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Lula propõe parceria com países africanos para combate ao desmatamento

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva discursou na manhã deste sábado (17) na abertura da 37ª Cúpula da União Africana do Brasil, em Adis Abeba, na Etiópia. Em sua vigésima primeira visita ao continente africano, ele propôs iniciativas conjuntas para a proteção das florestas tropicais, entre elas uma rede satélites para monitorar o desmatamento e a recuperação de áreas degradadas. Lula também reiterou o compromisso do Brasil em promover uma governança efetiva e multilateral em áreas como inteligência artificial, considerando os interesses do Sul Global.

“Venho para reafirmar a parceria e o vínculo do nosso país e do nosso povo com este continente irmão. A luta africana tem muito em comum com os desafios do Brasil. Mais da metade dos 200 milhões de brasileiros se reconhecem como afrodescendentes. Nós, africanos e brasileiros, precisamos traçar nossos próprios caminhos na ordem internacional que surge. Precisamos criar uma nova governança global, capaz de enfrentar os desafios do nosso tempo”, ressaltou o presidente.

“Já não vigoram as teses do Estado mínimo. Planejar o desenvolvimento agrícola e industrial voltou a ser parte das políticas públicas em todos os quadrantes. As transições energética e digital demandam o incentivo e a orientação dos governos.”

Lula também expressou o compromisso do Brasil em colaborar com a África no desenvolvimento de programas educacionais, saúde, meio ambiente e ciência e tecnologia. Além disso, anunciou planos para ampliar o intercâmbio de estudantes africanos nas instituições de ensino superior brasileiras e fortalecer a cooperação em áreas como pesquisa agrícola e saúde.

Em relação às crises internacionais, o presidente voltou a defender uma solução duradoura para o conflito Israel-Palestina, com o avanço na criação de um Estado palestino reconhecido pelas Nações Unidas, e destacou a necessidade de reformas na ONU para garantir uma representação mais equitativa, incluindo países da África e América Latina no Conselho de Segurança.

 

Lula reforçará apelo por financiamento climático dos países africanos

Após uma visita oficial de dois dias ao Egito, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva está em Adis Abeba, na Etiópia, onde prossegue seu giro na África para fortalecer a relação do Brasil com o continente. Lula chegou na noite desta quinta-feira (15) à cidade, onde fica até o domingo (18). O presidente tem como principal objetivo ampliar as parcerias por meio de uma agenda comum pró-Sul Global.

O termo Sul Global é usado para se referir aos países pobres ou emergentes que, em sua maioria, estão localizados no Hemisfério Sul do planeta. Na capital etíope, Lula cumpre uma visita de Estado – a mais alta em nível diplomático – e ainda participa, como convidado especial, da cúpula da União Africana, entidade que representa os cerca de 50 estados do continente e tem sua sede em Adis Abeba.

Transição

Entre os eventos estratégicos da viagem, está a participação do presidente brasileiro no evento “Financiamento climático para a agricultura e segurança alimentar: implementação da Declaração de Nairóbi e resultados da COP28”. A Declaração de Nairobi foi o documento final assinado durante a Cúpula Africana do Clima, em 2023, na capital do Quênia, em que os líderes africanos se comprometeram a investir U$ 30 bilhões por ano até 2030 para suprir a lacuna de financiamento em segurança hídrica. Além disso, os países cobraram da comunidade internacional o compromisso de aplicar U$ 100 bilhões por ano em financiamento climático, ou seja, em ações para assegurar a transição energética e outras medidas de mitigação e adaptação das mudanças climáticas que estão em curso no planeta.

Já na última Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP28, realizada também no ano passado, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, os países acordaram a instituição de um fundo global, de US$ 100 bilhões por ano, a serem ofertados de forma voluntária pelos países mais ricos para o financiamento climático. Também se cobrará um avanço concreto no financiamento para a recuperação de perdas e danos para os países que já foram muito afetados pelos efeitos da elevação média da temperatura do planeta.

