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Ministério recebe adesão à Rede de Evidências em Direitos Humanos

O Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC) deu início, nesta terça-feira (6), ao processo de adesão de órgãos e entidades públicas e privadas à Rede Nacional de Evidências em Direitos Humanos (Renedh).

Instituída pela Portaria nº 762, de dezembro de 2023, a rede é uma instância de articulação, produção e disseminação de informações estratégicas que sirvam de subsídios para a formulação de políticas de direitos humanos e cidadania.

Podem fazer parte da Renedh órgãos e entidades da administração pública federal, estadual, distrital ou municipal que desenvolvam pesquisas, estudos e análises no campo dos direitos humanos e da cidadania; além de representantes de instituições de pesquisa e ensino, públicas ou privadas; associações científicas; organizações da sociedade civil; movimentos sociais e organismos internacionais que desenvolvem ações na área de direitos humanos e cidadania.

São princípios da Renedh auxiliar na promoção da justiça social e da cidadania; valorizar a ciência e estimular o amplo debate técnico acerca das temáticas de interesse; fomentar a transversalidade das políticas públicas e a participação social na produção e no uso de conhecimento em direitos humanos e cidadania; bem como promover o uso de informações estratégicas e evidências por gestores públicos.

“Estamos montando este projeto, que vai sair em breve”, afirmou o ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, Silvio Almeida, ao participar, esta manhã, em Brasília, do 1º Encontro de Evidências em Direitos Humanos. “Vamos conectar todas as organizações [que atuam com a promoção e a defesa dos direitos humanos] nos estados brasileiros, onde precisamos acompanhar o que acontece e acionar parceiros que acompanhem as pessoas [que denunciem ameaças aos direitos fundamentais]”, acrescentou o ministro, assegurando que, ainda neste primeiro semestre, serão aprovados os membros, o regimento interno e o plano de trabalho da Renedh.

Entidades interessados em participar da iniciativa podem solicitar o termo e o formulário de adesão pelo e-mail.

Observatório

Durante o encontro desta manhã, representantes do MDHC também trataram do Observatório Nacional de Direitos Humanos (ObservaDH). Criado por meio da Portaria Ministerial nº 571, de setembro de 2023, a plataforma está disponível na internet desde meados de dezembro do ano passado.

De acordo com o coordenador-geral de Indicadores e Evidências do ministério, Roberto Pires, em menos de dois meses, o ObservaDH já contabiliza cerca de 8 mil acessos. Ao menos 93 reportagens já foram produzidas com base em informações retiradas do portal instituído para “difundir e analisar informações estratégicas sobre os direitos humanos no Brasil e fornecer evidências para o planejamento, monitoramento e avaliação de políticas públicas de defesa, promoção, proteção, educação e cultura em direitos humanos, nos níveis de governo federal, estadual e municipal.”

Ainda segundo Pires, a plataforma virtual contém informações elaboradas a partir da análise de mais de 400 indicadores extraídos de mais de 30 bases de dados. Organizado em áreas temáticas, o ObservaDH abrange uma série de indicadores sobre pessoas ou grupos sociais vulnerabilizados, como população em situação de rua; pessoas com necessidades especiais; idosos; crianças e adolescentes; comunidade LGBTQIA+; enfrentamento ao discurso de ódio, entre outras.

Juntos, o ObservaDH e a Rede Nacional de Evidências em Direitos Humanos buscam fornecer indicadores científicos que auxiliem os gestores públicos a formularem políticas eficientes. “São [duas] ferramentas que consideramos essenciais para o aprimoramento de nossas ações e da própria efetividade da democracia. Afinal, um país que não conhece sua realidade, especialmente aquela que atravessa os grupos mais vulnerabilizados, é incapaz de promover justiça social. É com estes mecanismos que identificamos obstáculos, monitoramos ações e buscamos novas e melhores formas de promover a igualdade, a justiça e a dignidade”, declarou a secretária-executiva do MDHC, Rita de Oliveira.

“No campo da segurança pública, a gente vai vendo que é um desafio que políticas públicas sejam pautadas em evidências, não mais em achismos ou outros. É preciso utilizar os dados, fazer com que eles estejam no cotidiano dos gestores para, assim, termos capacidade de mensurar, avaliar e corrigir algumas políticas e implementar outras”, endossou o pesquisador sênior do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Leonardo de Carvalho Silva, frisando a importância de um processo regular e contínuo de produção de informações.

