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Festival exibe filme sobre retirada de não indígenas de TI no Pará

Coordenada pelo governo federal, a megaoperação que resultou na retirada de ocupantes ilegais da Terra Indígena (TI) Alto Rio Guamá, no Pará, foi retratada em documentário exibido na tarde desta quinta-feira (14) no Festival Brasil É Terra Indígena, em Brasília.

O filme Desintrusão na TI Alto Rio Guamá foi produzido pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC), em parceria com a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom).

O documentário aborda o processo de reocupação de terras pelos povos do Alto Rio Guamá, no nordeste do Pará, neste ano. A obra conta o processo de negociação para a saída dos ocupantes ilegais com relatos de múltiplas vozes, entre indígenas, pequenos agricultores, desmatadores e agentes do Estado, como servidores da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).

TI Alto Rio Guamá

Segundo informações da Secom, a Terra Indígena Alto Rio Guamá foi reconhecida pelo Estado brasileiro em 1945. A homologação ocorreu em 1993. O território é de usufruto exclusivo dos povos Tembé, Ka’apor e Timbira. No entanto, cerca de 1,5 mil invasores permaneceram na região até 2023.

A desintrusão (termo que significa retirada de intrusos) da TI, que tem 280 mil hectares, atendeu a uma decisão da Justiça Federal, após pedido do Ministério Público Federal no Pará. A permanência de não indígenas na área demarcada representava uma ameaça à integridade dos povos originários, além de provocar uma série de danos ao meio ambiente, como a destruição de florestas.

A operação foi coordenada pela Secretaria-Geral da Presidência da República. Com a negociação envolvendo representantes de vários órgãos do governo federal, não foi necessário fazer a retirada compulsória dos não indígenas. As famílias deixaram voluntariamente a TI e foram apoiadas com cestas básicas, transporte e cadastramento em programas sociais. A devolução da terra indígena aos povos originários aconteceu em maio.

“A terra já está regularizada, já está homologada, e nós então temos a caracterização de uma invasão mesmo da terra indígena. Então, é nosso dever retirar esses não indígenas de dentro, para que a gente possa garantir a posse plena pelos povos indígenas”, destacou a diretora de Proteção Territorial da Funai, Maria Janete Albuquerque de Carvalho, presente ao evento de lançamento do documentário, realizado no auditório do Museu Nacional da República.

A diretora do documentário, Lorena Veras, que também participou do evento, disse que os povos indígenas não podem ser tutelados, porque “falam por si”.

A secretária executiva da Secretaria-Geral da Presidência da República, Maria Fernanda Ramos Coelho, também destacou a importância do processo de retomada da TI. 

“Para ter a sustentabilidade ambiental , para que a gente possa combater a fome e  a pobreza, isso passa também para que a gente tenha as terras que são dos indígenas, que são os seus legítimos donos, que tenha esse processo de retomada”, disse. 

Para Eunice Kerexu, secretária nacional de Direitos Territoriais Indígenas do Ministério dos Povos Indígenas, a ideia é que a partir de agora todos os processos de desintrusão ocorram de forma mais simples e seguindo a lei.

“A ocupação do território pelos povos indígenas através das escolas, da implementação de postos de saúde, outras implementações de políticas públicas dentro do território que possam trazer a gestão desse território, a autonomia e a posse plena, que a gente quer chegar nesse contexto”, disse.

*Colaborou Bruna Saniele, repórter da TV Brasil

Festival debate papel dos povos indígenas nas questões climáticas

O Festival Brasil é Terra Indígena, Iniciado nesta quarta-feira (13) em Brasília, sediou uma série de debates e celebrou a importância dos povos originários para o Brasil e para o mundo. Entre os temas levantados, esteve em destaque a preservação das florestas.

Mesa de debate”Questões climáticas, o que é isso? Participantes, da esquerda para direita: mediadora, Jozileia Kaingang, Suliete Baré, Conceição Amorim e Beka Munduruku- Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Na mesa Questões Climáticas, o que é isso?, nesta quinta-feira (14), a mediadora, secretária substituta de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas do Ministério dos Povos indígenas, Joziléia Kaingang, apresentou dados divulgados pelas Nações Unidas que mostram o tamanho da importância dos povos originários. “As populações indígenas representam 5% da população do planeta e é responsável pela manutenção de 80% da biodiversidade”, pontuou a secretária. “Nós, povos indígenas, somos responsáveis por frear o aquecimento global”, acrescentou.

o deputado distrital Max Maciel (PSOL-DF) defendeu que as forças de quem preserva e de quem prejudica são desproporcionais. “Enquanto o agronegócio tem muitas isenções e apoios financeiros bilionários, vemos extrema dificuldade até para pagarmos a passagem para alguém participar de um debate como este”, resumiu. A mediação do debate ficou a cargo da secretária substituta de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas do Ministério dos Povos indígenas, Joziléia Kaingang, que iniciou a mesa apresentando dados

Deputado Max Maciel fala da dificuldade que os indígenas têm para defender os interesses ambientais  – Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Impacto

Comunicadora da Mídia Indígena e integrante do Coletivo Daje Kapap Eypi, Beka Munduruku disse que, mesmo com todo o esforço por preservar suas terras, o povo munduruku do Tapajós tem visto cada vez mais seu território ser afetado por alagamentos e destruição.

“Falamos muito em proteger a Amazônia e a floresta, mas pouco em proteger os indígenas e o território de nossa futura geração. Tanto nossas aldeias como nossos territórios sagrados. Isso afeta o meu futuro e o dos demais jovens”, disse a munduruku.

A coordenadora Geral de Enfrentamento à Crise Climática do Ministério dos Povos Indígenas, Suliete Baré, acrescentou que praticamente todos os territórios indígenas já estão com problemas por conta das mudanças climáticas. “Somos os que mais protegem nossos territórios. Mas somos também os mais afetados. Seja pelas secas, seja pelas enchentes fora de época”, alertou.

Suliete Baré destaca que praticamente todos os territórios indígenas já foram impactados pelas mudanças climáticas- Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

A coordenadora do Centro de Defesa dos Direitos Humanos Padre Josimo, Conceição Amorim,  enfatiza que só quem mora perto das comunidades indígenas sabe o que se passa por nelas, “para enfrentar os desmatadores”.

Mobilizações

Conceição Amorim, que também é assistente social e professora no Maranhão, explica que são muitas as frentes de desmatamento e de empreendimentos prejudiciais à floresta e ao meio ambiente. “Era para ter milhões de pessoas contra decisões como a de explorar petróleo na Amazônia”, ressaltou, referindo-se ao leilão feito esta semana pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para 38 blocos exploratórios de 11 bacias sedimentares, inclusive na região amazônica.

Assistente social e professora, Conceição Amorim, participa da mesa de debate Questões climáticas, o que é isso? – Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

“Se não houver grandes mobilizações de impacto e de enfrentamento político – e, por meio delas, darmos o nome a quem destrói o planeta –, nós não vamos avançar. Precisamos desmascarar o agronegócio e os empreendimentos que fazem isso. É uma luta desproporcional, pelo tamanho que esses grandes empreendimentos têm. Há, no Brasil, mais bois do que gente”, acrescentou.

Ao final do debate, Max Maciel disse perceber, nas pessoas “cansaço por tantas lutas, tantos lutos, tantas plenárias e falas”. 

Filme

O festival apresentará hoje o filme Desintrusão na TI Alto Rio Guamá, produzido pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC). A trama retrata todo o processo de negociação para a saída dos ocupantes ilegais deste território indígena, com base em relatos de agentes do Estado, indígenas e não indígenas – entre eles, pequenos agricultores e grandes desmatadores.

Após o lançamento no festival, o filme, de 36 minutos, ficará disponível nos canais do YouTube da Secretaria de Comunicação (SECOM) da Presidência da República e da EBC.

Leilão de terminais portuários na B3 arrecada R$ 2,6 milhões

O governo federal e a Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina arrecadaram R$ 2,6 milhões em outorgas no leilão desta quarta-feira (13) de cinco terminais portuários, na sede da B3.

O primeiro terminal leiloado foi o de granéis sólidos no Porto de Paranaguá, no Paraná, o PAR09. Uma única empresa arrematou o terminal, a Quadra Capital, por meio do Q-Par09 Fundo de Investimento em Participações Multiestratégia, com o valor de outorga de R$ 615.751, negociado pela autoridade portuária do Paraná.

Os demais terminais foram negociados pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), vinculada ao Ministério de Portos e Aeroportos. Todos foram leiloados na forma de arrendamento simplificado. Segundo a Antaq, nessa modalidade os arrendamentos prescindem de audiência pública e podem também ser dispensados da análise de mérito pelo Tribunal de Contas da União (TCU), em razão do pequeno porte e do reduzido risco apresentado.

O terminal RIG71, no porto de Rio Grande, no Rio Grande do Sul, foi o segundo a ser leiloado na tarde desta quarta-feira. A AC Vita Serviços de Armazenagem fez a única proposta e venceu o leilão oferecendo R$ 1 milhão como valor de outorga.

O terminal POA02, em Porto Alegre, também contou com apenas uma proposta e foi arrematado pela Serra Morena por R$ 2 mil. Já o terminal POA11, também em Porto Alegre, ficou com a Unifértil, que ofereceu R$ 50 mil como valor de outorga.

O leilão mais disputado entre os que estavam em oferta foi o do terminal MAC15, em Maceió, que teve duas proponentes: a Braskem, que ofereceu R$ 150 mil de forma inicial, e a Intermarítima, com a oferta de R$ 200 mil. A disputa seguiu para os lances em viva voz e a Intermarítima acabou arrematando o terminal, com a oferta final de R$ 1 milhão.

O leilão dos cinco terminais foi acompanhado pelo ministro dos Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho. “Esse é o primeiro leilão do qual participo na B3. Isso dialoga com a agenda de desenvolvimento econômico com a qual o presidente Lula tem trabalhado e desempenhado pelo nosso país. A gente tem, cada vez mais, trabalhado para colocar na agenda de desenvolvimento nacional a agenda portuária, que é fundamental para o desenvolvimento do Brasil”, disse.