O evento desta sexta em Adis Abeba é organizado pela Comissão da União Africana (CUA) e pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), em colaboração com o governo de Uganda. Além de Lula, participarão os chefes de Estado de Angola, Comores, Djibouti, Quênia, Moçambique e Uganda, chefes de organizações não governamentais e da sociedade civil, Comunidades Econômicas Regionais, organizações de agricultores, povos indígenas e academia.

“Com isso em perspectiva, no encontro desta sexta-feira, os líderes vão discutir e fazer um apelo à ação em relação a vias financeiras, bem como intervenções políticas, inovação e conhecimento a fim de aprimorar a resiliência climática e a adaptação nos sistemas agrícolas e alimentares na África”, informou o Palácio do Planalto, em nota oficial.  

Encontro bilateral

Os compromissos de Lula na Etiópia começam com a cerimônia de oferenda floral em homenagem aos heróis caídos na Batalha de Adwa, ocorrida em março de 1896, entre a Etiópia e a Itália. Em seguida, o presidente visita o Museu Memorial de Adwa.

Posteriormente, o líder brasileiro será recebido na sede do governo para a cerimônia de boas-vindas, sucedida por uma reunião ampliada com o primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed. Depois, Lula e Ahmed se reunirão a portas fechadas.

Em seguida, Lula fará uma caminhada pelo Parque da Unidade e pelo Jardim Botânico. Um almoço à comitiva brasileira será oferecido pelo primeiro-ministro Ahmed, na sede do governo. Antes de participar do evento sobre financiamento climático, Lula ainda participará de cerimônia de plantio de mudas de café. A Etiópia é considerada o berço da cultura do café em todo o mundo.

A agenda do presidente ainda prevê possíveis encontros bilaterais com chefes de Estado africanos que estarão presentes em Adis Abeba por ocasião da cúpula da União Africana, mas os detalhes desses encontros não foram anunciados oficialmente pelo Palácio do Planalto, pois ainda estão em negociação.

A Etiópia é o segundo país mais populoso da África, com cerca de 125 milhões de habitantes, e a quinta maior economia do continente, com Produto Interno Bruto [PIB, soma dos bens e serviços] nominal de US$ 156 bilhões (2023). Membro pleno do BRICS desde 1º de janeiro de 2024, a Etiópia é um dos principais centros diplomáticos do continente africano, pelo fato de a capital, Adis Abeba, abrigar as sedes da União Africana (UA) e da Comissão Econômica das Nações Unidas para a África (Uneca).

Brasil e Etiópia desenvolvem programas de cooperação bilateral em áreas como manejo de solos ácidos e produção de algodão. Já em parceria com o Programa Mundial de Alimentos (PMA), cooperam na área de alimentação escolar.

Em 2023, segundo dados oficiais do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), o intercâmbio comercial bilateral somou US$ 23,8 milhões, o que na avaliação do Brasil ainda tem “amplo potencial de crescimento dos fluxos”.

União Africana

Já a participação de Lula na cúpula da União Africana, que ocorrerá no sábado (17), ocorre no contexto em que entidade africana se tornou membro oficial do G20 este ano, com apoio do Brasil. Presidido pelo Brasil em 2024, o G20 reúne as 19 maiores economias do planeta, além da União Europeia e, agora, da União Africana. No fim do ano, o Rio de Janeiro será sede do encontro da cúpula do G20.

O convite para a cúpula da União Africana, de acordo com o Palácio do Itamaraty, pode ser interpretado como um sinal de prestígio, já que na maior parte das vezes apenas os governantes africanos participam desse evento. Essa participação também se insere no processo de relançamento da política externa brasileira para a África, retomada no ano passado. É a segunda visita de Lula à África em seu terceiro mandato presidencial. Em 2023, ele visitou a África do Sul, Angola, a São Tomé e Príncipe e Cabo Verde.

