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Somália expulsa embaixador da Etiópia e ordena fechamento de dois consulados

5 de abril de 2024

 

A Somália disse que expulsou o embaixador da Etiópia e ordenou o encerramento de dois consulados – um na região semi-autónoma da Puntlândia e um na região separatista da Somalilândia – numa disputa sobre um acordo portuário.

“A clara interferência do governo da Etiópia nos assuntos internos da Somália é uma violação da independência e da soberania”, afirmou o gabinete do primeiro-ministro da Somália num comunicado quinta-feira.

A decisão seguiu-se a uma reunião de gabinete presidida pelo primeiro-ministro Hamza Barre em Mogadíscio.

Uma declaração separada do Ministério das Relações Exteriores da Somália disse que ordenou ao embaixador etíope Muktar Mohamed Ware que deixasse o país dentro de 72 horas, a partir de quinta-feira.

Numa entrevista, o ministro da Informação do país, Daud Aweis Jama, disse que a decisão ocorreu no momento em que a Etiópia continuava a interferir nos assuntos internos da Somália.

“Hoje em dia, a Etiópia tem violado repetidamente a independência nacional e territorial da Somália. Portanto, o governo tomou a decisão de fechar dois consulados etíopes e enviar [o] embaixador etíope em Mogadíscio e o seu pessoal diplomático de volta ao seu país”, disse Aweis.

 

Geovana Meyer carimba 3ª vaga olímpica do Brasil no tiro esportivo

A brasileira Geovana Meyer assegurou a terceira vaga olímpica do país no tiro esportivo ao faturar a prata no Pan-Americano de Rifle e Pistola, em Buenos Aires (Argentina), qualificatório para os Jogos de Paris. Nesta quarta-feira (3), a catarinense foi a segunda colocada na final da disputa feminina da carabina três posições, ao somar 455.9. Em princípio, apenas a vencedora – a norte-americana Sagen Maddalena (460.5) – teria direito à vaga, mas ela foi automaticamente transferida para Geovana, porque Maddalena já havia garantido presença nos Jogos. O bronze ficou com a canadense Shannon Westlake (443.2).

ALERTA DE VAGA OLÍMPICA! 🚨🇧🇷

Geovana Meyer conquista vaga para o Time Brasil na carabina de 3 posições do Tiro Esportivo! 🔫

A classificação para Paris 2024 veio após a brasileira ganhar a medalha de prata no Campeonato das Américas, em Buenos Aires 🇦🇷

Mandou bem demais, que… pic.twitter.com/HRKeUPC7pL

— Time Brasil (@timebrasil) April 3, 2024

O Pan-Americano de Buenos Aires, que prossegue até domingo (7), é a penúltima competição que garante pontos no ranking olímpico, cujo fechamento será em 9 de junho. A última seletiva para Paris 2024 começa no próximo dia 11 de abril, no Centro Militar de Tiro Esportivo (CMTE), em Deodoro, no Rio de Janeiro.

As outras duas vagas do Brasil na modalidade são na pistola de ar 10m masculina, conquistada por Philipe Chateaubrian- ouro no Pan-Americano da modalidade em Lima (Peru) em 2022 – e também no skeet feminino, assegurada em março por Geórgia Furquim, no Campeonato das Américas, na Santo Domingo (República Dominicana). Com a classificação hoje de Geovana Meyer, o Brasil já totaliza 171 vagas nos Jogos de Paris.

Comissão reconhece Clarice Herzog como anistiada política

“Nenhum Estado tem direito de abusar de seu poder e investir contra seus próprios cidadãos”. Com estas palavras, a presidenta da Comissão de Anistia, a advogada Enéa de Stutz e Almeida, proferiu, nesta quarta-feira (3), um pedido de desculpas do Estado brasileiro à jornalista e publicitária Clarice Herzog, vítima da perseguição estatal durante o regime militar (1964-1985).

A concessão da declaração de anistiada política à viúva do jornalista Vladimir Herzog, torturado e morto em outubro de 1975, nas dependências do Departamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), do Exército, em São Paulo, foi aprovada por unanimidade. O julgamento do requerimento de anistia ocorreu em conjunto com um seminário que a Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados realizou para lembrar os 60 anos do golpe civil-militar de 1964.

Além de declarar Clarice anistiada política e pedir desculpas em nome do Estado brasileiro pela perseguição estatal que a jornalista e publicitária sofreu por anos, por contestar a versão oficial de que seu marido havia se enforcado em uma sala do Doi-Codi enquanto aguardava para prestar depoimento, a Comissão de Anistia aprovou o pagamento de uma indenização equivalente a 390 salários mínimos (cerca de R$ 550 mil), mas, com o teto legal, a viúva receberá R$ 100 mil. 

“A partir da análise conjunta da narrativa, do material probatório [reunido no processo] e do contexto histórico, são incontestes os atos de exceção mencionados e a inequívoca motivação política dos mesmos”, afirmou a relatora do processo, a conselheira Vanda Oliveira, ao proferir seu voto. “Fica claro que a requerente [Clarice] sofreu prejuízos decorrentes da atuação da ditadura militar instalada no Brasil em 1964, devido à privação da convivência familiar com seu marido, morto por motivação exclusivamente política”.

Segundo as informações apresentadas pelos representantes legais de Clarice, após assumir a direção de jornalismo da TV Cultura, Vladimir Herzog passou a ser “hostilizado por integrar o Partido Comunista”. Na manhã de 25 de outubro, ele se apresentou voluntariamente no DOI-Codi a fim de prestar esclarecimentos sobre sua atuação política e profissional. Horas mais tarde, Clarice recebeu a informação de que o marido tinha se matado.