Para o ministro Silvio Almeida, o aprimoramento de instâncias como a Renedh e de ferramentas como o ObservaDH é um passo importante para institucionalizar a política de direitos humanos, transformando-a em uma política de Estado. “Precisamos ter institucionalidade. A política de Direitos Humanos tem que ser uma política de Estado, institucional. Ela não pode depender da vontade do ministro de Direitos Humanos [da vez] ou do presidente da República”, concluiu Almeida.

Hang é condenado a pagar R$ 85 mi por coagir empregados em eleição

O juiz Carlos Alberto Pereira de Castro, da 7a Vara do Trabalho de Florianópolis, condenou o empresário Luciano Hang, dono da rede de lojas Havan, ao pagamento de R$ 85 milhões em multa por ter coagido os empregados a votar em Jair Bolsonaro na eleição presidencial de 2018. Cabe recurso da decisão. 

A sentença foi proferida em ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT). O órgão alegou que Hang realizou campanha política dentro de lojas da Havan com participação obrigatória dos empregados. 

Segundo a acusação, Hang ameaçou despedir funcionários e fechar lojas da Havan se Fernando Haddad, então candidato do PT e adversário de Bolsonaro, fosse eleito presidente da República. Os empregados teriam sido ainda constrangidos a responder a enquetes dentro dos estabelecimentos, respondendo em quem votariam. 

Os promotores responsáveis pelo caso afirmaram que “os réus valeram-se de sua condição de empregadores para impor sua opinião política a respeito dos candidatos à Presidência da República e para vincular, de maneira absolutamente censurável, a manutenção dos postos de trabalho de seus colaboradores”. 

Ainda segundo a acusação, tais atos teriam sido replicados nas filiais da Havan. Em decisão assinada em 22 de janeiro, o magistrado à frente do caso confirmou uma liminar (decisão provisória) concedida ainda em 2018 e determinou o pagamento de R$ 500 mil para cada loja em funcionamento à época dos fatos. 

O juiz ordenou também o pagamento de R$ 1 milhão a título de danos morais coletivos, e estabeleceu indenização de R$ 1 mil para cada funcionário que tivesse vínculo empregatício com a Havan em outubro de 2018. O total a ser pago chega a R$ 85 milhões, pelos cálculos da Justiça do Trabalho. 

Na decisão, o juiz Carlos Alberto Pereira de Castro escreveu que Hang teria reeditado o antigo “voto de cabestro”, no qual pessoa dotada de maior poder numa comunidade busca impor sua escolha política aos demais. 

Da análise dos autos, o magistrado concluiu que o empresário “não só fez campanha para um candidato às eleições, mas colocou em xeque a continuidade de todos os contratos de trabalho firmados pela ré Havan, caso houvesse resultado desfavorável sob a sua ótica”.

“O tom da fala do réu aponta no sentido de uma conduta flagrantemente impositiva e amedrontadora de suas ideias quanto a pessoa do candidato que eles, seus empregados, deveriam apoiar e eleger”, diz outro trecho da decisão. 

Em nota, o empresário Luciano Hang classificou a condenação de “descabida e ideológica”, e chamou a sentença de “total absurdo”.

“Inclusive, na época dos acontecimentos foram feitas diversas perícias nomeadas pela própria Justiça do Trabalho e nada ficou comprovado, não houve irregularidades. O juiz deveria seguir as provas, o que não fez, seguiu a sua própria ideologia. Mais uma vez o empresário sendo colocado como bandido”, complementa o texto. 

Hang acrescentou que cumpriu todas as determinações da Justiça trabalhista ainda à época dos fatos. “Tudo foi feito de modo a garantir a liberdade dos colaboradores. Afinal, temos até hoje em nosso quadro, colaboradores de várias outras ideologias políticas. Aliás, importante lembrar que o voto é secreto e cada um votou conforme sua convicção”, disse o empresário. 

“Estamos tranquilos e vamos recorrer da decisão, afinal, nada foi feito de errado e isso já havia sido comprovado lá atrás. Ainda acreditamos na Justiça brasileira”, concluiu.  