O retorno de Lula ao Brasil está previsto para a madrugada de domingo (18), no horário de Brasília, onde deverá desembarcar no fim da noite. O presidente viajou para o Egito e a Etiópia acompanhado dos ministros Mauro Vieira (Relações Exteriores), Wellington Dias (Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome), Luciana Santos (Ciência, Tecnologia e Inovação), Anielle Franco (Igualdade Racial), Silvio Almeida (Direitos Humanos e Cidadania), Vinícius Marques de Carvalho (Controladoria-Geral da União), e do assessor-chefe adjunto da Assessoria Especial, Audo Faleiro.

Maior ataque a religiões de matriz africana atingiu 70 templos

Instrumentos musicais, indumentárias, estatuetas, insígnias e outros objetos sacralizados compõem um acervo raro de 216 peças que foram roubadas em 1912 de terreiros em Alagoas, mas não destruídas, durante o maior ataque na história do Brasil a religiões de matriz africana. Esse conjunto de materiais resgatados, de valor histórico e cultural imensurável, pode ser finalmente tombado neste ano como patrimônio cultural brasileiro pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan)

O ataque ocorrido a partir da madrugada do dia 2 de fevereiro de 1912 (há exatos 112 anos), em episódio que ficou conhecido como “Quebra de Xangô”, teria atingido, ao menos, 70 casas de religiões de matriz africana em Maceió e também em cidades vizinhas. De acordo com pesquisadores, um grupo que se intitulava Liga dos Republicanos Combatentes promoveu, naquele dia, terror com invasões, vandalismo, espancamentos e ameaças, além de roubar objetos sagrados.

Esses objetos a serem tombados, expostos na época pelos agressores como símbolo de vitória, passaram a significar a comprovação do crime. O ataque foi cometido pela agremiação política que fazia oposição ao governador da época, Euclides Malta, e o ‘acusava’ de proteção e proximidade aos terreiros. Por isso, prepararam aquele que se tornou um ataque sem precedentes de intolerância religiosa no país. Hoje, as 216 peças não destruídas estão sob guarda do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas (IHGAL).

Peça que restou do ataque de intolerância religiosa em Alagoas, conhecido como Quebra de Xangô, que ocorreu há exatos 112 anos – Foto Larissa Fontes/Divulgação

Segundo o historiador Clébio Correia, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), esse é o único caso registrado na história brasileira de quebra de terreiros de forma coletiva. “A gente tem episódios de invasão e quebra de terreiros em todo o Brasil, mas individualmente. No caso de Alagoas, houve verdadeiro levante de uma turba organizada por uma milícia chamada Liga dos Republicanos Combatentes, que era um braço armado do político Fernandes Lima, inimigo do governador Euclides Malta, à época”, explica.

O historiador do Iphan Maicon Marcante lembra que muitos objetos sagrados foram destruídos e queimados em praça pública. “Porém, esse conjunto de objetos sobreviveu a esses ataques e permaneceu por um período no Museu da Sociedade Perseverança até 1950. Depois foram transferidos para o IHGAL”, afirmou Marcante. Foi por isso que a coleção de objetos ganhou o nome de Perseverança. O primeiro inventário das peças foi feito em 1985.

Hoje, as peças, segundo o pesquisador do Iphan, apresentam desgaste. O diagnóstico do Iphan para o tombamento vai orientar as ações de conservação e restauração. Os tecidos estão desgastados. Alguns fios de conta estão arrebentados. “Mas, de forma geral, as peças estão preservadas. A gente está falando de estatuetas representativas de orixás, de instrumentos musicais, indumentárias, objetos e insígnias. São mais de 40 braceletes e pulseiras”.

Peça que restou do ataque de intolerância religiosa em Alagoas, conhecido como Quebra de Xangô, que ocorreu há exatos 112 anos – Foto Larissa Fontes/Divulgação

Mais divulgação

Maicon Marcante ressalta que, a partir do momento em que a coleção Perseverança for tombada pelo Iphan como patrimônio cultural brasileiro, haverá a responsabilidade do órgão na preservação e acautelamento desses bens. Nesse momento, ocorre a fase final de instrução de tombamento, que conta com a participação de representantes da comunidade de religiosos no processo de atribuição de valores e de significação cultural das peças. 

Ele explica que ao fim da fase de instrução, o processo passa por trâmites internos com avaliações na Câmara Técnica e no Conselho Consultivo, o que poderia ocorrer ainda no primeiro semestre de 2024. Após o tombamento, além das ações de preservação, conservação e estudo da historiografia, devem ser tomadas outras medidas para maior difusão do episódio invisibilizado. “Devemos levar o conhecimento sobre esse acervo, sobre esses objetos, para um público mais amplo, fora de Alagoas, inclusive. Podemos pensar em exposições virtuais também”.

Reverência aos ancestrais

 Entre as lideranças que colaboraram com o trabalho do Iphan está a Mãe Neide Oyá D´Oxum, de 62 anos. Ela afirma que os objetos e a memória do episódio de 1912 guardam o símbolo da resistência das religiões de matriz africana. “É a nossa história e com a qual podemos reverenciar a luta dos nossos ancestrais”. Um reconhecimento, segundo ela, veio em 2012, do então governador Teotônio Vilela Filho, que ediu desculpas, em nome de Alagoas, pelo episódio escandaloso de violência racista. 

Peça que restou do ataque de intolerância religiosa em Alagoas, conhecido como Quebra de Xangô, que ocorreu há exatos 112 anos – Foto Larissa Fontes/Divulgação 

Entre esses fatos, Mãe Neide cita Tia Marcelina que, conforme foi documentado pelos religiosos de Alagoas, foi espancada na noite do Quebra de Xangô e acabou morrendo nos dias seguintes. “Enquanto ela era açoitada, disse que os agressores poderiam quebrar braço e perna, tirar sangue, mas que não conseguiriam tirar o saber dela”.

Para preencher lacunas

De acordo com a professora Larissa Fontes, que produziu tese de doutorado na Universidade Lumiere Lyon (França) sobre as peças que restaram do ataque em Alagoas, a coleção Perseverança é o documento mais importante para a memória religiosa no estado. “São mais de 200 objetos que estão hoje abrigados no Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas em estado deplorável, precisando muito de restauro, de um projeto sério de salvaguarda. A gente está nessa luta há muitos anos para o tombamento e caminhando agora concretamente para que isso saia neste ano”.

O livro da professora Larissa, O museu silencioso, foi publicado na França. A obra será também impressa no Brasil. Larissa, que é pesquisadora e também religiosa, colaborou com o Iphan e informa que o dossiê a ser entregue para aprovação do tombamento já está praticamente pronto. “Na minha pesquisa de doutorado, fui atrás da biografia desses objetos, buscando a tradição oral das comunidades religiosas afro-brasileiras de Alagoas, muito afetadas pela repressão e por esse silêncio”. Ela acrescenta que descobriu na pesquisa sinais e vestígios de perdas de materiais.

Larissa atribuiu essas lacunas à dificuldade de acesso e às peculiaridades da história. “Diferentemente de outros episódios de repressão que a gente teve no Brasil, que era a polícia que invadia terreiros, quebravam coisas e batiam em gente, e guardava os autos dos processos, em Alagoas, curiosamente, o Estado estava ausente da ação”.

A pesquisa atual da professora é um prolongamento da tese e pretende trazer de volta a Alagoas conhecimentos de perdas litúrgicas por meio de religiosos, autoridades religiosas que ainda detêm conhecimento na Bahia. “É muito importante essa ação patrimonial de recuperação e de reparação da memória”, afirma Larissa, docente do Departamento de Ciências Humanas e Sociais do Instituto Superior de Eletrônica e Tecnologia Digital, de Brest (França).

Peça que restou do ataque de intolerância religiosa em Alagoas, conhecido como Quebra de Xangô, que ocorreu há exatos 112 anos – Foto Larissa Fontes/Divulgação

Para o historiador Clébio Correia, professor da Ufal, a despeito do Instituto Histórico ter cumprido papel de salvaguarda desse material, o entendimento dos “povos de terreiros” é que esses documentos deveriam estar em um museu, um memorial afro de Alagoas. “E não em um espaço da elite branca intelectual do estado. A gente está vivendo, neste momento, o processo de tombamento legal, muito importante para garantir a proteção das peças”.

Na sua opinião, a coleção Perseverança é o símbolo maior do ataque e mobiliza hoje os terreiros de Alagoas. “É o que a gente chama de prova material da resistência negra no estado. E gera esse ideário dos terreiros de ter um espaço próprio da memória em Alagoas”. 

“Imprensa preconceituosa”

Em busca também de compreender o violento episódio, cercado de apagamentos, o professor de antropologia Ulisses Neves Rafael, da Universidade Federal de Sergipe (UFS), assinou a tese Xangô Rezado Baixo, que faz referência à proibição, posterior à repressão do dia 2, do uso de atabaques nos terreiros, o “rezado baixo”. 

Ele descobriu o episódio por acaso, durante o mestrado, e se surpreendeu que praticamente não havia pesquisa sobre o ataque. Assim buscou garimpar o quebra-cabeças em veículos, com publicações desde o início do século 20 até os episódios de 1912. “O Jornal de Alagoas (veículo de oposição ao governador e o principal objeto de análise) publicou uma série de oito reportagens”.

Para esclarecer as lacunas da violência, descobriu que a imprensa teve um tom preconceituoso contra os terreiros. “A imprensa foi instrumento dessa repressão. Os textos tinham uma linguagem muito preconceituosa e racista. Na verdade, eles tiveram papel fundamental na construção dessa imagem negativa dos terreiros”, explica o professor, que desenvolveu a pesquisa na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) a partir do ano 2000.

Segundo a jornalista Valdeci Gomes da Silva, da Comissão Nacional de Jornalistas pela Igualdade Racial, a imprensa em Alagoas contribuiu, ao longo da história, com a reprodução do racismo. “Não foi diferente no Quebra de Xangô. Como naqueles dias, até hoje há quem se refira aos rituais das religiões de matriz africana como magia negra. Isso é um termo muito racista e que a gente não pode admitir”. A pesquisadora avalia que os jornais demonstraram ser coniventes com a elite financeira.

O professor Ulisses Rafael, da UFS, acrescenta que as notícias do Jornal de Alagoas (veículo de oposição ao governador e o principal objeto de análise) tornaram os grupos ainda mais vulneráveis e foram capazes de mobilizar pessoas além da Liga dos Republicanos combatentes. “A campanha recebeu grande adesão da população, da sociedade civil. Falou-se em centenas de pessoas nas ruas”. 

Os jornais informaram que os episódios ocorreram na madrugada, mas que, na verdade, já havia antes um clima de perseguição e de ataque. O próprio governador teria sido obrigado a fugir do Palácio pelos fundos e ido para o Recife. “Nesse intervalo, em que ele se encontra afastado, as casas são atacadas. As invasões acontecem em Maceió, em terrenos mais afastados e também em cidades vizinhas”. O professor não crava o número de casas atingidas porque não foi divulgado um quadro completo de terreiros com nomes das pessoas ou localização. 

Essa adesão de dezenas pessoas ao ataque contra terreiros é compreendida pela professora de antropologia Rachel Rocha de Almeida Barros, da Universidade Federal de Alagoas, como sintoma de uma sociedade ainda escravagista, majoritariamente católica, provinciana e analfabeta.   “Imagine 100 pessoas correndo por Maceió em 1912, quebrando tudo”. 

Teria havido, na opinião da antropóloga, um planejamento prévio. Ao mesmo tempo em que existiam integrantes sem qualquer consciência, a Liga dos Republicanos Combatentes era civil, com característica paramilitar, e constituída também por ex-integrantes da Guerra do Paraguai. Nessa mistura, essas pessoas, segundo explica, estariam vestidas de foliões carnavalescos quando chegaram aos terreiros. O Brasil vivia uma lógica racionalista, ainda escravagista e as manifestações religiosas de pessoas pretas eram desumanizadas. “A abolição não tinha completado ainda três décadas”.

Quem também entende o papel “estratégico” dos agressores é o Pai Célio Rodrigues dos Santos, que é historiador. “Essa milícia procurou estudar qual era a data e os horários mais propícios de invasão aos terreiros (em vista dos momentos de homenagens e oferendas dos cultos). Eles chegaram trasvestidos de um bloco carnavalesco. Tocavam, batiam e gritavam. Chamavam de macumbeiros, quebravam tudo, agrediram e ameaçaram”. Como efeito, segundo o Pai Célio, líderes religiosos correram, fecharam suas casas e saíram. “Mas resistimos. Hoje, Alagoas tem um grande número de terreiros, principalmente na periferia. E aí são esses terreiros que dizem não à intolerância religiosa”, avalia. Ele acredita que existam ao menos 3 mil terreiros no estado.

Existem ainda outros efeitos, de acordo com o professor Clébio Correio, para a identidade local.  “Quando lemos as notícias de 1910, vemos que Maceió era vista na época como uma referência para os negros de outros estados. Vinham pessoas conhecer as religiões afro. Depois do quebra, passou a se vender para o resto do país como uma cidade de coqueiro, de sol e praia”, lamenta. O resultado disso foi um esvaziamento do carnaval de Alagoas porque as manifestações culturais foram silenciadas. 

A professora Rachel acredita que o maior interesse por essa temática, após os anos 2000, tem relação com a maior democratização do espaço acadêmico, coincide com a política de cotas e cria, com isso, reflexos nas temáticos sociais abordadas. “É muito importante ver que esse episódio revisitado gerou livro, discussões contemporâneas e também filme”.

O trabalho a que ela se refere é do professor Siloé Amorim, de antropologia da Ufal. O documentário 1912: o quebra de Xangô (confira aqui o roteiro).

O filme, produzido em mais de três anos, tem 52 minutos de duração e foi motivado principalmente pelo silêncio sobre o ataque e o desconhecimento da população, inclusive dos terreiros. “Poucas pessoas tinham conhecimento do caso. Maceió tem muitos terreiros e isso era muito pouco divulgado. Me surpreendeu muito o preconceito velado sobre as religiosidades de matrizes africanas aqui no estado”. Ele explica que a opção pelo filme tem relação com a necessidade de garantir visibilidade para um público maior a fim de denunciar o que ficou tanto tempo em silêncio.

Veja galeria de fotos:

Galeria – Intolerância religiosa – “Quebra de Xangô” – juca.varella

Secretário de Estado dos EUA visita quatro países africanos

24 de janeiro de 2024

 

O Secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, iniciou ontem sua viagem por quatro países africanos.

O secretário Blinken reuniu-se neste dia com o primeiro-ministro Ulisses Correia e Silva em Praia, capital de Cabo Verde, primeiro país que visitou antes da Costa do Marfim, Nigéria e Angola.

Blinken disse neste evento que Cabo Verde é o primeiro país a concluir dois contratos com a agência norte-americana Millennium Challenge Corporation (MCC). Os acordos servem para financiar programas específicos para o crescimento econômico.

Depois de Cabo Verde, o secretário mudou-se para a Costa do Marfim e se reunirá com o presidente Alassane Ouattara e altos funcionários do governo em Abidjan.

Esta é a quarta viagem do secretário Blinken a África durante o seu mandato.