O ministro lembrou que o país tem batido recorde em exportações. “Neste ano, estamos batendo recorde nas nossas exportações. Foram US$ 90 bilhões, maior valor de exportação da história do nosso país. E, para podermos alavancar cada vez mais nossos investimentos, a gente precisa preparar nossos portos, aprimorando a competitividade”, disse.

“Nós próximos 3 anos, ao lado da Antaq, a gente espera participar na B3 de mais de 35 novos leilões, que vão significar mais de R$ 15 bilhões em investimentos nesses próximos anos”, acrescentou.

O ministro anunciou que o governo deve lançar, em janeiro, o programa Navegue Simples, segundo ele, o “maior programa de desburocratização de novos empreendimentos e novas outorgas e concessões de leilões e de novos terminais”.

A intenção, disse o ministro, é reduzir o processo de liberalização de novas outorgas e de novas concessões de 3 anos para uma média de 6 a 8 meses.

Britânica BP Energy arremata Bloco Tupinambá, no pré-sal de Santos

A multinacional britânica do petróleo BP Energy foi a única empresa interessada em participar, nesta quarta-feira (13), do 2º Ciclo da Oferta Permanente – Partilha, promovido pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Foram ofertados os blocos Cruzeiro do Sul, Esmeralda, Jade, Tupinambá (Bacia de Santos) e Turmalina (Bacia de Campos). Todos fazem parte do Polígono do Pré-Sal.

A BP arrematou o Bloco Tupinambá com um lance de R$ 7,04 milhões, valor fixo determinado em edital. O investimento previsto é de R$ 360 milhões. O leilão foi no Windsor Barra Hotel, no Rio de Janeiro.

O diretor-geral da ANP, Rodolfo Saboia, atribuiu a baixa participação de empresas à nova forma de analisar as áreas de exploração remanescentes na camada pré-sal. 

“Nós já sabemos que hoje não guarda todo aquele encanto inicial de que bastava perfurar que eram encontradas reservas extremamente vantajosas. Hoje não se vê mais o Polígono no Pré-Sal como sendo assim”, explicou.

Por se tratar de uma área do pré-sal, o contrato da petroleira com o governo será na modalidade de partilha. Isso significa que a produção de óleo excedente (saldo após pagamento dos custos) é dividida entre a empresa e a União. A BP Energy ofereceu 6,5% de excedente de óleo para a União, o que representa um ágio de 33,20% em cima do mínimo exigido.

Regimes de concessão

A realização do 2º Ciclo da Oferta Permanente – Partilha com apenas uma empresa interessada contrasta com o 4º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão, realizado pela ANP também nesta quarta-feira.

Na disputa por contratos de concessão – quando as empresas assumem o risco de encontrar ou não petróleo e remuneram o governo por meio de pagamento de royalties – a ANP arrecadou R$ 421,7 milhões no leilão de 33 setores com blocos exploratórios, nas bacias sedimentares de Amazonas, Espírito Santo, Paraná, Pelotas, Potiguar, Recôncavo, Santos, Sergipe-Alagoas e Tucano.

Ao todo, no modelo de concessão, foram arrematados 192 blocos, que correspondem a uma área de 47,1 mil quilômetros quadrados (km²) – aproximadamente o tamanho do Espírito Santo.

A Petrobras foi uma das maiores vencedoras da disputa, abrindo nova fronteira de exploração: a estatal arrematou 29 blocos na Bacia de Pelotas.

Oferta permanente

Os leilões de setores com blocos exploratórios de petróleo realizados nesta quarta-feira pela ANP fazem parte da oferta permanente, principal modalidade de licitação de blocos de exploração de petróleo e gás natural. Nesse formato, existe uma oferta contínua de áreas exploratórias. Assim, as empresas não precisam esperar uma rodada de licitações tradicional, que é feita de acordo com calendário de interesse do governo.

Além disso, as companhias contam com o tempo que julgarem necessário para estudar os dados técnicos dessas áreas antes de fazer uma oferta, sem o prazo limitado do edital de uma rodada. Esse modelo é considerado mais atrativo, em especial, para pequenas e médias empresas.

Desde que a exploração de petróleo no Brasil deixou de ser um monopólio da Petrobras, no fim da década de 1990, o Brasil realizou 33 rodadas de licitações de campos de exploração. De 1999 até o início dos leilões desta quarta-feira, o governo federal tinha arrecadado R$ 148 bilhões em bônus de assinatura pagos pelas empresas vencedoras das licitações.

Nesse período, o Brasil saltou do 18º para o nono lugar no ranking dos países produtores de petróleo e condensado (tipo muito leve de óleo). A produção cresceu de 970 mil barris por dia para 3,5 milhões por dia. 

Grupo protesta contra leilão de blocos de exploração de petróleo e gás

Um grupo de manifestantes protestou, nesta quarta-feira (13), contra o leilão de áreas de exploração de petróleo e gás natural, feito pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), nesta quarta-feira (13).

O ato foi feito em frente ao Hotel Windsor, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, onde a ANP promoveu o 4º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão (OPC) e o 2º Ciclo da Oferta Permanente de Partilha da Produção (OPP).

Ambientalistas protestam contra leilão da ANP. Foto: Cristina Índio do Brasil/Agência Brasil

Participaram da manifestação ambientalistas e indígenas da etnia xokleng que pertencem à Aldeia Rio dos Pardos, no município de Porto União, em Santa Catarina.  Segundo o grupo, exploração de petróleo e gás pode causar impactos ambientais negativos na região.

A manifestação foi coordenada pelo Instituto Internacional Arayara, organização brasileira sem fins lucrativos dedicada à defesa dos direitos humanos, do meio ambiente e da justiça social. Criado em 1992, no contexto da Eco 92, o Arayara atua em todos os estados brasileiros e em países latino-americanos. Conforme o Instituto, com o leilão, estão em risco territórios quilombolas, indígenas e unidades de conservação. Além disso, para o instituto, a negociação representa “uma bomba climática em emissões potenciais”.

Impacto ambiental

A diretora executiva do Arayara, Nicole Oliveira, diz que os blocos ofertados no leilão representam mais de 2% do território nacional e 63% da Oferta Permanente da ANP, que tem 955 blocos. De acordo com Nicole, 97% dos blocos têm algum tipo de contradição com as diretrizes ambientais da própria ANP, muitos dos blocos são sobrepostos a corais, o que representa quase 60% destes blocos; outros sobrepostos a áreas inteiras de quilombolas, territórios indígenas e áreas de conservação.

“São 15 unidades de conservação que estão sobrepostas por 23 blocos, são 17 que têm área de amortecimento sobrepostas por mais 33 blocos e no total 366 km² de unidades de conservação sobrepostas”, pontuou, acrescentando que nas áreas quilombolas, 15 territórios vão ser sobrepostos, em 684 km², impactando 5.6 mil habitantes.

“Territórios indígenas são 23 no total, destes, 22 estão na Amazônia. São nove etnias que vão ser impactadas, e destas, duas são de indígenas isolados”, explicou à Agência Brasil.

Segundo a ativista, o Instituto entrou na justiça para questionar a inclusão de 77 blocos que, conforme explicou, viola a legislação e a própria portaria da ANP, que estabeleceu diretrizes ambientais.

“É um leilão problemático, mas o que chama atenção é a questão climática. Se a gente for queimar todas as reservas ofertadas hoje, dá o equivalente a 1 giga tonelada de CO², sendo bem conservador no cálculo. Para comparação, o Brasil prevê na nova NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada) vai ter que emitir 1,2 giga tonelada em 2030. Então, a gente está leiloando [quase] o equivalente em giga toneladas ao que o Brasil se comprometeu em todos os setores a emitir em 2030. Do ponto de vista climático esse leilão é um desastre e do ponto de vista socioambiental também”, apontou.

Para o diretor técnico do Arayara e do Observatório do Petróleo e Gás, Juliano Bueno de Araújo, não é aceitável continuar com uma expansão fóssil no Brasil, como se dá atualmente, e ainda em cima de territórios de povos tradicionais, de áreas de risco geológicos significativos ou de conservação, tanto em mar quanto em terra.

“Nós precisamos fazer um novo pacto energético no Brasil, onde a ANP entenda e aceite o não da sociedade e obviamente respeite o jogo. A democracia do novo governo colocou antes da eleição uma série de compromissos com a sociedade, com quilombos, com indígenas com pescadores. Infelizmente, esse leilão que a gente vê hoje é um rompimento desses compromissos e obviamente todo esse grupo está insatisfeito”, completou.

O diretor técnico alertou para o perigo da inclusão no leilão do bloco próximo a área da mina de prospecção de sal-gema da Braskem, em Maceió, Alagoas. “Um dos blocos de petróleo oferecidos está apenas a 2,5 quilômetros de onde hoje está afundando. O risco geológico de oferecer um bloco tão próximo da mina que hoje está com uma série de problemas colocando em risco milhões de pessoas, é, na nossa opinião técnica, um risco que não precisaríamos colocar para a população lá de Maceió”, defendeu à Agência Brasil.

Abrolhos e Noronha

Na visão de Juliano Bueno de Araújo, há riscos também em relação aos blocos de exploração dos montes submarinos da região de Abrolhos e de Fernando de Noronha. “É uma repetição da 17ª Rodada. Não faz sentido nós colocarmos o maior estuário, a maior riqueza que nós temos hoje no litoral norte do Brasil, onde tem uma atividade econômica altamente sustentável como o turismo, para fazer uma exploração em uma área tão sensível e de alto risco. Imaginemos um vazamento de petróleo e gás na região de Fernando de Noronha. Esse desastre pode ser contido? Não. Vale a pena nós corrermos esse risco? Não. Precisamos furar poços nesta região? Também não. Então porque isso se dá? Esse jogo da indústria de petróleo e a irresponsabilidade da Agência e também do Conselho Nacional de Política Energética, precisa ser modificado”, apontou.

Indígenas

Rosalino Pereira de Carvalho, cacique da Aldeia Rio dos Pardos da etnia xokleng, que participa da manifestação, disse que o seu povo está preocupado com as áreas próximas ao seu território, em Porto União, incluídas no leilão. Os blocos 335 e 344, do setor SPAR-T5 na Bacia do Paraná, são o motivo de preocupação do líder indígena.

Arte-terra-indigena – Arte/Agência Brasil

“Vai afetar a nossa terra, então a gente se reuniu hoje para ver se a gente consegue que isso não aconteça. A gente pensa no futuro dos nossos filhos. Os povos indígenas têm bastante crianças, que amanhã ou depois vão ser afetadas e a toda população indígena e até o pessoal branco como a gente diz. A gente é a favor do meio ambiente e isso vai afetar o meio ambiente e toda a população humana, e a gente não quer que isso aconteça”, afirmou à Agência Brasil.

Atualmente a aldeia tem 15 pessoas, porque, segundo o cacique, uma parte se mudou para cidades maiores próximas. “O pessoal saiu para trabalhar fora, na cidade. Alguns voltam e outros vêm de vez em quando. A gente está tentando também repovoar essa aldeia, porque ela sempre existiu, sempre foi aldeia indígena e sempre vai ser. A gente está lutando hoje aqui para defender o nosso território indígena”, disse, acrescentando que na aldeia tem produção de feijão, milho e criação de gado, porcos e frangos. Além disso, os indígenas da Rio dos Pardos se alimentam da pesca no rio local.

Segundo o cacique, em um outro, território também em Santa Catarina, moram mais de 3 mil indígenas da etnia xokleng. 

ANP

Em discurso que antecedeu o início do leilão, o diretor geral da ANP, Rodolfo Saboia, disse que para incluir as áreas no certame, antes de submetê-las à aprovação conjunta dos Ministérios de Minas e Energia e do Meio Ambiente e Mudança do Clima, a agência reguladora consultou, como sempre é feito, todos os órgãos ambientais estaduais competentes, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). “Todavia, a análise pormenorizada de cada atividade no âmbito do licenciamento ambiental, item obrigatório e fundamental, aliado à rigorosa regulação e fiscalização da segurança operacional pela ANP, nos dá a segurança de que manteremos o mais elevado padrão de proteção à vida e ao meio ambiente que caracteriza a atividade petrolífera no Brasil”, assegurou.

O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, que também estava presente no leilão, disse que não poderia comentar as críticas dos ambientalistas, indígenas e quilombolas sobre a inclusão no leilão de blocos que podem provocar impacto nesses territórios, porque a companhia não disputou nenhuma dessas áreas. “Esse é um problema que a gente não pode comentar porque a gente não foi nesses blocos, a gente não está interessado nesses blocos e não está participando de nenhuma área dessas”, afirmou em coletiva no salão anexo ao leilão.

Resultados

Para a área próxima a Fernando de Noronha não houve ofertas, mas dos 14 blocos que estavam dentro do raio de restrição de terras indígenas indicados pelos manifestantes, três foram arrematados: AM-T-107 AM-T-133 (Bacia do Amazonas) que podem provocar impacto nas Terras Indígenas Gavião, Ponciano e Marinheiro e PAR-T-335 (Bacia do Paraná), que fica próximo à Terra Indígena Rio dos Pardos.

Nicole Oliveira disse que dos 77 blocos que o Instituto Arayara entrou na justiça para que fossem excluídos do leilão, cinco foram arrematados, o que representa 6% do total. “Tivemos 94% de sucesso”, comemorou.

Leilão de blocos de exploração fora do pré-sal arrecada R$ 422 milhões

A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) arrecadou, nesta quarta-feira (13), R$ 421,7 milhões no leilão de 33 setores com blocos exploratórios de petróleo nas bacias sedimentares de Amazonas, Espírito Santo, Paraná, Pelotas, Potiguar, Recôncavo, Santos, Sergipe-Alagoas e Tucano. A Petrobras foi uma das maiores vencedoras da disputa, abrindo nova fronteira de exploração.

O montante arrecadado pela ANP com os bônus de assinaturas representa um ágio de 179,69% em relação ao valor mínimo exigido pelas áreas exploratórias. No conjunto, os lances vencedores se comprometeram com R$ 2,01 bilhões em investimentos na fase de exploração.

As áreas ofertadas pela ANP fazem parte do 4º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão (OPC), realizado no Windsor Barra Hotel, no Rio de Janeiro, e ficam fora do Polígono do Pré-Sal.

São campos marítimos e terrestres, incluindo a área com acumulação marginal de Japiim, na Bacia do Amazonas. Acumulações marginais são campos onde a produção de petróleo está inativa ou foram devolvidos à ANP por falta de interesse econômico.

Ao todo, foram arrematados 192 blocos, que correspondem a uma área de 47,1 mil quilômetros quadrados (km²) – aproximadamente o tamanho do Espírito Santo.

Petrobras

Uma das grandes participantes foi a Petrobras, que arrematou 29 blocos, todos na Bacia de Pelotas, na Região Sul. A estatal deu preferência para participar por meio de consórcios. Em 26 lances vencedores, foi formada parceria com a Shell, que deteve 30%. Os outros três tiveram, além da Shell (30%), a chinesa CNOOC (20%) como participante. As duas empresas já integravam outras parcerias com a Petrobras.

O valor do bônus de assinatura a ser pago em abril de 2024 pela Petrobras é de cerca de R$ 116 milhões. Os 29 blocos arrematados se somam ao portfólio da estatal, que conta com 47 blocos. Isso significa que os cerca de 20 mil km² adquiridos fazem a área exploratória total da companhia saltar para 50 mil km².

O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, comemorou a atuação da estatal, com 100% de aproveitamento, ou seja, levou todos os blocos que quis. Prates classificou a Bacia de Pelotas de uma nova fronteira para a estatal.

“A gente precisa verificar novas fronteiras, repor reservas para manter, mais ou menos, o fluxo que é necessário de consumo de petróleo ainda para as próximas três, quatro, cinco décadas”, disse.

Prates considera que as áreas nos litorais do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina têm menos perspectivas de ter problemas de licenciamento ambiental e demoras.

“É uma área muito parecida com a Bacia de Santos e a Bacia de Campos, com distância também da costa e com os procedimentos que a Petrobras já utiliza que são plenamente aceitos pelos órgãos ambientais”, avaliou.

Um fator que explica o interesse da Petrobras na região são descobertas de poços de petróleo no Uruguai e na costa da África – Namíbia e África do Sul.

“Esses continentes estavam juntos, então esse processo é constante na cabeça dos geólogos”, disse Prates, se referindo a características físicas que assemelham as duas costas geográficas.

A outra empresa que arrematou áreas na Bacia de Pelotas é a Chevron Brasil, com 15 blocos.

Concorrência

Ao todo, 21 empresas tinham apresentado declarações de interesse e garantias para participarem do certame, que foi no modelo envelope fechado, quando os concorrentes não tomam conhecimento dos valores oferecidos pelos demais. Dessas, 17 fizeram lances, e 15 arremataram blocos, sendo seis estrangeiras.

São critérios para a disputa o valor oferecido como bônus de assinatura e o programa exploratório mínimo – atividades que a empresa se compromete a executar durante a fase de exploração. É declarado vencedor o concorrente que tiver a maior nota, calculada mediante atribuição de pontos e pesos a esses dois critérios.

Para áreas com acumulações marginais, o bônus de assinatura é o único critério, vencendo a licitante que ofertar o maior valor. A área de Japiim foi arrematada pelo consórcio formado pela Eneva e ATEM Participações, único interessando no certame. O bônus oferecido foi de R$ 165 mil.

Novata

Uma surpresa no leilão foi a empresa Elysian, criada em agosto deste ano com o objetivo específico de participar do leilão. Ela pertence ao empresário Ernani Machado, que nunca teve experiência na indústria do petróleo e arrematou mais de 100 blocos nas bacias de Potigar, Espírito Santo e Sergipe-Alagoas, se comprometendo com cerca de R$ 12 milhões em bônus de assinatura.

A empresa de Belo Horizonte não tem funcionários fixos. Conta apenas com sete consultores. De acordo com o empresário, o fato de ter vencido a disputa por dezenas de blocos não o preocupa.

“São várias áreas porque a minha probabilidade de ter petróleo em todas é um milagre de Deus. Então, eu tenho que levar em consideração que eu terei sucesso em 20% das áreas.”

Segundo o empresário, 40 pessoas devem ser contratadas nos próximos dias. A empresa precisará cumprir os investimentos mínimos de exploração – cerca de R$ 400 milhões – dentro de cinco anos.

“O que eu faço é criar tecnologias, e que essas novas tecnologias sejam aplicáveis em determinados setores. Esse é o nosso objetivo neste momento, fazer novas tecnologias com parceria com universidades, inclusive”, disse o dono da Elysian, que afirmou ter dinheiro próprio e de parceiros para bancar o investimento.

O diretor-geral da ANP, Rodolfo Saboia, confirmou que a Elysian estava apta a participar da concorrência pública. “A empresa apresentou as garantias. Se não, não teria sido nem qualificada para o leilão. Atendeu às exigências do edital. Aportou recursos para habilitá-la para dar os lances que deu.”

Saboia acrescentou que, em uma segunda fase, a Elysian precisará apresentar mais informações.

“Ela vai ter que comprovar condições técnicas e econômico-financeiras que são necessárias para empreender tudo aquilo que se comprometeu a fazer em termos de investimento”, disse.

Autossuficiência

Na abertura do leilão, Rodolfo Saboia defendeu a realização do certame em um momento em que o mundo busca uma transição energética voltada para fontes de energia sustentáveis.

“A dependência que o Brasil e o mundo têm do petróleo e do gás não será eliminada em cinco ou dez anos. Se deixarmos de realizar eventos como este, o que teremos na próxima década não será o fim do uso do petróleo no Brasil, mas o retorno à dependência externa de outros países produtores” disse.

Para enfatizar a defesa da exploração do combustível fóssil, Saboia acrescentou que a exportação de petróleo somou US$ 42,5 bilhões em 2022. “Quase metade do saldo da balança comercial brasileira advém exclusivamente do petróleo exportado”, afirmou.

Transição energética

Além disso, segundo o diretor da ANP, União, estados e municípios receberam R$ 118 bilhões em royalties e participações especiais pagas pelas companhias de petróleo no ano passado. “Esse valor aproxima-se a todo o orçamento da pasta de Educação do governo federal no mesmo ano”, comparou.

Para Saboia, não há contradição entre exploração de petróleo e transição energética. “A indústria do petróleo contribui para a arrecadação de recursos essenciais para a execução de políticas públicas para a educação, saúde, segurança pública e redução da pobreza e, inclusive, para financiar a própria transição energética”, disse.

Regime de concessão

As empresas vencedoras do 4º OPC assinarão contratos no regime de concessão. Nessa modalidade, o risco de investir e encontrar – ou não – petróleo ou gás natural é da concessionária, que se torna dona de todo o óleo e gás que venha a ser descoberto. Em contrapartida, além do bônus de assinatura, a petrolífera pagará royalties e participação especial (no caso de campos de grande produção). Os contratos são assinados pela ANP em nome da União.

Esse contrato é diferente do exercido nas áreas do pré-sal, onde acontece o regime de partilha. No pré-sal, a produção de óleo excedente (saldo após pagamento dos custos) é dividida entre a empresa e a União. Vence o direito de explorar a companhia que oferece a maior parcela de lucro à União. Ainda nesta quarta-feira, a ANP realizará o 2º Ciclo da Oferta Permanente de Partilha de Produção (OPP), que inclui blocos no Polígono do Pré-Sal: Cruzeiro do Sul, Esmeralda, Jade, Tupinambá (Bacia de Santos) e Turmalina (Bacia de Campos).

Áreas de preservação

O leilão desta quarta-feira enfrentou oposição de instituições da sociedade civil ligadas a questões ambientais. Na última quarta-feira (6), o Instituto Arayara divulgou um relatório que apontava que blocos ofertados pela ANP ameaçavam territórios quilombolas, indígenas e unidades de conservação.

Além de terem impetrado seis ações civis públicas na Justiça Federal contra o certame, os ativistas organizaram uma manifestação em frente ao hotel antes do leilão.

Oferta permanente

Os leilões de setores com blocos exploratórios de petróleo realizados nesta quarta-feira pela ANP fazem parte da oferta permanente, principal modalidade de licitação de blocos de exploração de petróleo e gás natural. Nesse formato, existe uma oferta contínua de áreas exploratórias. Assim, as empresas não precisam esperar uma rodada de licitações tradicional, que é feita de acordo com calendário de interesse do governo.

Além disso, as companhias contam com o tempo que julgarem necessário para estudar os dados técnicos dessas áreas antes de fazer uma oferta, sem o prazo limitado do edital de uma rodada. Esse modelo é considerado mais atrativo, em especial, para pequenas e médias empresas.

Desde que a exploração de petróleo no Brasil deixou de ser um monopólio da Petrobras, no fim da década de 1990, o Brasil realizou 33 rodadas de licitações de campos de exploração. De 1999 até o início dos leilões desta quarta-feira, o governo federal tinha arrecadado R$ 148 bilhões em bônus de assinatura pagos pelas empresas vencedoras das licitações.

Nesse período, o Brasil saltou do 18º para o nono lugar no ranking dos países produtores de petróleo e condensado (tipo muito leve de óleo). A produção cresceu de 970 mil barris por dia para 3,5 milhões por dia.

*Colaborou Cristina Indio do Brasil // Matéria ampliada às 17h28 para acréscimo das declarações do diretor-geral da ANP, Rodolfo Saboia, sobre a empresa Elysian

Brasil é um dos países mais perigosos para defensores de direitos

“Eu sofri uma tentativa de homicídio dentro deste território no começo deste ano”. O relato é do xondaro ruwixa Tiago Henrique Karai Djekupe, da Terra Indígena Jaraguá. Xondaro ruwixa significa líder  entre os guerreiros, em guarani. Na semana em que a Declaração Universal dos Direitos Humanos completa 75 anos, a Agência Brasil, em parceria com a TV Brasil e com a Rádio Nacional, publica uma série de reportagens sobre o tema. 

No Brasil, o papel de ativistas e movimentos sociais é imprescindível para que direitos e garantias fundamentais saiam do papel. Mas ser um defensor de direitos humanos no Brasil significa correr riscos. 

Levantamento das organizações Terra de Direitos e Justiça Global mostrou que, de 2019 a 2022, o Brasil registrou 1.171 casos de violência contra defensores de direitos humanos, com 169 pessoas assassinadas. Uma marca que coloca o Brasil entre os países mais perigosos do mundo para quem defende os direitos humanos.

“[Situações de] Pessoas passarem na frente da aldeia e ameaçar com arma. Apontar. Falar na região que minha cabeça estava a prêmio. Isso é o que vem trazendo essa dificuldade de eu conseguir… viver mesmo”, declara emocionado o jovem, de 29 anos, que é estudante de arquitetura e urbanismo da Escola da Cidade. 

São Paulo – Polícia militar atira bombas de gás lacrimogêneo contra manifestantes guaranis do Jaraguá – Foto Rovena Rosa/Agência Brasil (Arquivo)

Karai Djekupe é porta-voz de uma história ancestral. “Eu sou nascido neste território, Terra Indígena Jaraguá. Nosso território, que foi invadido em 1580 pelo bandeirante Afonso Sardinha, traficante de escravo angolano e conhecido como matador de Carijós. Carijós que eram como nos chamavam, o povo Mbya Guarani”, conta. A história é antiga e complexa, mas ajuda a entender o contexto em Karai Djekupé passou a correr risco de vida. 

Histórico

A Terra Indígena Jaraguá fazia parte de um aldeamento do século 17, o Barueri, informa relatório da Fundação Nacional do Índio (Funai) de 2013, assinado pelo antropólogo Spensy Pimentel. Depois de séculos de colonização, muitos indígenas morreram, e alguns adotaram a cultura dos colonizadores. Outros resistiram. Nos anos de 1960, a família de Djekupé foi expulsa de outro aldeamento guarani, no Sul do Brasil. Os avós seguiram, à força, para São Paulo, onde encontraram guaranis remanescentes do Barueri no Pico do Jaraguá. 

O Jaraguá é um pedacinho preservado da Mata Atlântica em plena cidade de São Paulo. O território foi demarcado em 1987 com apenas 1,7 hectare, a menor reserva indígena do Brasil. Em 2015, último ano do governo de Dilma Rousseff, a TI foi ampliada e passou a ter 532 hectares. Em 2016, uma portaria do então presidente Michel Temer voltou a reduzir o território, dessa vez para 3 hectares. Os indígenas recorreram à Justiça e uma liminar suspendeu a vigência da portaria. 

O texto de 2016, no entanto, nunca foi, de fato revogado, e o fantasma da redução do território segue assombrando os guaranis do Jaraguá. A reserva indígena é cercada por grandes rodovias, lugar estratégico para os serviços de logística e cobiçado pelo mercado imobiliário. Karai Djekupe aprendeu cedo que os interesses econômicos de gente poderosa alimentam a disputa.

São Paulo – Interdição da Rodovia dos Bandeirantes pelos indígenas do Jaraguá – Foto Rovena Rosa/Agência Brasil (Arquivo)

“Quando eu tinha por volta de 9 anos de idade chegou aqui a família Pereira Leite. A família de Joaquim Pereira Leite, que foi ministro do Meio Ambiente do [ex-presidente Jair] Bolsonaro. Ele veio reivindicando uma das áreas que estavam se formando na aldeia, que chama de Tekoa. A Tekoa Pyau fica encostada na Rodovia dos Bandeirantes e ele chegou falando que queria fazer ali uma transportadora, acesso para a rodovia, que a área ali era dele, era uma gleba. E ele queria que nosso xeramõi [meu avô] aceitasse um punhado de dinheiro em troca de sair da terra. Nosso xeramõi falou que não se trocava terra por papel e que a gente ia ficar ali, que aquela terra era sagrada para nós”, lembra. 

Luta por direitos

A família Pereira Leite é apenas uma das 15 que reivindicam a propriedade de partes da Terra Indígena Jaraguá. Karai Djekupe entrou para a lista de defensores de direitos humanos que são vítimas de violência no Brasil. O levantamento da Terra de Direitos e da Justiça Global mostra que corre ainda mais risco quem luta pelo direito à terra ou defende o meio ambiente, como é o caso dos guarani em São Paulo. De cada dez casos de agressões, oito foram de pessoas envolvidas em conflitos fundiários. Do total, 140 defensores e defensoras foram assassinados por defender seus territórios. 

O indigenista Bruno Pereira e o jornalista Dom Phillips, mortos no Vale do Javari em 2022, entram nessa estatística. Mas o levantamento ainda não inclui o assassinato de Maria Bernadete Pacífico, a Mãe Bernadete, liderança do Quilombo de Pitanga dos Palmares, na Bahia, assassinada em 2023 na frente dos netos, no dia 17 de agosto. Não é por acaso que indígenas e quilombolas estão entre as principais vítimas na luta por direitos. 

“Ela [a luta por direitos] está atravessada por uma dicotomia, vamos dizer assim, que persiste desde o nosso passado escravagista, que é uma dicotomia entre os alguém e os ninguém”, diz o psicanalista Christian Dunker, professor do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP).

São Paulo – Polícia Militar atira bombas de gás lacrimogêneo contra manifestantes guaranis do Jaraguá – Foto Rovena Rosa/Agência Brasil

Foi com lágrimas nos olhos e a voz embargada que Karai Djekupe disse o que significa ser uma pessoa alcançada pelos direitos humanos. “Acho que é o direito de viver. Não ter medo que alguém mate seu filho. Não ter medo de sair na rua e alguém te dar um tiro. Por você simplesmente querer defender a sua forma de ser. Acho que é isso. Desculpa”, disse à reportagem.

Dunker questiona esse cenário em que os direitos são garantidos parcialmente, numa lógica excludente. “Aqueles que têm lugar onde moram, têm habite-se, que constroem segundo as leis, pagam impostos, são reconhecidos pelo Estado, têm acesso à saúde e educação. E aqueles que estão no universo do, digamos assim, vida sem valor, que podem ser matadas impunemente, que são ninguém, que são quase gente. A gente força a mão ao dizer isso porque esse é um regime tácito de negação de direitos humanos.”

A reportagem tentou contato com o ex-ministro do Meio Ambiente Joaquim Pereira Leite, mas não conseguiu até a liberação desta matéria. 

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