Brasil quer pautar agenda internacional com o combate às desigualdades

Pela primeira vez na história, o Brasil ocupa a presidência temporária do G20 – um fórum de cooperação internacional que reúne as 19 principais economias do mundo, a União Europeia e a União Africana. 

O mandato brasileiro, iniciado em 1º de dezembro do ano passado, terá duração de um ano e se encerrará em 30 de novembro. Nesse período, o Brasil organizará mais de uma centena reuniões de grupos de trabalho e cerca de 20 reuniões ministeriais. À frente e nos bastidores de alguns desses eventos estará o embaixador de Maurício Lyrio, que ocupa a função de “Sherpa do Brasil para o G20“. 

Originalmente, o termo sherpa designa o nome de um povo que guia alpinistas nas montanhas do Himalaia, no Sudeste asiático – uma região composta por territórios da China, do Tibete, da Índia, do Paquistão, Butão e Nepal. Na diplomacia, sherpa designa os articuladores e negociadores em cúpulas de chefes de Estado e governo, como a que ocorrerá entre os dias 18 e 19 de novembro, no Rio de Janeiro.

Para o embaixador, a presidência do Brasil no G20 cria oportunidades para “associar as agendas da inclusão social e da sustentabilidade ambiental ao imperativo do desenvolvimento econômico.” Por escrito, Maurício Lyrio concedeu entrevista à Agência Brasil.

 

Agência Brasil – O presidente Lula tem dito que a presidência do Brasil no G20 talvez seja a oportunidade mais importante do país no cenário internacional. Qual é a relevância do Brasil presidir o grupo neste ano? O que o país pode conseguir com essa presidência?

Maurício Lyrio – Na reunião da Comissão Nacional do G20, o Presidente Lula foi muito claro: o G20 é uma prioridade de todo o governo. Não tenho dúvidas de que a presidência do G20 é uma das principais oportunidades que o Brasil tem de apresentar ao mundo os seus vários atributos e, ao mesmo tempo, comunicar suas prioridades de políticas públicas e relações exteriores. Teremos mais de 100 reuniões no Brasil, distribuídas em 15 cidades. Em 2024, com o G20, o Brasil consolida sua volta ao centro da agenda internacional. Buscaremos associar as agendas da inclusão social e da sustentabilidade ambiental ao imperativo do desenvolvimento econômico. Em particular, com o lançamento da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, o Brasil procura trazer o tema do combate às desigualdades para o centro da agenda internacional. 

Agência Brasil – Entre as agendas prioritárias definidas pelo Brasil no G20 está a reforma da governança global. Como fazer essa agenda avançar no G20? Afinal, espera-se que tal reforma reduza o poder das atuais potências nos fóruns multilaterais, o que deve gerar resistências a mudanças.

Maurício Lyrio – Uma das prioridades da presidência brasileira do G20 é o revigoramento do multilateralismo e a promoção da reforma das instituições de governança global. Muitas das organizações internacionais foram concebidas na década de 1940, refletindo uma realidade que não existe mais. À medida que o sistema internacional evolui para uma configuração mais multipolar, é essencial que essas instituições atualizem suas estruturas, para melhor representar seus membros e entregar resultados concretos. A presidência brasileira do G20 adota como premissa que apenas com um sistema multilateral revigorado será possível alcançar a paz, a estabilidade e o desenvolvimento sustentável inclusivo. 

Como mencionou o Presidente Lula no G7, em maio de 2023, não faz sentido apelar aos países em desenvolvimento para que contribuam para a resolução das crises de hoje sem que as suas preocupações sejam discutidas e sem que estejam adequadamente representados nos órgãos internacionais.

Agência Brasil – Outra prioridade é a agenda do desenvolvimento sustável por meio das três dimensões (social, econômica e ambiental). Como o G20 deve atuar nesse tema e qual será a proposta do Brasil?

Maurício Lyrio – O G20 tem um papel importante na mobilização de recursos para enfrentar os desafios globais no campo da sustentabilidade. O desenvolvimento econômico sustentável visa, além do crescimento, a garantia de que não ocorra às custas das gerações futuras. Políticas econômicas sustentáveis priorizam a criação de empregos, inovação e investimento em setores que promovem a prosperidade a longo prazo, reduzem as desigualdades e preservam o meio ambiente. É isso que está por trás do chamado “desenvolvimento sustentável em três pilares” (social, econômico e ambiental). 