“Desde então, ela tem travado uma luta contínua e permanente para esclarecer as circunstâncias e os responsáveis pela morte de Vlado. Viúva aos 34 anos de idade, Clarice foi a primeira [pessoa] a romper o silêncio e dizer “mataram o Vlado”, conduzindo os dias seguintes à morte com intervenções que davam cada vez mais visibilidade ao que tinha acontecido”, pontuou a conselheira Vanda Oliveira.

“Dali para frente, Clarice travou muitas lutas. A primeira contra a mentira forjada pelo Exército de que Vlado havia cometido suicídio. ‘Mataram Vlado’: uma frase que, não podendo ser escrita pelos jornalistas, passou a correr de boca em boca como uma senha contra a farsa montada pelos militares. Clarice não recuou diante de ameaças anônimas que recebeu por telefone. Nem com a constante vigilância policial montada diante de sua casa”, acrescentou a relatora, lembrando que, já em 1978, em pleno regime de exceção, Clarice recorreu à Justiça contra o Estado brasileiro e, em um fato histórico, obteve uma sentença do juiz Márcio José de Moraes condenando o Estado pela morte de Vladimir e obrigando-o a indenizar a família do jornalista. Em 2013, 38 anos após o crime, Clarice conseguiu a retificação do atestado de óbito, fazendo constar que seu marido foi mais uma vítima da violência do Estado brasileiro.

“A longa resistência de Clarice é uma luz que ilumina os erros que o país tem cometido diante da sua própria história. Ao ser tão determinada, ela ajudou o Brasil, um país que se acostumou ao esquecimento e à impunidade”, afirmou a relatora, lembrando que outras pessoas, como os jornalistas Rodolfo Konder e George Benigno Duque Estrada, que estavam nas dependências do Doi-Codi no mesmo dia, e o rabino Henry Sobel, que se recusou a enterrar Vlado no espaço do cemitério israelita destinado aos suicidas, entre outras, também passaram a questionar abertamente a versão oficial.

“Minha mãe nunca quis nenhuma reparação financeira”, destacou o engenheiro Ivo Herzog, filho de Vlado e Clarice e autor do requerimento de reparação à mãe, que, aos 82 anos e com Alzheimer, precisa de cuidados especiais. “Minha mãe não queria que se pagasse pela morte do meu pai. Tomei a decisão de entrar com este processo porque agora ela precisa”, disse Ivo ao lembrar um episódio com o escritor Marcelo Rubens Paiva, cujo pai, o ex-deputado federal Rubens Paiva, também foi morto pelo regime.

Ivo Herzog, filho de Clarice Herzog chora durante seu discurso na Comissão de Anistia- Lula Marques/ Agência Brasil

“O Marcelo Rubens Paiva me disse: “Teu pai, meu pai, eles não foram heróis. Foram vítimas. As verdadeiras heroínas foram as companheiras deles. As mães, irmãs e tantas outras que dedicaram suas vidas, com coragem, à busca pela verdade e justiça. Agradeço esta homenagem da Comissão de Anistia a Clarice Herzog, uma destas heroínas. Tenho muito orgulho de ser filho dela. E acho que todos devemos nos sentir muito privilegiados em termos tido Clarice e tantas outras heroínas ao nosso redor, lutando pela democracia neste país”.

Barroso libera para julgamento processo sobre foro privilegiado

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, liberou nesta terça-feira (1º) para julgamento o processo que trata do foro privilegiado para políticos. 

O julgamento foi suspenso na semana passada após um pedido de vista de Barroso. A retomada do julgamento virtual será no dia 12 de abril. 

Até o momento, o placar do julgamento está 5 a 0 pela ampliação do foro por prerrogativa de função, nome técnico do foro privilegiado. O julgamento vai atingir deputados federais e senadores que respondem a processos na Corte. 

O voto do ministro Gilmar Mendes, relator do caso, está prevalecendo no julgamento. Para o ministro, o foro privilegiado de um político fica mantido se o crime tiver sido cometido durante o exercício da função de parlamentar. Essa é a regra válida atualmente. Contudo, no caso de renúncia, não reeleição ou cassação, o processo seria mantido no STF. 

Além de Mendes, já votaram no mesmo sentido os ministros Dias Toffoli, Flávio Dino, Cristiano Zanin e Alexandre de Moraes. 

A Corte julga um habeas corpus do senador Zequinha Marinho (Podemos-PA). O parlamentar é acusado de “rachadinha”, por ser suspeito de exigir parte do salário de funcionários de seu gabinete, em 2013, quando ele era deputado federal. 

Ao longo do tempo, o político foi eleito vice-governador do Pará e senador, e o processo foi transferido para instâncias da Justiça. 

Golpe: debate deve ir além da academia, diz responsável por arquivos

Arte/Agência Brasil

Em entrevista exclusiva à Agência Brasil, a diretora de Processamento Técnico, Preservação e Acesso ao Acervo (DPT) do Arquivo Nacional, Gabrielle Abreu, promete expandir, para além das universidades, as parcerias do projeto Memórias Reveladas, que reúne os arquivos sobre os anos de chumbo no Brasil (1964-1985), envolvendo também escolas de educação básica, meios de comunicação e movimentos sociais.  

Empossada no início deste mês, a mestre em história comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) ressaltou que é comprometida com a luta pela memória sobre a ditadura civil-militar brasileira e que o período é chave para compreender o presente e o futuro do país.

“Esse é um tema muito caro para mim, é a agenda da minha vida”, revelou a historiadora. Gabrielle atuou nos últimos anos na área de Memória e Verdade e Justiça do Instituto Vladimir Herzog, organização não-governamental que leva o nome do jornalista da TV Cultura assassinado pela ditadura.

Criado em 2009, o projeto Memórias Reveladas coloca à disposição do país os arquivos que contam a história das lutas de resistência à ditadura militar durante as décadas de 1960 a 1980. A historiadora afirmou que o projeto foi esquecido pelo governo Bolsonaro e reconhece que falta pessoal, já que apenas dois servidores estão lotados no programa. Por outro lado, lembrou que o projeto virou uma Divisão, ganhando importância institucional dentro do Arquivo Nacional.

Entre as iniciativas previstas para este ano está a retomada do Prêmio Memórias Reveladas, que valoriza iniciativas que promovam a memória sobre a ditadura brasileira. A última edição do prêmio foi de 2017.

Segundo Gabrielle, o objetivo é “premiar produções acadêmicas, artigos científicos sobre a temática, mas também projetos educacionais, valorizando o que tem sido feito no chão da escola sobre esse tema, e também produtos comunicacionais”.

Devido à proximidade temporal da última ditadura, a diretora destacou que ela ainda produz efeitos no presente. “A maneira como os ditadores, os militares especialmente, conduziram esse processo faz com que hoje a gente ainda viva com muitas reverberações desse período”, avaliou.

Confira a entrevista completa:

A diretora de Processamento Técnico, Preservação e Acesso ao Acervo do Arquivo Nacional, Gabrielle Abreu. Foto: Ascom Arquivo Nacional

Agência Brasil: Qual a importância de revelar as memórias sobre a ditadura civil-militar (1964-1985)?
Gabrielle Abreu: É importante uma compreensão total da nossa história, enquanto nação, algo que no Brasil é muito negligenciado. Infelizmente, somos um país com pouco apreço à nossa memória, com dificuldades de conhecer a nós mesmos.

Nesse sentido, nenhum período se sobrepõe em relação a outro, mas eu acho que a história da ditadura militar brasileira acaba sendo um período muito chave para a compreensão dos acontecimentos mais recentes. Por isso, jamais, por parte da gestão do Arquivo Nacional, vai haver uma movimentação no sentido de esvaziar essa pauta dentro do órgão.

Tal como outros períodos históricos, é um período chave para uma compreensão do nosso presente, porque há muitas continuidades, muitos desdobramentos desse período. É um período chave para uma compreensão do presente e até mesmo do futuro.

Agência Brasil: Como é essa conexão da ditadura com o presente e o futuro?
Gabrielle Abreu: Não dá para abrir mão de uma reflexão crítica sobre o passado. E isso a partir de qualquer período histórico. Se a gente for pensar a linha do tempo histórico, a ditadura ocorreu muito recentemente. Dada essa proximidade temporal, a gente ainda vai viver certos efeitos dela.

A ditadura militar que vigorou no Brasil de 1964 a 1985 tinha um elemento muito específico se comparado aos outros regimes autoritários que ocorreram em países vizinhos ao Brasil no mesmo período. Aqui se tentou mascarar o caráter ditatorial e dar certa legitimidade ao regime.

As ditaduras não se sustentam só com repressão e violência. Parece paradoxal, mas existia também a construção de um conjunto de valores, de ideologias, que foram pensadas para dar musculatura a esse regime e fez com que ele vigorasse por tanto tempo, por 21 anos. A maneira como os ditadores, os militares especialmente, conduziram esse processo faz com que hoje a gente ainda viva com muitas reverberações desse período.

Agência Brasil: Você assumiu recentemente a Diretoria responsável pelo Memórias Reveladas. Quais novas ações e medidas serão tomadas para fortalecer esse projeto?
Gabrielle Abreu: O que está sendo pensado para o Memórias Reveladas já vinham sendo pensadas antes da minha chegada, obviamente, mas ganham um novo fôlego a partir da minha aproximação.

No finalzinho do ano passado, houve uma reestruturação e o Memórias Reveladas passou a ser uma divisão dentro da estrutura do Arquivo Nacional. Ele é reposicionado também na Diretoria de Processamento Técnico, Preservação e Acesso ao Acervo (DTP), diretamente vinculada ao gabinete dessa diretoria, o que também fortalece institucionalmente o programa.

Nesse ano, temos os 15 anos de Memórias Reveladas no dia 13 de maio. Nosso intuito é que a gente possa reverberar as ações da divisão ao longo de todo o ano, pautando a memória da ditadura militar brasileira, a reflexão e o conhecimento das lutas por direitos e como os arquivos se relacionam com o fortalecimento democrático. A gente tem a previsão de realizar a 5ª edição do Prêmio Memórias Reveladas de maneira renovada, agregando a multiplicidade dos segmentos que têm refletido sobre o tema. O Prêmio, nos últimos anos, esteve focado em produções acadêmicas monográficas. A gente sabe que a universidade é um palco muito importante para esse tema. Isso é um fato. Mas existem outros setores, outros segmentos que também estão tratando da ditadura de forma muito central.

Eu estou falando das escolas, dos veículos de comunicação, da sociedade organizada, dos movimentos sociais, dos movimentos de vítimas do período. A gente quer colocar o Prêmio na rua dando conta dessa multiplicidade de vozes e formatos, especialmente nas escolas, na educação básica, em como podemos fortalecer esse tema nos currículos, por exemplo.

O Prêmio Memórias Reveladas vai premiar produções acadêmicas, artigos científicos sobre a temática, mas também projetos educacionais, valorizando o que tem sido feito no chão da escola sobre esse tema, e também produtos comunicacionais.

Prêmio de Pesquisa Memórias Reveladas, por Arquivo Nacional

Agência Brasil: Os servidores do Arquivo Nacional têm reclamado da falta de estrutura para tocar o projeto, que teria sido abandonado pela gestão anterior, que era simpática à ditadura no Brasil. Apesar de você não estar na área no ano passado, mas caso já tenha sido possível se atualizar, como estava a situação do projeto e como recuperar ele?
Gabrielle Abreu: Quando a atual gestão do Arquivo Nacional assumiu o órgão, o que ocorreu foi um grande susto em relação ao estado que se encontrava o Memórias Reveladas. É como se o Memórias Reveladas sequer existisse. Ele não estava visível na estrutura regimental do Arquivo Nacional.

Agora, o Memórias Reveladas aparece no regimento, ganha nova musculatura, se tornando uma divisão. Com a minha aproximação, a gente começa a fazer uma movimentação interna de recomposição dessa equipe. Hoje, apenas dois servidores estão dedicados às atividades do Memórias Reveladas. Isso é muito pouco. Desde o meu 1º dia no órgão, trabalho para reforçar o expediente do Memórias Reveladas.

Agência Brasil: Nessa semana, um estudo inédito do pesquisador da UnB e ex-preso político Gilney Viana apontou 1.654 camponeses assassinados pela ditadura. O número é muito superior ao identificado pela Comissão Nacional da Verdade, que é de 434 vítimas fatais. Como o Memórias Reveladas dialoga com essas pesquisas feitas por particulares?
Gabrielle Abreu: Essa pesquisa do Gilney, essas novas estatísticas, só mostra o quanto esse ainda é um tema muito vivo e dinâmico. É muito importante que nós estejamos próximos da rede de pesquisadores que lidam com essa temática, fortalecendo essas pesquisas com a documentação que a gente mantém hoje no órgão. O principal objetivo é fortalecer essas pesquisas a partir da documentação que nós temos para que a gente um dia, quem saiba, possa chegar numa estatística, num dado mais fidedigno, mais próximo da realidade em relação a esse número, principalmente de vitimados pela ditadura militar.

EUA impõem restrições a autoridades de Hong Kong por repressão aos direitos humanos

Antony Blinken

31 de março de 2024

 

Os Estados Unidos vão impor novas restrições de vistos a autoridades de Hong Kong a quem atribuem a repressão aos direitos humanas naquela cidade chinesa, dias após a entrada em vigor de uma nova lei de segurança nacional.

O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, disse em comunicado divulgado na sexta-feira, 29, que Pequim “continuou a tomar medidas contra o prometido alto grau de autonomia, instituições democráticas e direitos e liberdades de Hong Kong” durante o ano passado.

Esta repressão, continuou Blinken, inclui a recente aprovação do “Artigo 23”, uma lei de segurança nacional que visa traição, insurreição, espionagem e roubo de segredos de Estado, entre outros crimes.

Em resposta à “intensificação da repressão” e às restrições impostas à “sociedade civil, aos meios de comunicação e às vozes dissidentes”, o Departamento de Estado “está a tomar medidas para impor novas restrições de vistos a vários funcionários de Hong Kong”, refere o comunicado.

Blinken não detalhou as medidas de visto a serem tomadas ou os funcionários a serem visados.

O anúncio surge após a revisão anual da autonomia de Hong Kong por Washington, um estatuto prometido por Pequim quando o Reino Unido entregou a cidade em 1997.

“Este ano, certifiquei novamente que Hong Kong não merece tratamento ao abrigo das leis dos EUA da mesma forma que as leis eram aplicadas a Hong Kong antes de 1 de julho de 1997”, concluiu o secretário de Estado americano.

Washington já impôs restrições de vistos e sanções a autoridades de Hong Kong que acusa de minar os direitos e liberdades que diferenciam a cidade do resto da China.

Pequim reage

Entretanto, neste sábado, 30, o gabinete do comissário do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês em Hong Kong classificou a posição do Departamento de Estado norte-americano como uma “tentativa de enganar o mundo” e afirmou que o relatório subjacente à decisão “deveria ter sido atirado para o caixote do lixo da história”.

Pequim manifestou a sua “firme oposição e forte condenação” e afirmou que tanto o relatório como as sanções anunciadas constituíam “uma interferência flagrante nos assuntos de Hong Kong e nos assuntos internos da China”.

Fonte
 

Decisão que pode ampliar alcance do foro privilegiado é adiada

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, pediu vista e, com isso, interrompeu um julgamento no plenário virtual da Corte que pode mudar o atual entendimento sobre a aplicação do princípio foro por prerrogativa de função, o chamado foro privilegiado. Até o momento, o julgamento, que começou na madrugada desta sexta-feira (29), tem dois votos favoráveis à ampliação do alcance do foro privilegiado.  

O relator do caso, ministro Gilmar Mendes, definiu que a saída de um cargo público com foro privilegiado por renúncia, não reeleição, cassação, aposentadoria, entre outros, só afasta a prerrogativa se o delito tiver sido praticado antes da investidura no cargo ou não tenha relação com o exercício da função.

Já se o crime tiver relação com a atuação funcional, a prerrogativa deverá se manter mesmo com afastamento posterior do cargo. Este voto foi seguidio integralmente pelo ministro Cristiano Zanin, o segundo a votar, antes do pedido de vista.

“Se a própria Constituição Federal delimitou o juízo competente para processar e julgar determinados agentes em razão do cargo, é possível depreender que atos contingentes de aposentadoria, renúncia e exoneração, bem como a circunstância de não ser reeleito o agente público, não devem possibilitar a desnaturação do foro previamente traçado. Como já dito alhures, em atenção à garantia do juiz natural deve prevalecer a regra de competência prevista no texto constitucional no momento da eventual prática do fato criminoso”, escreveu Zanin em seu voto.

Caso concreto

A ampliação do alcance do foro especial foi proposta pelo relator Gilmar Mendes em resposta a habeas corpus do senador Zequinha Marinho (Podemos-PA). O parlamentar é suspeito de ter exigido, a servidores de seu gabinete, o depósito de 5% de seus salários em contas do partido, prática conhecida como “rachadinha”.

“Considerando que a própria denúncia indica que as condutas imputadas ao paciente foram praticadas durante o exercício do mandato e em razão das suas funções, concedo ordem de habeas corpus para reconhecer a competência desta Corte para processar e julgar a ação penal”, decidiu o ministro em seu voto.  

O crime começou a ser investigado ainda em 2013, quando Marinho era deputado federal. Ele, depois, foi eleito vice-governador do Pará e, em seguida, senador, cargo que ocupa atualmente. Ao longo desse período, o processo foi alternado de competência, conforme o cargo ocupado. O parlamentar defende que o caso permaneça no Supremo, uma vez que recuperou o foro privilegiado ao ter se elegido para o Congresso novamente.

“O entendimento atual reduz indevidamente o alcance da prerrogativa de foro, distorcendo seus fundamentos e frustrando o atendimento dos fins perseguidos pelo legislador. Mas não é só. Ele também é contraproducente, por causar flutuações de competência no decorrer das causas criminais e por trazer instabilidade para o sistema de Justiça”, observou Mendes em seu voto. Ele ainda argumentou sobre a necessidade de manter o foro, para fazer jus ao princípio constitucional.

“A subsistência do foro especial, após a cessação das funções, também se justifica pelo enfoque da preservação da capacidade de decisão do titular das funções públicas. Se o propósito da prerrogativa é garantir a tranquilidade necessária para que o agente possa agir com brio e destemor, e tomar decisões, por vezes, impopulares, não convém que, ao se desligar do cargo, as ações penais contra ele passem a tramitar no órgão singular da Justiça local, e não mais no colegiado que, segundo o legislador, reúne mais condições de resistir a pressões indevidas”, escreveu.

O caso estava sendo julgado em plenário virtual, em que os ministros votam sem deliberação presencial. Com o pedido de vista, o prazo para que Barroso devolva o processo com seu voto é de 90 dias.

A proposta contida no voto de Mendes altera os contornos da prerrogativa de foro que foram definidos pelo Supremo em 2018, quando os ministros restringiram o alcance do instituto para cobrir apenas os crimes cometidos durante o mandato e em razão dele. Na época, a restrição ocorreu por meio de uma questão de ordem levantada em ação penal pelo atual presidente do Supremo, ministro Luís Roberto Barroso.

Com isso, após o fim de um mandato, por exemplo, um processo penal que não tivesse relação com o exercício da função era automaticamente remetido a instâncias inferiores.

Motivação

A análise do Supremo sobre o tema coincide também com a prisão do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), apontado pela Polícia Federal (PF) como um dos mentores do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes.

Brazão foi preso no último domingo (25), por ordem de Moraes. A prisão foi referendada pelo plenário do Supremo no dia seguinte, por unanimidade. Entretanto, na época do crime, em 2018, Brazão era vereador do Rio de Janeiro. As motivações apontadas – a disputa fundiária em zonas controladas por milícias – também não têm relação com o mandato federal do parlamentar, exercido desde 2019 na Câmara dos Deputados.

Somente por Brazão ser deputado federal é que o caso Marielle chegou ao Supremo, onde aparenta ter ganhado tração.

O entendimento atual do STF já define que qualquer conduta de um parlamentar federal, mesmo se cometida antes do mandato, deve automaticamente tramitar na corte a partir da posse ou diplomação no cargo. Na mesma investigação do caso Marielle, o Supremo decidiu pela prisão de Domingos Brazão, irmão de Chiquinho, que é conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ), bem como do delegado Rivaldo Barbosa, da Polícia Civil do Rio de Janeiro.

Pela Constituição, o STF possui a competência para julgar casos envolvendo o presidente da República e vice, bem como ministros de Estado, parlamentares federais, embaixadores e membros de tribunais superiores e do Tribunal de Contas da União (TCU).

Gilmar Mendes vota por ampliar alcance de foro privilegiado no STF

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta sexta-feira (29) para que seja ampliado o alcance do foro por prerrogativa de função, o chamado foro privilegiado, de modo a abranger também o julgamento de crimes em tribunais específicos mesmo após o fim da ocupação do cargo público.

A ampliação foi proposta por Mendes em resposta a habeas corpus do senador Zequinha Marinho (Podemos-PA). O parlamentar é suspeito de ter exigido, a servidores de seu gabinete, o depósito de 5% de seus salários em contas do partido, prática conhecida como “rachadinha”.

O crime começou a ser investigado ainda em 2013, quando Marinho era deputado federal. Ele, depois, foi eleito vice-governador do Pará e, em seguida, senador, cargo que ocupa atualmente. Ao longo desse período, o processo foi alternado de competência, conforme o cargo ocupado. O parlamentar defende que o caso permaneça no Supremo, uma vez que recuperou o foro privilegiado ao ter se elegido para o Congresso novamente.

“O entendimento atual reduz indevidamente o alcance da prerrogativa de foro, distorcendo seus fundamentos e frustrando o atendimento dos fins perseguidos pelo legislador. Mas não é só. Ele também é contraproducente, por causar flutuações de competência no decorrer das causas criminais e por trazer instabilidade para o sistema de Justiça”, observou o ministro em seu voto.

O caso é julgado no plenário virtual, em que os ministros votam sem deliberação presencial. A sessão de julgamentos começou nos primeiros momentos desta sexta-feira (29) e segue até 8 de abril. Como relator, Mendes foi o primeiro e único a votar até o momento.

“Considerando que a própria denúncia indica que as condutas imputadas ao paciente foram praticadas durante o exercício do mandato e em razão das suas funções, concedo ordem de habeas corpus para reconhecer a competência desta Corte para processar e julgar a ação penal”, decidiu o monistro em seu voto.  

Pelo voto de Mendes, devem ser competência do Supremo também os casos de crimes comuns cometidos antes do mandato e sem relação com o mesmo, e que o foro especial por prerrogativa de função deve ser mantido mesmo após o fim do exercício das funções públicas.  

“A subsistência do foro especial, após a cessação das funções, também se justifica pelo enfoque da preservação da capacidade de decisão do titular das funções públicas. Se o propósito da prerrogativa é garantir a tranquilidade necessária para que o agente possa agir com brio e destemor, e tomar decisões, por vezes, impopulares, não convém que, ao se desligar do cargo, as ações penais contra ele passem a tramitar no órgão singular da Justiça local, e não mais no colegiado que, segundo o legislador, reúne mais condições de resistir a pressões indevidas”, argumentou.

A proposta contida no voto de Mendes altera os contornos da prerrogativa de foro que foram definidos pelo Supremo em 2018, quando os ministros restringiram o alcance do instituto para cobrir apenas os crimes cometidos durante o mandato e em razão dele. Na época, a restrição ocorreu por meio de uma questão de ordem levantada em ação penal pelo atual presidente do Supremo, ministro Luís Roberto Barroso.

Com isso, após o fim de um mandato, por exemplo, um processo penal que não tivesse relação com o exercíco da função era automaticamente remetido a instâncias inferiores.

Motivação

A análise do Supremo sobre o tema coincide também com a prisão do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), apontado pela Polícia Federal (PF) como um dos mentores do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes.

Brazão foi preso no último domingo (25), por ordem de Moraes. A prisão foi referendada pelo plenário do Supremo no dia seguinte, por unanimidade. Entretanto, na época do crime, em 2018, Brazão era vereador do Rio de Janeiro. As motivações apontadas – a disputa fundiária em zonas controladas por milícias – também não têm relação com o mandato federal do parlamentar, exercido desde 2019 na Câmara dos Deputados.

Somente por Brazão ser deputado federal é que o caso Marielle chegou ao Supremo, onde aparenta ter ganhado tração.

O entendimento atual do STF já define que qualquer conduta de um parlamentar federal, mesmo se cometida antes do mandato, deve automaticamente tramitar na corte a partir da posse ou diplomação no cargo. Na mesma investigação do caso Marielle, o Supremo decidiu pela prisão de Domingos Brazão, irmão de Chiquinho, que é conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ), bem como do delegado Rivaldo Barbosa, da Polícia Civil do Rio de Janeiro.

Pela Constituição, o STF possui a competência para julgar casos envolvendo o presidente da República e vice, bem como ministros de Estado, parlamentares federais, embaixadores e membros de tribunais superiores e do Tribunal de Contas da União (TCU).

ONU: Gangues do Haiti matam 1.500 em três meses

Volker Türk

29 de março de 2024

 

A violência das gangues já matou mais de 1.500 pessoas no Haiti este ano, informou a ONU na quinta-feira, ao lamentar o fluxo contínuo de armas que chegam à nação insular do Caribe.

A ONU descreveu a situação no país devastado pelo caos como “cataclísmica”.

“É chocante que, apesar da situação horrível no terreno, as armas continuem a chegar”, disse Volker Türk, o alto comissário da ONU para os direitos humanos, num comunicado.

A ONU disse que dezenas de pessoas foram linchadas pelas chamadas brigadas de autodefesa este ano. Muitos dos membros de gangues são criminosos condenados, 4.000 dos quais escaparam das duas maiores prisões do Haiti.

“Todas estas práticas são ultrajantes e devem parar imediatamente”, disse Türk.

A ONU disse que as guerras de gangues se intensificaram nas últimas semanas, à medida que rivais fortemente armados se envolveram em novas ondas de ataques, incluindo ataques a delegacias de polícia e ao aeroporto internacional.

O primeiro-ministro Ariel Henry anunciou sua renúncia em 11 de março. Ele deixou o Haiti e agora está no território norte-americano de Porto Rico, com as gangues impedindo seu retorno ao Haiti.

Um conselho presidencial de transição que será responsável pela seleção de um novo primeiro-ministro emitiu a sua primeira declaração oficial na quarta-feira, prometendo restaurar a “ordem pública e democrática” no Haiti.

“Estamos determinados a aliviar o sofrimento do povo haitiano, preso durante demasiado tempo entre a má governação, a violência multifacetada e o desrespeito pelas suas perspectivas e necessidades”, afirmou o conselho.

Os membros do conselho afirmaram que, assim que fossem oficialmente instalados, ajudariam a “colocar o Haiti de volta no caminho da legitimidade democrática, estabilidade e dignidade”.

O relatório da ONU documentou 4.451 assassinatos no ano passado e 1.554 até 22 de março deste ano. A ONU disse que algumas das mortes ocorreram em casas de moradores devido ao suposto apoio de civis à polícia ou a gangues rivais, ou em ruas densamente povoadas devido a fogo cruzado ou franco-atiradores. Uma das vítimas era um bebê de três meses.

Além disso, o gabinete dos direitos humanos da ONU afirmou que, com a falta de segurança no Haiti, 528 pessoas suspeitas de ligações a gangues foram linchadas por brigadas armadas no ano passado e mais 59 este ano.

 

Favela-Bairro, 30 anos: legado do programa desaparece aos poucos

Os caminhos que cruzam o Morro do Andaraí, na zona norte do Rio, têm sinais de deterioração e de abandono. Em determinado ponto, o chão está afundando. No anel viário, que percorre as áreas mais altas, quando é dia de chuva e tudo alaga melhor nem tentar passar de carro.

A comunidade foi a primeira a ter um plano de urbanização em 1994, quando surgiu o programa Favela-Bairro. Trinta anos depois, as melhorias de infraestrutura, habitação e serviços sociais são lembranças distantes de um raro momento de intervenção do Poder Público. Sem manutenção e novos investimentos, os problemas se multiplicam no ritmo de crescimento da população.

“O plano piloto de 94 foi desenhado para uma comunidade que tinha cerca de 5 mil pessoas. No último levantamento, de 2010, já eram 30 mil. Agora, deve ter muito mais que isso, uns 40 ou 50 mil. Tudo ficou completamente defasado. As vias estão sobrecarregadas, as partes de esgoto e pluvial nunca foram modernizadas. Nada teve manutenção e, com esse crescimento desordenado da comunidade, tudo foi só piorando”, analisa Fernando Pinto, presidente da Associação de Moradores e Amigos do Morro do Andaraí (Amama).

A cozinheira Maria Elisabete conta que, em meio à situação precária, é o espírito de coletividade que ajuda a comunidade a se manter de pé.

“O maior problema aqui é a falta de água. É a reclamação que mais ouço. Felizmente, tenho a sorte de morar em um lugar onde quase nunca falta. E as pessoas vão tentando se ajudar. Eu ofereço a minha casa para o pessoal tomar banho e resolver outras coisas. Sem falar nas questões de esgoto. Quando cai qualquer chuvinha, os ralos entopem”, disse Elisabete.

Ela mora ao lado da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). O edifício, que hoje parece uma fortaleza cravada na parte baixa da favela, já foi um Centro Municipal de Assistência Integrada (Cemasi), com quadra esportiva onde as crianças passavam o dia jogando bola. Desde 2010, esse ambiente foi substituído por viaturas, homens fardados e fuzis. Além de perder um espaço de assistência social e lazer, moradores não tiveram cumprida a tão prometida melhoria na segurança. Há poucos metros dali, os traficantes circulam tranquilamente.

“O Estado entrou só com armamento e policiamento. Isso não veio agregado de outras ações que seriam muito mais importantes, como educação, saúde, lazer, esporte. Essa é uma reclamação que a gente ouve muito dos moradores”, disse Fernando Pinto.

Programa Favela-Bairro

O Favela-Bairro trazia no próprio nome a promessa de transformação do status das favelas em bairros e a integração delas com as regiões vizinhas. No senso comum, favela normalmente foi vista como lugar de desordem, informalidade e ilegalidade.

“Sempre pareceu que era muito interessante para o Poder Público manter as favelas numa espécie de lugar indeterminado. Entre o legal e o ilegal. Entre o tolerado e o que deve ser expulso. Isso acontecia para que as pessoas ficassem numa situação de vulnerabilidade, que favorecesse práticas clientelistas, vindas de um parlamentar ou de determinado grupo político que adotava certa favela”, analisa Tarcyla Fidalgo, doutora em planejamento urbano e regional e pesquisadora do Observatório das Metrópoles.

Durante boa parte do século 20, o Poder Público olhava para as favelas como problemas a serem erradicados. A palavra de ordem era a remoção. Um exemplo é o Código de Obra da Cidade do Rio de Janeiro, de 1937, que proíbe a construção de novas moradias, melhorias nas que já existiam e, progressivamente, a eliminação delas.

Também é conhecido por essa mentalidade o governo de Carlos Lacerda (1960-1965), que adotou política forte de remoção de favelas, principalmente na zona sul. E a ditadura militar, com destaque para o período de maior repressão (1968-1973), quando cerca de 60 favelas e 100 mil habitantes foram removidos, principalmente de áreas mais nobres, de interesse do setor imobiliário.

A situação começa a mudar com a chegada do período democrático. São marcos desse período o Projeto Mutirão (1981-1989), com a retomada de intervenções urbanísticas em favelas, e o Plano Diretor do Rio de Janeiro de 1992, que previa políticas públicas nas favelas e a inclusão delas nos mapas e cadastros da cidade.

Em 1993, a gestão municipal de César Maia cria o Grupo Executivo de Assentamentos Populares (Geap), para centralizar a política habitacional. Entre os programas previstos, está o Favela-Bairro. No mesmo ano, surge a Secretaria de Habitação. A ideia começou a sair oficialmente do papel no dia 28 de março de 1994, quando é aberto oficialmente o edital para escolha de arquitetos e projetos, organizado pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil do Rio de Janeiro (IAB-RJ).

“Favela-bairro é o primeiro grande programa de urbanização de favelas que a gente tem aqui no Rio de Janeiro. Tem uma importância fundamental no sentido de marcar a possibilidade de que o Estado reconheça um território e possa agir para melhorá-lo. Ele rompe um pouco com a visão da favela como algo a ser combatido, a ser exterminado, como um lugar que não tem salvação”, diz Tarcyla.

Inicialmente, 16 favelas foram contempladas na primeira fase do programa. Foram priorizadas as de médio porte, na época, caracterizadas assim por ter entre 500 e 2.500 domicílios. As obras da prefeitura começaram com recursos próprios em 1995. No fim do mesmo ano, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) assina um convênio com a prefeitura. O total combinado de recursos aplicados nas duas fases do programa foi de US$ 600 milhões.

Calcula-se que, no total, mais de 150 comunidades foram contempladas por algum tipo de obra nas duas fases. O modelo foi vendido pelo mundo para ser adotado em regiões periféricas e inspirou ações semelhantes em países da América do Sul.

“Os serviços prestados durante esse período, sem nenhum exagero, revolucionaram a vida dentro dessas comunidades. As pessoas passaram a ter um padrão superior. Vários estudos acadêmicos foram encomendados que atestaram isso. Os resultados sociais e econômicos foram enormes”, afirma Sérgio Magalhães, que foi secretário municipal de Habitação do Rio entre 1993 e 2000 e responsável pelo programa durante a maior parte da existência dele.

“As favelas não tinham recolhimento de lixo, limpeza das águas fluviais, creches, serviços de saúde. Passaram a ter escritórios da prefeitura em todas elas, além de centros esportivos, iluminação pública, uma série de serviços de interesse social que valorizaram a cidadania. Tudo era muito precário antes do programa nas favelas”, complementa Sérgio.

O programa terminou em 2008 e, apesar do reconhecimento de que trouxe avanços importantes, não está livre de críticas.

“Os moradores historicamente construíram soluções muito criativas e inventivas para solucionar problemas como falta de água, enchente, pavimentação, drenagem. O programa de urbanização partiu de uma visão técnica construída em gabinete. Uma perspectiva de que a favela precisava se tornar a cidade formal, um bairro igual aos outros. Foram ignoradas soluções desenvolvidas no próprio território, e aplicados modelos que não necessariamente se adequavam àquela realidade”, diz Tarcyla Fidaldo.

Outras políticas de urbanização

Em 2007, o governo federal criou o Programa de Aceleração de Crescimento (PAC) para investir na urbanização de favelas. Foram quase R$ 3 bilhões investidos em 30 favelas ou complexos. Críticos do projeto apontam que ele priorizou “obras faraônicas” pouco efetivas, não combatendo os problemas reais de infraestrutura. O teleférico do Complexo do Alemão é citado como exemplo.

Em 2010, a gestão do prefeito Eduardo Paes criou o Morar Carioca, considerado continuação do Favela-Bairro. A meta era urbanizar todas as favelas até 2020, o que não aconteceu. Por outro lado, conforme pesquisa de Lucas Faulhaber e Lena Azevedo no livro SMH 2016: remoções no Rio de Janeiro Olímpico, pelo menos 60 mil pessoas foram removidas de comunidades. O caso mais famoso é o da Vila Autódromo. Em 2017, o então prefeito Marcelo Crivella chegou a anunciar a volta do programa Favela-Bairro, mas o projeto não foi adiante.

“Houve um esvaziamento da política habitacional e não houve manutenção das obras que foram feitas nas favelas. As que tinham sido contempladas no programa passaram a perder qualidade de vida. Sem investimentos, os indicadores sociais e de segurança nas comunidades pioraram bastante”, analisa Sérgio Magalhães.

Eduardo Paes, eleito para novo mandato, decidiu retomar o Morar Carioca em 2022, com plano de investimento de R$ 500 milhões. O atual secretário municipal de Habitação, Patrick Corrêa, disse que o objetivo é que o Rio volte a ser “vanguarda na construção de habitação de interesse social” e prometeu desenvolver programa específico para manutenção das favelas.

“O Morar Carioca é uma evolução natural do Favela-Bairro frente aos novos desafios urbanos, diante de nova realidade que já são favelas urbanizadas. Aprimoramos o programa, porque o conjunto e o contexto são diferentes para que ele possa responder às necessidades atuais. O combate ao déficit habitacional se dá em duas vertentes no programa: qualitativo – para levar infraestrutura (saneamento, drenagem, pavimentação) ao entorno das casas que já existem – e quantitativo – com a construção de unidades habitacionais”, diz o secretário.

A promessa é de que o programa também contemple outras áreas de interesse das comunidades.

“Estamos sempre trabalhando em conjunto com outras secretarias como a RioLuz, Ordem Pública, Infraestrutura, Meio Ambiente, Ação Comunitária e Comlurb, por exemplo. Com a Ação Comunitária, temos o Favela Com Dignidade, que leva diversos serviços públicos para várias comunidades. Como cada uma das comunidades tem sua peculiaridade, se faz necessário esse diálogo constante com outras secretarias, que nos apoiam na implementação do Morar Carioca”, acrescenta Corrêa.

Participação e integração

Entre os principais objetivos anunciados pelo Programa Favela-Bairro no edital de 1994, estavam a integração das comunidades com o restante da cidade e participação ativa dos moradores nos planos de urbanização. Algo que, para especialistas e moradores, está longe de ser realidade.

“A participação tem que ser efetiva e não só um aceite, uma exigência administrativa. Normalmente, técnicos da prefeitura vão até a comunidade, apresentam um monte de plantas e documentações de topografias. Os moradores não têm muita condição de compreender aquilo. E a gente sabe que vai ser aprovado, seja por essa falta de conhecimento técnico, seja porque os moradores precisam muito de intervenções que melhorem as condições do território”, diz Tarcyla Fidalgo.

“Favela, na cabeça das pessoas, continua sendo favela. Não mudou nada”, afirma Bete. “As autoridades não se importam. Fazem uns serviços pequenos, uma maquiagem e só. Teve uma vez aí que um desses políticos pintou meia dúzia de casas só para dizer que fez algo”, diz a moradora do Morro do Andaraí, Maria Elisabete.

“A gente sabe que a maior parte da população que mora no ‘asfalto’ tem preconceito com o pessoal da comunidade. Pensam, mesmo que de forma velada, que todo mundo aqui é bandido. Eles não assumem isso publicamente mas, no fundo, pensam isso. Não querem integração, nem que a gente desça o morro. Querem que a gente continue aqui. A não ser quando é para as nossas mães serem domésticas ou os nossos pais serem porteiros. Isso é o que eles querem”, diz Fernando Pinto.