo e negociações que conduzam à solução de dois estados, com a Palestina e Israel convivendo em paz e segurança dentro das fronteiras mutuamente acordadas e internacionalmente reconhecidas”, defendeu.

Vendas no comércio retomam crescimento e têm alta de 2,5% em janeiro

As vendas no comércio cresceram 2,5% em janeiro na comparação com dezembro. É o primeiro crescimento significativo desde setembro de 2023. Na época, o avanço fora de 0,8%.

É também a melhor evolução entre meses seguidos desde janeiro de 2023, quando a alta tinha sido igualmente de 2,5%. Os dados fazem parte da Pesquisa Mensal de Comércio, divulgada nesta quinta-feira (14) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O resultado do primeiro mês de 2024 ajuda a compensar a queda de 1,4% de dezembro de 2023. Na comparação com o mesmo mês do ano passado, janeiro apresenta alta de 4,1%. Já no acumulado de 12 meses, o resultado é positivo em 1,8%.

Com os novos números, o varejo brasileiro se encontra 5,7% acima do patamar pré-pandemia da covid-19, de fevereiro de 2020, porém 0,8% abaixo de nível recorde, alcançado em outubro de 2020.

“O comércio varejista veio de 2 meses mais fracos, em que os resultados foram bastante abaixo do que poderíamos ter visto. Esse é um comportamento que foi observado não só em 2024, mas também em outros anos, quando, por exemplo, houve queda nas vendas no fim de 2022 e uma recuperação em janeiro”, explica o gerente da pesquisa, Cristiano Santos.

Efeito Black Friday

Cinco das oito atividades pesquisadas avançaram em janeiro deste ano. Os destaques foram as de tecidos, vestuário e calçados (8,5%) e de equipamentos e materiais para escritório, informática e comunicação (6,1%), que tiveram as principais influências sobre o resultado.

O pesquisador do IBGE explica que a evolução significativa de janeiro é também um efeito estatístico da Black Friday, que antecipou para novembro vendas que seriam realizadas em dezembro.

“Setorialmente, os resultados vieram com muita amplitude de crescimento em setores que tiveram queda grande no Natal, depois de concentrar as vendas na Black Friday. Isso aconteceu em tecidos, vestuário e calçados, móveis e eletrodomésticos; equipamentos e materiais para escritório, informática e comunicação; e outros artigos de uso pessoal e doméstico, que, juntos, puxaram o crescimento do varejo em janeiro”.

As vendas de tecidos, vestuário e calçados caíram 6,9% no último mês de 2023. No caso de móveis e eletrodomésticos, o tombo foi ainda maior, 7,4%.

Os números de janeiro são comparados com uma base mais baixa de dezembro, sem contar que janeiro é também mês tradicional de queimas de estoque, que estimulam vendas.

Outro setor que teve ampliação de vendas em janeiro foi o de hiper, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo, que cresceu 0,9%. O comportamento desse segmento do varejo é importante, pois é o de maior peso na pesquisa, 55,5%. Janeiro foi o terceiro mês seguido no campo positivo, o que deixou o setor 9,9% acima do patamar pré-pandemia.

Campo negativo

Três atividades ficaram no campo negativo em janeiro: livros, jornais, revistas e papelaria (3,6%); artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos e de perfumaria (1,1%), terceira de maior peso na pesquisa; e combustíveis e lubrificantes (0,2%).

O IBGE identificou que as vendas do varejo em janeiro tiveram alta em 24 das 27 unidades da federação. Em queda, apenas Santa Catarina (1%), Minas Gerais (0,1%) e Maranhão (0,1%).

Empresários no Brasil são otimistas, mas pouco organizados, diz estudo

Um levantamento nacional feito pela Febracis Escola de Negócios apontou que os empreendedores e empresários brasileiros tendem a ser extrovertidos, otimistas e entusiasmados, mas pouco prudentes, pacientes e organizados. Para a Febracis, isso indica que os empreendedores brasileiros são mais imediatistas, impulsivos e ansiosos.

O estudo foi feito com mais de 20 mil empresários de todas as regiões do país, que tiveram seus perfis coletados de forma espontânea por meio da tecnologia CIS Assessment, um software que faz análise comportamental e que foi utilizado em sua base de dados. Os dados foram coletados entre dezembro de 2016 e abril de 2023.

O objetivo da Febracis foi entender como os empreendedores se relacionam com seus colaboradores, parceiros e fazem negócios e identificar características positivas ou habilidades que precisam ser melhor desenvolvidas. Para isso, foi utilizada a teoria Disc, desenvolvida por William Marston, um teste comportamental que estabelece quatro tipos básicos de comportamentos: dominância, estabilidade, conformidade e influência. “É importante ressaltar que todas as pessoas possuem os quatro traços (dominância, influência, estabilidade e conformidade), no entanto, o que impacta é o quão alto ou baixo são tais características. Os comportamentos não são fatos em si, mas sim, indicadores de tendências comportamentais do indivíduo em seu estado natural”, explicou a Febrascis.

“A pesquisa apontou que a maioria dos empresários são dominantes e influentes, que são carismáticos e comunicativos. Esse perfil dominante e influente é pouco voltado ao detalhe, à prudência, à paciência e ao planejamento. Essa é uma característica. O perfil dominante é mais focado no objetivo, mais ousado, mais rápido e visionário. Já o influente é mais comunicativo e mais influenciador, tem o poder de convencimento das pessoas. E essas são as características do empresariado brasileiro, o que não significa dizer que estas são as melhores características para um empresário”, explicou Sidney Aquino, empresário e diretor da Febracis São Paulo e Ribeirão Preto.

Ainda segundo o levantamento, 63,8% dos empreendedores e empresários analisados possuem maior foco em comunicação e 58,6% em tomada de decisão. Isso indicaria, de acordo com o estudo, que as personalidades dos entrevistados estão mais voltadas para o diálogo e a comunicação de forma mais entusiasmada, persuasiva, prática e objetiva. No entanto, eles apresentam menos traços voltados ao planejamento, à organização e à paciência.

Além do perfil comportamental individual dos empreendedores, o levantamento também pesquisou sobre o modo como esses profissionais lideram e orientam seus times por meio de quatro vertentes: executivo, motivador, metódico e sistemático. Com base nisso, o software apontou que a maioria dos empreendedores são líderes motivadores (35,9%) e executivos (32,69%), ou seja, tendem a interagir com proximidade e informalidade, sendo mais acessíveis e agindo com ousadia e foco no resultado.