No campo da mudança do clima, a presidência brasileira do G20 criou uma Força-Tarefa para a Mobilização Global contra as Mudanças Climáticas, com o objetivo de reforçar a resposta coordenada do G20 à mudança do clima. A ideia é reforçar o papel dos planos nacionais de transformação ecológica e dar fôlego ao envolvimento do setor financeiro na ação climática.

Agência Brasil – As guerras na Ucrânia e no Oriente Médio somadas as crescentes tensões ao redor do mundo, como a disputa comercial/tecnológica entre China e Estados Unidos e os golpes militares na África, parecem mostrar um mundo em crescente fragmentação e conflagração. Nesse contexto, como fazer com que o G20 tenha eficiência em coordenar respostas aos desafios globais?

Maurício Lyrio – De forma realista, não se pode esperar que o G20 esteja totalmente imune a conflitos e rivalidades internacionais. Assim, é ainda mais importante que o Brasil defenda o revigoramento do multilateralismo e a reforma dos organismos multilaterais. Precisamos que o sistema multilateral seja capaz, por meio do diálogo e da negociação, de dar respostas aos conflitos e desafios mencionados em sua questão. Por isso, o Brasil defende a reforma das instituições internacionais – para que esses órgãos sejam mais representativos e eficazes na busca da paz e do desenvolvimento.

*Colaborou o repórter Gilberto Costa

Corpo de Zagallo é sepultado no Rio de Janeiro sob aplausos

Foi sepultado no final da tarde deste domingo (7) o corpo do ex-técnico Mário Jorge Lobo Zagallo, no cemitério São João Batista, zona sul do do Rio de Janeiro. O caixão saiu da sede da CBF, na zona oeste da cidade, sobre um carro do Corpo de Bombeiros e depois carregado por militares até o túmulo. Afinal, em 1950, Zagallo era policial do Exército e assistiu fardado a decisão histórica da Copa do Mundo entre Brasil e Uruguai, no Maracanã.

Poucas estrelas do futebol compareceram ao enterro. Entre elas, Cafu, capitão da seleção brasileira, pentacampeã mundial (2002). 

“Foi uma relação que começou em 1993, de pai e filho, técnico e jogador” 

Inicialmente, apenas familiares e amigos poderiam participar da última despedida ao ex-treinador e jogador. Mas admiradores e fãs – com camisas da seleção Brasileira, do Botafogo, Flamengo e outros clubes – comparecer ao enterro, rendendo as últimas homenagens ao Velho Lobo.  

Aplausos não faltaram no adeus a Zagallo, sepultado no jazigo da família, ao lado da mulher Alcina, com quem foi casado por 57 anos, teve quatro filhos e foi responsável superstição do número 13. 

Dor e legado revolucionário: morte de Chico Mendes completa 35 anos

“Se descesse do céu um anjo e dissesse que a minha morte ajudaria a salvar a Amazônia, morreria de bom grado. Mas a história tem nos mostrado que não são atos públicos numerosos e concorridos que vão salvar a Amazônia. Por isso, eu quero viver”. As frases de Chico Mendes são declamadas e não saem da memória do grande amigo, companheiro de luta e assessor, o engenheiro agrônomo Gomercinco Rodrigues, o Guma. 

Hoje, aos 64 anos de idade, ele lembra com detalhes, ainda emocionado, sobre a conversa que teve no dia do assassinato do ecologista, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri, no Acre, há exatos 35 anos, e também sobre o legado imensurável do líder seringueiro. 

Afinal, foi na tarde daquele 22 de dezembro de 1988 que Guma havia encontrado Chico Mendes e conversado sobre o futuro dos trabalhadores rurais, mas também sobre preocupação com a segurança do ativista. “Eu estive com ele minutos antes do assassinato na casa dele. Eu falei para ele que estava preocupado (por causa de movimentação de pistoleiros)”,  relembra.

