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Mostra traz material inédito do criador do Zé do Caixão

Além, Muito Além do Zé do Caixão é uma exposição que traz não só material inédito sobre o personagem de filmes de terror, como busca resgatar facetas menos conhecidas de seu criador, o ator e diretor José Mojica Marins. “A minha geração, por exemplo, conheceu o Zé como um cara de programa de auditório, uma coisa meio caricata, daquela figura com as unhas grandes. Não era todo mundo que sabia que o cara tinha feito mais de 100 produções”, explica o curador da mostra, Marcelo Colaiacovo.

Nessa extensa carreira, que começa na década de 1940 e chega aos anos 2000, além do terror, Mojica dirigiu e atuou em filmes de faroeste, aventura, dramas sombrios (noir) e comédia. “Tem filmes de sexo explícito, que a gente deixou mais para o segundo andar, uma coisa mais 18 anos”, completa Colaiacovo sobre a organização da mostra. Podem ser vistos cartazes dos filmes, objetos cênicos, trechos de algumas produções e colagens inéditas.

São Paulo – Mostra Além, muito além do Zé do Caixão homenageia cineasta José Mojica Marins – Foto Rovena Rosa/Agência Brasil

Obras inéditas

“Quando o cinema acabou na Boca do Lixo, nos anos 1990 no Brasil, o Zé ficava recortando revista, recortando paisagens, juntava com coisas dos cartazes dele, xerocava, pintava com canetinha [caneta hidrocor]. Fez um trabalho de artes plásticas”, explica o curador sobre as obras que compõem o acervo da família do artista, que morreu em 2020, aos 83 anos. Ele completaria 88 anos na última quarta-feira (13).

Outra raridade é uma cena perdida do primeiro longa-metragem A Sina do Aventureiro, um faroeste de 1958. A película foi digitalizada artesanalmente pelo curador e faz parte do acervo que está sob sua guarda. Segundo ele, havia quem dissesse que a cena desaparecida por décadas, em que Mojica contracena com duas atrizes em um cabaré, não existia. “Os especialistas falavam que era mentira”, diz.

Boca do Lixo e Cracolândia

Para recontar a história de Mojica, Colaiacovo está resgatando também a história da chamada Boca do Lixo, área da região central paulistana que foi um polo de produção cinematográfica, principalmente entre as décadas de 1950 e 1980. Junto com sua sócia e companheira, Renata Forato, reabriu o Bar Soberano, que era ponto de encontro dos artistas à época. “O pessoal chegava aqui com um roteiro, e as produções eram formadas na mesa do bar. Atrizes escolhidas, eletricistas, maquinistas, era um lugar bem democrático”, conta sobre o espaço que foi reaberto próximo à Estação da Luz, em meio à aglomeração de pessoas em situação de rua e com consumo abusivo de drogas, conhecida com Cracolândia.

São Paulo – Mostra Além, muito além do Zé do Caixão homenageia o cineasta José Mojica Marins – Foto Rovena Rosa/Agência Brasil

“A gente não teria como acessar esse lugar se ele não tivesse tão degradado. A gente fez uma parceria independente com o antigo proprietário, porque era um lugar que, para ele, não valia a pena”, explica sobre como conseguiu realizar o sonho que alimentava há 15 anos de abrir um espaço sobre a história do cinema da Boca do Lixo.

Durante a reforma para implantação do empreendimento, que funcionará como bar e centro cultural, o casal se aproximou das organizações que oferecem atendimento à população desprotegida socialmente. “Fomos conhecendo todo tipo de coletivo, ONG [organização não governamental], artistas independentes e foi uma surpresa incrível de respeito com as pessoas, de ver como é possível lidar com as situações mais difíceis de uma maneira humana”, diz.

O curador lembra, inclusive, que mesmo antes da chegada do crack, já havia uma população marginalizada naquelas ruas. “À época da boca, do cinema, tinha um respeito mútuo com a marginalidade, a prostituição, o crime. O cinema aqui era uma coisa cara, que todo mundo respeitava: não ia vir aqui alguém assaltar as atrizes porque o negócio ficava feio”, lembra Colaiacovo, que foi assistente de Mojica por 15 anos.

Ele também se diz tranquilo em lidar com a carga controversa de parte da produção de Mojica, como a violência e o machismo, vistos por vezes no seu principal personagem. “O Zé do Caixão é um assassino. Ele mata pessoas porque tem uma funerária. É um sádico que mata e ainda lucra”, explica sobre como o personagem é claramente um vilão e não há exaltação de suas condutas. “É um personagem desprezível”, enfatiza Colaiacovo.

São Paulo – Mostra Além, muito além do Zé do Caixão homenageia o cineasta José Mojica Marins – Foto Rovena Rosa/Agência Brasil

Além do caixão

Os filmes feitos com baixo orçamento marcaram não só a história do cinema nacional, mas são referência do gênero em outras partes do mundo. Uma das filhas de Mojica, Liz Marins, lembra que o diretor norte-americano Tim Burton, nas vezes que esteve em São Paulo, se encontrou com o criador do Zé do Caixão e manifestou sua admiração pelo trabalho. Burton comandou grandes produções em Hollywood, como os filmes Edward Mãos de Tesoura e A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça. “Papai foi uma das referências do Tim. É muito forte isso, porque o trabalho do Tim é maravilhoso também”, diz Liz.

Com criatividade, Mojica foi capaz de produzir cenas e efeitos que custariam muito mais do que os recursos que tinha disponíveis. Um desses momentos acontece, segundo Liz, em À Meia-Noite Levarei Sua Alma, quando o diretor simula uma cena externa em um bosque, dentro de um espaço do tamanho de um quarto. O negócio é impressionante, ele correndo, perseguido por mortos-vivos pela floresta, você vai pensar que isso foi um cemitério. uma gravação externa. Nunca você vai imaginar que aquilo lá era pessoal correndo meio que em círculos”, diz.

O primeiro estúdio do criador do Zé do Caixão foi um galinheiro adaptado. De acordo com Colaiacovo foi ali que Mojica fez os primeiros filmes amadores na década de 1940. De uma família de artistas circenses espanhóis, o curador da exposição conta que desde cedo ele esteve em contato com a arte e com o cinema, até por esse ter sido um dos negócios do pai. “O pai e o tio eram toureiros e artistas. Eles estimularam muito o Mojica desde pequeno. Quando compraram o cinema, eles moravam nos fundos”, conta.

A exposição pode ser vista na Rua do Triunfo, 155, no centro paulistano, de quarta-feira a sábado, das 10h às 16h. A entrada é gratuita.

Museu paulistano completa 50 anos com mostras, palestras e concertos

Uma homenagem de um marido em luto para a falecida esposa. Foi assim que nasceu a Fundação Maria Luisa e Oscar Americano. Era março de 1974, dois anos após a morte de Maria Luisa, quando o engenheiro paulistano Oscar Americano de Caldas Filho (1908-1974) decidiu transformar a casa da família, na Avenida Morumbi, zona sul paulistana, em um espaço de lazer e cultura. 