Bragantino e Botafogo decidem vaga na fase de grupos da Libertadores

O Bragantino recebe o Botafogo, a partir das 21h30 (horário de Brasília) desta quarta-feira (13) no estádio Nabi Abi Chedid, em Bragança Paulista, em partida que definirá qual será o último representante brasileiro na edição 2024 da Copa Libertadores da América. A Rádio Nacional transmite o confronto ao vivo.

🔥🌎 AMANHÃ 🌎🔥

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O Glorioso chega ao jogo em vantagem, após derrotar o Massa Bruta por 2 a 1 na última semana em partida disputada no estádio Nilton Santos, no Rio de Janeiro. A equipe que avançar nesta disputa se juntará a Fluminense, Palmeiras, São Paulo, Grêmio, Atlético-MG e Flamengo para jogar a fase de grupos do torneio de clubes mais importante da América do Sul.

A equipe de General Severiano chega ao confronto apostando muito no bom momento do atacante Júnior Santos, que, com os dois gols marcados na partida de ida pela 3ª fase prévia da Libertadores, se tornou o maior artilheiro da história da Libertadores com o total de sete tentos. Mas, diante de um adversário forte e organizado como o Massa Bruta, o auxiliar técnico Fábio Matias não espera facilidades: “Vamos ter outro jogo difícil. O Bragantino é uma equipe pressionante. E nós já estamos com alguns comportamentos pressionantes, conseguimos sustentar isso por mais tempo”.

⚡️💪🏾 #VamosBOTAFOGO

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Para buscar a classificação para a fase de grupos da Libertadores, uma possível escalação do Botafogo é: Gatito Fernández; Damián Suárez, Lucas Halter, Barboza e Marçal; Gregore e Danilo Barbosa; Júnior Santos, Eduardo e Savarino; Tiquinho Soares.

Se o Botafogo tem uma pequena vantagem no placar, o Bragantino mantém a confiança na obtenção na vaga, como deixou claro o técnico Pedro Caixinha em entrevista coletiva: “Digo que a eliminatória não está fechada. De maneira nenhuma está fechada. Nós vamos fazer de tudo. Ainda não vencemos [o Botafogo] em 2023, e agora vamos vencer, passar e estar na fase de grupos [da Libertadores]”.

Mas, para alcançar cumprir esta meta, o Massa Bruta terá que quebrar um incômodo jejum diante do Botafogo. Nas últimas cinco partidas entre as equipes o Glorioso venceu quatro e um empate foi registrado. O último triunfo do Bragantino sobre a equipe de General Severiano foi no dia 16 de novembro de 2020 pelo Campeonato Brasileiro.

Foco para mais uma decisão pela @Libertadores! 💪🏽

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Uma possível formação inicial do time de Bragança Paulista para a partida é: Cleiton; Nathan Mendes, Lucas Cunha, Luan Cândido e Juninho Capixaba; Jadsom, Eric Ramires e Lincoln; Helinho, Thiago Borbas e Eduardo Sasha.

Transmissão da Rádio Nacional

A Rádio Nacional transmite Bragantino e Botafogo com a narração de André Luiz Mendes, comentários de Waldir Luiz, reportagem de Rodrigo Ricardo e plantão Bruno Mendes. Você acompanha o Show Bola Nacional aqui:

Em 2 anos, 13 milhões de brasileiros deixam de passar fome

Estudo do Instituto Fome Zero aponta que o número de pessoas em situação de insegurança alimentar grave no Brasil passou de 33 milhões no 1º trimestre de 2022 para 20 milhões no 4º trimestre de 2023, uma queda de 13 milhões no número total de pessoas que passam fome no país.

A pesquisa se baseou em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua de 2022 e 2023 (Pnad Contínua), combinados com informações da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2017-2018, para desenvolver modelos matemáticos.

“Deve-se fazer uma ressalva. A estimativa aqui analisada é preliminar e deve ser interpretada como uma análise de cenário de como está a situação geral da insegurança alimentar e nutricional no Brasil e de seus indicadores macroeconômicos”, destaca o estudo.

“O comportamento dos indicadores descreve um cenário de estabilidade dos indicadores determinantes de insegurança alimentar e nutricional e, portanto, o início de uma possível retração da prevalência de insegurança alimentar”, explica.

A pesquisa mostra ainda que, em 2022, o Brasil enfrentava uma grave crise de insegurança alimentar, com 65 milhões de pessoas com restrições nutricionais. “Em 2023, com mudanças políticas e medidas econômicas, incluindo a restauração do Novo Bolsa Família e a expansão do BPC [Benefício de Prestação Continuada], houve uma melhoria”.

“Embora encorajadores, os resultados ressaltam a necessidade contínua de ações coordenadas para enfrentar a insegurança alimentar. O estudo destaca a importância de dados confiáveis e oportunidades para orientar políticas públicas e intervenções futuras”, avalia o instituto.

“Apesar dos avanços, o trabalho para garantir a segurança alimentar de todos os brasileiros continua. A colaboração entre pesquisadores, formuladores de políticas e a sociedade civil será essencial para enfrentar os desafios persistentes e criar um futuro mais justo e seguro para todos”, defende o Instituto Fome Zero.

Neurotecnologia permitirá alterar funcionamento mental, diz cientista

O neurobiólogo espanhol Rafael Yuste é apontado como um dos mais influentes neurocientistas da atualidade. Admirador de seu conterrâneo, o médico Santiago Ramón y Cajal, que recebeu o Nobel de Fisiologia ou Medicina de 1906 e é considerado o “pai de neurociência moderna”, Yuste tornou-se um forte candidato a receber o principal prêmio científico mundial, graças a suas importantes contribuições científicas.

O neurobiólogo Rafael Yuste defende a proteção dos dados obtidos com uso de neurotecnologias – Neuro Technology Center/Divulgação

Diretor do Centro de Neurotecnologia da Universidade de Columbia (Estados Unidos), onde tenta decifrar o código neural (relação entre conjuntos de neurônios e o comportamento ou estado mental de indivíduos), ele é um dos idealizadores da Iniciativa Brain, lançada em 2014 pelo então presidente norte americano, Barack Obama como forma de promover o desenvolvimento de técnicas e aparelhos que ajudem os especialistas a compreender o funcionamento da mente humana.