Depois que deixou a casa, Guma soube que o amigo havia sido alvejado por um tiro de espingarda no peito quando saía para tomar banho. A investigação levou às prisões de Darcy Alves da Silva, que teria cometido o crime a mando do pai, o fazendeiro Darly Alves da Silva.

Quando Guma retornou à casa de Chico Mendes (minutos depois), ele estava sendo socorrido. “Na cidade (de Xapuri), havia poucos carros. Eu voltei correndo e saí de moto pela cidade procurando ajuda”, recorda. Foi em um veículo de um vereador de cidade que Chico foi resgatado. Mas morreu logo depois no hospital. “Comecei a ligar para as pessoas para dar informação. Eu estava chorando”.

Investigação

Com receio da impunidade, naquela mesma noite, ele e outros ativistas criaram, no Acre, o Comitê Chico Mendes para cobrar das autoridades uma investigação célere e punição aos culpados. “Eu acompanhei a reconstituição. Eu fiquei com dúvidas. Havia provas contra os envolvidos, mas existia gente que apoiava e que financiava. Nesses, nunca se chegou”, observa.

A atual coordenadora do Comitê Chico Mendes é a filha dele, a ativista e militante socioambiental Ângela Mendes. “A ideia do comitê surgiu, na verdade, na noite do assassinato do meu pai, como uma estratégia de mobilização da sociedade para pressionar pela punição dos criminosos. Havia um cenário de medo e impunidade”, argumenta. Um cenário, aliás, que vigora até hjoje, 35 anos depois. 

Em setembro de 2023, a organização não governamental Global Witness divulgou que – um em cada cinco assassinatos de defensores da terra e do meio ambiente no mundo (crimes registrados no ano passado) – ocorreram na Amazônia. No Brasil, foram 34 assassinatos no ano passado (incluindo o indigenista Bruno Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips) e 26 em 2021. Na década, 376 ativistas morreram no Brasil. Leia mais aqui.

“Naquela época, não era diferente. Para que isso não ficasse no esquecimento, os companheiros e companheiras, na noite do assassinato, criaram esse espaço de mobilização, mas também de acompanhamento de casos como o do Chico Mendes e do seringueiro Wilson Pinheiro (assassinado em julho de 1980)”, afirma Ângela Mendes. Desde então, entre 15 de dezembro (data de aniversário de Chico) e o dia 22, o comitê realiza uma semana de mobilização para tratar sobre a situação atual dos trabalhadores da floresta.  

Ângela tinha 19 anos de idade e estava em Rio Branco quando recebeu a notícia da morte do pai. Ela estava na casa dos tios, com quem conviveu mais tempo. Ela foi criada na capital do Acre com os familiares para estudar e acabou se aproximando mais de Chico Mendes no final da adolescência.

“Depois que ele foi assassinado, um amigo do meu pai disse que a intenção dele era que eu fosse para Xapuri trabalhar com ele no sindicato. Nós fomos nos reaproximando e tentando recuperar esse tempo que a gente ficou distante. Ele era um pai muito carinhoso. Ele me tratava muito bem, assim como tratava meus dois irmãos”, recorda.

Enquanto Ângela buscou atuar pela causa ambiental, o amigo Guma fez um curso de Direito para se formar advogado e lutar de outras formas contra a impunidade e violência que atingem os trabalhadores rurais. “Como advogado, eu já atuei muitas vezes em causas que começaram lá naquela época. Atuo até hoje em processos de direito de posse, por exemplo”, exemplifica.

Legado

No entender da filha e de Guma, o legado mais importante de Chico Mendes foi a ideia “revolucionária” da criação de reservas extrativistas, algo que só vigorou após a morte do sindicalista. “É um modelo de área protegida com segurança jurídica e física para as pessoas”, opinam.  

A proposta que nasceu do seringueiro se espalhou pelo Brasil após a morte dele. O Ministério do Meio Ambiente considera Reserva Extrativista como um tipo de unidade de conservação de uso sustentável. “Estão baseadas na agricultura de subsistência e criação de animais de pequeno porte. Tem como objetivos básicos proteger os meios de vida e a cultura dessas populações (…)”, indica o ministério.

Ângela Mendes entende que as reservas, além de serem eficazes no enfrentamento e no combate à crise climática, também são muito eficazes na manutenção da vida e dos direitos das pessoas em seus territórios.

