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Remadores Beatriz Tavares e Lucas Verthein se garantem em Paris 2024

O remo brasileiro garantiu duas vagas na próxima edição dos Jogos Olímpicos, que serão disputados em Paris. Na manhã deste sábado (16), Beatriz Tavares e Lucas Verthein triunfaram nas provas de single skiff no Pré-olímpico das Américas, realizado no estádio de Remo da Lagoa, no Rio de Janeiro.

“Foi muito bom vencer em casa, porque eu sempre perdia quando participava de competições internacionais aqui. Pensei em parar de remar muitas vezes, já que nunca imaginei que, de fato, fosse disputar as Olimpíadas. Por isso, fiz um combinado comigo para hoje que a minha única opção seria ganhar, e deu certo”, declarou Beatriz, que completou o percurso de 2 mil metros com o tempo de 8min13s54.

BEATRIZ TAVARES E LUCAS VERTHEIN ESTÃO CLASSIFICADOS PARA OS JOGOS OLÍMPICOS DE PARIS 2024!

Os dois venceram suas provas no Single Skiff do Pré-Olímpico e garantiram a vaga na competição.

NÃO TEM JEITO, O BRASIL ESTÁ MUITO BEM REPRESENTADO NO REMO! 🚣‍♀️🚣#TimeBrasil #Remo pic.twitter.com/Ccc8bo6c2j

— Time Brasil (@timebrasil) March 16, 2024

Já o medalhista de ouro no Pan-Americano de Santiago (Chile) Lucas Verthein, que venceu a prova do single skiff masculino com a marca de 7min24s52, celebrou a vaga nos Jogos de Paris: “É uma felicidade enorme poder representar o Brasil nos Jogos Olímpicos e vou dar o meu melhor para brigar por uma medalha. A meta é focar em melhorar os detalhes técnicos e fisiológicos. Tenho muito a melhorar ainda e estaria preocupado se terminasse essa competição sem nada para evoluir. Estou só com 25 anos e quero ir muito além, ajudando a massificar novamente o remo, como era na década de 1980”.

Os remadores das Américas ainda têm mais uma oportunidade de alcançar a classificação para os Jogos de Paris, pois entre 19 e 21 de maio, em Lucerna (Suíça), será disputado o qualificatório mundial, que distribui duas vagas em cada uma das provas que integram o programa da Olimpíada.

Documentário mostra experiência de fotojornalista em áreas de conflito

Documentário retrata experiência do fotojornalista Joel Silva em áreas de conflito. Foto: Joel Silva/Divulgação

O fotojornalista Joel Silva perdeu o nascimento de seu filho. Há 24 anos, quando ele nasceu, Joel estava trabalhando em uma floresta colombiana, documentando um acampamento de guerrilheiros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). “Não assisti ao nascimento do meu filho. Deixei de participar de vários momentos da minha vida pessoal para me dedicar à minha vida profissional”, contou ele à Agência Brasil.

Joel Silva é fotógrafo há 29 anos. Grande parte dessa carreira foi dedicada ao jornal Folha de S.Paulo. Foi lá que ele passou a cobrir grandes conflitos em diversos países.

Algumas de suas fotos desse período extrapolaram as fronteiras e viraram capa dos principais jornais do mundo, como a de uma bomba que foi lançada pelo regime de Muammar Khadafi contra os rebeldes, na Líbia. “Fotografei a guerrilha colombiana em 2000, depois cobri o golpe militar em Honduras, a ocupação do Morro do Alemão [no Rio de Janeiro], os conflitos na África, o massacre no Cairo (Egito), a Primavera Árabe na Líbia e a Faixa de Gaza”, exemplificou.

Em uma dessas coberturas, lembrou, ele chegou a receber “um tiro de raspão na cabeça”. “Estava cobrindo o massacre, a revolta de manifestantes no Cairo, quando um tiro esbarrou no concreto e respaldou na minha testa. Graças a Deus foi só de raspão. E eu continuei a cobertura, não parei”.

“O jornalismo tem essa função de mostrar a realidade em uma zona de guerra, como está acontecendo agora na Faixa de Gaza. O fotógrafo não se preocupa se ele vai morrer, se ele vai pisar em uma bomba. Ele se preocupa em chegar o mais próximo da verdade, de uma notícia. O limite é tentar encontrar o que não seja invadir uma situação extrema, de sofrimento da pessoa e, ao mesmo tempo, fotografar aquilo para o mundo. É preciso ter equilíbrio”, reforçou.

As várias e impactantes fotos e vídeos que produziu nesse período foram reunidas agora em um documentário que ele mesmo produziu e que foi lançado em fevereiro para relatar como é ser um correspondente em áreas de conflito. Chamado de Todas as Guerras que eu Vi, o documentário pode ser assistido gratuitamente no YouTube e é baseado em um livro de sua autoria, Uma Fresta de Luz no Porão da Sociedade.

“Quando pensei sobre o documentário, pensei em deixar aí um documento da minha vivência no jornalismo, principalmente para os meus filhos. Quero deixar essa vivência para eles e também para essa geração de jornalistas, fotógrafos e repórteres e que precisam de uma referência. Acho que esse é um documento histórico”, disse ele.

Documentário retrata experiência do fotojornalista Joel Silva em áreas de conflito. Foto: Joel Silva/Divulgação

Pesquisadora brasileira recebe Prêmio Internacional de História

A pesquisadora Laura de Mello e Souza foi escolhida pelo Conselho do International Commitee of Historical Sciences (ICHS) para receber o Prêmio Internacional de História. A historiadora, que começou seus estudos na área em plena ditadura militar, é a primeira mulher e a primeira pessoa do continente sul-americano a ganhar o prêmio.

Laura lecionou no Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP) de 1983 a 2014. Ocupou também a cátedra de história do Brasil na Universidade de Sorbonne, em Paris.

Em entrevista no Dia Internacional da Mulher, Laura ressaltou as dificuldades que as mulheres enfrentam ainda hoje em suas carreiras, tanto por causa do tempo disponível quanto pelo reconhecimento profissional, em uma sociedade marcada pela desigualdade de gênero.

“As conquistas obtidas pelas mulheres são fruto sobretudo da luta e do sofrimento delas, e a luta tem de ser cotidiana, pois o mundo ainda é dos homens”, disse Laura à Agência Brasil. 

O prêmio deve ser entregue em outubro deste ano, em Tóquio, durante cerimônia que marcará a Assembleia Geral do Comitê Internacional de Ciências Históricas.

Leia a entrevista da pesquisadora

Agência Brasil – Como você decidiu estudar história? 

Laura Souza – Sempre gostei de história, desde pequena, mas hesitei muito em seguir o curso quando estava para terminar o ensino médio. A ditadura militar investira pesado contra as ciências humanas, e muitos professores da USP e de outras universidades, que ensinavam nessa área, tinham sido cassados ou haviam deixado o país. Pensei em arquitetura, medicina e psicologia, mas o amor pela história falou mais forte, e entrei no curso de história da USP em 1972. 

Agência Brasil – Quais foram as suas referências?

Laura Souza – Eu gostava muito de ler sobre a Grécia antiga, me interessava pela cultura clássica e adorava romances históricos. Mas creio que foi a leitura de Caio Prado Jr (História Econômica do Brasil), ainda no ensino médio, e a de Jacob Burkhardt, no mês que antecedeu minha entrada na USP (Cultura do Renascimento na Itália), que me marcaram decisivamente.
Uma vez na universidade, fui muito influenciada pela historiografia francesa da revista Annales, por autores como Jacques Le Goff, Marc Bloch e Philippe Ariès e pelos historiadores da micro-história italiana, como Carlo Ginzburg. Dentre os brasileiros, sempre Caio Prado Jr, mas sobretudo Fernando Novais e Sérgio Buarque de Holanda. 

Agência Brasil – Em que tema você começou suas pesquisas? 

Laura Souza – Comecei com a história contemporânea: escrevi um texto de pesquisa oral sobre o lazer em São Paulo no entre-guerras, e fiz a pesquisa histórica para um documentário de Lauro Escorel sobre o movimento operário brasileiro no primeiro quartel do século 20, Libertários.
Depois, mudei de período e comecei a pesquisar a pobreza e a marginalidade em Minas Gerais no século 18. Esta foi a minha porta de entrada na pesquisa acadêmica, ali me fiz historiadora.
Desde então, mudei muito de tema. Meu doutorado foi sobre a feitiçaria e a religiosidade popular entre os séculos 16 e 18. Em trabalhos posteriores, estudei as visões negativas que incidiram sobre a América Hispânica; a administração colonial e a trajetória dos governadores portugueses que iam para as conquistas ultramarinas; escrevi a biografia de um poeta do século 18 que se envolveu na Inconfidência Mineira, Cláudio Manuel da Costa, e meu último livro publicado tratou das visões de natureza no século 18, em Minas Gerais. Organizei ainda um volume sobre o cotidiano e a vida privada no Brasil colonial. 

Agência Brasil – Atualmente que tema você pesquisa? 

Laura Souza – Tenho dois projetos em andamento. O mais antigo aborda o deslocamento de três cortes europeias cujos países foram invadidos pelos exércitos revolucionários franceses entre os últimos anos do século 18 e o início do século 19. O mais recente estuda três escritos literários sobre regiões diferentes do império português no século 17.

Agência Brasil – Quais dificuldades você encontrou na carreira de pesquisadora e de professora?

Laura Souza – Encontrei as dificuldades inerentes à época em que vivi. Os documentos não estavam digitalizados, era preciso viajar para consultá-los, a consulta era difícil, sobretudo quando os arquivos eram privados. Enfim, nada estava informatizado, e eu sempre trabalhei muito e ainda trabalho com documentos manuscritos e não publicados.
Por outro lado, pertenço a uma geração privilegiada, que teve bolsas de pesquisa porque as agências mais importantes de financiamento já existiam, como a Fapesp [Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo], em nível estadual, a Capes [Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior] e o CNPq [Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico], no âmbito federal. Nesse sentido, foi mais fácil para nós do que tem sido para as gerações posteriores, que viveram recentemente um período tenebroso, com ameaça e corte de verbas para a educação e a pesquisa. 

Agência Brasil – Como foi receber o Prêmio Internacional de História? 

Laura Souza – Foi uma grande honra e sobretudo uma grande surpresa. Há grandes historiadoras e historiadores no mundo, certamente mais merecedores do que eu. Mas fiquei feliz porque mostra a força da historiografia brasileira, que é cada vez mais reconhecida em nível internacional, e conta com excelentes especialistas.
Além disso, recebi muitas mensagens afetuosas de mulheres historiadoras, que se sentiram incentivadas e prestigiadas com essa premiação, porque sabem que é bem mais difícil ter tempo disponível para a pesquisa e reconhecimento profissional quando se é mulher, já que as tarefas domésticas e a criação de filhos ainda recaem mais sobre elas do que sobre os parceiros.

Agência Brasil – O que você considera importante ressaltar no Dia Internacional da Mulher?

Laura Souza – Que as conquistas obtidas pelas mulheres são fruto sobretudo da luta e do sofrimento das mulheres, e que a luta tem de ser cotidiana, pois o mundo ainda é dos homens. As mães têm de educar filhos homens que respeitem as mulheres e sejam solidários a elas. A lei tem que garantir igualdade entre os sexos em todos os sentidos. As agressões e assassinatos têm de ser severa e implacavelmente punidos. É muito triste que ainda estejamos longe disso.
Torço para que os avanços se tornem cada vez mais significativos. Afinal, minha descendência é totalmente feminina: tenho três filhas e três netas, e espero que o mundo seja mais acolhedor para elas.

Ilustradoras negras lançam versão em quadrinhos de Quarto de Despejo

Escrito a partir das memórias da catadora de papel Carolina Maria de Jesus, o livro Quarto de Despejo vai ganhar nova versão neste ano, como história em quadrinhos (HQ). O lançamento, liderado por ilustradoras negras, comemora os 110 anos da autora, que se tornou referência na literatura brasileira, que serão completados no dia 14 de março.

A coordenadora editorial de literatura e informativos da SOMOS Educação, grupo do qual faz parte a editora Ática, que publicou o livro no Brasil, em 1960, Laura Vecchioli do Prado, teve a ideia quando, em 2020, saiu a edição comemorativa dos 60 anos do Quarto de Despejo. Foi então lançada a adaptação da obra para teatro.

“Queríamos continuar fazendo algum trabalho em cima do Quarto de Despejo. Como é um gênero literário que gera bastante interesse do público, a ideia foi adaptá-lo para HQ, com o propósito também de incentivar a leitura já a partir do sexto ou sétimo ano do ensino fundamental”, disse Laura à Agência Brasil. A obra é lida pelo público juvenil do ensino médio em diante e, com a versão em quadrinhos, seria possível atingir um público mais novo, acrescentou Laura.

O livro já está disponível para venda na internet e em algumas livrarias. A data dos eventos de lançamento, entretanto, ainda não foram alinhadas com as herdeiras de Carolina Maria de Jesus, mas deverão acontecer nos próximos meses.

Artistas negras

A versão HQ da obra foi feita por quatro artistas negras: a roteirista Triscila Oliveira (@afemme1), a ilustradora Vanessa Ferreira (@pretailustra) e as arte-finalistas Hely de Brito (@ilustralyly) e Emanuelly Araujo (@vulgoafronauta).

“Pelo próprio histórico do livro e da Carolina, a ideia inicial, quando eu pensei na HQ, era trazer para esse livro mulheres pretas e, de preferência, periféricas. Foi aí que começamos a pesquisar. Todas elas são mulheres pretas e somente uma não é periférica. A gente queria dar um espaço para novatas, mas como era um livro de grande importância, uma responsabilidade muito grande, pegamos mulheres já experientes com HQ, caso da Triscila Oliveira, que já escreve roteiros”.

Nas orelhas e também dentro do livro, as quatro artistas relataram como foi fazer o livro e a relação delas com o Quarto de Despejo.

Experiência

Para a ilustradora Vanessa Ferreira, ilustrar o livro de Carolina Maria de Jesus “foi uma loucura. É um projeto que a gente soltou em tempo recorde. Foi muita correria, principalmente na etapa final, além do fato de a gente ter que trazer do imaginário, ter que construir visualmente uma vivência que muita gente não tem”, disse Vanessa à Agência Brasil. “Foi uma experiência incrível.”

Com 90 páginas ilustradas, o livro de HQ demandaria, normalmente, em torno de um ano e meio para ficar pronto, cumprindo todo o processo clássico, mas as quatro artistas conseguiram finalizá-lo em sete meses.

Quando iniciou as ilustrações para o livro, Vanessa verificou que a infância de Carolina e a dela própria tinham semelhanças. Ambas cresceram dentro de favelas. “Era, visualmente, uma história que a gente já conhecia, mas adaptar os relatos de Carolina foi muito complicado e em tempo recorde também”.

Vanessa Ferreira ressaltou que a diferença entre ela e a escritora é que Carolina foi uma catadora que veio de Minas, e todo o conhecimento que teve veio do lixo. “Eu, apesar de crescer em um barraco e vir de uma situação muito pobre, tive uma mãe que falava que era muito importante estudar. Minha mãe zelou por isso na minha vida”. No local, não havia pessoas que trabalhassem com ilustração. “Não havia nem essa palavra, na verdade.”

Nascida em 1986, na zona sul de São Paulo, Vanessa ouvia que tinha que terminar o colégio, arrumar um emprego na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e ficar naquilo pelo resto da vida. “Nem à faculdade a gente tinha acesso. Ainda mais uma pessoa preta. Ganhar dinheiro com arte? Nunca”. Dali para cá, o cenário mudou. “Mudou muito, porque a gama que a gente tem de artistas é grande. Juntou muito essa galera e a gente faz muito essa troca”. Gente que tinha carreira em outras áreas, como a própria Vanessa, formada em publicidade, foi para a ilustração, que era uma coisa que ela sempre quis executar. “Eu nunca parei de desenhar, na verdade.”

História

A escritora Carolina Maria de Jesus – Divulgação/Mostra CMJ

 

Nascida em 14 de março de 1914, em Sacramento, Minas Gerais, Carolina Maria de Jesus mudou-se para a cidade de São Paulo em 1937, onde trabalhou como empregada doméstica. Em 1948, foi viver na favela do Canindé, onde nasceram seus três filhos. Enquanto viveu ali, a forma de subsistência dela e dos filhos era catar papéis e outros materiais para reciclar.

O livro Quarto de Despejo reproduz o diário em que Carolina narra seu dia a dia em uma comunidade pobre da cidade de São Paulo, desocupada para construção da Marginal Tietê, em 1961, por influência da repercussão de sua obra. O texto é considerado um dos marcos da literatura feminina no Brasil.

Carolina descreve suas vivências no período de 1955 a 1960 e relata o sofrimento e as angústias dos habitantes da favela, sobretudo a rotina da fome. Ela se sustentava recolhendo papel nas ruas. Quando não conseguia papel, ela e seus filhos não comiam. Sua linguagem é objetiva, ao mesmo tempo culta e inculta, oscilando entre um registro popular e o discurso literário.

A tiragem inicial de dez mil exemplares se esgotou em apenas uma semana. Desde o lançamento, a obra já foi traduzida para mais de 13 idiomas. A publicação é uma edição feita pelo repórter Audálio Dantas e pela equipe de editoração da Livraria Francisco Alves, que recebeu 20 cadernos escritos por Carolina. Dantas selecionou os trechos do diário a serem publicados e escreveu o prefácio do livro. Foi ainda responsável pela estratégia de divulgação da obra na imprensa.

Os dois textos escritos por Audálio Dantas na imprensa são anteriores à publicação do livro e tornaram sua autora conhecida do grande público. A primeira matéria do jornalista sobre o livro foi a reportagem de página inteira no jornal Folha da Noite, de 9 de maio de 1958, intitulada O drama da favela escrito pela favelada: Carolina Maria de Jesus faz um retrato sem retoque do mundo sórdido em que vive. Depois, ele publicou matéria na revista O Cruzeiro, da qual era editor-chefe, com o título Retrato da favela no diário de Carolina: a fome fabrica uma escritora.

Bloco da Terreirada reúne no Rio famílias e foliões criativos

O verde da Quinta da Boa Vista ganhou a companhia de novas cores em um carnaval para todas as faixas etárias. Assim como acontece todos os sábados, o parque localizado na zona norte do Rio de Janeiro foi o destino escolhido para o passeio de diversas famílias. Mas não é um fim de semana comum: crianças, pais e avós caíram na folia com o Bloco da Terreirada.

Junto a eles, jovens com fantasias coloridas formavam uma aglomeração para acompanhar o encontro entre ritmos nordestinos e a tradição do carnaval carioca. A apresentação do Bloco da Terreirada é repleta de signos e referências da cultura popular, em especial o Reisado de Congo do Cariri.

O reencontro de Isaque com sua mãe, após um pequeno susto, comprovava a atmosfera acolhedora. Após o sumiço da criança em meio aos presentes, líderes do bloco pediram que todos se assentassem. A mobilização permitiu que ela fosse rapidamente localizada, sob aplausos coletivos.

Fantasia de Vincent Van Gogh fez sucesso na Quinta da Boa Vista. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil 

A criatividade das fantasias facilitava as brincadeiras entre desconhecidos. Um Vincent Van Gogh não cansava de tirar fotos com foliões que o abordavam sucessivamente. Vestindo uma das fantasias mais criativas, a diretora de arte visual Beatriz Moisés destacou que a atmosfera também é influenciada pelo conforto do espaço. Com uma grande nuvem na cabeça, ela teria dificuldades de se locomover em outros blocos que transitam por vias apertadas.

“Fiz bem de última hora. Estava trabalhando na montagem de um cenário e aproveitei materiais que estavam sobrando. Usei uma lanterna japonesa para montar a base de cabeça e acrilon por fora. E fiz essa chuvinha com pedrinhas. Primeiro surgiu a ideia de fazer a fantasia. Depois eu pensei em um bloco que onde eu pudesse ir com ela. Um que coubesse ela. E como eu amo o Terreirada, foi a escolha certa. Não sei dizer o porquê, mas eu amo o Terreirada. Eu venho todo ano sim, acho lindo”, explicou.

Outros dois foliões também viram no Terreirada Cearense o bloco ideal para exibiram suas fantasias originais. “A ideia era fazer algo que ligado às crianças, ligado à paz. Então a gente quis juntar bonecos, fitas, emojis. Uma mistura justamente para colocar a criança para fora nesse carnaval. Quando a gente terminou o figurino, a gente falou: ‘é a cara de uma terreirada’. A gente vai se divertir bastante”, disse o agente de viagem, Leonardo Silva.

O bloco surgiu em 2012 e, desde 2015, tem a configuração de banda, percussão e perna de pau. Anualmente, há duas grandes apresentações: uma celebração de carnaval e um arraial em junho, também na Quinta da Boa Vista. Ensaios e outros eventos menores também são realizados sem data fixa.

 Foliões na apresentação de carnaval do bloco da Terreirada Cearense, na Quinta da Boa Vista. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Segundo explicou à Agência Brasil a produtora-executiva do bloco, Juliana Costa, a banda é composta por Deya Motta, Natascha Falcão, Thalita Duarte, Vitoria Rodrigues, Beto Lemos, Gabe Pontes e Eduardo Karranka. O desfile mobilizou ainda 200 componentes, divididos igualmente entre a Ala da Percussão e a Ala dos Pernaltas.

Entre os participantes, estão alunos de oficinas de percussão e de perna de pau realizadas pelo bloco. “A gente tem parceria com dois projetos. Um é a Liga do Bem. O outro é o Ser Criança Perna de Pau, que levam as crianças para a apresentação”, informou Juliana. Cerca de 15 crianças participam da oficina, entre 8 e 14 anos de idade, além de alguns pais e mães.

A Ala de Percussão está sob responsabilidade pela maestrina Thais Bezerra, que também assina a direção musical dos enredos e apresentações do bloco. Ela comanda uma oficina dois dias por semana. Nas aulas, ela trabalha a música como ferramenta do brinquedo popular, explorando os folguedos e a diversidade rítmica da cultura brasileira. São usados instrumentos variados como zabumba, alfaia, Caixa, xequerê, ganzá, triângulo e agogô.

Já a Ala Pernalta se desdobra da oficina de perna de pau que, desde 2014, estrutura a linguagem performática das apresentações. As aulas são comandadas pela atriz, educadora e artista multilinguagem Raquel Potí, também responsável pela direção artística e cênica do bloco. A oficina acontece nos jardins do Museu de Arte Moderna (MAM), na zona sul do Rio de Janeiro, aos sábados. Conforme divulga o bloco, as aulas proporcionam aos alunos a oportunidade de “ver a si e o mundo a partir de um novo ponto de vista, potencializar potências, fortalecer comunidades, promover o desenvolvimento pessoal e coletivo, brincar e fazer arte”.

 Apresentação de carnaval do bloco da Terreirada Cearense, na Quinta da Boa Vista. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Bebida mineira

A bebida que se tornou febre no carnaval de Belo Horizonte nos últimos anos também marcou presença na Quinta da Boa Vista. Fabiano de Gonçalves Medeiros apostou na venda do xeque mate para buscar uma renda extra em meio à folia. “Está pegando bem, está fazendo sucesso aqui. Tem uma curiosidade por causa dos ingredientes. E culturalmente o mate é muito presente no Rio. As pessoas tomam na praia, nas lanchonetes”, disse.

Goiano, Fabiano é geólogo e está realizando sua pós-graduação no Rio de Janeiro. Uma das matérias do curso foi concluída em intercâmbio na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em Belo Horizonte. “Todo mundo lá é apaixonado por essa bebida. Eu fiquei lá um mês. Está fazendo um sucesso merecido. Mas é uma bebida que tem que ter cuidado. Porque o mate com guaraná e limão mascara o gosto do rum. Então você está tomando uma bebida refrescante, mas que tem mais de 8% de álcool. Na terceira ou quarta, já pode ficar balançado”, conta.

Pelo menos 129 blocos de rua cancelam a participação no carnaval de SP

Pelo menos 129 blocos de carnaval de rua desistiram de desfilar na capital paulista neste ano, muitos deles, são grupos menores e de periferia. Representantes alegam falta de recursos financeiros, falta de organização da prefeitura para viabilizar o evento e pouco tempo entre a licitação para a definição do patrocinador da prefeitura e o evento.

Emerson Boy, fundador do Bloco Jegue Elétrico, existente há 24 anos, conta que desde o início o bloco sempre saiu nos quatro dias de carnaval, porém, no ano passado, foi preciso diminuir um dia para viabilizar o desfile. Em 2024 a ideia era continuar com os três dias, mas também foi preciso desistir de mais um dia. “Eu inscrevi o bloco em três dias e pensei em desistir de dois, mas consegui desistir de só um. Tudo por questão financeira. E porque o edital definindo quem ia bancar o carnaval demorou para sair. Por isso ficamos indeciso para conseguir apoios, correr atrás de patrocínios. É tudo muito fechado, mal organizado por essa prefeitura”, reclama.

O carnavalesco alega que há muitas dificuldades em colocar um bloco na rua e ressalta que a organização não tem retorno financeiro. “Nós fazemos um esforço para trabalhar pelo carnaval da cidade, trazer esses momentos de felicidade para os foliões, para o povo de São Paulo, para ocupar as ruas e humanizar as ruas com alegria. O carnaval é uma festa muito grande para a cidade, por isso estamos tristes, porque não recebemos nenhum apoio”.

Responsável pelo maior bloco da zona leste, o Bloco Tatuapé, Gustavo Leman diz que espera conseguir fazer o desfile, mas ainda está muito difícil garantir. Neste ano o bloco completa dez anos, mas a falta de patrocínio está se mostrando como um grande impeditivo para a comemoração. “O bloco é o maior da zona leste, é o único megabloco decentralizado, reúne 50 mil pessoas, mas por sermos da zona leste acabamos sendo desinteressantes para as grandes marcas. Por isso, para nós, é sempre um pouco mais difícil, mas este ano foi o pior”.

Leman reclamou que os grandes protagonistas, que são os blocos e os organizadores, ficam apenas com as dificuldades para fazer o carnaval acontecer nas ruas da cidade. “A gente faz uma grande festa linda para a cidade que ganha muito, gera emprego, movimento, muito dinheiro, mas nós que estamos fazendo isso acontecer não conseguimos encaminhar as coisas. Isso é triste porque cada bloco tem sua importância junto com a pessoa física que o criou, além de representar muito para quem o frequenta”, reforçou.

Apesar das dificuldades, Leman diz acreditar que conseguirá fazer o desfile de dez anos, já que uma marca local resolveu apoiar o projeto, após a indicação de uma rede de comerciantes da área. “Obviamente isso não garante o desfile, não tranquilizou a ponto de termos certeza de que ele vai ocorrer da forma que se deve”.

O membro do Fórum de Blocos de São Paulo José Cury disse ser difícil fazer a contagem exata de todos os desistentes. Segundo ele, as desistências começaram a acontecer logo após a inscrição em outubro, já que muitos grupos se inscrevem mesmo sem ter certeza de que vão obter dinheiro suficiente para viabilizar o bloco.

“Muitos dizem que o bloco não foi competente para conseguir o patrocínio, mas a realidade é que a gente não tinha nem certeza de quem era o patrocinador da prefeitura. Assim as marcas ficam segurando até a licitação sair. E se ganham não patrocinam os blocos porque a verba já está comprometida. De certa forma a prefeitura prejudica a relação comercial dos blocos. E blocos maiores não precisam fazer muita coisa para conseguir, porque as marcas se interessam”, disse.

Prefeitura

Segundo a prefeitura, o Carnaval de Rua 2024, que começa neste sábado (3) e vai até o dia 18 de fevereiro, tem número recorde de blocos confirmados, com 536 desfiles, 16% a mais do que no ano passado, e está com toda a infraestrutura organizada para receber os mais de 15 milhões de foliões esperados para este ano.

O patrocínio geral será da Ambev, que venceu a licitação ao apresentar o lance de R$ 26,6 milhões no pregão realizado pela prefeitura no dia 16 de janeiro. Os valores servem para cobrir os custos da prefeitura com a realização do evento. No caso dos  blocos, o patrocínio é individual.

“Os blocos captam diretamente os patrocínios com as empresas. É bom deixar claro que não é a prefeitura que faz o pagamento para os blocos do carnaval de rua. Os blocos são autônomos, independentes, e o recurso que eles buscam, e sempre buscaram, foi direto do privado. Agora, se o privado resolve não patrocinar, aí a prefeitura não tem o que fazer”, disse o prefeito Ricardo Nunes.

Ainda assim, a prefeitura criou um plano de fomento para que os blocos com mais tradição na cidade tenham um incentivo a mais. A administração vai aportar R$ 2,5 milhões para 100 blocos (R$ 25 mil para cada) como forma de incrementar as atividades dos grupos que atuam na festa carnavalesca.

Segundo as informações da prefeitura, em 2023, 213 blocos cancelaram seus desfiles, enquanto neste ano foram 129. “Lógico que num evento desse tamanho, com centenas de blocos participando, pode ter um ou outro que desista Se algum bloco ou outro desiste, aí é um problema único e exclusivamente dele, de uma organização dele. A gente gostaria que não desistisse”, afirmou Nunes.

Bombeiro foi dado como morto após trabalhos de salvamento no Joelma

“Meu nome estava na relação de mortos. É por isso que eu falo que o único bombeiro que tinha falecido nesse incêndio do Joelma era eu”. Naquele dia 1º de fevereiro de 1974, o bombeiro João Simão de Souza, 73 anos, primeiro-sargento veterano, foi dado como morto após ter trabalhado por horas para salvar vítimas do grande incêndio que consumiu o Edifício Joelma, no centro da capital paulista, e que levou à morte 181 pessoas.

A notícia surgiu logo após ele ter conseguido entrar no edifício, já consumido pelas chamas, para fazer uma vistoria. Foi então que ele encontrou um rapaz gemendo no local e tentou retirá-lo pelas escadas. Enquanto fazia esse salvamento, uma laje caiu sobre eles. “Encontrei um rapaz gemendo e resolvi pegá-lo e descer [as escadas]. As águas [usadas para o combate às chamas] que caíam do prédio batiam nas costas e a gente estava sem proteção, só com a roupa, e parecia que ia furar as costas da gente, de tão quentes. Eu estava descendo [com a vítima] e vi uma entrada. Quando cheguei perto era um estacionamento. E pensei em ficarmos por ali. Mas senti um puxão grande atrás de mim e o rapaz acabou caindo do meu braço. Só vi um poeirão e fui apagando. Depois de muito tempo, quando acordei, estava no hospital”.

Joelma em chamas. Imagens feitas pela produtora Souza Lima rodaram o mundo. Divulgação/ Produtora Souza Lima

Foi no hospital que Simão, como é mais conhecido, finalmente descobriu o que tinha acontecido com ele e a vítima, que acabou não resistindo. Foi também no hospital que lhe contaram que ele chegou a ser dado como morto após o acidente. Nesse acidente, Simão quebrou o nariz, os dentes, a clavícula, dois braços, duas pernas e três costelas. Uma dessas costelas chegou a lhe perfurar o pulmão.

“Quando acordei no hospital, estava engessado do pescoço para baixo”, relembra.

Salvamento

O incêndio no Edifício Joelma, atualmente chamado de Edifício Praça da Bandeira, ocorreu na manhã do dia 1º de fevereiro de 1974, provocado por um curto-circuito no sistema de refrigeração do 12º andar. E não foi o único grande incêndio ocorrido na cidade de São Paulo.

Alguns dos bombeiros que trabalharam na tentativa de conter as chamas do Joelma e no socorro às vítimas já tinham enfrentado um evento muito parecido dois anos antes. Em fevereiro de 1972 eles trabalharam no incêndio do Edifício Andraus, também no centro da capital paulista, que provocou a morte de 16 pessoas e deixou mais de 300 feridas. Esse é o caso de Simão e também do primeiro-sargento reformado do Corpo de Bombeiros, Franclin de Jesus Ferreira, de 76 anos.

“Ouvimos no rádio que estava tendo um incêndio no centro da cidade. Não sabíamos o que era, mas quando falou que era em um edifício, logo imaginei o Andraus, onde já tinha trabalhado. ‘Deve ser outro pavoroso’, imaginei”, disse Ferreira.

O trabalho em ambos os edifícios, no entanto, não guardou muitas semelhanças. Se no Andraus muitas das vítimas foram salvas pelo alto, já que o edifício contava com heliponto, no Joelma isso não ocorreu. Pouquíssimas vítimas puderam ser salvas no segundo incêndio dessa forma, já que os helicópteros não conseguiam pousar no local: a cobertura do prédio tinha telhas de amianto e não tinha heliponto.

Cobertura do prédio tinha telhas de amianto e nenhum heliponto – Bombeiro Mato Grosso do Sul/Divulgação

“Todo mundo [do Joelma] resolveu subir para o telhado porque eles se lembraram do Andraus. Mas o primeiro helicóptero que tentou, não conseguiu [parar] por causa da hélice. Teve um [bombeiro que estava no helicóptero] que tentou pular [do helicóptero para a cobertura]. Mas ele passou pelo telhado e parece que quebrou o tornozelo. Não tinha aquele tipo de salvamento que teve no Andraus”, detalha o primeiro-tenente veterano Roberto Silva, 83 anos.

Já a semelhança entre ambos os salvamentos foi que, nos anos 70, não havia equipamentos adequados para se trabalhar na contenção de incêndios. A começar pela farda.

“Naquela época, a farda era de manga curta”, conta Silva. Por isso, antes de entrar em um prédio em chamas, ele sempre passava Hipoglós em todo o corpo, para evitar que a água quente caísse pela pele desprotegida. “O povo passava no rosto e nos braços. Não era como os equipamentos que existem hoje”.

“No outro dia a gente não conseguia colocar a farda, principalmente a grandona, porque as costas queimaram todas. A sorte é que levamos bastante Hipoglós. Mas ficamos um bom tempo sem por roupa, principalmente nas costas, porque queimou tudo”, acrescenta Ferreira.

“Era uma porcaria as botas que a gente usava. A sola saiu de tanto calor. O que sobrou para a gente trabalhar foi o coração”.

De acordo com Ferreira, as fardas não eram o único problema que os bombeiros enfrentavam naquela época para trabalhar em um incêndio. “O que a gente mais precisava era de viatura, mas elas eram sucateadas e também eram poucas”. Outro problema é que a escada magirus, naquela época, só alcançava até o 14º andar, insuficiente para fazer o resgate em edifícios muito altos.

Essas condições são hoje bem diferentes, contou o major da reserva Eduardo Boanerges Barbosa, 77 anos. “Hoje o bombeiro está muito mais preparado para entrar no incêndio, com capacete, capa americana, bota alemã e cinto alemão”, citou.

Outro fator que contribuiu para que o trabalho de contenção de incêndio aconteça de forma mais eficiente nos dias de hoje são as exigências de segurança predial, que passaram a ser regulamentadas. Em 1974, o Joelma não tinha isolamento entre os andares, nem escadas de emergência, nem brigada de incêndio, aspectos que são obrigatórios em edifícios atualmente. “A sorte que temos dos incêndios atuais não serem iguais ao do Joelma é que hoje a lei obriga que os edifícios tenham brigadas de incêndio, que controlam o fogo e não deixam que ele passe para incêndio. Fogo é controlável. No incêndio, ele está fora de controle”, explica major Boanerges.

Reconhecimento

Anos se passaram da tragédia, mas o trabalho desenvolvido pelos bombeiros nunca deixou de ser reconhecido, apesar das dificuldades encontradas na ocasião. Na tarde desta quinta-feira (1), por exemplo, a Câmara Municipal de São Paulo vai homenagear os bombeiros que trabalharam para salvar vítimas e conter as chamas do Edifício Joelma.

Mas essa não será a única homenagem que esses bombeiros já presenciaram pelo ato. A maior delas não veio de nenhum órgão público, empresa ou instituição: mas da lembrança das vítimas que eles salvaram.

No ano passado, por exemplo, durante entrevista a um programa de TV que tratava sobre o incêndio, Simão foi reconhecido por uma das vítimas a quem resgatou do Joelma: o microempresário Mauro Ligere Filho, de 73 anos, a quem ele salvou do parapeito do 22º andar.

“No ano passado, fui convidado para dar uma entrevista para um programa de TV. Conversando com ele [Mauro Ligere Filho], ele contou que estava naquele beiral”, lembrou Simão. “Ele me reconheceu e, naquela hora, eu senti um arrepio. A gente vai lá e salva, mas não reconhece a pessoa. Mas ele me reconheceu. Eu falei: ‘ganhei outro amigo’. E agora, de vez em quando ele liga para mim”, conta Simão.

“Ele agora é um amigo que eu tenho, que eu ganhei, e que só fui encontrar após 49 anos”, confirmou Ligere Filho, em entrevista à EBC.

Dever cumprido

Passados 50 anos, o que ficou para a equipe foi o sentimento de que cumpriram o trabalho da melhor maneira que podiam. “Dever cumprido. Fizemos o que nosso coração mandou. Éramos tão pequenininhos, ínfimos. Mas diante da quantidade de bombeiros que estavam lá, juntos nos tornamos grandes”, se orgulha Ferreira.

Também ficou o sentimento de tristeza. “Foi um pedacinho do ar-condicionado perto de um prédio daquele. Me emociono ao lembrar disso depois de 50 anos. Cheguei a sonhar muitas vezes o mesmo sonho. É duro lembrar tudo aquilo, dá vontade de esquecer”, disse Silva.

Entre essas memórias e sentimentos que os quatro compartilham, ficou também um desejo comum. “Depois de 50 anos do incêndio do Joelma, tenho isso comigo: que um incêndio como esse nunca mais se repita em São Paulo”, reforçou Simão.

A TV Brasil preparou um especial sobre os 50 anos do incêndio do Joelma, que vai ao ar no Caminhos da Reportagem, no dia 4 de fevereiro, às 22h

50 anos depois, marcas do incêndio permanecem

No dia 1º de fevereiro de 1974, Hiroshi Shimuta, 80 anos, chegou bem cedo ao 22º andar do Edifício Joelma, no centro da capital paulista, onde trabalhava. O expediente começava às 9h da manhã, mas ele decidiu chegar antes das 8h porque queria ler os jornais antes de começar a jornada, para se atualizar sobre o que estava acontecendo no Brasil e no mundo. 

Acabara de ser pai de gêmeos. Uma menina e um menino haviam nascido no dia 18 de janeiro e ele sequer os havia segurado no colo porque nasceram prematuros e ainda permaneciam no hospital.

“Eu estava na minha sala lendo meu jornal e então recebi um telefonema da portaria me informando que o prédio estava pegando fogo”, relembra.

Era por volta das 8h45 da manhã, quando o Edifício Joelma começou a pegar fogo. Naquele dia, São Paulo enfrentava muitos ventos, fator que contribuiu para a propagação das chamas.

O incêndio no Edifício Joelma foi uma das maiores tragédias ocorridas no Brasil, provocando a morte de 181 pessoas e deixando mais de 300 feridas. Embora o país nunca tenha se preocupado em homenagear esses mortos ou transformar essa tragédia em um memorial, as marcas e lembranças do incêndio permanecem vivas em muitas pessoas.

Incêndio

O fogo teve início no 12º andar, ocupado pelo Banco Crefisul, resultado de um curto-circuito no sistema de refrigeração. O vento e a falta de segurança do prédio logo fizeram as chamas se alastrarem, levando à morte centenas de pessoas. O número de óbitos registrados variou ao longo dos anos, mas pesquisa feita pelo jornalista e escritor Adriano Dolph, autor do livro Fevereiro em Chamas, documenta que 181 pessoas morreram  no incêndio.

“Busquei documentos oficiais do IML (Instituto Médico Legal) e do Cemitério do Vila Alpina. Busquei também nos processos criminais, em documentos do Corpo de Bombeiros, no Arquivo Público do Estado de São Paulo e em jornais da época”, relembra. “O que tenho são 181 laudos necroscópicos”, atesta o jornalista.

Adriano Dolph, autor de Fevereiro em chamas – Divulgação/TV Brasil

Torres

Inaugurado em 1971, o Edifício Joelma – atualmente chamado de Edifício Praça da Bandeira – é uma obra do arquiteto Salvador Candia. Construído em concreto armado, é composto por duas torres de 25 andares: uma virada para a Avenida Nove de Julho e outra para a Rua Santo Antônio, no centro da capital paulista. Entre elas, uma única escada central.

“Ele tem características arquitetônicas muito interessantes. Ele tem sete andares de estacionamento mas, pela altura desses andares, compõem uma altura de aproximadamente dez andares. Por isso ele não tem marcados três andares. Ele pula do sétimo para o décimo primeiro andar”, explicou Dolph.

Do 11º ao 25º andar, o prédio conta com salas de escritórios que, naquela época, estavam sendo ocupadas pelo Crefisul. “Muitos estavam ali em busca do primeiro emprego. Sexta-feira era o dia de entrevistas de emprego no banco. O livro Fevereiro em Chamas traz relatos de funcionários que estavam levando, por exemplo, uma irmã para entrevista de emprego [naquele dia]”.

As salas eram repartidas por divisórias e tinham carpetes, móveis de madeira e cortinas de tecido, que contribuíram para que o fogo se alastrasse rapidamente.

Dois anos antes, o centro da cidade de São Paulo já havia enfrentado uma grande tragédia. Um incêndio no Edifício Andraus, localizado próximo da Praça da República, havia deixado 16 mortos e entre 300 ou 400 feridos.

“Todo mundo imaginou que a tragédia do Andraus seria aquela épica, aquela que iria marcar gerações. Mas veio uma ainda pior: o Joelma fez muito mais pessoas perderem a vida”, disse o escritor.

Hiroshi Shimuta

Sobrevivente da tragédia, o presidente da Nicom Comércio e Material de Construção, Hiroshi Shimuta, começou a trabalhar no Citibank no início dos anos 70, empresa pela qual dedicou 20 anos de sua vida. Em 1972, o Citibank adquiriu participação no Crefisul para complementar seus negócios. Com isso, o departamento do banco em que ele trabalhava se dividiu: parte continuou na Avenida Ipiranga [onde estava o Citibank] e parte se mudou para o Edifício Joelma, que tinha acabado de ser todo alugado para o Crefisul.

Empresário Hiroshi Shimuta sobrevivente do incêndio do Edifício Joelma. – Paulo Pinto/Agência Brasil

Shimuta alternava entre os prédios a cada semana. Na fatídica sexta-feira de 1974 ele estava no Joelma. “Eu tentei sair [da minha sala]. Mas a fumaça era muito forte. Pensei: ‘vou morrer sufocado’. Decidi arrancar todas as cortinas. O fogo começava nas cortinas, que eram feitas de juta. As janelas ficavam abertas e a cortina ficava balançando para fora. Então, pegava fogo embaixo e ia impulsionando o fogo para cima”, contou o empresário, que estava com outras seis pessoas na sala. 

Sob liderança dele, o grupo saiu da sala em direção a um pequeno banheiro do andar. “O banheiro não pega fogo. Então, vamos ficar aqui, vamos nos acomodar por aqui”, pensaram. Eles ficaram por ali um tempo, mas a fumaça não tardou a chegar. Foi então que decidiram deixar o banheiro e passar para um pequeno parapeito do lado de fora, onde permaneceram até que pudessem ser resgatados pelos bombeiros. O que tardou cerca de cinco horas para acontecer.

“Com o fogo subindo, havia quem se jogava lá de cima [de andares superiores]. O cenário era simplesmente dramático. Eu tentava acalmar o pessoal. Falava para não fazerem besteira porque daqui a pouco o fogo iria se apagar”, falou. “A gente orava muito e pedia para que Deus nos salvasse”.

Antes de ser resgatado, Shimuta pensava nos filhos recém-nascidos. “Eu não posso morrer. Tenho que viver de qualquer forma. Coloquei duas crianças no mundo e essas crianças não vão viver sem o pai. Sou responsável, preciso estar vivo”.

O resgate foi complicado. A escada magirus do Corpo de Bombeiros só alcançava até o 14º andar. Eles estavam no 22º. Então, para fazer esse resgaste, os bombeiros precisaram subir ao topo da magirus e depois usar uma escada de alumínio, de forma complementar, com a qual iam escalando andar a andar. “Eles iam se revezando até chegar ao nosso andar. Fui o último a ser resgatado. Acho que levou mais ou menos uma hora nesse processo porque tinha que descer até o 12º andar [onde estava a magirus]. Aí ele ia descendo até chegar lá embaixo. Depois, subia para resgatar a segunda pessoa. Mas a essa altura do campeonato. estávamos felizes da vida, pois víamos nossos colegas saindo da escada e caminhando lá embaixo. Isso foi dando um alívio na gente”.

Quando finalmente chegou ao asfalto, Shimuta só agradeceu. “A primeira coisa que fiz foi olhar para cima e agradecer a Deus por ter devolvido a minha vida. Depois agachei e beijei o chão”, conta.

Naquela noite, ele não conseguiu dormir. “Estava cansado fisicamente, mas quando fechava os olhos, dava a impressão que eu estava sendo lançado no ar, que estava flutuando. Aquela sensação eu não esqueço nunca. Parecia que Deus estava querendo me levar”.

Mauro Ligere Filho

O microempresário Mauro Ligere Filho, 73 anos, é outro sobrevivente do Joelma. Ele também trabalhava no Citibank, banco pelo qual foi funcionário por 22 anos. “Nós estávamos [no Joelma] justamente vendo o que a financeira Citibank tinha e a financeira Crefisul tinha para podermos adequar os padrões. Os trabalhos tinham recém-começado. Acho que não tinha um mês”.

Mauro Ligere esperou com um grupo mais de cinco horas pelo resgate. Divulgação/TV Brasil

Mauro, estava no mesmo andar de Shimuta, embora em salas diferentes. “Era uma sexta-feira garoenta. Tinha uma reunião e eu estava no prédio antes das 9h. Eu e meu diretor estávamos preparando uma apresentação. Eu tinha recém-ganhado uma caneta Parker 51 do meu pai”, conta.

“Na hora exata do incêndio, eu estava na sala do meu diretor, no 22º andar. Nessa sala tem um banheiro privativo. Estávamos eu, ele e uma secretária preparando a apresentação, quando escutamos uma barulhada de vidros explodindo. Meu chefe pegou um extintor e saiu correndo. A secretária foi atrás dele. Eu estava correndo atrás deles, mas lembrei que tinha esquecido minha caneta [que havia ganhado do pai] e voltei. Peguei a caneta, minha mala e meu paletó. Quando fui sair de novo, alguns segundos depois, o hall dos elevadores e a escada já haviam virado uma chaminé. Tentei subir ou descer pela escada, mas não consegui e acabei voltando para a sala onde estava. Nesse meio tempo, seis pessoas apareceram por ali. O Hiroshi era uma delas”, contou.

De início eles tentaram apagar o incêndio naquele andar. “Tentamos pegar uma mangueira de incêndio para apagar o fogo. Esticamos, conectamos no registro, mas não tinha água. O registro central do sistema de abastecimento de incêndio estava fechado”.

Foi então que tiveram a ideia de se confinar no banheiro. Mas não conseguiram ficar muito tempo por ali por causa da fumaça. A solução acabou sendo pular para o parapeito. “Eu abri a janela [do banheiro] e vi que tinha um parapeito. E daí consegui respirar porque ali é um vale [Vale do Anhangabaú] e os ventos ora vinha daqui ora dali. Aí eu pulei [a janela do banheiro] e as outras pessoas pularam também. [O parapeito] era pequeno e não cabiam sete pessoas. Então ficamos um em cima do outro. E uma pessoa em cima de mim. Ficamos ali por horas. Se não tivéssemos pulado [a janela do banheiro] teríamos morrido asfixiados”.

Ligere foi um dos primeiros a ser resgatado daquele parapeito. Seu salvador foi o bombeiro João Simão de Souza. O nome do bombeiro ele só foi descobrir ao dar entrevista para um programa de TV, no ano passado. “Ele agora é um amigo que eu tenho, que eu ganhei, e que só fui encontrar após 49 anos”.

Daquele fatídico incêndio, Ligere Filho saiu apenas com uma orelha queimada. “Só a orelha que queimou. Eu estava praticamente intacto, não tinha nada além daquela ardência no olho e daquela secura na boca”. E na segunda-feira após a tragédia ele já tinha voltado a trabalhar.

Mas as marcas não foram só físicas. Anos depois ele desenvolveu uma síndrome do pânico. “Imagino que tenha sido consequência disso aí porque eu sempre tinha sido tranquilo”, falou.

Responsabilização

As imagens daquele 1º de fevereiro continuam vivas na memória desses sobreviventes. Ligere Filho, por exemplo, não somente lembra detalhes sobre o que aconteceu naquele dia, como também guarda recortes de reportagens sobre o assunto que foram publicadas em jornais e revistas. Inclusive das muitas entrevistas que deu. “Como eu tinha vivido aquilo, tudo que tinha [sobre o Joelma] eu comprava e guardava. Até que eu resolvi fazer um livro com várias manchetes da Veja, Estadão, Folha para contar para os meus netos”.

Cada um teve que conviver com as recordações à sua maneira, já que, segundo relatos de sobreviventes, nem o condomínio, nem a prefeitura e nem o Crefisul disponibilizaram psicólogo para as vítimas após o incêndio.

De acordo com o escritor Adriano Dolph, houve uma batalha pelo reconhecimento de que o Crefisul teve responsabilidade no incêndio. O banco chegou a indenizar alguns por acidente de trabalho, e entendia que era o suficiente, e que não era devida indenização às famílias pelos mortos. “Foi uma batalha de cinco anos que chegou ao STF (Supremo Tribunal Federal) e que o pagamento só ocorreu após dez anos, com idas e vindas, embargos declaratórios”, explica o autor. Dolph ressalta ainda que os valores pagos foram ínfimos.

“As pessoas só começaram a receber, de fato, a indenização após um acordo com o grupo Crefisul, que não era mais o Crefisul. Elas só começaram a receber indenização em 1986”, relembrou Adriano Dolph.

Além disso, nem todo foram indenizados. “[A indenização] recebi de Deus, que foi a vida”, afirmou Ligere Filho.

Pelo lado criminal, cinco pessoas foram responsabilizadas pelo incêndio no Joelma. Em abril de 1975, Kiril Petrov, engenheiro responsável pelas instalações gerais, foi condenado a três anos de prisão. Já os eletricistas Sebastião da Silva Filho, Alvino Fernandes e Gilberto Araújo e o proprietário da empresa Termoclima, Walfried Georg, foram condenados a dois anos de prisão. Eles recorreram da sentença e então houve diminuição das penas. “De fato, eles nunca cumpriram a pena de cadeia. Todos permaneceram livres”, disse o autor de Fevereiro em Chamas.

Já a empresa Crefisul jamais foi julgada. “Da diretoria do grupo Crefisul ninguém foi tido como réu. Ninguém [do banco] foi encarado pela promotoria ou pelo delegado que cuidou do caso como responsável”, acrescentou o escritor.

A TV Brasil preparou um especial sobre os 50 anos do incêndio do Joelma, que vai ao ar no Caminhos da Reportagem, no dia 4 de fevereiro, às 22h

Após bronze inédito, Zion sonha com Jogos de Inverno de 2026 na Itália

O catarinense Zion Bethônico, de 18 anos, pode dizer que conseguiu, ainda muito jovem, algo que nenhum brasileiro havia alcançado ainda. No dia 20 de janeiro – quando ele ainda tinha 17, já que fez aniversário no último domingo (28) – ele conquistou o bronze no snowboard cross nos Jogos Olímpicos de Inverno da Juventude, em Gangwon (Coreia do Sul), se tornando o primeiro atleta do país a subir ao pódio em uma Olimpíada de Inverno – seja entre jovens ou adultos – na história. De volta ao Brasil, ele visitou as instalações do Centro de Treinamento do COB, no Rio de Janeiro, nesta terça (30) e contou que foi pego de surpresa ao saber do ineditismo do feito.

“Contaram para mim na linha de chegada. Ainda estava decepcionado que não havia conseguido o ouro. Ao final da descida, o pessoal do time Brasil me recebeu com tantos gritos que fiquei impressionado. Pensei comigo: ‘realmente fiz algo de se honrar”, disse o catarinense à Agência Brasil.

Em família 😍

Zion e seu diferencial, o irmão Noah.

Quer saber mais sobre a dupla de snowboarders? 🏂

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— Time Brasil (@timebrasil) January 20, 2024

Já ciente da repercussão de sua conquista, o menino, que retornou ao país no último dia 25, tem passado os últimos dias descansando e contando sua história, alvo de curiosidade para um público pouco acostumado a acompanhar esportes disputados abaixo de zero grau. Zion revelou como se prepara ao longo do ano para competir.

“No Brasil, eu só faço a parte da preparação física. Eu passo mais da metade do ano fora e em competições na América do Sul, América do Norte, Estados Unidos, Canadá. E de outubro até dezembro eu passo na Europa. Eu fico indo de competição em competição e tentando ganhar o máximo de experiência em corrida. Já me acostumei. Estou há muitos anos fazendo isso e é uma rotina que eu gosto. Eu prefiro o frio ao calor, talvez (risos)”, dispara.

A preferência fica ainda mais clara quando ele revela que Snowmass Village, cidade no estado norte-americano do Colorado, é o lugar preferido dele no mundo inteiro. Zion pôde estudar e treinar no local por dois anos quando era menor.

No ambiente familiar, ele encontrou a maior inspiração: o irmão Noah, que também participou dos Jogos Olímpicos de Inverno da Juventude no snowboard cross, mas na edição de 2020, em Lausanne, na Suíça.

“Estamos juntos desde pequenos e ele sempre esteve um passo à frente. Então estou sempre correndo atrás dele e ele dando o máximo para não deixar eu alcançá-lo. A gente se puxa para frente, com certeza”, opina Zion.

Agora atleta adulto, Zion tem desafios pela frente

Durante a visita ao CT do COB, Zion conversou brevemente com o presidente da entidade, Paulo Wanderley Teixeira, que considerou o resultado na Coreia do Sul o primeiro passo para uma evolução do Brasil nos esportes de inverno.

“Ainda é preciso muita paciência e perseverança, principalmente. Mas o caminho está aberto. O comitê vem dando suporte às duas confederações, tanto a de neve quanto a de gelo. E elas têm aproveitado esses projetos específicos de apoio às modalidades de inverno”, disse o dirigente.

Na foto estão Carlos Eduardo Barros (vice-presidente da Confederação Brasileira de Desportos na Neve- CBDN), Camila da Cunha Pereira ao lado do filho Zion, e Paulo Wanderley Teixeira (presidente do COB) – Zion em visita ao COB em 30/01/2024 – Rafael Bello/COB/Direitos Reservados

Como ultrapassou o recorte de idade para participar de competições como atleta da juventude, Zion agora terá que encarar a categoria adulta. Ir aos Jogos Olímpicos de Inverno em 2026, nas cidades italianas de Milão e Cortina D’Ampezzo, passou a ser o seu grande objetivo. Curiosamente, enquanto realizava o passeio organizado pelo COB, o jovem encontrou outra atleta brasileira de carreira destacada nos esportes na neve.

Jaqueline Mourão, de 48 anos, fez história como a primeira brasileira a participar de Olimpíadas de verão como de inverno. Em 2022, ela se tornou a atleta do país com mais edições olímpicas no currículo: oito, sendo cinco de inverno (onde compete no esqui cross country) e três de verão (no ciclismo mountain bike). Ela estava participando de um curso no local e falou sobre a alegria pela conquista de Zion, compartilhada com outros atletas brasileiros.

Durante visita ao CT do COB, Jaqueline Mourão não poupou elogios a Zion. “”Foi um resultado incrível para todos os amantes dos esportes da neve no Brasil”, afirmou a veterana, que soma oito participações em Olímpiadas- Rafael Bello/COB/Direitos Reservados

“Foi um resultado incrível para todos os amantes dos esportes da neve no Brasil. Falei para ele: você realizou o meu sonho. O sonho de todos os apaixonados de ver o Brasil realmente participando do esporte e conseguindo a sua excelência. Ele tem que continuar a carreira dele, tem ainda várias etapas para desenvolver e que essa medalha não seja um peso na carreira dele. Que seja só um empurrãozinho ali para que ele conquiste os sonhos dele”, disse Jaqueline.

Ariel Nobre usa arte para chamar atenção para violência contra trans

 

“Preciso dizer que te Amo”. Essa frase é escrita de forma cotidiana pelo artista e comunicador Ariel Nobre. Foi com ela que Ariel “sobreviveu ao suicídio”, como ele mesmo descreve. “No último segundo, eu lembrei de registrar o que seriam as minhas últimas palavras. Com certeza, eu estou vivo hoje por conta da minha capacidade de produzir poesia”, diz.

A história está registrada no filme curta-metragem Preciso Dizer que Te Amo, disponível online. O filme passou por mais de 30 festivais, tanto no Brasil quanto no exterior, obtendo reconhecimento do público no Festival Internacional de Curtas Metragens de São Paulo, além de ter sido eleito o melhor curta no festival Goiânia Mostra de Curtas e ter recebido indicação ao Grande Prêmio de Cinema Brasileiro. O projeto também se transformou em campanha de prevenção de suicídio de homens trans.

“O Preciso Dizer que Te Amo é uma extensão da minha existência e conta como me tornei quem sou a partir da minha perspectiva e de companheires de jornada”, diz, ao acrescentar: “Essa é a mensagem que eu tenho para dizer para mim mesmo em público.”

Por meio da arte, Ariel Nobre chama atenção para uma realidade que não é apenas a dele. O Brasil é o país que mais mata pessoas LBGTQIA+ no mundo. O número de pessoas lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, queer, intersexuais, assexuais e outras foram assassinadas no Brasil em 2022 mantém o país no topo mundial entre aqueles que realizam pesquisas sobre esse tipo de violência. Foram 242 homicídios – ou uma morte a cada 34 horas –, além de 14 suicídios.

Dados como estes também deram origem a outra obra de Ariel Nobre, 14 cartas escritas para 14 líderes. Em 2023, pela 14ª vez, o Brasil foi o país com o maior número de assassinatos de trans, segundo levantamentos da organização não governamental (ONG) suíça Trans Gender Europe, confirmados pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). Foram 131 trans e travestis assassinados no país em 2022.

Nobre escreveu, então, 14 cartas à mão para líderes influentes da indústria da comunicação, para sensibilizá-los sobre a importância da formação de líderes trans. Um registro com o teor da carta também está disponível online. “Me sinto injustiçado quando dizem que pessoas como eu destroem famílias. O que eu mais quero é ser e ter família. E apesar de tudo acredito que sou digno de vida, trabalho e amor”, diz um trecho da carta, que chama atenção para o mercado excludente de trabalho e para a necessidade de políticas de inclusão nas empresas.

Mais vozes trans

Ariel Nobre defende não apenas um mercado corporativo mais inclusivo, mas também medidas inclusivas na área das artes. O filme Preciso Dizer que Te Amo foi realizado, por exemplo, por conta de um edital que tinha cotas para pessoas trans. O artista conta que, na época, ele compartilhava a própria história no Facebook e chegou a ser procurado por jornalistas e outros profissionais interessados em reproduzir essa história.

“Eu compartilhei minha história muitas vezes, mas, depois de um ano, eu vi que eu estava com os mesmos problemas. Eu contei, contei minha história, algumas pessoas ganharam prêmio de jornalismo, ganharam prêmio de outras áreas, e eu não. Eu continuei tendo os mesmos problemas. Foi aí que eu pensei, eu não tenho um real, eu não sei como vai ser a minha vida no mês que vem, estou no limite da sobrevivência, mas eu preciso entender que a minha história tem valor, porque essas pessoas estão contando a minha história e elas estão ganhando prêmio”, relata.

Para ele, é muito importante que as pessoas trans possam elas mesmas contar as próprias histórias, defender os próprios interesses, ocupar cargos de liderança. Para que isso aconteça, são necessárias principalmente políticas públicas, além de políticas privadas, como a inclusão em empresas.

“Então, eu entendi que eu precisava contar a minha história e eu precisava lucrar com a minha história. E a partir daí eu entendi, assim, eu parei tudo o que eu estava fazendo para esse edital e nesse processo também de contar a história, eu entendi que a minha história passava por outras histórias”, acrescenta ele.

Segundo Nobre, com mais inclusão e mais visibilidade, o Brasil passará a ter conversas, muitas vezes difíceis, mas necessárias. “A gente está adiando essa conversa e, quando a gente adia essa conversa, a gente está adiando vidas, a gente está adiando dignidade, a gente está adiando abraços, a gente está adiando educação, sabe? A gente está adiando a reconciliação que o Brasil merece, que as famílias merecem”, defende.

Para o comunicador, quanto mais oportunidade as pessoas trans tiverem de contar as próprias histórias a partir da própria perspectiva, “vai ser mais difícil expulsar a gente de casa”. “Vai ser mais difícil, sabe? Quanto mais as mães e os pais, os cuidadores ouvirem as conversas de o que aconteceu depois: Dia 1 – expulso de casa, Dia 2 … Um mês, dois meses e todas as consequências emocionais e econômicas daquilo, daqueles traumas, quanto mais mães e pais ouvirem essas notícias, mais difícil vai ser de expulsar de casa”, diz.

Para marcar a visibilidade trans, cuja data é 29 de janeiro, a Agência Brasil publica histórias de cinco artistas trans na série Transformando a Arte, que segue até o dia 31 de janeiro.