Também é um dos fundadores e principal porta-voz da Fundação Neurorights, organização que reúne um grupo de especialistas que propõem a ampliação do rol de direitos humanos a fim de proteger os indivíduos da eventual má utilização das neurotecnologias.

Em entrevista exclusiva à Agência Brasil, o espanhol fala sobre os avanços no desenvolvimento de inovações na área e defende a proteção dos dados obtidos por meio das neurotecnologias. “Propomos o direito à privacidade mental. É preciso proteger as informações pessoais obtidas com o emprego de neurotecnologias, ou seja, os neurodados, da decodificação sem consentimento prévio, mantendo-as em sigilo.”

Leia a íntegra da entrevista:

Agência Brasil: O que são neurotecnologias? O senhor pode citar exemplos do quanto e como estas ferramentas e técnicas estão presentes em nosso dia a dia?
Rafael Yuste: São métodos ou dispositivos usados para registrar os sinais elétricos [do sistema nervoso] ou modificar a atividade cerebral. Os dispositivos podem ser invasivos, quando implantados no cérebro – um chip ou um eletrodo, por exemplo – ou não invasivos – um capacete, óculos ou fone de ouvido. Hoje, a maior parte das neurotecnologias é usada no ambiente clínico. Já há dezenas de milhares de pacientes em todo o mundo usando implantes cocleares [prótese eletrônica utilizada para restaurar a audição em pessoas com déficit funcional] ou estimuladores cerebrais para tratar doenças como Parkinson ou depressão. Também já há casos de pacientes nos quais estão sendo testadas interfaces cérebro-máquinas. E, fora do âmbito clínico, há companhias vendendo de capacetes que prometem medir os níveis de estresse e ajudar as pessoas a meditar a pulseiras capazes de registrar a atividade do sistema nervoso.

Agência Brasil: Por que tantas empresas e países têm investido tanto dinheiro no desenvolvimento e aperfeiçoamento das chamadas neurotecnologias?
Yuste: Por ao menos três razões. A primeira, científica. O cérebro não é só mais um órgão do corpo: é o órgão que dá origem à mente. Com novas tecnologias que nos permitam ‘entrar’ no cérebro e registrar sua atividade, poderemos entender os seres humanos por dentro, ou seja, como nossa mente funciona. Consequentemente, mais cedo ou mais tarde, poderemos decifrar a atividade mental e, em alguns casos, alterá-la. O segundo motivo é a importância clínica. Com novos métodos ou dispositivos, poderemos desenvolver novos diagnósticos e terapias para doenças mentais, sejam elas neurodegenerativas ou neurológicas. A terceira razão é econômica. Muitas companhias tecnológicas apostam que, após o smartphone, a próxima revolução virá com um dispositivo cerebral, uma espécie de Iphone cerebral, um dispositivo que levaremos na cabeça e com o qual nos conectaremos direta e rapidamente à rede mundial de computadores. Há ainda uma quarta razão: os objetivos militares. Alguns países, como a China, também estão desenvolvendo neurotecnologia como ferramentas armamentistas e para incrementar a segurança nacional.

Agência Brasil: O senhor e outros especialistas sustentam que o aperfeiçoamento e a consequente intensificação do uso das neurotecnologias suscitam novos problemas éticos e sociais. Que problemas são esses?
Yuste: Em 2017, um grupo de 25 especialistas de diversas nacionalidades se reuniu na Universidade Columbia, em Nova York, para analisar os problemas éticos e sociais das neurotecnologias. Essa reunião ocorreu no campus de Morningside Heights, razão pela qual o grupo passou a ser chamado de Grupo de Morningside. Identificamos cinco aspectos críticos em relação aos quais o uso das neurotecnologias sem nenhum tipo de regulamentação provoca preocupações éticas e sociais. E propusemos a ampliação dos direitos humanos para a inclusão dos chamados neurodireitos. Nossa proposta é, com isso, protegermos esses cinco aspectos da atividade humana contra o potencial uso indevido ou abuso na utilização das neurotecnologias.

Agência Brasil: Quais são esses cinco aspectos que os senhores creem que precisam ser protegidos?
Yuste: Propomos o direito à privacidade mental. É preciso proteger as informações pessoais obtidas com o emprego de neurotecnologias, ou seja, os neurodados, da decodificação sem consentimento prévio, mantendo-as em sigilo. O segundo direito proposto estabelece o direito à identidade pessoal, ou à consciência. Para que o uso da neurotecnologia não perturbe ou altere o senso de identidade, confundindo-o com os insumos tecnológicos usados para conectar as pessoas. O terceiro neurodireito é o direito ao livre-arbítrio. Para que possamos continuar escolhendo a forma como nos comportamos sem interferências externas, sem a manipulação neurotecnológica. O quarto neurodireito prevê o acesso equitativo às neurotecnologias de ampliação sensorial ou cognitiva. Importante esclarecer que, para a maioria dos especialistas, esse melhoramento de certas funções mentais já está ocorrendo. Basta pensarmos nos aplicativos que nos fornecem informações que, de outra forma, teríamos que memorizar, como os localizadores por GPS ou agendas. Queremos prevenir as desigualdades decorrentes do maior ou menor acesso a essas tecnologias. O último dos cinco neurodireitos diz respeito à proteção contra as chances do uso das neurotecnologias injetar características discriminatórias em nossos cérebros, combatendo expressões preconceituosas no design do algoritmo que determina o funcionamento desses dispositivos.

Agência Brasil: Em relação a esse quinto ponto, o Grupo Morningside também propõe que cientistas, empreendedores e empresas prestem uma espécie de juramento parecido com o que é feito pelos médicos. Qual o objetivo disso?
Yuste: A ideia é copiar a medicina, cujas técnicas também servem para manipular o corpo humano e cujas regras éticas se aplicam a todos os médicos do mundo, que têm que prestar o Juramento de Hipócrates, prometendo só empregar o que aprenderam para ajudar os seus pacientes. Queremos copiar essa ideia e introduzir nas neurociências o Juramento Tecnocrático, com o qual todos os que desenvolvem e administram a neurotecnologia se comprometam a empregar seus conhecimentos e as técnicas a seu dispor para ajudar as pessoas.