“Precisa que o poder público cumpra com o seu papel de, através da construção, da criação e da disponibilização de políticas públicas para esses cidadãos, sejam garantidos serviços e qualidade de vida”, diz Ângela. A primeira reserva foi criada em 1990, no Alto Juruá, dois anos depois da morte de Chico Mendes. 

“Oficialmente, são 66 reservas extrativistas sob gestão do governo federal. De gestão estadual, oscilam entre 40 e 50. [Elas] estão nessa média. Essas reservas extrativistas prestam esse papel importante como modelo de desenvolvimento sustentável”, enfatiza. O que começou com os seringueiros ganhou outras características como as reservas extrativistas marinhas”.

Revolução

Para o engenheiro agrônomo Gomercindo Rodrigues, trata-se de uma ação revolucionária. “Eu acho que é esse o grande legado. Não é algo só aplicado à Amazônia. São bens marinhos, ou no mangue ou com as quebradeiras de côco. É um modelo que não propõe que os lugares sejam santuários, mas sim que aqueles locais possam ser explorados pelas populações tradicionais que já conhecem para usá-los sem destruí-los”. Ele recorda que a ideia da reserva extrativista foi lançada no primeiro Encontro Nacional de Seringueiros, de 10 a 17 de outubro de 1985, em Brasília.

Para Rodrigues, que passou a pesquisar os efeitos das reservas, a proposta é de desenvolver sem destruir. “Essa é uma grande discussão das mudanças climáticas. Desenvolver sem aumentar a poluição, sem aumentar a emissão de gases poluentes. Isso foi visionário. Chico sempre foi alguém à frente do tempo dele”, disse Rodrigues, que é autor do livro Caminho da Floresta. Como ativista, participou das técnicas de empate (quando trabalhadores enfileirados ocupam a floresta para tentar evitar o desmatamento). “Eu caminhei muito pelos seringais”, recorda.

O agrônomo Gomercindo elenca ainda outro aprendizado com Chico Mendes: o poder de estabelecer alianças. “Ele sabia que não se conseguia nada sozinho”, relembra. Ele acompanhou a implementação, por exemplo, do projeto Seringueiro, em 1986, que era desenvolvido para alfabetização de adultos e tinha como uma das metas criar cooperativas. 

Preservação da memória

Para a ativista Ângela Mendes, essa habilidade dele em conseguir reunir diferentes grupos fez a diferença. Para ela, empresários conseguiram criar rixas entre trabalhadores, mas o pai era perspicaz em mostrar que todos deveriam atuar juntos. “Indígenas, ribeirinhos, quilombolas, pessoas moradoras das periferias, das cidades, de populações que sempre estiveram à margem dos direitos, sempre invisibilizadas”, enfatiza.

Ela explica que o Comitê Chico Mendes atua, também, na preservação da memória e contra o apagamento da história do líder sindicalista. “Nos últimos anos, tentaram reduzir a importância do Chico Mendes. A casa dele, que é um memorial em Xapuri, ficou fechada, sendo reaberta apenas em 2023. A estátua dele, no centro da cidade, foi deliberadamente jogada ao chão e só voltou a ser erguida por um movimento que nós fizemos”, revela. 

A luta da mãe encanta a filha desde a adolescência. Tanto que Angélica Francisca (em homenagem ao avô) Mendes, de 34 anos, é bióloga e cursou mestrado e doutorado no campo da ecologia. 

Ela atua como analista de conservação na Organização Não Governamental (ONG) internacional WWF. “As reservas extrativistas são um modelo de unidade de conservação de uso sustentável. Mas eu acho que a maior lição que ele deixou para mim é a esperança. Ele foi um agente de luta”, enfatiza. As lições de não desistir, persistir nas dificuldades e conseguir cativar aliados iluminam os olhos da neta.

A pesquisadora lembra que a mãe atuava numa ONG chamada Centro dos Trabalhadores da Amazônia, que fazia assistência de técnica, de saúde e de educação para a região. “Eu tinha muito isso na cabeça. Eu queria fazer alguma coisa parecida. Por isso, resolvi fazer Biologia”.

No trabalho dela, na WWF, participa de um projeto de sensibilização para a Amazônia. “Eu estou trabalhando como coordenadora do projeto Vozes pela Ação Climática Justa. Ele ocorre em sete países e tem vários parceiros aqui no Brasil”.