Oscar Americano era um conhecido engenheiro de grandes obras no país e proprietário da Companhia Brasileira de Projetos e Obras (CBPO). “Oscar Americano foi um dos grandes responsáveis pelo crescimento e urbanização da cidade [de São Paulo], especialmente da região do Morumbi”, disse Luiz Ventura, diretor administrativo e financeiro da fundação. Já Maria Luisa Ferraz Americano de Caldas (1917-1972) era mecenas, uma patrocinadora de artistas.

“Essa transição de uma casa para museu vem de uma ideia do Oscar Americano para homenagear Maria Luisa. Os dois morrem jovens: ela com 54 e ele com 66 anos, em um intervalo de dois anos entre a morte de um e outro. Durante o luto, ele teve essa ideia de fazer reformas [na casa] e deixar um fundo de dinheiro pra cuidar desses primeiros anos de expansão do acervo e foi assim que se organizou essa homenagem. O acervo começa com essa ideia da casa, do parque e da coleção do casal sendo doados para que outras pessoas pudessem prestigiar e acessar um pouco da visão e do cotidiano deles”, explicou Gloria Maria dos Santos, educadora da fundação.

Foi assim que a casa modernista onde o casal viveu, projetada pelo famoso engenheiro-arquiteto Oswaldo Arthur Bratke (1907-1997) e rodeada por um vasto parque com paisagismo de Octavio Augusto Teixeira Mendes (1907-1988), foi doada à cidade de São Paulo, junto com uma vasta coleção de obras de arte. Vizinha do Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista, a fundação foi tombada em 2018 pelo Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp). Antes disso, a fundação já havia sido declarada de utilidade pública pelo governo de São Paulo.

Neta do Oscar e Maria Luisa, Patrícia Americano Vidigal Simón, conselheira da fundação, não conheceu os avós, mas mesmo assim, diz que o espaço tem um significado muito especial para ela. “Aqui sempre foi uma referência da minha família, mostrando como eles viviam. Sempre tive curiosidade de entender como é que era essa dinâmica familiar, mesmo porque a minha mãe era a mais nova da família, a filha temporã. A história que eu escuto é que ela teve um cômodo adaptado para ela”, contou ela à Agência Brasil.

“Infelizmente não os conheci [os avós]. Queria muito ter vivido aqui nessa casa, enquanto ela era casa, mas fui saber mais sobre ela com a minha participação na fundação”, acrescentou.

Hoje, o endereço onde o casal Oscar Americano e Maria Luisa viveu por 20 anos com os cinco filhos é um espaço cultural e arquitetônico formado por uma casa-museu, um parque com espécies nativas da Mata Atlântica e uma vasta programação cultural, que inclui os tradicionais domingos com concerto musical no auditório da casa e encontros literários. “O que a família almeja é que permaneça esse legado dos meus avós no sentido da cultura, da música, da arte e do parque. A fundação precisa ser um parque artístico e cultural”, reforçou Patrícia.

Fundação completa 50 anos com mostras dedicadas aos 500 anos de Camões e 200 anos da primeira Constituição brasileira. Foto: Júlio Acevedo

Acervo

Entre 1974, ano em que foi instituída a Fundação Maria Luisa e Oscar Americano, e 1980, quando a sede foi aberta ao público, a casa sofreu adaptações para permitir a distribuição organizada do acervo para visitação.

A coleção inicial teve como base os objetos de arte pertencentes à família, composto por pinturas, esculturas, porcelanas, pratas e mobiliário. Ao longo do tempo, novas peças foram sendo incluídas ao vasto acervo, que abriga objetos que ajudam a compor um retrato do país. “Todas as peças aqui conversam com a história do Brasil”, explicou Luís Henrique Rodrigues, educador da fundação.

O acervo é constituído, por exemplo, por mobiliários, pratarias, arte sacra e pinturas do artista holandês Frans Post, que ajudam a contar o período do Brasil Colônia; até louças, comendas, cartas e adereços do Brasil Império. “A nossa coleção Imperial, possivelmente, está entre as três coleções mais importantes do Brasil junto ao Museu Imperial [em Petropólis-RJ] e o Museu Mariano Procópio [em Juiz de Fora-MG]”, conta Eduardo Monteiro, diretor cultural da Fundação.

Há no acervo também muitas obras representativas do Modernismo brasileiro, com pinturas e esculturas de Di Cavalcanti, Cândido Portinari, Lasar Segall e Victor Brecheret.

“A narrativa que a gente tende a seguir é essa que conta 400 anos de Brasil. Então a gente pensa a representação do Brasil colonial, Brasil imperial e também de artistas modernos. Nesse caráter de coleção do modernismo ainda entram a casa e o parque”, esclareceu Gloria Maria dos Santos. “Quando a gente está lidando com um acervo que passa tanto pelo [período] colonial e pelo imperial, [precisamos] justamente entender que eram tempos diferentes. Agora, quando já temos um outro olhar, podemos ir revisitando essas obras”, disse a monitora.

Celebrações

Os 50 anos da fundação, completados neste mês de março, vai ser celebrado com programação diversa. A agenda prevê palestras sobre a história do Brasil, encontros literários, concertos musicais, exposições e até chá com membros da Academia Paulista de Letras (APL).

Em abril, por exemplo, um evento literário vai falar sobre os 500 anos de nascimento do poeta e dramaturgo Luís de Camões (nascimento estimado em 1524 e morte em 1580), destacando uma peça do acervo da fundação: uma cópia do livro Os Lusíadas que foi feita especialmente para homenagear Dom Pedro II.

Haverá também homenagens aos 80 anos de nascimento do poeta brasileiro Paulo Leminski (1944-1989) e aos 200 anos da primeira Constituição brasileira, de 1824. Para a celebração da Constituição, por exemplo, a fundação vai destacar um exemplar do seu acervo: um estojo contendo uma miniatura da Constituição Imperial, outorgada por D. Pedro I.

A Constituição de 1824 foi a de duração mais longa do país, num total de 65 anos. A Carta continha 179 artigos e é considerada pelos historiadores como uma imposição do imperador. Entre as principais medidas dessa Constituição estava o fortalecimento do poder pessoal de Dom Pedro, com a criação do Poder Moderador, que estava acima dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

Medalha-estojo da Constituição Imperial outorgada por d. Pedro em 1824. Foto – Acervo Fundação Maria Luisa e Oscar Americano

“Temos esse exemplar, em miniatura, da Constituição de 1824. Vamos fazer uma mostra para expor essa peça no hall de entrada porque ela é uma peça única. É incrível que está tudo escrito ali, em papel. É uma medalha-estojo, com a Constituição ali dentro”, disse Monteiro.

A instituição também está se preparando para os 200 anos de nascimento de Dom Pedro II, que serão completados em 2025. Para isso ela vai realizar uma série de palestras sobre a história do Brasil, que vão culminar com uma exposição sobre Dom Pedro II, a partir de novembro.

A Fundação Maria Luisa e Oscar Americano tem entrada gratuita às terças-feiras. Mais informações podem ser obtidas no site da instituição

Abdias Nascimento, 110 anos: a luta para unir africanos e descendentes

O ano era 1974. Abdias Nascimento participava do 6º Congresso Pan-Africano em Dar-es-Salaam, na Tanzânia, como único representante da América do Sul. Durante o evento, o intelectual brasileiro foi convidado pelo embaixador de Uganda para conhecer a fonte do Rio Nilo. Ao lado de outros ativistas, artistas e intelectuais, Abdias experimentou um banho transformador.

“Aquelas águas que alimentaram tantas antigas civilizações negras me emocionaram extremamente; elas encharcaram a minha alma. Banhei-me nelas como num batismo primordial, como se de fato estivesse nascendo de novo”, escreveu Abdias em testemunho de 1976.

Homem negro, era natural de Franca, no interior de São Paulo. Foi ator, dramaturgo, poeta, escritor, artista plástico, professor, político e ativista antirracista. Há exatos 110 anos, nascia Abdias, um dos maiores intelectuais do Brasil. Nessa trajetória extensa, ele se destacou como o principal difusor do pan-africanismo no país. Em termos simples, um movimento em defesa da unidade política dos povos africanos, que tem origem no século 19, mas ganha força no século 20, no contexto da descolonização da África e das lutas antirracistas em todo o mundo.

O “batismo” de Abdias no Nilo representava essa reconexão com a África, que dizia ser a verdadeira terra natal dele, o único lugar em que havia se sentido em casa. Com o Brasil, a relação era “cheia de revolta” e “paradoxal”, por entender que a sociedade recusava as raízes africanas do povo negro e tentava silenciá-las.

Foto Acervo do Ipeafro/Divulgação

Em 1968, Abdias viajou aos Estados Unidos para um intercâmbio com movimentos que promoviam os direitos civis e humanos da população negra. Ao perceber o aumento da repressão e da violência na ditadura militar brasileira, decidiu autoexilar-se. Durante 13 anos, viveu nos Estados Unidos e na Nigéria.

O sociólogo Túlio Custódio, mestre e doutor pela Universidade de São Paulo (USP), pesquisou o período de exílio de Abdias e explica que as experiências internacionais tiveram influência grande no pensamento político e intelectual dele. Como professor universitário, participou de vários eventos nos Estados Unidos, na América Central e na África. E pôde aprofundar críticas à ideia do Brasil como uma democracia racial, além estreitar os laços internacionais com pensamentos e intelectuais africanos.

“O foco dele continua sendo o Brasil. É a partir do país que pensa a questão racial. Mas ele entende que as raízes negras brasileiras estão diretamente associadas a uma noção de cultura africana, que dá respaldo a uma visão de pan-africanismo e de diáspora. O intelectual alarga a dimensão de resistência e de revolta que já estava presente no pensamento dele nos anos 1960, e as conecta com o pan-africanismo. Conecta a luta do negro brasileiro com o movimento de descolonização da África e com o movimento dos direitos civis nos Estados Unidos”, explica Túlio Custódio.

No contexto da perseguição dos militares aos opositores e de outros exílios, Abdias fez questão de marcar a diferença da situação dele em relação à de outros intelectuais e militantes brancos.

“Meu exílio é de outra natureza. Não começou em 1968 ou 1964, nem em momento algum dos meus 62 anos de vida. Hoje, mais do que nunca, compreendo que nasci exilado, de pais que também nasceram no exílio, descendentes de gente africana trazida à força para as Américas”, escreveu.

Pan-africanismo

Quando chegou aos Estados Unidos, Abdias já trazia um currículo longo: havia fundado o Teatro Experimental do Negro (TEN) em 1944, que denunciava a segregação nas artes brasileiras e promovia os direitos civis e humanos dos negros; participara da organização da Convenção Nacional do Negro, em 1945 e 1946, e do 1º Congresso do Negro Brasileiro, em 1950; editara o jornal Quilombo: Vida, Problemas e Aspirações do Negro; e era o curador fundador do Museu de Arte Negra.

Como professor universitário no exterior, teve a oportunidade de conhecer intelectuais e militantes de vários países e entrar em contato com as diferentes vertentes do pan-africanismo, como explica o sociólogo Túlio Custódio.

Foto Acervo do Ipeafro/Divulgação

“Antes da minha pesquisa, tinha expectativa de que o Abdias estaria em diálogo com as teorias norte-americanas e o movimento negro de lá. E não é o caso. Na verdade, ele acaba se conectando mais com os intelectuais de origem africana. E mesmo quando dialoga com intelectuais dos EUA, é mais com aqueles que estão envolvidos na discussão do pan-africanismo ou do nacionalismo negro. Casos de Molefi Asante, Maulana Karenga, Cheikh Anta Diop e Anani Dzidzienyo”.

O pan-africanismo estava dividido ente grupos pró-comunistas, pró-capitalistas e de uma chamada terceira via. Abdias se identificou com o último grupo, por entender que comunismo e capitalismo não apresentavam soluções para os problemas específicos da população negra. Para ele, o mundo africano deveria buscar a própria identidade ideológica, com base na experiência histórica do continente, mas também nas experiências das diásporas nas Américas e Pacífico. Foi o que ele defendeu no discurso do 6º Congresso Pan-Africano de 1974, aquele citado no início da reportagem, do emblemático banho no Rio Nilo.

Rio de Janeiro – A diretora do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros, Elisa Larkin Nascimento – Tomaz Silva/Agência Brasil

Foi nesse mesmo ano que Abdias conheceu Elisa Larkin nos Estados Unidos. Ela havia participado de movimentos estudantis e políticos contra a guerra do Vietnã, contra empresas americanas que sustentavam o regime do apartheid na África do Sul e de outros embates contra o racismo no próprio país. Elisa conta que houve uma afinidade imediata, por terem tantos pontos em comum na vida pessoal e intelectual. Das trocas entre os dois, aprendeu mais sobre a história das filosofias e culturas africanas e acompanhou de perto a atuação incisiva do companheiro nos círculos internacionais.

“O Abdias vai ter uma voz muito maior dentro desses círculos do pan-africanismo. No Brasil, crescia a consciência entre a população negra sobre essa dimensão internacional e pan-africana de luta. E a mesma coisa acontecia do lado de lá. Os movimentos pan-africanos no exterior não tomavam conhecimento de uma população negra que era a maior do mundo fora da Nigéria. Quando Abdias começou a dizer isso no início dos anos 70, as pessoas achavam um absurdo: ‘esse cara está enlouquecendo’. Ele era rechaçado. Os ativistas do exterior não tinham a consciência dessas outras populações”, diz Elisa.

Volta ao Brasil

Quando voltou ao Brasil em 1981 definitivamente, Abdias fundou com Elisa o Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (Ipeafro). A instituição organizou o 3º Congresso de Cultura Negra das Américas, em São Paulo, em 1982). A revista Afrodiáspora, lançada no ano seguinte pelo Ipeafro, traz na capa menção ao congresso e diz que os negros reunidos nele buscavam a própria identidade, impor respeito à condição comum de descendentes dos povos africanos.

Nas décadas seguintes, se manteve ativo na defesa do pan-africanismo e contra a desigualdade racial em congressos e seminários internacionais, além de publicar dezenas de livros em inglês e português. Entre eles estão O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado, O quilombismo e O Brasil na mira do pan-africanismo.

Na vida política, Abdias Nascimento assumiu o cargo de deputado federal em 1983, eleito suplente pelo PDT-RJ. Como integrante da Comissão das Relações Exteriores, propôs medidas contra o apartheid, de apoio ao Congresso Nacional Africano (ANC) da África do Sul e ao movimento pela independência da Namíbia.

Abdias Nascimento deixou legado de luta antirracista – Foto Acervo do Ipeafro/Divulgação

“É o Abdias que traz essa discussão sobre o apartheid e a necessidade de rompimento de relações diplomáticas do Brasil com o regime sul-africano do apartheid. E também vai incluir isso além do Congresso, como item importante de luta para todos os negros, inclusive o brasileiro”, afirma Fabiana Vieira, historiadora que pesquisa as relações entre Brasil e África do Sul, no que diz respeito à atuação do movimento negro.

Legado

Abdias Nascimento morreu em 2011, aos 97 anos. Deixou um legado de luta antirracista, vasta publicação intelectual, acadêmica e artística. Mas os pesquisadores ouvidos pela Agência Brasil dizem que, apesar dos esforços para difundir o pan-africanismo no país, a doutrina ainda tem pouca influência sobre o movimento negro.

A historiadora Fabiana Vieira entende que falta projeto político de integração com pautas do exterior.

“O movimento negro atual perdeu essa ideia de internacionalização. O que me parece é que a conexão hoje é mais acadêmica e pontual, quando tem algum evento ou acontecimento no exterior que mereça maior atenção. Não há um projeto político contínuo de internacionalização do movimento negro, como pretendia Abdias Nascimento”.

O sociólogo Túlio Custódio entende que intelectuais e pensamentos do movimento negro dos Estados Unidos são mais influentes sobre os brasileiros.

“Apesar de toda a contribuição que uma parte do movimento negro teve, o que inclui o Abdias, de pensar uma identidade negra a partir da África, quem leva o jogo, vou colocar nesses termos, é a perspectiva norte-americana. Impacto dela na realidade brasileira vem pelas roupas, pelos movimentos culturais, musicais, e que vão trazer uma força de influência na identidade negra. Quando a África aparece, é quase numa perspectiva etérea, menos conectada com os elementos culturais que estão no pensamento de Abdias. As reflexões para lidar com os problemas concretos do Brasil partem de ferramentas teóricas mobilizadas no debate estadunidense”.

Quem continua na luta pela valorização das raízes africanas e defende o legado de Abdias é o Ipeafro, hoje sob direção da viúva Elisa Larkin Nascimento.

“Nosso trabalho é fazer com que o pictórico, o acervo museológico, as obras de arte e o acervo documental do Abdias possam ajudar a pensar e a criar maneiras de trazer esse legado ao conhecimento das novas gerações. Não apenas de crianças e adolescentes e pessoas negras, mas do país inteiro, para a gente entender melhor a história do povo negro e como ela se relaciona à dos povos originários africanos”, disse Elisa.

Saúde anuncia criação de memorial para vítimas da covid-19

Em 11 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) classificava o cenário de covid-19 no mundo como uma pandemia. Quatro anos depois, nesta segunda-feira (11), o Ministério da Saúde anuncia a criação de um memorial às vítimas da doença que matou 710 mil brasileiros. O local escolhido, de acordo com a ministra da Saúde, Nísia Trindade, é o Centro Cultural do Ministério da Saúde no Rio de Janeiro.

“Ao falarmos de um memorial e de uma política de memória, porque é isso que estamos propondo, não circunscrevemos a pandemia de covid-19 ao passado. Como todas as reflexões sobre memória, sabemos do componente presente, político, das ações de memória. E, ao mesmo tempo, lembramos que, a despeito de termos superado a emergência sanitária, nós não superamos a covid-19 como problema de saúde pública.”

Nísia participa da abertura do Seminário para Concepção e Criação do Memorial da Pandemia da Covid-19. Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Ao participar da abertura do Seminário para Concepção e Criação do Memorial da Pandemia da Covid-19, a ministra lembrou que a OMS discute atualmente a criação de um instrumento para o enfrentamento de emergências e pandemias que não permita que cenários como o registrado em junho de 2021 se repitam.

Neste período, a vacina contra a covid-19 já havia sido registrada e era amplamente comercializada, mas apenas 10% dos países tinham acesso. “Não pelo negacionismo, como vivemos no Brasil, mas pela desigualdade na distribuição e produção de vacinas e outros insumos.”

“Ao mesmo tempo, tem que fazer parte desse aprendizado o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS). Porque só um sistema de saúde potente e resiliente pode fazer frente a possíveis e futuras pandemias que o mundo todo discute”, disse.

“Ao falarmos do memorial, falamos da importante relação entre memória e história. Não circunscrevemos ao passado, mas pensamos também em que projeto nós queremos para a saúde, para o Brasil, para a democracia e para o mundo.”

Marcas

Para a representante da Rede Nacional das Entidades de Familiares e Vítimas da Covid, Rosângela Dornelles, a pandemia de covid-19 deixou marcas de profundo sofrimento na população brasileira. “No Brasil, ela foi agravada pela desresponsabilização do Estado na coordenação de medidas para seu combate, pelo desmonte de serviços públicos e pelo negacionismo ao seu enfrentamento”. Ela cita ainda um processo de “naturalização” de um número cada vez maior de mortes pela doença.

“Cabe lembramos da bravura dos trabalhadores do SUS, que enfrentaram com suas vidas essa doença. Antes mesmo da covid-19 e mais agora no pós-pandemia, a defesa do SUS exige que apontemos para o seu redimensionamento, de modo a dar respostas efetivas às atuais e futuras demandas orientados por um conceito ampliado de saúde”, destacou a médica de família, ao citar desafios como o represamento assistencial imposto pela pandemia, as desigualdades sociais e a crise climática.

“A OMS nos lembra: apesar de passada a situação de emergência, continuamos a viver comum vírus que sofre mutações e pode seguir gerando a doença e mortes. A pandemia deixou marcas de profundo sofrimento na população brasileira. Um processo dramático vivido pela maioria das famílias. Isso nos impõe promover a defesa da dignidade humana e da vida. Responsabilizar sim os gestores públicos e privados, negligentes ou omissos, e recompor as políticas de direitos e proteções sociais de forma articulada, com ousadia e expectativas ampliadas.”

São Paulo vence Ituano nos acréscimos e vai às quartas do Paulistão

O São Paulo venceu o Ituano por 3 a 2, na tarde deste domingo (10), no estádio Novelli Júnior, e avançou às quartas de final do Campeonato Paulista, em primeiro lugar do Grupo D. Com o triunfo, O Tricolor chegou aos 22 pontos e fechou a primeira fase na liderança do Grupo D. Já o Ituano encerrou o torneio com a pior campanha  e foi rebaixado para a Série A ado Estadual em 2025. O time da cidade de Itu somou apenas seis pontos no Paulistão e terminou o torneio na lanterna do Grupo A.

⚽️ Nos acréscimos, o gol de @LucasMoura7 que deu a vitória ao Tricolor!

Ituano 2️⃣ x 3️⃣ São Paulo #VamosSãoPaulo 🇾🇪 pic.twitter.com/s9o0ta5w2a

— São Paulo FC (@SaoPauloFC) March 10, 2024

A classificação do São Paulo foi dramática. O gol que garantiu a vitória e a vaga nas quartas saiu já aos 52 minutos da etapa final, marcado por Lucas Moura. Os outros gols do Tricolor foram de Ferreirinha, aos 18 minutos, e de Luciano, aos 35 da primeira etapa,. Na volta do intervalo, Zé Carlos fez os dois gols do Ituano de cabeça: o primeiro aos 26 minutos, contando com o desvio da zaga e o outro aos 43 da etapa final. 

O outro classificado do Grupo D foi o Novorizontino, que superou a Portuguesa por 2 a 0 jogando em casa. A equipe do interior paulista fechou a primeira fase na segunda colocação, com 22 pontos – mesmo total do São Paulo, mas com saldo de gols inferior. Os dois se enfrentarão nas quartas final. 

Já o São Bernardo venceu o Mirassol por 2 a 0 fora de casa, mas foi eliminado na terceira posição do Grupo D, com 21 pontos. O time, no entanto, encerrou a primeira fase entre os seis clubes com melhor campanha. O Mirassol também deu adeus ao Paulistão, na quarta e ficou em quarta e última posição do Grupo C,   

VAI PEGAR FOGO!
Assim ficaram os confrontos das quartas de final do Paulistão Sicredi 2024 🔥#PaulistãoSicredi pic.twitter.com/XIYK67ehH8

— Paulistão (@Paulistao) March 10, 2024

Água Santa dá adeus à classificação 

O Água Santa entrou em campo sonhando com a classificação diante do já eliminado Corinthians, mas não saiu do 0 a 0 em casa, em Diadema. A equipe do ABC Paulista encerrou a primeira fase em terceiro lugar do Grupo B, com 15 pontos, atrás do líder Palmeiras (28) e da Ponte Preta (17), segunda colocada. O Timão fechou a fase classificatória em terceiro no Grupo C com 14 pontos, atrás do Bragantino (21), primeiro da chave, e do Inter de Limeira (17), o vice-líder. 

Santo André só empata e está rebaixado

O Santo André chegou na tarde deste domingo (10) precisando de uma combinação de resultados para não ser rebaixado à Série A2 na próxima temporada. Além de vencer, e equipe dependia da derrota do Guarani diante do Red Bull Bragantino, já classificado às quartas na liderança do Grupo C.  O Santo André até fez a parte dele. Ganhou em casa da Ponte Preta por 1 a 0, no estádio Bruno José Daniel. Mas o Guarani também garantiu os três pontos na tabela ao ganhar do Bragantino por 1 a 0 em Campinas, e o Santo André acabou fora da zona de classificação em terceiro lugar do Grupo A  – o Santos (25) liderou a chave e a Portuguesa (10) ficou e segundo lugar. 

Penúltimo na classificação geral da primeira fase,com oito pontos, o Santo André  vai jogar a Série A2 do Paulistão em 2025. Já o Guarani escapou do rebaixamento, mesmo com a última colocação no Grupo B, ao somar 10 pontos. 

Hoje é dia: combate ao sedentarismo e Teatro do Oprimido são destaques

A semana começa com um convite: vamos nos movimentar? Hoje, 10, é o dia Mundial de Combate ao Sedentarismo. A data lembra a importância da atividade física, seja ela qual for. Uma pesquisa realizada pelo Sesi, no ano passado, mostrou que 52% dos brasileiros não praticavam atividade física. A Agência Brasil trouxe os detalhes do estudo, que ainda relacionou a prática da atividade física com o adoecimento: 72% das pessoas que praticavam exercícios com frequência não tinham tido problemas de saúde nos 12 meses anteriores à pesquisa. Em compensação, entre os que nunca praticavam atividades físicas, 42% tinham sofrido algum problema de saúde em 2022.

Na segunda, 11, a cantora e compositora, atriz e dubladora, Tetê Espindola comemora 70 anos. Nascida no Mato Grosso, Tetê estourou com a canção “Escrito Nas Estrelas”, de Arnaldo Black e Carlos Rennó, que venceu o Festival dos Festivais, em 1985. A cantora foi a estrela do programa Todas as Bossas, exibido pela TV Brasil em 2019. E bateu um papo com a jornalista Ana Pimenta, no Mosaico, da Rádio Nacional da Amazônia.

Falando em rádio, no dia 13 a atriz e dubladora paulista Gessy Fonseca, completaria 100 anos. Ela foi atriz de radionovelas na Rádio Nacional do Rio de Janeiro e emprestou a voz a grandes divas, como Sophia Loren e Winona Ryder. Era considerada uma das melhores radioatrizes do Brasil. E a tradição das radionovelas segue firme nas rádios da EBC. A radiodramaturgia é uma forma lúdica de levar ao ouvinte todo tipo de informação e conteúdo.

Na quinta, dia 14, lembramos os 110 anos de nascimento da escritora mineira Carolina Maria de Jesus. Com sua obra de maior sucesso, Quarto de Despejo, Carolina foi traduzida em mais de uma dúzia de idiomas. No ano em que o livro, escrito em forma de diário, completou 60 anos, o Caminhos da Reportagem nos apresentou uma Carolina para além do quarto: vaidosa, que gostava de se arrumar e usar pérolas. Uma Carolina que escreveu livros, peças de teatro e provérbios e que inspira escritoras até os dias atuais.

Encerrando a semana, o dia 16 celebra o Dia Nacional do Teatro do Oprimido. O dia é uma homenagem ao seu criador, o teatrólogo Augusto Boal. O Teatro do Oprimido ficou mundialmente conhecido como uma forma de democratização dos meios de produção cultural. A Agência Brasil conversou com jovens que participavam do projeto Teatro do Oprimido na Maré, que disseram que a técnica teatral ajuda na reflexão sobre a sociedade.

Homens ocupam seis em cada dez cargos gerenciais, aponta IBGE

As mulheres são maioria entre os estudantes que estão em vias de concluir o ensino superior, no entanto são minoria em relação a posições de poder. Dados divulgados nesta sexta-feira (8) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram, por exemplo, que apenas 39,3% dos cargos gerenciais no país são ocupados por mulheres.

As mulheres só são maioria nas gerências e coordenações das áreas de educação (69,4%) e saúde humana e serviços sociais (70%).

“As mulheres ocupam mais posições de gerência justamente onde elas estão também mais colocadas de uma forma geral, que é na área de educação, na área de saúde e serviços sociais, ou seja, áreas relacionadas a cuidados”, constata a pesquisadora Bárbara Cobo.

A menor participação feminina é percebida no setor de agricultura, pecuária, engenharia florestal, aquicultura e pesca (15,8%).

A disparidade é observada não apenas no percentual dos cargos como também na remuneração. O rendimento das executivas femininas é apenas 78,8% dos pagos para os homens.

Em apenas três áreas, o rendimento feminino supera o masculino: agricultura, pecuária, engenharia florestal, aquicultura e pesca (128,6%), água, esgoto e atividades de resíduos (109,4%) e atividades administrativas e serviços complementares (107,5%).

São curiosamente atividades em que os homens predominam. “A gente imagina que isso esteja associado a elas estarem entrando nesses setores caracteristicamente ocupados por homens com uma especialização profissional maior, que leve a esse rendimento maior”, explica Bárbara.

As maiores desigualdades estão nos setores de transporte, armazenagem e correio e de saúde humana e serviços sociais. Nesses setores, os rendimentos das mulheres correspondem a 51,2% e 60,9% dos homens, respectivamente.

Outros cargos

As mulheres são minoria também em cargos de poder no serviço público, tanto na política como na Justiça, mostra a pesquisa. Em relação ao parlamento, por exemplo, apenas 17,9% dos deputados federais eram mulheres em novembro de 2023.

Apesar de apresentar um avanço em relação a setembro de 2020, quando as deputadas federais representavam 14,8% do total, o Brasil ainda está na 133ª posição entre 186 países, no que se refere à participação parlamentar das mulheres.

Em 2020, somente 12,1% dos municípios elegeram prefeitas – das quais dois terços eram brancas. Do total de parlamentares municipais eleitos naquele ano, 16,1% eram vereadoras.

Em relação aos ministérios, apenas nove dos 38 cargos com status ministerial eram ocupados por mulheres em novembro de 2023.

Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostram que houve um avanço na parcela de magistradas no país de 1988 (24,6%) para 2022 (40%), mas as mulheres ainda são minoria. Na Justiça estadual, as mulheres são 38%, enquanto no Superior Tribunal de Justiça (STJ) são 23%.

Educação

Se, no mercado de trabalho formal, os homens levam vantagem, na educação são as mulheres que mais se destacam.

Entre os estudantes que estão no último ano da faculdade, 60,3% são mulheres. A maior parte delas está concentrada nos cursos de graduação relacionados à área de bem-estar (91% são mulheres).

“Elas concluem o ensino superior numa proporção maior do que os homens, então supostamente deveriam ter uma média salarial maior, mas quando você olha as áreas em que elas têm participação maior, são as áreas menos valorizadas”, ressalta a pesquisadora Betina Fresneda.

Nos cursos de ciência e tecnologia, que incluem as áreas de ciência, tecnologia da informação, matemática, estatística e engenharia, as mulheres são apenas 22% dos concluintes.

“Apesar de elas estarem em ampla vantagem no acesso ao ensino superior, e isso não mudou muito em 10 anos, elas ainda enfrentam barreiras para ingressar em determinadas áreas do conhecimento, especialmente naquelas ligadas a ciências exatas e à esfera da produção”, destaca Betina.

Segundo a pesquisa, entre as mulheres com 25 anos de idade ou mais, 21,3% tinham completado o ensino superior, contra 16,8% dos homens. Percebe-se, no entanto, desigualdade maior quando se compara as mulheres brancas (29%) com as pretas ou pardas (14,7%). A disparidade de cor ou raça pode ser observada também no quesito frequência escolar: 39,7% das mulheres brancas de 18 a 24 anos estudavam, contra apenas 27,9% das mulheres pretas ou pardas.

 

CEO

Milena Palumbo, primeira mulher CEO da GL events Brasil – Foto: GL events Brasil/Divulgação

O sonho de adolescente era ser jogadora de vôlei. Passado algum tempo, pensou em fazer faculdade de medicina. Enquanto não chegava esse momento, o rumo mudou e foi em um curso de turismo na Faculdade Federal do Paraná que Milena Palumbo encontrou o caminho na área de planejamento, que a levou atualmente a ser a primeira mulher a ocupar o cargo de CEO da GL events Brasil, uma das unidades do grupo espalhado em mais de 20 países de cinco continentes com a matriz na França.

O grupo, no qual está há 17 anos, é líder mundial do mercado de eventos culturais, esportivos, institucionais, corporativos ou políticos e congressos e convenções, além de feiras de negócios e exposições. “O caminho feminino é muito mais complexo. Tem mais obstáculos, alguns sprints maiores. Tem que estar mais bem preparada, tem que estar com preparo físico muito melhor. A mulher para chegar em funções ela precisa entregar mais e ser mais preparada do que os homens”, avalia em entrevista à Agência Brasil.

A descoberta da área de planejamento foi fundamental para a carreira de Milena. A medicina perdeu uma médica e o mercado ganhou uma administradora. Milena reconheceu que nem sempre outras mulheres conseguem o apoio que recebeu tanto dos pais, ao resolver o seu destino profissional, quanto, depois, do marido, quando precisou se transferir de Curitiba, no Paraná, para assumir um cargo em uma unidade da empresa no Rio de Janeiro. Naquele momento estava casada há 3 anos e chegou a ficar insegura, até pensando em não aceitar a transferência.

“No mundo masculino seria uma coisa positiva, porque a mulher acompanha, não tem tantos dramas, não passa por um dilema como eu passei. Embora a pauta seja feminina, um dos meus maiores suportes é o meu lado masculino em casa, porque ele foi a pessoa que mais me deu força e disse ‘vai’”, disse, acrescentando que em nenhum momento houve a sensação de ficar devendo ao marido. “Nunca fui devedora desse movimento profissional, e esse movimento foi onde minha carreira alavancou”.

A referência dos pais que são ortodontistas, e sempre tiveram juntos uma vida profissional, ajudou na sua evolução profissional. Após a chegada ao Rio de Janeiro, foi um longo aprendizado em áreas onde não tinha exercido qualquer função e o conhecimento ainda não era completo.

Preconceitos

Conforme foi evoluindo e alcançando cargos, foram surgindo também as diferenças. Em uma viagem acompanhando um presidente de uma empresa, foi perguntada se era secretária dele, mas, na verdade, era diretora da empresa. Em outro momento, um diretor com o qual trabalhava precisou dizer a um executivo estrangeiro que se dirigisse a ela, porque era a diretora do projeto. “O cara continuou falando com ele. Esse é o direto, é um choque, mas aí estou falando de cultura”, disse, defendendo que não se pode normalizar situações deste tipo.

Milena apontou ainda a questão dos elogios à aparência, como mais um fator cultural. Nesse caso, é como se as mulheres precisassem ser agradecidas. “Eu não saio de um almoço de trabalho e falo ‘nossa como você está bonito’ [se dirigindo a um homem]. ‘Nossa essa roupa te cai muito bem’. As mulheres não fazem isso. Você aceita um elogio se está em uma situação social diferente. Não em ambiente profissional”.

A CEO tem duas filhas, uma de 11 e a outra de 8 anos de idade. “Tive momentos difíceis. Na primeira gravidez, eu estava no meio da Rio+20, um evento super complexo, extremamente estressante. Eu já era diretora e a gente entregou tudo para a Rio+20. Foram 156 países representantes em um evento com mais de 20 mil pessoas, que exigiu 6 meses. O evento acabou, dei à luz 3 semanas depois. É possível, mas você é exigida. Na segunda filha, eu estava de licença e precisei voltar porque a gente ia entrar em concorrência de um mega projeto para o grupo no Brasil”.

Para as filhas, Milena quer que façam boas escolhas na vida. “A primeira coisa do fundo do meu coração é que elas façam boas escolhas. Em relação à vida profissional, que seja em alguma coisa que tenham muito prazer. Vai ser difícil, mas que elas saibam que 70% do tempo vão ser de coisas que não gostam e 30% que gostam em qualquer decisão profissional que tenham”, desejou, lembrando de como é a realidade. 

Ilustradoras negras lançam versão em quadrinhos de Quarto de Despejo

Escrito a partir das memórias da catadora de papel Carolina Maria de Jesus, o livro Quarto de Despejo vai ganhar nova versão neste ano, como história em quadrinhos (HQ). O lançamento, liderado por ilustradoras negras, comemora os 110 anos da autora, que se tornou referência na literatura brasileira, que serão completados no dia 14 de março.

A coordenadora editorial de literatura e informativos da SOMOS Educação, grupo do qual faz parte a editora Ática, que publicou o livro no Brasil, em 1960, Laura Vecchioli do Prado, teve a ideia quando, em 2020, saiu a edição comemorativa dos 60 anos do Quarto de Despejo. Foi então lançada a adaptação da obra para teatro.

“Queríamos continuar fazendo algum trabalho em cima do Quarto de Despejo. Como é um gênero literário que gera bastante interesse do público, a ideia foi adaptá-lo para HQ, com o propósito também de incentivar a leitura já a partir do sexto ou sétimo ano do ensino fundamental”, disse Laura à Agência Brasil. A obra é lida pelo público juvenil do ensino médio em diante e, com a versão em quadrinhos, seria possível atingir um público mais novo, acrescentou Laura.

O livro já está disponível para venda na internet e em algumas livrarias. A data dos eventos de lançamento, entretanto, ainda não foram alinhadas com as herdeiras de Carolina Maria de Jesus, mas deverão acontecer nos próximos meses.

Artistas negras

A versão HQ da obra foi feita por quatro artistas negras: a roteirista Triscila Oliveira (@afemme1), a ilustradora Vanessa Ferreira (@pretailustra) e as arte-finalistas Hely de Brito (@ilustralyly) e Emanuelly Araujo (@vulgoafronauta).

“Pelo próprio histórico do livro e da Carolina, a ideia inicial, quando eu pensei na HQ, era trazer para esse livro mulheres pretas e, de preferência, periféricas. Foi aí que começamos a pesquisar. Todas elas são mulheres pretas e somente uma não é periférica. A gente queria dar um espaço para novatas, mas como era um livro de grande importância, uma responsabilidade muito grande, pegamos mulheres já experientes com HQ, caso da Triscila Oliveira, que já escreve roteiros”.

Nas orelhas e também dentro do livro, as quatro artistas relataram como foi fazer o livro e a relação delas com o Quarto de Despejo.

Experiência

Para a ilustradora Vanessa Ferreira, ilustrar o livro de Carolina Maria de Jesus “foi uma loucura. É um projeto que a gente soltou em tempo recorde. Foi muita correria, principalmente na etapa final, além do fato de a gente ter que trazer do imaginário, ter que construir visualmente uma vivência que muita gente não tem”, disse Vanessa à Agência Brasil. “Foi uma experiência incrível.”

Com 90 páginas ilustradas, o livro de HQ demandaria, normalmente, em torno de um ano e meio para ficar pronto, cumprindo todo o processo clássico, mas as quatro artistas conseguiram finalizá-lo em sete meses.

Quando iniciou as ilustrações para o livro, Vanessa verificou que a infância de Carolina e a dela própria tinham semelhanças. Ambas cresceram dentro de favelas. “Era, visualmente, uma história que a gente já conhecia, mas adaptar os relatos de Carolina foi muito complicado e em tempo recorde também”.

Vanessa Ferreira ressaltou que a diferença entre ela e a escritora é que Carolina foi uma catadora que veio de Minas, e todo o conhecimento que teve veio do lixo. “Eu, apesar de crescer em um barraco e vir de uma situação muito pobre, tive uma mãe que falava que era muito importante estudar. Minha mãe zelou por isso na minha vida”. No local, não havia pessoas que trabalhassem com ilustração. “Não havia nem essa palavra, na verdade.”

Nascida em 1986, na zona sul de São Paulo, Vanessa ouvia que tinha que terminar o colégio, arrumar um emprego na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e ficar naquilo pelo resto da vida. “Nem à faculdade a gente tinha acesso. Ainda mais uma pessoa preta. Ganhar dinheiro com arte? Nunca”. Dali para cá, o cenário mudou. “Mudou muito, porque a gama que a gente tem de artistas é grande. Juntou muito essa galera e a gente faz muito essa troca”. Gente que tinha carreira em outras áreas, como a própria Vanessa, formada em publicidade, foi para a ilustração, que era uma coisa que ela sempre quis executar. “Eu nunca parei de desenhar, na verdade.”

História

A escritora Carolina Maria de Jesus – Divulgação/Mostra CMJ

 

Nascida em 14 de março de 1914, em Sacramento, Minas Gerais, Carolina Maria de Jesus mudou-se para a cidade de São Paulo em 1937, onde trabalhou como empregada doméstica. Em 1948, foi viver na favela do Canindé, onde nasceram seus três filhos. Enquanto viveu ali, a forma de subsistência dela e dos filhos era catar papéis e outros materiais para reciclar.

O livro Quarto de Despejo reproduz o diário em que Carolina narra seu dia a dia em uma comunidade pobre da cidade de São Paulo, desocupada para construção da Marginal Tietê, em 1961, por influência da repercussão de sua obra. O texto é considerado um dos marcos da literatura feminina no Brasil.

Carolina descreve suas vivências no período de 1955 a 1960 e relata o sofrimento e as angústias dos habitantes da favela, sobretudo a rotina da fome. Ela se sustentava recolhendo papel nas ruas. Quando não conseguia papel, ela e seus filhos não comiam. Sua linguagem é objetiva, ao mesmo tempo culta e inculta, oscilando entre um registro popular e o discurso literário.

A tiragem inicial de dez mil exemplares se esgotou em apenas uma semana. Desde o lançamento, a obra já foi traduzida para mais de 13 idiomas. A publicação é uma edição feita pelo repórter Audálio Dantas e pela equipe de editoração da Livraria Francisco Alves, que recebeu 20 cadernos escritos por Carolina. Dantas selecionou os trechos do diário a serem publicados e escreveu o prefácio do livro. Foi ainda responsável pela estratégia de divulgação da obra na imprensa.

Os dois textos escritos por Audálio Dantas na imprensa são anteriores à publicação do livro e tornaram sua autora conhecida do grande público. A primeira matéria do jornalista sobre o livro foi a reportagem de página inteira no jornal Folha da Noite, de 9 de maio de 1958, intitulada O drama da favela escrito pela favelada: Carolina Maria de Jesus faz um retrato sem retoque do mundo sórdido em que vive. Depois, ele publicou matéria na revista O Cruzeiro, da qual era editor-chefe, com o título Retrato da favela no diário de Carolina: a fome fabrica uma escritora.

Legisladores dos EUA criticam secretário de Defesa por hospitalização secreta

1 de março de 2024

 

O secretário de Defesa dos EUA, Lloyd Austin, enfrentou críticas bipartidárias em uma audiência no Congresso na quinta-feira por não ter notificado prontamente o presidente Joe Biden e outros líderes sobre sua internação no mês passado. Os republicanos exigiram saber por que ninguém foi disciplinado.

Os membros do Comitê de Serviços Armados da Câmara condenaram o erro como um constrangimento e um fracasso de sua liderança. Eles observaram que o fato de Biden não ter sido informado de que Austin não estava no comando por dias poderia ter levado a confusão ou atrasos na ação militar.

Austin insistiu que não havia lacunas no controle do departamento ou na segurança do país porque “em todos os momentos, eu ou o subsecretário estávamos em condições de cumprir as funções do meu cargo”. Ele afirmou que foram feitas alterações no processo de notificação.

Muitos democratas também expressaram preocupação com a falta de transparência de Austin sobre sua hospitalização por complicações de uma cirurgia de câncer de próstata.

A deputada Elissa Slotkin, democrata do Michigan, lamentou a “indignação e drama” dos membros do comitê, dizendo que Austin admitiu ter cometido um erro, pediu desculpas e tomou medidas para evitar que se repetisse. Ele pediu aos seus colegas que “se concentrassem nas coisas que são realmente importantes para a segurança nacional”.

 

Fluminense conquista título da Recopa Sul-Americana sobre a LDU

Com dois gols do colombiano Jhon Arias o Fluminense arrancou uma vitória de 2 a 0 sobre a LDU (Equador) para conquistar o título da Recopa Sul-Americana, na noite desta quinta-feira (29) no estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro. A inédita conquista do Tricolor das Laranjeiras foi transmitida ao vivo pela Rádio Nacional.

VEEEEEEEEEEEEEENNNNNNNNNNNNNNNNNCEEEEEEEEEEEEEEEEE O FLUMINEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEENNNNNNNNNNNSEEEEEEEEEEEEEEE! JHON ARIAS FAZ DUAS VEZES, O SEGUNDO AOS 45 DO SEGUNDO TEMPO, E O FLU É CAMPEÃO DA CONMEBOL RECOPA! pic.twitter.com/Hgrar63Yw0

— Fluminense F.C. (@FluminenseFC) March 1, 2024

A conquista foi garantida porque o Fluminense conseguiu reverter a vantagem alcançada pela LDU na partida de ida, uma vitória de 1 a 0 nos 2.850 metros de altitude da cidade de Quito. Com o título desta quinta-feira o Tricolor exorcizou um fantasma do passado, a equipe equatoriana, para a qual perdeu as finais da Libertadores de 2008 e da Copa Sul-Americana de 2009.

Decisão dramática

O Fluminense não encontrou facilidades diante da LDU, que se fechou atrás na primeira etapa com o objetivo claro de não oferecer espaços para o ataque tricolor e tentar criar algo em jogadas rápidas de contra-ataque. E a aposta dos equatorianos se mostrou acertada, pois o time de Fernando Diniz conseguiu apenas três finalizações no alvo até o intervalo.

Sem conseguir furar a defesa adversária, o comandante do Tricolor começou a fazer mudanças no segundo tempo. Primeiro promoveu a entrada do centroavante John Kennedy e, minutos depois, colocou em campo o lateral Marcelo, o meio-campista Renato Augusto e o meia-atacante Douglas Costa.

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As mudanças surtiram efeito e o Fluminense conseguiu criar mais oportunidades claras de marcar. Até que, aos 30 minutos, Samuel Xavier levantou a bola na área, onde Jhon Arias cabeceou com categoria para superar o goleiro Alexander Domínguez.

Porém, três minutos depois a equipe das Laranjeiras sofreu um duro golpe: John Kennedy foi expulso com cartão vermelho direto após pisar em Zambrano, que estava caído. Com um a menos, o Tricolor aumentou ainda mais o seu ímpeto ofensivo e deixou a LDU perdida de vez na partida.

🎶🏆 Clube que orgulha o Brasil / Retumbante de glórias / E vitórias mil 🎶🇭🇺

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A pressão do Fluminense aumentou e, aos 41 minutos, Douglas Costa encontrou Renato Augusto dentro da área. Valverde derrubou então o meio-campista do Flu e o árbitro marcou pênalti. Jhon Arias foi então para a cobrança e não falhou para garantir o inédito título do Tricolor das Laranjeiras.

Agora o Fluminense volta suas atenções para a Taça Guanabara do Campeonato Carioca, na qual enfrenta o Botafogo no estádio do Maracanã a partir das 16h (horário de Brasília) do próximo domingo (3).