Agência Brasil: O debate sobre a necessidade de os legisladores reconhecerem e protegerem os neurodireitos vem conquistando espaço em diferentes países. Da mesma forma como a discussão sobre a importância de mais investimentos no desenvolvimento de neurotecnologias que permitam aos cientistas avançar nas pesquisas sobre o funcionamento do sistema nervoso e da mente humana. Como o senhor avalia o atual momento? Quão perto estamos de ver essas propostas se tornarem algo efetivo?
Yuste: São duas coisas distintas. Os neurodireitos já foram acolhidos no Chile, onde uma emenda constitucional foi aprovada para proteger a atividade cerebral. No Brasil também já há uma proposta de emenda constitucional tramitando no Congresso Nacional, semelhante à que o Chile aprovou. Da mesma forma como no México. Uruguai e Espanha devem seguir por esse caminho. E nós, do Grupo Morningside, estamos trabalhando junto à Organização das Nações Unidas [ONU] para que esta incorpore os neurodireitos a seus tratados internacionais sobre direitos humanos. Ao mesmo tempo, estamos trabalhando em níveis nacionais e estaduais, como no Rio Grande do Sul, no Brasil, e no Colorado, nos Estados Unidos.

Agência Brasil: Há o risco de a regulamentação dos neurodireitos e a proteção dos neurodados retardarem o desenvolvimento das neurotecnologias?
Yuste: Via de regra, o uso das neurotecnologias é menos problemático no ambiente clínico, regulamentado por leis que já protegem a privacidade dos pacientes. O que nos preocupa é quando esses dispositivos e técnicas começam a ser usados para outros fins, em outros espaços, sem a necessidade do aval de um médico ou profissional sujeito a um código de ética. Ou seja, o que nos preocupa é a potencial popularização de aparelhos que qualquer pessoa poderá adquirir e usar em casa, para diversos fins, e que poderão recolher e transmitir neurodados para um servidor capaz de armazená-los e decodificá-los. É preciso antecipar-se a isso e proteger a todos, dentro e fora de hospitais e clínicas.

Agência Brasil: Mas não há o risco de isso desestimular investimentos, retardando os resultados dos estudos?
Yuste: Isso não significa impedir que empresas façam negócios ou pesquisas. Trata-se de, principalmente, estabelecer a obrigatoriedade de os responsáveis protegerem os dados cerebrais com o mesmo rigor com que empresas de biomedicina devem proteger as informações pessoais de seus pacientes. Uma das formas de fazer isso é estabelecendo que os dispositivos desenvolvidos por empresas neurotecnológicas sejam inspecionados por agências de regulação. Neste sentido, cabe destacar que, há pouco tempo, a Neurorights Foundation estudou os contratos de 30 companhias de neurotecnologia e concluiu que os clientes dessas empresas estão totalmente desprotegidos diante da falta de estruturas legais e regulatórias nacionais e internacional. Em todos os contratos analisados havia as chamadas ‘letras pequenas’, cláusulas que quase ninguém lê. E segundo as quais os clientes transferiam o direito sobre seus neurodados a terceiros. Inclusive para que as companhias os vendessem ou os transferissem a outras empresas.

Agência Brasil: É possível afirmar que, em breve, detentores das novas tecnologias poderão ler nossos pensamentos e interferir em nossos comportamentos?
Yuste: O desenvolvimento da inteligência artificial já possibilitou o uso de dispositivos neurotecnológicos não invasivos capazes de decifrar a linguagem, imagens mentais e emoções. Isso já foi feito. Há pouco tempo, com o uso da interface cérebro-máquina, um neurocirurgião de São Francisco [EUA] conseguiu reconstruir a linguagem e as emoções de uma mulher paralisada há vários anos, decodificando-as e reproduzindo-as com o uso de um computador. Para mim, isso é algo semelhante à explosão da primeira bomba atômica, pois significa que já é possível decodificar a atividade mental de uma pessoa. Com isso, acredito que, em mais cinco ou dez anos, descobriremos como começar a modificar a atividade cerebral. E, hoje, o único país cuja população está efetivamente protegida contra o eventual uso indevido disso é o Chile, onde já houve, inclusive, um caso em que a Corte Suprema ordenou que uma companhia de neurotecnologia apagasse todos os dados relativos à atividade cerebral de um cidadão e se submetesse à inspeção da Agência Nacional de Regulação Médica.

Agência Brasil: Ao mesmo tempo em que propõe a regulamentação dos neurodireitos, apontando os riscos do uso tecnológico indevido, o senhor defende a importância do desenvolvimento das neurotecnologias. O senhor é otimista? Acredita que as possibilidades positivas superam os eventuais riscos?
Yuste: Sim. Sou muito otimista. Dediquei minha vida e minha carreira ao desenvolvimento de neurotecnologias e à tentativa de compreender como o cérebro funciona para auxiliar quem precisa de ajuda urgente. Não há, no mundo, quem hoje não tenha um parente ou conhecido sofrendo com um transtorno neurodegenerativo como as doenças de Alzheimer ou de Parkinson ou mesmo com ansiedade, esquizofrenia e outras enfermidades para as quais ainda não encontramos cura. Temos que ajudar esses pacientes, e as neurotecnologias nos possibilitam fazer isso. Só que as mesmas tecnologias que nos permitirão decodificar a mente de um esquizofrênico e reprogramá-la poderão ser usadas para fazer o mesmo com uma pessoa dita normal. Daí a necessidade de assegurarmos que essas técnicas só sejam usadas para ajudar quem realmente necessita.

Pesquisa de longo prazo aponta impacto ambiental da agricultura

Como conciliar a expansão das fronteiras agrícolas com a manutenção da paisagem das bacias e a integridade do ciclo hidrológico tão necessários à vida humana? E de que forma tudo isso tem a ver com a segurança alimentar? A busca por essas respostas moveu a pesquisadora Márcia Macedo a desenvolver, junto com outros pesquisadores, um estudo de longo prazo em dez microbacias do Rio Xingu, em Mato Grosso.

Foi a partir do Projeto Tanguro, uma iniciativa do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) na cidade de Querência, que a pesquisadora encontrou o ambiente perfeito para desenvolver seu primeiro experimento em busca dessas respostas. Em um laboratório a céu aberto, que reúne pesquisadores de vários países, Márcia também teve à disposição cursos de água inseridos em terras com usos diferentes. “É um lugar onde a gente pode comparar bacias florestadas, ou seja, integrais e bacias com agricultura intensiva. Então nós pesquisamos quatro bacias em floresta e seis bacias em agricultura”, explica.

 A pesquisadora é Márcia Macedo, fala sobre o impacto da agricultura no ciclo hídrico, na Fazenda Tanguro em MT. Foto:- Fabiola Sinimbu/Agência Brasil

De acordo com o Código Florestal, esses cursos de água com menos de 10 metros de largura são considerados, em 30 metros de margem para cada lado, Áreas de Proteção Permanentes (APPs). Após esses limites, a terra recebe a destinação escolhida pelo proprietário.

Por ser uma fazenda de uso inicialmente de pecuária e que passou por uma transição para uso da terra pelas lavouras de soja, milho e algodão, a Tanguro, destinada também à ciência, possibilita a busca pelo entendimento do impacto dessas escolhas.

Pesquisadora da Organização Não Governamental norte-americana Woodwell Climate Research Center, Márcia passou a trabalhar com a equipe do Ipam, por meio de uma parceria entre as duas instituições. “Com isso, a gente conseguiu medir vários parâmetros que mostram como que essa grande mudança de uso da vegetação afeta o balanço da água e de energia”.

Foram instalados vários equipamentos de medição para diferentes parâmetros e os pesquisadores passaram a monitorar os cursos de água em relação à vasão dos córregos, existência de nutrientes, temperatura e outros fatores de avaliação do ambiente aquático que permitem entender o habitat de toda a cadeia alimentar existente.

Segundo Márcia, um dos achados mais significativos representa uma grave interferência no ciclo hídrico, já que as vegetações de raízes consideravelmente menores da agricultura não conseguem cumprir o mesmo papel que a vegetação presente originalmente na região estudada, situada em uma área de transição entre a Amazônia e o Cerrado.

Mato Grosso –  A pesquisadora Márcia Macedo e o pesquisador é Leonardo Santos. O impacto da agricultura no ciclo hídrico, na Fazenda Tanguro, em MT. Foto: Fabiola Sinimbu/Agência Brasil

“As florestas usam muita água, ao longo do ano todo, e elas bombeiam essa água do solo para a atmosfera, em um processo que se chama evapotranspiração, e as áreas de lavoura usam muito menos água e por menos tempo”, explica.

Na prática, no lugar de ir para a atmosfera a água acumula no solo e é drenada pelos córregos em quantidades maiores deixando menos água disponível na região, o que, além de aumentar a temperatura também diminui os períodos de chuvas. Em regiões de relevo maior, o alto volume drenado pode esvaziar o curso de água durante a seca.

“Quando a vegetação joga água para a atmosfera tem o efeito de resfriar a terra, então você muda isso e você esquenta bastante. Pudemos observar que as bacias nas áreas não florestadas são entre 4 e 5 graus Célcius mais quentes, então isso também afeta a temperatura da água, afeta todo o microclima a traz várias sequelas para vida existente naquele córrego”, explica.

De acordo com a pesquisadora, se for levado para uma escala maior pode representar, inclusive, uma ameaça à própria produção de alimentos, em longo prazo. “Na escala macro, se você começa a mudar a quantidade de água que está sendo reciclada da chuva, que está sendo reciclada da atmosfera, os impactos acontecem nos rios voadores que abastecem as grandes áreas de agricultura”, afirmou.

Flora

Enquanto Márcia se dedicou aos cursos de água, o pesquisador do Ipam, Leonardo Maracahipes Santos estudou a própria vegetação da floresta ripária, ou seja, as margens dos córregos preservadas por lei, e comparou as que permaneceram inseridas na floresta original com as que passaram a integrar área de agricultura. E a conclusão foi de que a agricultura também interferiu na estrutura da vegetação e na composição das espécies dessas APPs.

Mato Grosso – O pesquisador é Leonardo Santos, fala sobre o impacto da agricultura no ciclo hídrico, na Fazenda Tanguro. Foto: Fabiola Sinimbu/Agência Brasil

De acordo com o pesquisador, na floresta que passou por mudança de paisagem é possível observar um comportamento chamado de efeito de borda, que se aplica às faixas de cerca de 100 metros limítrofes com terras degradadas, onde as espécies menos resistentes não conseguem sobreviver, o ambiente fica mais pobre de espécies, o que diminui a cobertura vegetal e aumenta a entrada da luz do sol. “Com isso prevalecem árvores menores, portanto com menos biomassa, que estocam menos carbono, têm copas menores e deixam a luz entrar, tornando o ambiente mais quente e seco, e isso afeta os serviços ecossistêmicos, já que o ambiente passa a ter maior número de indivíduos da mesma espécie”, explica.

Fauna

Como em uma floresta em equilíbrio tudo se conecta, a mudança na vegetação e nos rios também afeta os animais e insetos que habitam a região. O pesquisador do Ipam, Filipe Arruda, se dedicou a entender como as abelhas, formigas e aves são afetadas por todas essas mudanças provocadas pelo uso do solo para a agricultura.

Segundo o pesquisador, os grupos taxinômicos de insetos são afetados de formas diferentes, e durante a pesquisa foi observada tanto a perda total de uma espécie naquela floresta inserida em uma área de agriculta, quanto a troca de espécies, ou seja, desapareceram as que costumam viver em ambientes de mata fechada e passaram a viver naquela área, espécies acostumadas com menos vegetação.

“A perda pôde ser observada em algumas espécies de formiga, e a troca, nós observamos entre as espécies de abelha. Lembrando que as formigas e as abelhas desempenham importantes serviços ecossistêmicos, como a dispersão secundária de sementes pelas formigas e a predação de pragas como a lagarta da soja. Já as abelhas exercem um papel fundamental de polinização”, ressalta.

Longo Prazo

Mato Grosso – A pesquisadora é Márcia Macedo e o pesquisador é Leonardo Santos, falam sobre o impacto da agricultura no ciclo hídrico, na Fazenda Tanguro em MT. Foto: Fabiola Sinimbu/Agência Brasil

Como o Projeto Tanguro está inserido no Programa de Pesquisas Ecológicas de Longa Duração (Peld), de fomento às pesquisas contínuas sobre ecossistemas e a biodiversidade, os estudos ganham desdobramentos em novos projetos que aprofundam ainda mais os conhecimentos e oferecem ferramentas às políticas públicas.

Márcia Macedo atualmente trabalha em novo estudo sobre as represas existentes nas microbacias da Tanguro e, para isso, montou uma equipe com jovens cientistas que buscam não apenas entender as mudanças causadas pela ação humana no meio ambiente, mas também auxiliam no desenvolvimento de tecnologias para aprimorar os métodos de coletas de dados e amostras para as pesquisas.

“O fato de ter a presença de pesquisadores por tanto tempo atuando no mesmo lugar permite à gente montar um quebra-cabeça de várias perguntas, de várias perspectivas. O financiamento do governo também nos permite trazer colaboradores da região, ter a experiência fantástica dos técnicos do Ipam, oferecer bolsas para alunos e treinar a próxima geração”, conclui.

STF julga ação para impedir desqualificação de vítimas de violência

O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar nesta quinta-feira (7) uma ação para impedir que mulheres vítimas de crimes sexuais sejam desqualificadas em audiências judiciais e investigações policiais.  

Os ministros julgam uma ação protocolada no final do ano passado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) para garantir que vítimas de crimes sexuais sejam tratadas de forma digna durante a tramitação de processos.

O objetivo da procuradoria é impedir que a vida sexual pregressa da vítima seja utilizada como argumento para desqualificação moral. Se a ação for aceita pelo Supremo, fatos alheios ao caso investigado não poderão ser usados por advogados, policiais e juízes para avaliar a conduta da mulher que denunciou ser vítima de crime sexual.

A sessão foi dedicada somente às sustentações orais das partes envolvidas. A data do julgamento final ainda será marcada. Para a subprocuradora Elizeta Paiva, o discurso de desqualificação da vítima deve ser combatido pelo Judiciário.

“É imperativo que o STF reconheça a inconstitucionalidade de narrativa de desqualificação da vítima em crimes sexuais, bem como reforce o dever do poder público de coibir comportamentos com esse propósito”, afirmou Elizeta.

Mari Ferrer

Um dos casos que motivou a ação da PGR ocorreu com a modelo e influenciadora digital Mariana Ferrer, em 2018. Durante audiência na qual prestou depoimento na condição de vítima de estupro, ela foi constrangida pelo advogado do acusado.

O episódio provocou a aprovação da Lei Mari Ferrer, norma que protege vítimas e testemunhas de constrangimentos. No ano passado, o juiz responsável pelo caso foi advertido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Dia da Mulher

O julgamento foi iniciado nesta quinta-feira para marcar o Dia Internacional da Mulher, que será comemorado amanhã (8). Na abertura da sessão, a ministra Cármen Lúcia, única mulher na Corte, disse que as mulheres continuam em posição de desvalor profissional e social no país. 

Na avaliação da ministra, mesmo após a promulgação da Constituição de 1988, as mulheres não desfrutam da igualdade de gênero em direitos e obrigações.  

Violência contra entregadores tem herança escravista, diz pesquisador

Não é um caso isolado. Não é apenas sobre entregadores de aplicativos. A história de Nilton Ramon de Oliveira, de 24 anos, baleado por um cliente policial militar na terça-feira (4), na zona oeste do Rio de Janeiro, tem dimensões estruturais que remetem ao passado escravista brasileiro. Esse é o posicionamento de Leonardo Dias Alves, mestre em política social e professor da Universidade de Brasília (UnB).

Nas ciências sociais, a ideia de estrutura é frequentemente usada para falar de um fenômeno de longa duração. Por isso, apesar da abolição da escravidão no Brasil ter mais de 135 anos, o professor defende que alguns princípios que organizavam as relações raciais e trabalhistas da época escravista continuam no presente.

“O processo de exploração da força de trabalho do escravizado era baseada no controle e na violência. Com o advento da abolição, a violência continuou a ser algo central, com atributos que desumanizam a força de trabalho. E a população negra foi colocada à margem da sociedade, ocupando espaços racialmente discriminados no mercado de trabalho. Ela vai ocupar postos com menor remuneração, maior degradação humana, funções braçais e servis”, disse Leonardo.

“Quem são as pessoas que fazem trabalhos de limpeza? Quem são os que estão majoritariamente em trabalhos de entrega? Que fazem jornada gigantes? São essas pessoas que podem tomar um tiro, ser agredidas por aqueles que acham que podem tudo por estarem pagando. É uma violência voltada para a população negra, em um espaço de trabalho que é destinado à população negra. O racismo é tratado como algo moral, pessoal, comportamental. E nunca dimensionado enquanto uma estrutura. Todo o Estado e a sociedade deveriam ser cobrados e responsabilizados”, complementa o pesquisador.

Rio de Janeiro – “Clientes nos confundem com garçons”, reclama entregador de aplicativo. Foto Rafael Simões/Arquivo Pessoal

O caminho para ter relações de trabalho justas e antirracistas passaria por uma transformação social profunda, com mudança de consciência coletiva, analisa Leonardo Dias. Mas, de forma imediata e específica sobre a situação dos entregadores, ele cobra atuação mais incisiva das plataformas digitais que os empregam, como o iFood.

“É necessário um trabalho reflexivo e crítico dessas plataformas. Se isso for do interesse delas também. Porque, pela lógica do capital e do lucro, será que é importante para elas que o trabalhador tenha segurança? A segurança de não sofrer racismo no ambiente de trabalho? Depois de uma jornada exaustiva, ter a possibilidade de morrer por conta disso? Há interesse em resolver e lidar com isso, estabelecer políticas antirracistas? Ou está tudo bem, porque morreu um, coloca mais dois que estão interessados no trabalho também?”, questiona o pesquisador.

Dados e iniciativas do iFood

A empresa iFood disse à Agência Brasil que tem uma central de apoio jurídico e psicológico para tratar casos de violência contra os entregadores. Em 2024, foram notificadas 13.576 denúncias de ameaça e agressão física à plataforma. Em 16% dos casos atendidos, os problemas aconteceram porque o cliente exigiu que os entregadores subissem nos apartamentos.

O Rio de Janeiro é considerado o lugar mais crítico, o que fez a empresa criar a primeira central física de atendimento para tratar casos como esses, na Vila da Penha, bairro da zona norte. Também foi lançada uma campanha específica, com o nome Bora Descer, para conscientizar as pessoas que elas têm que pegar o pedido.

Rio de Janeiro – Entregadores de aplicativo trabalham no centro da capital – Foto Fernando Frazão/Agência Brasil

“A iniciativa recebe denúncias do Brasil todo. Existem áreas onde os problemas são maiores. No caso do Rio, com mais incidentes, isso pode acontecer pelo fato de ser uma cidade que enfrenta desafios socioeconômicos, como desigualdade de renda, falta de acesso aos serviços básicos, além de altos índices de violência urbana. E esses problemas podem se manifestar nas interações entre entregadores e clientes”, explica Dione Assis, fundadora da Black Sister in Law, coletivo de advogadas negras criminalistas responsável pela central de atendimento do iFood.

Dione Assis entende que existe uma naturalização das agressões e que, muitas vezes, elas são vistas como parte constituinte da atividade de entregador. A principal explicação para esses comportamentos, segundo ela, é o racismo.

“Há estudos que comprovam que os entregadores no Brasil são majoritariamente homens pretos e pardos. Isso é uma informação importante porque, no imaginário do cliente, necessariamente virá ao seu encontro uma pessoa com essas características. O que dá a ele a sensação de que pode agir assim, com determinadas exigências. E isso pode gerar uma situação de discriminação desses trabalhadores”, diz a advogada.

Direitos trabalhistas e sociais

O Ministério Público do Trabalho (MPT) disse estar atento aos episódios de agressão e humilhação contra os entregadores e destacou a existência de normas específicas que proíbem o racismo e outras formas de discriminação no ambiente de trabalho.

“Existem disposições constitucionais que vedam condutas discriminatórias contra os trabalhadores. Por exemplo, a Lei 9.029, que proíbe qualquer prática discriminatória e limitativa nas relações do trabalho. Para o MPT, as empresas que exploram esse tipo de atividade devem garantir que os trabalhadores não sofram qualquer tipo de discriminação e possam desenvolver suas atividades com segurança, para que não sofram nenhum dano nenhum ou agravo à saúde”, disse a procuradora do trabalho, Juliane Mombelli.

O MPT também reforçou que as empresas proprietárias dos aplicativos de entrega são responsáveis pela segurança dos trabalhadores e devem assumir a responsabilidade pelo cumprimento dos direitos deles.

“Essas plataformas digitais devem implementar medidas de proteção, independentemente do questionamento quanto à natureza jurídica dos vínculos que os trabalhadores têm com as empresas. Ou seja, é dever dos empregadores e das empresas proprietárias de plataformas monitorar e avaliar regularmente todos os riscos e impactos na rotina de trabalho”, afirma Juliane.

*Colaborou Vinicius Lisboa

“Clientes nos confundem com garçons”, reclama entregador de aplicativo

Sofrer episódios de agressão, ofensa e humilhação são rotina no cotidiano de entregadores de aplicativo. A percepção foi relatada à Agência Brasil por trabalhadores das duas maiores cidades do país, Rio de Janeiro e São Paulo. O caso mais recente de repercussão foi o do entregador da plataforma iFood Nilton Ramon de Oliveira, de 24 anos, baleado por um cliente policial militar (PM) na segunda-feira (4), em Vila Valqueire, zona oeste do Rio de Janeiro.

O motivo do desentendimento entre Nilton e o cabo Roy Martins Cavalcanti foi a exigência do cliente para que o pedido fosse entregue na porta da casa do PM. Nilton foi baleado na perna e está internado no Hospital Municipal Salgado Filho. O quadro dele é grave. O cabo da PM se apresentou a uma delegacia, prestou depoimento e foi liberado. A Polícia Civil investiga o caso, e a Corregedoria da PM abriu um procedimento interno.

O iFood reforça que os entregadores não têm obrigação de levar os pedidos até a porta dos apartamentos. “A entrega tem que ser realizada no primeiro ponto de contato, ou seja, no portão da residência ou na portaria do condomínio. O que aconteceu com o Nilton é inaceitável e condenável”, diz a gerente de Impacto Social do iFood, Tatiane Alves.

Segundo ela, a empresa entrou em contato com a família do entregador e se colocou à disposição para todo tipo de apoio. “Espero que o caso não fique impune e que o Nilton se recupere muito em breve. Vamos acompanhar de perto esse caso”, afirma.

Passado escravocrata

O entregador Bruno França trabalha no centro do Rio de Janeiro. Ele contou que todos os dias acontecem casos de ofensas e desentendimentos entre clientes e entregadores. Para ele, a raiz do problema tem relação com o passado escravocrata do país.

“Eu acho que a história de como foi construído o Brasil permeia até hoje. As reverberações do que aconteceu no passado influenciam a nossa vida. Não tenho dúvida de que isso tem ligação com o racismo. Muitos clientes, dentro de uma visão histórica escravocrata brasileira, acreditam que a gente tem que subir até o apartamento, colocar um babador e colocar comida na boca deles”, diz o entregador.

Bruno França conta que os desentendimentos com clientes são frequentes – Vinícius Ribeiro/Divulgação

Outra queixa de Bruno é que a plataforma, na avaliação dele, não deixa claro para o cliente que os entregadores não são obrigados a fazer a entrega na porta do apartamento.

“Todo dia acontece isso [desentendimento] porque muitos clientes entendem que a gente é obrigado a subir”. Ele cita ainda que, eventualmente, há um descumprimento da lei em vigor na cidade do Rio que proíbe a distinção no uso de elevadores entre social e de serviço.

O entregador também aponta a falta de direitos trabalhistas como um dos motivos para a categoria ser alvo de agressões e ofensas.

“Marginalização em relação ao mundo do trabalho. Não temos direito algum. A gente vive em uma sociedade violenta. Dentro dessa perspectiva desses agressores, eles nos veem como alguém sem direitos e que pode ser agredido, pode ser violado.”

Garçons

Rafael Simões faz entregas na cidade de Niterói, região metropolitana do Rio. Ao conversar com a reportagem da Agência Brasil, pouco antes do meio-dia, ele avisou: “Vamos rapidinho porque está chegando o horário de pico, sabe como é, né?”

Ele compartilha da opinião de que o passado do país tem a ver com a forma atual como entregadores são tratados por alguns clientes.

“O cliente acha que é obrigação [entregar no andar]”, reclama Rafael Simões, que trabalha em Niterói – Rafael Simões/Arquivo Pessoal

“A gente vive nessa sociedade assim. O pessoal está realmente pensando que a gente é escravo”, diz.

“O cliente acha que é obrigação [entregar no andar]. O cliente está confundindo entregador com garçom. Nós não somos garçons”, reclama Rafael.

Rafael Simões conta que muitas vezes o entregador opta por deixar o pedido na porta do cliente para evitar problemas e também não perder tempo esperando a pessoa descer – muitas vezes com pressa nenhuma. “Às vezes, para evitar o problema, a gente sobe. Mas não é obrigação.”

Agressões

A comparação de Bruno e Rafael com o tempo de escravidão ganha mais significância ao se lembrar o caso de Max Ângelo dos Santos. Em abril de 2023, o entregador negro foi “chicoteado” com uma coleira de cachorro por uma mulher branca que se sentiu incomodada com a presença de entregadores em uma calçada, em São Conrado, bairro nobre na zona sul do Rio de Janeiro.

Em outro caso de repercussão, também em São Conrado, um entregador compartilhou nas redes sociais a abordagem de uma mulher que desceu até a portaria do prédio com um cutelo, depois de ele ter se recusado a subir para fazer a entrega.

Produtividade

Fora do Rio de Janeiro, desentendimentos e ofensas também são frequentes, afirma o presidente da Associação dos Motofretistas de Aplicativo e Autônomos do Brasil (AMABR), Edgar Franscisco da Silva, conhecido como Gringo. Outro ponto de atrito recorrente, segundo ele, é quando há demora para a chegada do pedido.

Gringo atribui a recusa da entrega na porta do apartamento a uma busca por produtividade, uma vez que, pelos aplicativos de delivery, os trabalhadores ganham por quantidade de entregas.

“Se a pessoa já está na portaria na hora que o entregador chega, ele entrega, e o aplicativo já toca imediatamente para ele pegar outra corrida. Quando ele tem que subir até o apartamento, ele perde uma ou duas entregas, que vão fazer falta na casa deles”, explica. Gringo lembra que há prédios em que a pessoa anda centenas de metros até chegar ao cliente.

Exército de reserva

O presidente da AMABR contextualiza que a mudança de comportamento dos entregadores, que antes faziam a entrega na porta do domicílio, sofreu alterações mais profundamente durante a pandemia, quando muita gente foi forçada a trabalhar como meio de sustento. Além de mais gente fazendo delivery, os aplicativos acirravam a concorrência por cliente baixando valores da taxa de entrega.

Conhecido com Gringo, Edgar Francisco da Silva diz que os aplicativos de entrega têm à sua disposição um “exército de reserva” – Edgar Francisco da Silva/Arquivo

“Eles baixaram o preço para ter mais clientes, mas quem sentiu isso foi o entregador”, observa.

“Devido à baixíssima remuneração, os entregadores estão tendo outro comportamento que é ‘não vou subir, porque eu corro risco de ser multado, de a minha moto ser roubada, e não estou ganhando para isso, não vale a pena.”

Gringo nota ainda que algumas pessoas se veem superiores aos trabalhadores de delivery.

“Eu não sei explicar esse comportamento, mas tem pessoas que se sentem superiores e, em qualquer situação que não for do jeito que elas gostariam, já partem para esse lado da humilhação e da agressão”, lamenta o presidente da associação.

Ele conta que já vivenciou situações em que teve que ser transportado em elevador que carregava lixo. “Aquele fedor insuportável”. Além disso, já levou um empurrão de uma cliente.

“Isso impacta, você fica com aquilo na cabeça. A chance de você depois sofrer um acidente de moto porque estava com a cabeça naquilo é gigante”, relata.

Gringo complementa que o fato de ter muita gente buscando trabalho como entregador faz com que empresas e plataformas não deem a devida atenção a reclamações dos trabalhadores.

“O entregador fica muito submisso ao cliente, e o cliente aproveita disso. O cliente sabe que é só ele falar ‘o entregador foi mal-educado’. O aplicativo não quer nem escutar o entregador, ele não quer perder o cliente, então bloqueia o entregador porque ele tem um exército de reserva para fazer as entregas”, diz Gringo.

Campanha

A iFood faz campanhas e parcerias, inclusive com o Secovi (sindicato que reúne administradoras de imóveis), para conscientizar a população e diminuir as chances de desentendimentos entre clientes e entregadores. No carnaval, houve a campanha #BoraDescer, sobre a necessidade de o cliente ir até o entregador no ponto de contato (portaria ou portão da residência).

A plataforma, que tem 250 mil entregadores ativos, oferece, desde junho 2023, uma central de apoio jurídico e psicológico, que fornece assistência para entregadores vítimas de discriminação, agressão física, ameaça, assédio, abuso e/ou violência sexual. A central é uma parceria com o grupo Black Sisters in Law, formado por advogadas negras.

Apenas em 2024, a central recebeu 13.576 denúncias de ameaça e agressão física. Desde 2023, dos casos que resultaram em processos e atendimentos pela central de apoio, 26% se referem a casos de agressão física, 23%, de ameaça e 22%, de discriminação. De todos os casos atendidos, 16% estão relacionados a subir ou não nos apartamentos.

Legislação

Um levantamento do Instituto Fogo Cruzado, especializado na coleta de informações relacionadas à violência armada, aponta que ao menos 26 entregadores motoboys foram baleados em serviço na região metropolitana do Rio desde 2017. Desses, 21 morreram. Os dados não apontam se eram especificamente ligados a plataformas e incluem vítimas de operações policiais.

“Precisamos continuar falando dessa profissão que é tão desprezada, que coloca muita gente em risco e sustenta tantas famílias no Brasil”, observa Carlos Nhanga, coordenador regional do Instituto Fogo Cruzado no Rio de Janeiro.

“Esses trabalhadores precisam de proteção que assegurem os direitos ao emprego e os direitos da vida também. É preciso criar políticas que assegurem o vínculo empregatício mais seguro, além de punir agentes de segurança que usem da violência para impor as suas vontades. É inadmissível que um policial militar armado ameace cidadãos dessa forma e fique por isso mesmo”, critica o coordenador.

Nhanga lembra que o país discute formas de regulamentação do trabalho por meio de plataformas. Na segunda-feira (4), o governo enviou ao Congresso um projeto de lei que regula a atividade de motorista de aplicativos. 

*Colaborou Vinicius Lisboa.