Pela memória do avô, pela luta da mãe, a bióloga pratica o que foi ensinado em família. “A gente não está sozinha. Nós temos na Amazônia aqui uma juventude também potente que está junto com a gente nessa luta”, finaliza.

Defesa de Bolsonaro diz que postagem após 8 de janeiro foi “acidental”

A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta terça-feira (19) ao Supremo Tribunal Federal (STF) que a publicação de um vídeo após os atos golpistas de 8 de janeiro foi feita de forma acidental. A gravação foi apagada por Bolsonaro duas horas após a postagem, mas foi recuperada na semana passada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).

No dia 13 de janeiro deste ano, o ministro Alexandre de Moraes incluiu Bolsonaro na investigação sobre a invasão às sedes do Três Poderes, para apurar se o ex-presidente incitou os atos ao compartilhar o vídeo nas redes sociais no dia 10 de janeiro. A gravação tinha como tema o questionamento da regularidade das eleições de 2022, levantado por um procurador do estado de Mato Grosso, durante entrevista à Rádio Hora 92,3.

A petição dos advogados de Bolsonaro contesta a inclusão do vídeo na investigação pela PGR. Segundo a defesa, o vídeo foi retirado da plataforma Metamemo.org, sendo necessária uma perícia para analisar a veracidade da gravação.

“É preciso cautela ao se analisar o referido conteúdo como prova, uma vez que a mera associação entre um vídeo apagado e um supostamente salvo não pode ser tomada como uma correspondência definitiva. Afinal, estamos lidando com contextos e provedores diferentes. A noção de que o vídeo recuperado reflete fielmente o conteúdo do vídeo deletado é uma conjectura sensível, porém, longe de ser uma afirmação incontestável”, afirma a defesa.

Antes da recuperação da gravação, Alexandre de Moraes deu prazo de 48 horas para o Facebook enviar o vídeo à Corte, no entanto, a plataforma informou que a publicação foi apagada por Bolsonaro e “não está disponível nos servidores da empresa”.

Governadora Fátima Bezerra vai presidir Consórcio Nordeste

A governadora do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra, foi eleita, por unanimidade, presidente do Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável do Nordeste, durante reunião realizada nessa quarta-feira (13), no Instituto Ricardo Brennand, no Recife.

Fátima será a primeira mulher a assumir o comando da entidade. Ela falou das prioridades de sua gestão à frente do consórcio em conjunto com os demais governadores nordestinos.

“Nesse contexto, nossa prioridade agora em 2024 vai ser acelerar o PAC [Programa de Aceleração do Crescimento]. Só para o Nordeste está destinada uma carteira da ordem de R$ 700 bilhões. Porque nós estamos falando de investimento de estradas, a infraestrutura viária, com duplicação de estradas do Rio Grande do Norte a todos os estados que compõem o Nordeste, nós estamos falando de investimentos na área da segurança hídrica, consolidar o São Francisco, [isso é] fundamental.”

A governadora potiguar também destacou o planejamento conjunto do Nordeste, por meio do consórcio, no avanço dos investimentos em energias renováveis.

“O Nordeste já [está] no centro dessa agenda da transição energética com um potencial imenso. Afinal de contas, a região é líder de produção de energia eólica em nível nacional, e agora também preparar o Nordeste para adentrar na offshore, que é exatamente a energia no mar. Para tanto, o compromisso do governo federal de expandir as chamadas linhas de transmissão, para que o Nordeste possa concretizar cerca de R$ 140 bilhões, que são projetos já contratados na expansão das energias renováveis na nossa região.”

O Consórcio Nordeste foi criado em 2019 para ser o instrumento jurídico, político e econômico de integração dos nove estados da região. Tem como objetivo atrair investimentos, alavancar projetos, realizar compras conjuntas e implementar políticas públicas de interesse coletivo das nove unidades da federação, inclusive em nível internacional.

A posse de Fátima Bezerra na presidência do conselho está prevista para fevereiro do próximo ano. Quem chefia a entidade desde dezembro do ano passado é o governador da Paraíba, João Azevedo.

Ouça na Radioagência Nacional: