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Nova técnica pode produzir embriões com genes de dois homens a partir de óvulo feminino

19 de abril de 2024

 

Cientistas da Universidade de Saúde e Ciência do Oregon, nos Estados Unidos, estão trabalhando para desenvolver uma técnica capaz de produzir embriões viáveis a partir de células da pele masculina e a pesquisa pode contribuir com casais compostos de dois homens para a geração de bebês com características genéticas de ambos os pais. Lygia da Veiga Pereira, professora do Instituto de Biociências (IB) da Universidade de São Paulo, explica o processo de formação de um embrião e a técnica empregada na pesquisa.

Segundo a especialista, as células humanas têm duas cópias de cada um dos cromossomos, um herdado da mãe e outro herdado do pai e, por ter uma dupla de cada cromossomo, são chamadas de células diploides. “Quando a gente vai produzir os nossos gametas, a gente tem que fazer um tipo de divisão celular de forma a gerar células que possuam só uma cópia de cada cromossomo, porque o gameta feminino vai se juntar com gameta masculino para formar um novo indivíduo com duas cópias”, explica.

De acordo com a docente, o grupo norte-americano conseguiu pegar um óvulo feminino e introduzir nele o núcleo de uma célula de pele de um camundongo masculino. A partir desse processo, a célula de pele reduziu o seu número de cromossomos e, por fim, a estrutura passou a ser um óvulo, mas composto de um cromossomo masculino em seu interior. “Então isso seria uma maneira de você fazer um indivíduo masculino produzir um óvulo. Mas é importante ressaltar que, mesmo podendo surgir um embrião com as características de dois indivíduos masculinos, ainda é necessário o óvulo de uma mulher, o que conseguiram fazer foi colocar dentro desse óvulo um material genético masculino”, esclarece.

Aplicação em humanos

Lygia conta que a pesquisa ainda está nos estágios iniciais de com camundongos e ainda está muito longe da possibilidade de iniciar a aplicação na espécie humana. Ela explica que os testes em humanos só começam a ser realizados após serem esgotadas todas as possibilidades de estudos e possíveis novas descobertas com a manipulação entre os camundongos. “Eles ainda estão no camundongo e ainda nem demonstraram que esse óvulo que produziram é funcional e capaz de produzir um camundongo normal. Então, esse trabalho é o começo de uma possibilidade de alternativa reprodutiva, mas está muito longe ainda”, analisa.

Conforme a especialista, essa técnica pode permitir, daqui a muito tempo e assim que os estudos em animais se mostrarem plausíveis, contribuir para tratamentos de infertilidade e auxiliar casais compostos de dois homens a terem um filho com características genéticas de ambos. Ela explica, no entanto, que a fecundação do óvulo com o material genético masculino precisa ser realizada com espermatozoide de um homem diferente. “Se você transforma o óvulo de uma mulher em um óvulo com material genético masculino e insere ali o espermatozoide do mesmo homem, isso pode acabar gerando um clone dele. Portanto, o que deve ser feito é pegar esse óvulo masculino, colocar o material genético de outro homem e então teremos uma criança que possui dois pais”, discorre.

De acordo com Lygia, as pesquisas feitas a partir das células-tronco pluripotentes estão mais avançadas e já apresentaram resultados promissores, inclusive conseguindo gerar embriões saudáveis de camundongos a partir de óvulos e espermatozoides oriundos dessas substâncias. “Recentemente os cientistas puderam mostrar que conseguiam produzir, em camundongos, óvulos e espermatozoides viáveis, que foram capazes até de dar origem a um novo indivíduo a partir das células-tronco. Então, eu acho que está muito mais avançado do que essa pesquisa que foi feita agora com os óvulos com material masculino”, finaliza.

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Esta notícia é uma transcrição parcial ou total do Jornal da Universidade de São Paulo. Este texto pode ser utilizado desde que seja atribuído corretamente aos autores e ao sítio oficial.
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Ensino a distância estimula inclusão indígena, mas qualidade é desafio

Aos 21 anos, a indígena Macuxi, Roberta de Lima, acredita que fez uma boa escolha quando ingressou no curso a distância de tecnologia em empreendedorismo. Ela conta que iniciou os estudos no meio da pandemia de covid-19, quando as universidades paralisaram suas atividades presenciais. Mas esse não foi o único motivo que impactou em sua escolha. Não há universidades nos arredores de sua comunidade, no interior de Roraima.

“Não tinha condições de vir para a capital”, explica ela, justificando sua decisão de se matricular na UniCesumar, instituição vinculada à mantenedora Vitru Educação. A situação mudou e hoje, se aproximando da conclusão do curso, ela vive em Boa Vista. Roberta conta que o ensino superior lhe abriu portas e atualmente faz estágio no polo de ensino a distância da própria UniCesumar, o que lhe garante renda.

O polo de ensino a distância nada mais é do que um centro de apoio, devidamente credenciado pelo Ministério da Educação (MEC), onde é oferecido suporte aos estudantes desse cursos. Ali podem ocorrer algumas aulas, ocorridas de forma pontual, e também atividades avaliativas, cuja aplicação presencial é obrigatória. Além disso, no polo, é realizado atendimento técnico e pedagógico. Segundo Roberta, o estágio é o primeiro passo e ela sonha com um emprego de carteira assinada. Futuramente quer abrir o próprio negócio.

“Antes de estudar, eu já tinha meu próprio negócio, que era o artesanato. Também trabalhava em agricultura. Pra mim, entrar no curso foi muito bom. Abriu a minha mente e também melhorou a questão financeira, consegui o estágio. O ensino a distância é um meio de levar mais conhecimento para a minha comunidade, para o meu povo. E para os outros povos também. Acho que falta mais infraestrutura para atender a comunidade. Mais computadores, mais livros e mais cursos, na verdade, porque muitos deles ainda não chegaram aqui”, cobra ela.

A demanda por mais cursos é atestada pelos números. De acordo com dados do Censo da Educação Superior 2022, divulgado no ano passado pelo MEC, o crescimento da modalidade a distância no Brasil é impressionante, o que vem garantindo também aumento do número de estudantes de graduação no país. Simultaneamente, essa expansão tem gerado preocupações acerca da qualidade do ensino. Em uma década, o número de cursos saltou mais de 700% chegando a 9.186. O total de estudantes ingressantes por ano saiu de 1.113.850 em 2012 para 4.330.934 em 2022. É um salto de 288%. Considerando os dados de 2022, 95,7% das novas matrículas ocorreram em cursos ministrados por instituições privadas.

A quantidade de matrículas no ensino superior realizada por alunos autodeclarados indígenas também disparou ao longo da última década. Um levantamento do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior do Brasil (Semesp), realizado esmiuçando os microdados do Censo da Educação Superior 2021, indicou que houve uma evolução de 374% ao longo de uma década, entre 2011 e 2021. O avanço, no entanto, foi impulsionado sobretudo pelas matrículas em cursos presenciais. Ainda assim, nesse período, entre o contingente dos indígenas que concluíram o curso e pegaram o diploma, 19,8% foram na modalidade a distância.

É possível que esse percentual ainda cresça bastante nos próximos anos com as novas possibilidades da tecnologia moderna. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que o uso da internet no Brasil alcançou em 2022 com recorde de 87,2% das pessoas com 10 anos ou mais. A ampliação do acesso ao mundo online é pré-requisito para a expansão dos cursos da modalidade a distância, que vem registrando seu crescimento mais robusto justamente nos últimos anos.

Em 2018, uma pesquisa divulgada pela Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), entidade que representa grande parte do ensino superior particular do país, mostrava que o número de novas matrículas em cursos ministrados na modalidade a distância crescia em uma velocidade mais acelerada do que nos cursos presenciais. Em 2022, os dados do MEC mostram que houve 3,1 milhões de alunos ingressantes na graduação a distancia, quase o dobro dos 1,6 milhão que deram entrada na modalidade presencial.

Mas embora o acesso ao ambiente online venha sendo possível a partir de lugares cada vez mais remotos, ainda há significativas assimetrias regionais. Na região Norte, por exemplo, apenas 58,6% dos domicílios na área rural fazia utilização de internet. É nessa região que se concentram 44,48% da população indígena do país segundo o Censo Demográfico 2022.

  Ensino a distância nas comunidades – Marcelo Camargo/Agência Brasil

“O ensino a distância tem a capacidade de chegar mais nas comunidades, mas tem que ter uma infraestrutura mínima local que muitas aldeias não têm. Mesmo no estado de São Paulo, que tem mais recursos, às vezes elas não têm computadores e acesso à internet. O ensino a distância é uma democratização importante. Mas há desafios não apenas relacionados à qualidade do ensino. A metodologia é uma questão: é bastante desafiador realizar um acompanhamento mais próximo do aluno. Tem a questão de como esses estudantes podem se apropriar da tecnologia e do material didático. Isso é bem importante para povos que falam outras línguas”, diz Talita Lazarin, pesquisadora do Centro de Estudos Ameríndios da Universidade de São Paulo (CEstA-USP).

Embora a Constituição de 1988 tenha fixado a educação como um direito de todos e um dever do Estado, foram as ações afirmativas das últimas duas décadas que viabilizaram um maior acesso dos indígenas à educação superior. Isso inclui, por exemplo, as cotas, as políticas de assistência estudantil e a criação de licenciaturas específicas para a educação indígena. Elas ajudaram a driblar barreiras sociais e culturais que dificultavam o acesso às instituições tradicionais de ensino.

Nos últimos anos, o ensino a distância passou a ser um nova ferramenta de aceleração dessa inclusão. De acordo com Talita Lazarin, ela vem se mostrando eficaz não apenas para contornar barreiras sociais e culturais, mas também geográficas. Nestes cursos, os estudantes não precisam deixar suas comunidades, que muitas vezes se localizam em áreas de difícil acesso, e ainda podem conciliar os estudos com suas atividades comunitárias.

Em 2021, o levantamento do Semesp mostrava que 0,5% do total de alunos do ensino superior haviam se autodeclarado indígenas. Considerando os dados demográficos, esse percentual se torna significativo. Conforme o Censo 2022, cujos resultados foram divulgados pelo IBGE no ano passado, os indígenas residentes no Brasil representam 0,83% da população total do país. De toda forma, a diferença desses percentuais mostra que há espaço para o crescimento no número de matrículas.

Qualidade

Desde o ano passado, o MEC tem informado que estuda reavaliar o marco regulatório do ensino a distância no Brasil. A decisão foi anunciada após os resultados do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) 2022, que é aplicado em diferentes países sob a coordenação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Os resultados do Brasil indicaram um alto percentual de alunos sem conhecimentos básicos em matemática e ciências.

A maior atenção se voltou para os cursos de licenciatura, nos quais os universitários se formam para atuar como professor no Ensino Fundamental ou Ensino Médio. O desempenho no Pisa gerou preocupação porque uma boa formação destes futuros professores é considerada essencial para melhorar a qualidade da aprendizagem das crianças e jovens da educação básica.

Um dado do Censo da Educação Superior 2022, divulgado no ano passado pelo MEC, também é apontado como justificativa para uma maior atenção ao assunto. A modalidade de ensino a distância absorveu 81% de todos os alunos ingressantes em cursos de licenciatura em 2022. Nas instituições privadas, esse percentual chega a 93,7%.

Diante do cenário, o MEC sinaliza que irá proibir a oferta de licenciatura 100% a distância e deve estabelecer um mínimo obrigatório de atividades presenciais. A expectativa é que ocorra assim uma melhora na qualidade dos cursos. A medida parece estar alinhada o que se observa em resultados do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), por meio do qual uma prova escrita é aplicada aos alunos para avaliação dos cursos de ensino superior brasileiros. Os dados costumam indicar um desempenho melhor dos estudantes de cursos presenciais e de semipresenciais em comparação com os de cursos 100% a distância.

Celly Saba, professora e coordenadora do curso de Ciências Biológicas a distância oferecido pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), acredita que as universidades públicas não devem sofrer com as mudanças. Ela dá o exemplo do Rio de Janeiro. No estado, as diferentes universidades públicas – como a Uerj, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf), entre outras – se uniram para desenvolver uma plataforma de ensino a distância. Foi assim criado o Centro de Educação Superior a Distância do Rio de Janeiro (Cederj), por meio do qual os cursos são administrados.

“Nossas licenciaturas já possuem atividades práticas obrigatórias que o aluno tem que fazer na escola. A gente cumpre a legislação que exige um estágio supervisionado na escola. Sabemos que algumas universidade não cumprem, mas não é o nosso caso”, afirma. Ainda assim, ela faz ponderações.”No geral, estou vendo a postura do MEC com bons olhos. É preciso fixar regras porque quando a gente fala de licenciatura, estamos falando de formação de educadores. Mas eu entendo que de uma maneira geral para o Brasil, algumas regras podem ser puxadas. Principalmente se a gente entende que tem aluno que é trabalhador e que mora longe da região metropolitana, o que gera dificuldade maior de acesso. Talvez fosse o caso de pegar um pouquinho mais leve na questão da carga horária presencial”, avalia.

Celly destaca que o fato de ser ministrado a distância não pode significar que haverá menor exigência. “Nós observamos um fenômeno muito parecido com o que ocorre nos nossos cursos presenciais. A evasão geralmente acontece logo no início do curso, até o segundo período. Porque há um mito de que ensino à distância é fácil. E não é bem assim. Quando eles percebem que não vão conseguir se adaptar, eles desistem. Porque tem que estudar, tem que ter toda uma disciplina, cumprir um cronograma”.

Ela também levanta dados que desafiam a ideia de que o mercado de trabalho menospreza esses cursos e não valoriza os concluintes. “O que a gente observa é que os alunos da educação a distancia levam um pouquinho mais de tempo para concluir. Mas posso dizer que 90% dos concluintes na Uerj vão para o mercado de trabalho rapidamente e a maioria deles vai para aquela área do curso que ele fez. É uma grande satisfação que a gente”, diz ela.

Mantenedora da UniCesumar e da Uniasselvi, a Vitru Educação encomendou à consultoria Nomads um estudo sobre a inserção no mercado de trabalho de seus alunos e ex-alunos da modalidade de ensino a distância. Os resultados indicam que 15,5% obtiveram seu primeiro emprego na área em que estavam cursando e outros 16% relataram que os estudos lhe proporcionaram uma promoção ou um mudança no cargo que possuíam antes. Houve ainda outros 17,5% que afirmaram ter obtido aumento salarial.

A discussão mobiliza diversos pesquisadores. Mas apesar das preocupações com a qualidade, há geralmente um reconhecimento de que a modalidade a distância será fundamental para ajudar o país a alcançar metas do Plano Nacional de Educação (PNE). Uma delas estabelece que 33% dos jovens de 18 a 24 anos estejam na educação superior. No último balanço divulgado, de 2022, esse percentual era de 25,3%.

Perfil

O levantamento da Abmes realizado em 2018 agregou dados que indicam diferenças no perfil dos estudantes de graduação conforme a modalidade de ensino. Os jovens respondiam majoritariamente pelas matrículas de educação presencial: 53% tinham até 30 anos. Já no ensino a distância, 67% tinham mais de 30 anos. Além disso, nessa modalidade, havia um maior percentual de alunos que trabalhavam, que estudaram em escolas públicas e que situavam-se nas classes C e D.

Na época em que esses dados foram divulgados, o então vice-presidente da ABMES, Celso Niskier, avaliou que a expansão do ensino a distância promovia uma inclusão educacional de pessoas mais velhas que já estavam no mercado de trabalho. “Esse público precisa da flexibilidade da educação a distância para completar o curso superior”, disse Niskier, que hoje preside a ABMES.

No caso específico dos indígenas, faltam estudos mais detalhados. Não há pesquisas que se dedicaram a traçar um perfil desses ingressantes em cursos de ensino a distância. Celly Saba revela uma dificuldade na Uerj. “O que acontece é que nós não temos esses alunos identificados. Se entraram pela reserva de vagas, consta que é cotista. E a cota é para negros, oriundos de escolas públicas, povos indígenas e quilombolas. Então os indígenas ficam nesse meio”, diz.

De acordo com Talita Lazarin, há elementos na cultura indígena que também podem explicar a boa aceitação do ensino a distância por parte deste público. “Ele permite que as pessoas continuem vivendo nas suas comunidades enquanto estão estudando. Porque umas das grandes questões para estudantes indígenas é ter que morar fora. Para vários povos, é muito difícil passar muito tempo longe da família e da comunidade. Por outro lado, irá demandar dele uma maior independência. O ensino a distância exige que a pessoa faça um planejamento de estudo, tenha uma disciplina”, diz a pesquisadora do CEstA-USP.

Lazarin também observa que, mesmo após formados, eles geralmente querem seguir vivendo na aldeia, como profissionais atuando, por exemplo, na escola ou no posto de saúde comunitário. Nos polos de Feijó e Tarauacá, no Acre, as universidades vinculadas à Vitru Educação atendem cerca de 200 estudantes indígenas oriundos de sete aldeias. O gestor acadêmico Geisson de Souza, que atua no suporte a esses alunos, faz constatação similar.

“Eles não querem se transformar em pessoas brancas. Eles querem assimilar a nossa cultura, assim como nós queremos aprender a deles, sem deixar de ter a própria essência. A procura maior é por Pedagogia, Gestão Pública, Enfermagem e   Biomedicina. O que a gente observa é que 99% dos nossos alunos indígenas não querem fazer uma graduação para passar em um concurso e vir para a cidade, porque tem mais oportunidade. Eles querem absorver o conhecimento, se tornar um profissional de excelência e voltar para aplicar esse conhecimento com o intuito de melhorar a vida das pessoas que cresceram com eles”, explicou.

A experiência nas universidades vinculadas à Vitru Educação refletem os dados do levantamento do Semesp realizado em 2021. Eles indicam que os cursos a distância com mais estudantes indígenas eram pedagogia (21,3%) e administração (7,0%). “A evasão do aluno indígena é pelo menos 50% menor do que dos demais alunos. Assiduidade e pagamento também. É quase 90% a adimplência deles, o que indica que estão levando o curso a sério, estão realmente interessados”, acrescenta Geisson. Segundo ele, esses estudantes afirmam que concluir o ensino superior e compartilhar seus conhecimentos é uma forma de mostrar o compromisso com sua comunidade.

Essa é a expectativa da indígena macuxi Consolata Gregorio, de Normandia (RR). “Sou falante da língua maimu, e escolhi o curso Pedagogia porque sou professora, trabalho com crianças da educação infantil e fundamental ensinando a elas a língua materna Macuxi. Quero aprofundar mais o que eu já tenho de conhecimento”, explica.

Polícia Federal faz ação contra exploração sexual infantil no Rio

Policiais federais fazem, nesta quinta-feira (18), mais uma operação contra a produção e distribuição de imagens de exploração sexual infantil. A operação Jizo cumpre dois mandados de busca e apreensão, expedidos pelas 8ª e 10ª Varas Federais Criminais do Rio de Janeiro, no subúrbio carioca.

Os policiais da Delegacia de Repressão aos Crimes Cibernéticos (Deleciber) buscam apreender computadores, celulares e outros dispositivos de armazenamento de fotos e vídeos que contenham material de abuso sexual contra crianças.

Um dos alvos da operação desta quinta já havia sido preso em 2011 e condenado por estupro de vulnerável e por produção de material de abuso sexual infantil, mas estava solto desde 2017.

Segundo a Policia Federal (PF), os atos de adquirir, possuir ou armazenar qualquer tipo de registro de abuso sexual infantil são punidos com pena de prisão de um a quatro anos, além de multa.

A publicação, divulgação e compartilhamento dessas imagens têm pena de prisão de três a seis anos, além de multa. O crime é considerado hediondo pela Lei 14.811/2024.

Canal do Panamá atingido pela seca pode aliviar as restrições de trânsitos diários

17 de abril de 2024

 

O número de navios autorizados a atravessar todos os dias o canal do Panamá, que tem sido atingido pela seca, pode aumentar devido aos sinais de uma melhoria nos níveis de água nos dois lagos artificiais, disseram autoridades na segunda-feira.

O Canal Interoceânico é um ponto de trânsito fundamental para a carga internacional, mas os baixos níveis de água atribuídos às alterações climáticas e ao fenómeno El Niño no ano passado levaram as autoridades a limitar o número de navios que o utilizam.

O Chefe do Canal do Panamá, Ricardo Vasquez disse na segunda-feira que informou aos clientes que permitiria gradualmente a passagem de até 32 navios por dia, em comparação com um limite de 27 anunciado há um mês, dos 36 a 39 em condições normais. Ele disse que “A gestão e a administração da água têm sido muito eficientes, e chegada da estação chuvosa também deveria ajudar”.

As restrições à profundidade máxima do calado dos navios que passam pelas maiores eclusas serão aumentadas em meados de junho de 13,4 para 13,7 metros, disseram as autoridades.

A hidrovia centenária de 80 km de comprimento, que normalmente lida com cerca de 6% do comércio marítimo global, é usado principalmente por clientes dos Estados Unidos, China e Japão, e possui um sistema de eclusas para levantar e baixar navios que utiliza águas pluviais armazenadas em dois lagos artificiais.

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Teste para HTLV passa a ser indicado para gestantes durante pré-natal

O Ministério da Saúde ampliou o uso de testes para diagnóstico do vírus Linfotrópico de Células T Humanas (HTLV) na rede pública. A tecnologia, a partir de agora, passa a ser utilizada também em gestantes, durante o pré-natal.

A incorporação do teste para gestantes foi recomendada pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec). A proposta é reduzir a transmissão vertical (de mãe para filho) do vírus durante a amamentação.

A comissão considerou que o procedimento, feito por meio de exame de sangue, é eficaz e seguro e que a implementação no Sistema Único de Saúde (SUS) utilizaria recursos já disponíveis, uma vez que os testes já são realizados fora do programa de triagem pré-natal.

Em nota, o ministério informou que as áreas técnicas terão prazo máximo de 180 dias para efetivar a oferta na rede pública.

Notificação compulsória

Desde fevereiro, infecções por HTLV em gestantes, parturientes, puérperas e crianças expostas ao risco de transmissão vertical passaram a ser de notificação compulsória no Brasil. Isso significa que profissionais de saúde de serviços público e privado devem comunicar obrigatoriamente os casos ao ministério.

À época, a pasta informou que a inclusão do HTLV na lista nacional de notificação compulsória de doenças, agravos e eventos de saúde pública permite estimar o número de pessoas com o vírus e a quantidade de insumos necessários, além de qualificar a rede de atenção para atendimento dessa população.

Vírus

O HTLV, da mesma família do HIV, foi descoberto na década de 1980. O vírus infecta principalmente as células do sistema imunológico e possui a capacidade de fazer com que percam sua função de defender o organismo.

A infecção está associada a doenças inflamatórias crônicas como leucemia, linfoma de células T do adulto (ATLL) e mielopatia associada ao HTLV-1 (HAM). Outras manifestações como a dermatite infecciosa, uveíte, síndrome de sicca, ceratite intersticial, síndrome de Sjögren, tireoidite de Hashimoto, miosite e artrite, embora de menor gravidade, também são associadas ao vírus.

O tratamento é direcionado de acordo com a doença relacionada ao HTLV. O paciente deve ser acompanhado nos serviços de saúde e, quando necessário, receber seguimento em serviços especializados para diagnóstico e tratamento precoce de doenças associadas ao vírus.

Números

A estimativa do governo federal é que mais de 800 mil pessoas estejam infectadas pelo HTLV no Brasil. O vírus pode ser transmitido durante relações sexuais sem o uso de preservativo e pelo compartilhamento de seringas e agulhas.

O HTLV também pode ser transmitido verticalmente, de mãe para filho, sobretudo via amamentação e, de forma mais rara, durante a gestação e no momento do parto.

O ministério tem como meta eliminar a transmissão vertical do HTLV até 2030, objetivo alinhado às diretrizes da Organização Mundial de Saúde (OMS), da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas).

Lula: Equador deve desculpas ao México por invasão de embaixada

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou, nesta terça-feira (16), de uma cúpula virtual de chefes de Estado e de governo da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac). Convocada de forma extraordinária pela líder pro-tempore do bloco, a presidenta de Honduras, Xiomara Castro, a reunião discutiu o episódio de invasão da embaixada do México em Quito, capital Equador, em uma operação policial para prender o ex-vice-presidente equatoriano Jorge Glas, que havia ganhado asilo político do governo mexicano e estava abrigado na sede diplomática. A Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, de 1961, define embaixadas como territórios estrangeiros e, em tese, são invioláveis ​a ação de agentes locais do país onde a representação está abrigada.

Glas, que foi vice-presidente durante o mandato de Rafael Correa, entre 2013 e 2017, foi condenado duas vezes pela Justiça equatoriana por corrupção. O incidente na embaixada ocorreu na noite do dia dia 5 de abril, levando à uma crise diplomática entre os dois países. O governo mexicano rompeu relações com o Equador e retirou seus diplomatas do país.

“Medida dessa natureza nunca havia ocorrido, nem nos piores momentos de desunião e desentendimento registrados na América Latina e no Caribe. Nem mesmo nos sombrios tempos das ditaduras militares em nosso continente. O que aconteceu em Quito, no último dia 5, é simplesmente inaceitável e não afeta só o México. Diz respeitos a todos nós. Um pedido formal de desculpas por parte do Equador é um primeiro passo na direção correta”, afirmou Lula durante a reunião. O presidente também defendeu uma proposta da Bolívia de formar uma comissão, integrada por países da Celac, para acompanhar a evolução da situação e da saúde do ex-vice-presidente Jorge Glas. O político equatoriano chegou a ficar internado após a invasão da embaixada, mas já retornou à prisão. Ele foi condenado a 6 anos de detenção.

“A gravidade da situação nos impõe o dever de expressar claramente o inequívoco repúdio da região ao ocorrido. A inviolabilidade absoluta das missões e do pessoal diplomático, conforme estabelecido pela Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas de 1961, é um desses pilares do direito internacional que não admite exceções, seja qual for a justificativa. A América Latina possui tradição humanitária pioneira em defesa do direito de asilo diplomático”, prosseguiu Lula, na cúpula da Celac.

Na semana passada, o México apresentou uma queixa contra o Equador na Corte Internacional de Justiça (CIJ) das Nações Unidas, em Haia, na Holanda. No pedido, o México pede que o país seja suspenso da Organização das Nações Unidas (ONU) até que emita um pedido público de desculpas.

Lula ainda defendeu esforços de reaproximação entre os dois países. “Somos uma região plural. Continuaremos a ter diferenças de visões e opiniões, mas temos, sobretudo, o compromisso de resolvê-las com base no diálogo e na diplomacia. Nesse sentido, vejo como positivo o recurso do México à Corte Internacional de Justiça. Também é fundamental que a CELAC siga trabalhando para o restabelecimento do diálogo e da normalização das relações entre o Equador e o México, dois importantes parceiros do Brasil, fundamentais para a consolidação da integração regional”, afirmou.

Maioria dos brasileiros não tem boas condições de conectividade

Apenas 22% dos brasileiros com mais de 10 anos de idade têm condições satisfatórias de conectividade, apesar de o acesso à internet estar perto da universalização no país. Outros 33% da população estão no nível mais baixo do índice que mede a conectividade significativa no país (de 0 a 2 pontos) e 24% ocupam a faixa de 3 a 4 pontos. 

Os índices são mais baixos entre pretos e pardos, nas classes D e E, nas regiões Norte e Nordeste e nas cidades menores. 

Os dados estão no estudo inédito Conectividade Significativa: propostas para medição e o retrato da população no Brasil, lançado nesta terça-feira (16) pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), braço executivo do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br). O estudo mediu a qualidade e efetividade do acesso da população às tecnologias digitais a partir de variáveis como custo da conexão, uso diversificado de dispositivos, tipo e velocidade de conexão e frequência de uso da internet.  

A partir dessas variáveis, foram estabelecidos diferentes níveis de conectividade significativa, o que resultou numa escala de 0 a 9, na qual o score zero indica ausência de todas as características aferidas, enquanto o nove denota a presença de todas elas. 

Apesar de 84% da população do Brasil já ser usuária de internet, as condições desse acesso são bastante desiguais, na avaliação de Graziela Castello, coordenadora de estudos setoriais no Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br/NIC.br), e responsável pelo levantamento.

“Um jovem, por exemplo, que tem acesso apenas pelo celular, com um pacote de dados que termina antes do final do mês e sem conexão em casa, de saída já tem barreiras muito maiores para o aproveitamento das oportunidades da internet para sua formação e desenvolvimento profissional, quando comparado a outro jovem que consegue se conectar quando e onde quiser e que tem acesso a diferentes tipos de dispositivos, por exemplo”, explica. 

 

Raça, classe social e região

A análise dos dados com base na autodeclaração de cor ou raça dos participantes mostra que, entre os brancos, 32% estão na faixa mais alta de conectividade significativa (score entre 7 e 9). Já entre pretos e pardos, a porcentagem cai para 18%.

A distância também é verificada na comparação entre estratos sociais. Na classe A, a maioria (83%) está na melhor faixa de pontuação e apenas 1%, na pior. Por outro lado, entre as pessoas nas classes D e E, apenas 1% delas está na melhor faixa e a maioria (64%), na pior.

As regiões Norte e Nordeste têm as piores condições de conectividade significativa. No Norte, apenas 11% estão na faixa entre 7 e 9 pontos e 44% estão na faixa de 0 a 2 pontos. No Nordeste, os percentuais são de 10% e 48%, respectivamente. Por outro lado, as regiões Sul e Sudeste têm os melhores índices de usuários na faixa entre 7 e 9 pontos, com 27% e 31%, respectivamente.  

Nas cidades com até 50 mil habitantes, 44% da população encontram-se na pior faixa da escala e nas com mais de 500 mil habitantes, a proporção negativa cai quase pela metade (24%). Em relação à área, enquanto 30% dos habitantes das localidades urbanas estão no grupo de pior faixa (até 2 pontos), 54% dos moradores de zonas rurais encontram-se nessa condição.

Gênero e faixa etária

O estudo mostrou que os entrevistados do sexo masculino apresentaram melhores índices de conectividade significativa, com 28% na faixa entre 7 e 9 pontos e 31% entre 0 e 2 pontos. Já as mulheres tiveram 17% na melhor faixa e 35% na faixa mais baixa. 

Segundo a pesquisa, apesar de indicadores como a prevalência de usuários de internet no Brasil não mostrar distâncias significativas entre homens e mulheres, a análise combinada de indicadores revela condições de conectividade mais precárias para a população feminina, “sublinhando barreiras pré-existentes para sua inclusão produtiva, equiparação em renda, incidência pública e participação na vida social, política e econômica do país”.

No recorte de faixa etária, o levantamento confirma a maior vulnerabilidade à exclusão digital dos idosos: 61% dos brasileiros com 60 anos ou mais apresentam scores mais baixos (até 2 pontos) de conectividade significativa. 

Por outro lado, somente 16% e 24% dos usuários com idades entre 10 e 15 anos e 16 e 24 anos, respectivamente, estão na faixa mais alta (entre 7 e 9 pontos), contrariando a ideia de que os mais jovens apresentariam melhores indicadores no mesmo quesito. Os níveis mais elevados ocorrem justamente entre os grupos etários de maior incidência no mercado de trabalho (entre 25 e 44 anos).

“O estudo questiona a ideia de que os gargalos para inclusão digital seriam sanados por uma possível transição geracional, uma vez que os jovens já seriam super conectados. Quando olhamos para os usuários de internet de maneira geral, isso se confirma, mas ao complexificar a análise e entendermos a conectividade como um todo, fica claro que uma parcela importante desse grupo possui condições precárias de conectividade e vai ingressar no mercado de trabalho com uma desvantagem grande”, alerta Graziela Castello.

Redução da Disparidade

Ao analisar dados de anos anteriores, o estudo identificou uma redução na disparidade entre os grupos que ocupam os extremos da escala de conectividade significativa. Em 2017, 48% da população tinham score entre 0 e 2 e apenas 10% estavam na faixa de 7 a 9 pontos – uma distância de 38 pontos percentuais. Em 2023, a diferença entre eles recuou para 11 pontos percentuais.

Segundo Graziela, essa melhora progressiva, com a redução do grupo populacional com pior nível de conectividade e aumento do grupo com melhor nível, pode ser explicada por fatores como o crescimento da oferta de planos de conexão com maior velocidade pelas operadoras, mudanças nas formas e locais de uso pela população, que se intensificaram durante a pandemia. 

“Até o aumento natural da frequência de uso da internet, que assumiu e assume cada vez mais centralidade em nossas vidas. Mas esse progresso, em parte também por melhorias de infraestrutura, parece ainda em velocidade bastante inferior às reais necessidades da população”, diz. 

 

Estudo

O estudo foi feito a partir do processamento de indicadores da pesquisa TIC Domicílios, para compreensão da qualidade de acesso às tecnologias digitais no país. A TIC Domicílios, realizada pelo Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (Cetic.br), é a mais abrangente pesquisa amostral domiciliar especializada em tecnologias da informação e comunicação feita no país.

A ideia de “conectividade significativa” é um conceito em construção apoiado no entendimento de que a conexão deveria permitir utilização satisfatória de vários serviços na internet, possibilitando o aproveitamento das oportunidades no ambiente online. 

De acordo com Graziela, as políticas públicas para resolver os gargalos desse setor devem ser orientadas pelas quatro dimensões utilizadas para medir a conectividade significativa: custo acessível, acesso a dispositivos, qualidade da conexão e ambientes de uso (frequência e locais de uso). 

“As políticas devem ser orientadas para que todos os cidadãos e cidadãs tenham acesso a conexões intermitentes e de qualidade, em múltiplos lugares, com acesso a dispositivos adequados às necessidades e atividades que se pretenda desenvolver, a um custo compatível com a renda da população. Mas se deve levar em conta também as particulares sociais, econômicas e territoriais, para que as políticas atendam de maneira efetiva às diferentes realidades que compõem nosso país”, avalia a coordenadora. 

Apenas 22% dos brasileiros têm boas condições de conectividade

Apenas 22% dos brasileiros com mais de 10 anos de idade têm condições satisfatórias de conectividade, apesar de o acesso à internet estar perto da universalização no país. Outros 33% da população estão no nível mais baixo do índice que mede a conectividade significativa no país (de 0 a 2 pontos) e 24% ocupam a faixa de 3 a 4 pontos. 

Os índices são mais baixos entre pretos e pardos, nas classes D e E, nas regiões Norte e Nordeste e nas cidades menores. 

Os dados estão no estudo inédito Conectividade Significativa: propostas para medição e o retrato da população no Brasil, lançado nesta terça-feira (16) pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), braço executivo do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br). O estudo mediu a qualidade e efetividade do acesso da população às tecnologias digitais a partir de variáveis como custo da conexão, uso diversificado de dispositivos, tipo e velocidade de conexão e frequência de uso da internet.  

A partir dessas variáveis, foram estabelecidos diferentes níveis de conectividade significativa, o que resultou numa escala de 0 a 9, na qual o score zero indica ausência de todas as características aferidas, enquanto o nove denota a presença de todas elas. 

Apesar de 84% da população do Brasil já ser usuária de internet, as condições desse acesso são bastante desiguais, na avaliação de Graziela Castello, coordenadora de estudos setoriais no Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br/NIC.br), e responsável pelo levantamento.

“Um jovem, por exemplo, que tem acesso apenas pelo celular, com um pacote de dados que termina antes do final do mês e sem conexão em casa, de saída já tem barreiras muito maiores para o aproveitamento das oportunidades da internet para sua formação e desenvolvimento profissional, quando comparado a outro jovem que consegue se conectar quando e onde quiser e que tem acesso a diferentes tipos de dispositivos, por exemplo”, explica. 

 

Raça, classe social e região

A análise dos dados com base na autodeclaração de cor ou raça dos participantes mostra que, entre os brancos, 32% estão na faixa mais alta de conectividade significativa (score entre 7 e 9). Já entre pretos e pardos, a porcentagem cai para 18%.

A distância também é verificada na comparação entre estratos sociais. Na classe A, a maioria (83%) está na melhor faixa de pontuação e apenas 1%, na pior. Por outro lado, entre as pessoas nas classes D e E, apenas 1% delas está na melhor faixa e a maioria (64%), na pior.

As regiões Norte e Nordeste têm as piores condições de conectividade significativa. No Norte, apenas 11% estão na faixa entre 7 e 9 pontos e 44% estão na faixa de 0 a 2 pontos. No Nordeste, os percentuais são de 10% e 48%, respectivamente. Por outro lado, as regiões Sul e Sudeste têm os melhores índices de usuários na faixa entre 7 e 9 pontos, com 27% e 31%, respectivamente.  

Nas cidades com até 50 mil habitantes, 44% da população encontram-se na pior faixa da escala e nas com mais de 500 mil habitantes, a proporção negativa cai quase pela metade (24%). Em relação à área, enquanto 30% dos habitantes das localidades urbanas estão no grupo de pior faixa (até 2 pontos), 54% dos moradores de zonas rurais encontram-se nessa condição.

Gênero e faixa etária

O estudo mostrou que os entrevistados do sexo masculino apresentaram melhores índices de conectividade significativa, com 28% na faixa entre 7 e 9 pontos e 31% entre 0 e 2 pontos. Já as mulheres tiveram 17% na melhor faixa e 35% na faixa mais baixa. 

Segundo a pesquisa, apesar de indicadores como a prevalência de usuários de internet no Brasil não mostrar distâncias significativas entre homens e mulheres, a análise combinada de indicadores revela condições de conectividade mais precárias para a população feminina, “sublinhando barreiras pré-existentes para sua inclusão produtiva, equiparação em renda, incidência pública e participação na vida social, política e econômica do país”.

No recorte de faixa etária, o levantamento confirma a maior vulnerabilidade à exclusão digital dos idosos: 61% dos brasileiros com 60 anos ou mais apresentam scores mais baixos (até 2 pontos) de conectividade significativa. 

Por outro lado, somente 16% e 24% dos usuários com idades entre 10 e 15 anos e 16 e 24 anos, respectivamente, estão na faixa mais alta (entre 7 e 9 pontos), contrariando a ideia de que os mais jovens apresentariam melhores indicadores no mesmo quesito. Os níveis mais elevados ocorrem justamente entre os grupos etários de maior incidência no mercado de trabalho (entre 25 e 44 anos).

“O estudo questiona a ideia de que os gargalos para inclusão digital seriam sanados por uma possível transição geracional, uma vez que os jovens já seriam super conectados. Quando olhamos para os usuários de internet de maneira geral, isso se confirma, mas ao complexificar a análise e entendermos a conectividade como um todo, fica claro que uma parcela importante desse grupo possui condições precárias de conectividade e vai ingressar no mercado de trabalho com uma desvantagem grande”, alerta Graziela Castello.

Redução da Disparidade

Ao analisar dados de anos anteriores, o estudo identificou uma redução na disparidade entre os grupos que ocupam os extremos da escala de conectividade significativa. Em 2017, 48% da população tinham score entre 0 e 2 e apenas 10% estavam na faixa de 7 a 9 pontos – uma distância de 38 pontos percentuais. Em 2023, a diferença entre eles recuou para 11 pontos percentuais.

Segundo Graziela, essa melhora progressiva, com a redução do grupo populacional com pior nível de conectividade e aumento do grupo com melhor nível, pode ser explicada por fatores como o crescimento da oferta de planos de conexão com maior velocidade pelas operadoras, mudanças nas formas e locais de uso pela população, que se intensificaram durante a pandemia. 

“Até o aumento natural da frequência de uso da internet, que assumiu e assume cada vez mais centralidade em nossas vidas. Mas esse progresso, em parte também por melhorias de infraestrutura, parece ainda em velocidade bastante inferior às reais necessidades da população”, diz. 

 

Estudo

O estudo foi feito a partir do processamento de indicadores da pesquisa TIC Domicílios, para compreensão da qualidade de acesso às tecnologias digitais no país. A TIC Domicílios, realizada pelo Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (Cetic.br), é a mais abrangente pesquisa amostral domiciliar especializada em tecnologias da informação e comunicação feita no país.

A ideia de “conectividade significativa” é um conceito em construção apoiado no entendimento de que a conexão deveria permitir utilização satisfatória de vários serviços na internet, possibilitando o aproveitamento das oportunidades no ambiente online. 

De acordo com Graziela, as políticas públicas para resolver os gargalos desse setor devem ser orientadas pelas quatro dimensões utilizadas para medir a conectividade significativa: custo acessível, acesso a dispositivos, qualidade da conexão e ambientes de uso (frequência e locais de uso). 

“As políticas devem ser orientadas para que todos os cidadãos e cidadãs tenham acesso a conexões intermitentes e de qualidade, em múltiplos lugares, com acesso a dispositivos adequados às necessidades e atividades que se pretenda desenvolver, a um custo compatível com a renda da população. Mas se deve levar em conta também as particulares sociais, econômicas e territoriais, para que as políticas atendam de maneira efetiva às diferentes realidades que compõem nosso país”, avalia a coordenadora. 

Estudo mostra que escolas com mais alunos negros têm piores estruturas

As escolas públicas de educação básica com alunos majoritariamente negros têm piores infraestruturas de ensino comparadas a unidades educacionais com maioria de estudantes brancos. A constatação faz parte de um estudo lançado nesta terça-feira (16) pelo Observatório da Branquitude.

O levantamento aponta que das escolas do país com melhores infraestruturas, 69% são as que têm a maioria dos alunos brancos. Um exemplo: 74,69% das escolas majoritariamente brancas têm laboratório de informática. Entre as de maioria negra, são apenas 46,90%.

São consideradas escolas predominantemente brancas as com 60% ou mais de alunos autodeclarados brancos; e as negras são as com 60% ou mais de estudantes pretos e pardos.

Quando o quesito é a presença de biblioteca, 55,29% das escolas de maioria branca possuem, enquanto menos da metade das de maioria negra (49,80%) contam como equipamento.

As diferenças também são notadas em relação à existência de quadras de esporte. Aproximadamente 80% das escolas majoritariamente brancas têm, enquanto entre as de maioria negra são apenas 48%.

A pesquisa analisou também infraestrutura fora da sala de aula, como rede de esgoto. Enquanto 72,28% das escolas de maioria branca têm coleta, 56,56% das unidades com mais alunos negros não possuem.

A pesquisadora Carol Canegal explica que os dados apontam uma desvantagem para os estudantes negros em relação aos brancos. Carol ressalta que a situação atual de desigualdade está ligada ao histórico de relações raciais no país.

“[A questão está ligada a] todos os anos em que a gente negligenciou a discussão racial. É importante lembrar que o nosso país é fundado sobre o mito da democracia racial”, disse à Agência Brasil.

Para a pesquisadora, as desigualdades existentes formam uma combinação que resulta numa persistência dessas desigualdades. Ela lamenta o fato de que as disparidades se mostram presentes no ciclo mais longo do sistema de ensino brasileiro. A educação básica começa no ensino infantil e abrange até o ensino médio.

Estudo mostra que escolas com mais alunos negros têm piores estruturas – Arte/EBC

Fonte de dados

O Observatório da Branquitude é uma organização da sociedade civil que se dedica a produzir e divulgar informações sobre desigualdades raciais e estruturas de poder da população branca.

O estudo A cor da infraestrutura escolar: diferenças entre escolas brancas e negras foi elaborado com dados do Censo Escolar e do Indicador de Nível Socioeconômico (Inse). Ambos são divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), ligado ao Ministério da Educação (MEC).

A análise é referente a 2021, última vez em que as duas bases de dados foram divulgadas no mesmo ano.

Condição de vida

O Indicador de Nível Socioeconômico é uma avaliação que combina, basicamente, a escolaridade dos pais dos estudantes e a posse de bens e serviços da família. O indicador vai de 1 a 7. Quanto menor, pior a condição socioeconômica do aluno.

A análise revela que 75% das escolas majoritariamente negras concentram alunos nos níveis 3 e 4. São estudantes que relatam ter em casa uma televisão, um banheiro, rede de internet sem fio. No nível 4, os alunos responderam possuir em casa dois ou mais celulares. Em ambos os níveis, a escolaridade da mãe/responsável varia entre o 5º ano do ensino fundamental e o ensino médio completo.

Já 88% das escolas majoritariamente brancas concentram estudantes nos níveis 5 e 6. Eles contam ter em casa um carro, uma ou duas televisões, um ou dois banheiros, internet sem fio, entre outros bens. A escolaridade da mãe/responsável varia entre o ensino médio e o ensino superior completo.

Piores indicadores

Os pesquisadores fizeram uma análise específica das escolas que ficaram na base e no topo do ranking socioeconômico. Foram encontradas treze unidades no nível 1, o mais baixo. Todas são predominantemente negras e nenhuma conta com rede de esgoto e coleta de lixo.

Das 13, 11 ficam no Norte e duas no Nordeste do Brasil. Todas são de área rural. Cerca de um terço (30,77%) sequer tem água potável. Apenas 7,69% têm quadra esportiva. O mesmo vale para biblioteca e sala de informática.

Topo do ranking

Foram identificadas 32 escolas no nível 7, o mais elevado. Todas são de maioria branca e ficam principalmente em áreas urbanas. Todas têm abastecimento de água potável. Mais de 80% contam com laboratório de informática e quadra de esporte. Bibliotecas estão presentes em 71,88% delas.

A analista de pesquisas do Observatório da Branquitude, Nayara Melo, pontua que o levantamento ajuda a enxergar a diferença de oportunidade enfrentada por estudantes. “Não quer dizer que o mesmo 5º ano que um estudante faz em uma capital em escola urbana é o mesmo 5º ano de um estudante no interior em uma escola rural”, exemplifica.

Ações afirmativas

De acordo com o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 55,5% da população brasileira se identifica como preta ou parda.

Nayara Melo observa que as disparidades encontradas no estudo podem ser entendidas como uma justificativa para políticas de cotas raciais em universidades, ou seja, não bastariam apenas vagas reservadas para alunos de escolas públicas e de baixa renda, sem levar em conta a cor do candidato.

“A gente observa que tem uma defasagem na estrutura escolar de escolas com maioria de alunos negros. Estudantes negros se encontram em condição socioeconômicas mais baixa do que estudante brancos”, disse à Agência Brasil.

No fim do ano passado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a atualização da Lei de Cotas ((https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2023-11/atualizacao-da-lei-de-cotas-inclui-quilombolas-e-reduz-teto-de-renda#)). Criada em 2012, a legislação passa por revisões a cada dez anos.

O texto reserva 50% de vagas em universidades federais e instituições federais de ensino técnico para estudantes de escolas públicas, pretos, pardos, indígenas, quilombolas e pessoas com deficiência. Há ainda critérios socioeconômicos que levam em consideração a renda familiar do estudante. 

Na opinião de Carol Canegal, um dos objetivos do estudo é afirmar que “raça importa”.

“A gente destaca a importância de políticas públicas que sejam eficazes, assertivas e que também incorporem esse olhar para as desigualdades raciais”.

“Há uma distância que precisa ser considerada justamente nesse momento de formulação e implementação de políticas públicas para que sejam focalizadas e possam, a

médio e longo prazos, reverter esse processo de desvantagens das populações não brancas”, conclui.

“Uma educação com igualdade de oportunidades também passa por uma infraestrutura escolar que garanta o desenvolvimento pleno de todos os alunos”, aponta a conclusão do estudo do Observatório da Branquitude.

Brasil deve recuperar 25 milhões de hectares de vegetação nativa

Neste 15 de abril – Dia Nacional de Conservação do Solo – o Brasil tem pouco a celebrar, já que não avançou no compromisso assumido internacionalmente de recuperar 12 milhões de hectares de vegetação nativa. Dados da plataforma do Observatório da Restauração e do Reflorestamento apontam que o país possui hoje pouco mais de 79 mil hectares da sua cobertura vegetal original recuperada. Isso significa que menos de 1% da meta foi atingida.

Somado a isso, nos últimos anos o desmatamento e a degradação avançaram sobre os biomas brasileiros. De acordo com levantamento da MapBiomas, entre os anos de 2019 e 2022, o Brasil perdeu 9,6 milhões de hectares de vegetação nativa.

Segundo a diretora do Departamento de Florestas do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Fabíola Zerbini, esse cenário fez com que desde janeiro de 2023 o governo iniciasse uma revisão das metas e políticas públicas para o setor, não apenas para que o Brasil possa cumprir com os acordos firmados para conter os avanços da crise climática, mas principalmente para que as propriedades rurais privadas e o próprio Estado fiquem regulares em relação à legislação ambiental.

“O horizonte de passivo do Código Florestal – somando área privada e pública – está em torno de 25 milhões de hectares de vegetação nativa que precisa ser recuperada. A gente entende que desses 25 [milhões], aproximadamente nove podem ser compensados, ou seja, o produtor decide que vai proteger uma área que está conservada, e a gente vai recuperar algo em torno de 14 milhões, que é a meta atualizada, mas lembrando que a oficial é pelo menos 12 milhões de hectares,” disse Fabíola.

Histórico

Há um entendimento global de que para a crise climática não avançar é necessário reduzir a emissão dos gases de efeito estufa e também capturar o que já foi lançado na atmosfera. Uma das principais estratégias globais para que isso ocorra é a recomposição da cobertura verde do planeta por meio da recuperação das vegetações nativas.

Um estudo coordenado pelo Instituto Internacional para Sustentabilidade, que reuniu pesquisadores de 12 países e foi publicado na revista científica Nature em 2020, revelou que a recomposição de apenas 15% de vegetações nativas do planeta seria capaz de sequestrar 14% de todas as emissões de gás carbônico lançadas na atmosfera desde a revolução industrial.

A capacidade de contribuição dessa estratégia para diminuir os impactos da crise climática se mostrou tão eficaz que a Organização das Nações Unidas (ONU) definiu os dez anos seguintes à pesquisa como a Década para a Restauração de Ecossistemas.

No Brasil, antes mesmo disso, uma legislação ambiental robusta não apenas protege os biomas por meio de cotas de preservação, como também determina quando é obrigatório compensar áreas impactadas pela ação humana, ou seja, reflorestar áreas degradadas ou desmatadas além dos limites. Os chamados passivos ambientais podem ser gerados por propriedades privadas, quando os limites de conservação não são respeitados, ou em áreas públicas atingidas por queimadas ou ocupadas por atividades ilegais.

As cotas são previstas no Código Florestal, criado em 2012. Em 2015 e 2016, o Brasil aderiu a três acordos globais: o Acordo de Paris, o Desafio de Bonn e a Iniciativa 20×20, nos quais assumiu o compromisso de recompor 12 milhões de hectares de sua cobertura verde. Ainda em 2017, o país criou a Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg).

Segundo Fabíola, o MMA tem se dedicado a entender qual o desafio que o país tem até 2030, prazo limite para cumprimento das metas. “Estamos trabalhando primeiro para atualizar os custos da restauração para os dias de hoje e fazer uma precificação por tipo de território: se são áreas privadas, áreas públicas, modelos de restauração e localizar cada situação nos biomas”, explica.

Estratégias

De acordo com a diretora, entre as estratégias possíveis para que cada bioma receba de volta a parcela mínima necessária para a sua manutenção, é preciso entender fatores como as condições atuais da área desmatada ou degradada, se há possibilidade de regeneração natural, se há pessoas que dependem da área para subsistência e também se ainda é possível reestabelecer os serviços ecossistêmicos como eram antes.

Neste sentido, há três caminhos possíveis: a regeneração natural, que pode ser assistida ou não; o plantio em área total, que é a solução mais indicada para Unidades de Conservação, mas também a de maior custo; e os sistemas agroflorestais, que consideram a necessidade de subsistência da população que vive na área em questão. Nesse último caso, podem ser adotados modelos como a silvicultura de espécies nativas, o sistema agroflorestal (SAF) e sistema integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF).

Regeneração

Para Fabíola, uma boa notícia é que um estudo em conjunto com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) conseguiu mapear quase 30 milhões de hectares de vegetação secundária no território brasileiro. “Se protegida, a gente pode aplicar a modalidade de regeneração natural, que é de baixo custo, e só aí se consegue garantir grande parte dessa meta”, preconiza.

Outra estratégia do governo é tornar a recuperação de vegetação nativa um modelo de negócio para o país. Um exemplo é o trabalho desenvolvido pela empresa de madeira sustentável em que Alan Batista é diretor financeiro, no sul da Bahia. Segundo o executivo, a região foi escolhida em 2008 para dar início ao negócio, exatamente por fazer parte do bioma Mata Atlântica, que é o mais desmatado no Brasil. “Aqui que começou a degradação no país, então aqui que a gente queria começar a restauração desse bioma”, observa.

Com a aquisição de três áreas desmatadas pela pecuária extensiva, com baixo potencial agrícola, a empresa desenvolveu um negócio vantajoso para o meio ambiente e também rentável, a partir do investimento na recuperação da vegetação nativa para manejo florestal. Com a floresta replantada, o lucro veio pela venda de madeira de reflorestamento e também do comércio de tecnologia e sementes e mudas melhoradas geneticamente.

Alan Batista é diretor de empresa que recupera áreas desmatadas na Bahia – Foto: Symbiosis/ Divulgação

A silvicultura para o manejo ocorre em uma área 800 hectares, dentro das propriedades que somam 1,4 mil hectares. Segundo Alan, o restante tem áreas de conservação, que, em parte, resultam de restauração somada às áreas adquiridas para serem mantidas livres de ação humana. “A empresa deixa livre de caça, de pesca, cuida para que não haja incêndio, com brigada treinada e manutenção de infraestrutura para prevenção de incêndio”, diz.

A pesquisa “Reflorestamento com espécies nativas: estudo de casos, viabilidade econômica e benefícios ambientais”, publicada em 2021 pelo World Resources Institute (WRI) Brasil, analisou 40 arranjos produtivos envolvendo reflorestamento, restauração ou conservação de 30 diferentes organizações. A partir do estudo, concluiu-se que a taxa de retorno de investimentos para esse modelo de negócio fica entre 9,5% e 28,4%, a depender do arranjo.

De acordo com o especialista do instituto de pesquisa. Miguel Calmon, além dos serviços ecossistêmicos como a própria captação do gás carbônico da atmosfera, as florestas recuperadas também auxiliam na produção alimentar. “Já se abe que esse modelo de negócio baseado no plantio de árvores também aumenta a resiliência do sistema produtivo às mudanças climáticas. Cada ano que passa, nós temos mais eventos extremos como seca, altas temperaturas e enxurradas e já sabemos que sistemas com árvores são mais resilientes a esses eventos extremos, ou seja, é um modelo ganha-ganha.”

Fomento

De acordo com Fabíola Zerbini, além de rever o cenário da recuperação florestal no Brasil, o MMA tem articulado formas para fomentar a regularização ambiental.

“Temos articulado com parceiros, em especial o BNDES, linhas de financiamento e linhas de crédito, como o Restaura Amazônia, que é dinheiro do Fundo Amazônia, que vai direcionar R$ 450 milhões para projetos de recuperação da vegetação nativa na Amazônia. Para além disso, a gente também combinou com o Fundo Clima mais R$ 550 milhões”, explica.

Para a diretora, iniciativas de fomento e a atualização da Política Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa, prevista para ser lançada em junho, combinadas com as políticas públicas, serão capazes de destravar a agenda ambiental.

“A ideia é combinar a articulação com estados, municípios e produtores para a regularização ambiental, como editais e financiamentos, além de programas vinculados a melhores condições de taxas para produtores regulares, somados à estruturação do poder público para a validação dessa documentação” finaliza.