 

Cabo Verde é a terceira nação africana a eliminar a malária

14 de janeiro de 2024

 

Cabo Verde tornou-se o terceiro país africano a ser declarado livre da malária, apesar de a doença continuar a matar centenas de milhares de pessoas no continente todos os anos, afirmou a Organização Mundial de Saúde (OMS) no final de dezembro. O arquipélago atlântico de cerca de 500.000 habitantes segue as Maurícias em 1973 e a Argélia em 2019 ao ser declarado livre da malária.

Em todo o mundo, pelo menos 43 países foram certificados como livres de malária pela OMS, o que exige demonstrar que a cadeia doméstica de transmissão foi interrompida durante pelo menos três anos consecutivos. “Saúdo o governo e o povo de Cabo Verde pelo seu compromisso inabalável e resiliência na sua jornada para eliminar a malária”, disse o Diretor-Geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, usando o nome local do país. “A certificação da OMS de que Cabo Verde está livre de malária é uma prova do poder do planeamento estratégico de saúde pública, da colaboração e do esforço sustentado para proteger e promover a saúde”.

A diretora regional da OMS para África, Matshidiso Moeti, também elogiou o feito. “A realização de Cabo Verde é um farol de esperança para a Região Africana e não só. Demonstra que com uma forte vontade política, políticas eficazes, envolvimento comunitário e colaboração multissectorial, a eliminação da malária é um objectivo alcançável”, disse Moeti.

A OMS estima que a malária matou 608 mil pessoas em todo o mundo e infectou 250 milhões em 2022. A doença está particularmente presente na África, que em 2021 foi responsável por 95% das mortes e 94% das contaminações. As crianças com menos de cinco anos representaram 80% das mortes em África, segundo a OMS.

Mas no pequeno arquipélago de Cabo Verde, com taxas de malária relativamente baixas, a OMS considerou a eliminação da doença um objetivo viável. “Foi necessário muito trabalho árduo por parte da liderança de Cabo Verde. São mais de 50 anos de luta contra a malária. É um país pequeno com baixas transmissões de malária, por isso já foram identificados como elegíveis para eliminar a malária até 2025, “Dra. Dorothy Achu, chefe de Doenças Tropicais e Transmitidas por Vetores na África da OMS, disse à VOA.

Embora o país tenha alcançado o estatuto de livre de malária, “isso não significa que parem as suas actividades”, alertou ela. “Trabalhamos com Cabo Verde para desenvolver outro plano, uma estratégia, que visa prevenir o restabelecimento da malária”, incluindo o fortalecimento dos sistemas de saúde e a formação de profissionais médicos, disse Achu.

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Projeto ensina cultura africana e afro-brasileira com brincadeiras

O esconde-esconde ou pique-esconde é uma brincadeira popular no Brasil, mas pouca gente deve saber que esses passatempos também divertem crianças em diferentes países africanos como Angola, Moçambique, e São Tomé e Príncipe. Mais improvável ainda é que alguém já tenha ouvido falar do Nguec, jogo de pontaria da Guiné Equatorial, em que os participantes marcam pontos se conseguirem acertar um fruto da árvore Anguec com uma vara.

Esses são apenas alguns exemplos das mais de 100 brincadeiras que foram registradas no Brasil e em seis países africanos que também falam português: Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique e São Tomé e Príncipe. Elas estão no Catálogo de Jogos e Brincadeiras Africanas e Afro-Brasileiras. O livro é organizado pelas pesquisadoras Helen Pinto, Luciana Soares da Silva e Míghian Danae e está disponível gratuitamente em versão digital.

Trabalhos como esses ajudam professores e alunos, principalmente da educação infantil, a se aproximarem das diretrizes estabelecidas pela Lei 10.639, que há 21 anos tornou obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana nas escolas. A pedagoga Míghian Danae, professora da Universidade Internacional da Integração da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), explica que o objetivo principal do projeto era produzir materiais pedagógicos com subsídios para educadores discutirem questões que atravessam historicamente a vida da população negra no país.

Ilustração do Catálogo de Jogos e Brincadeiras Africanas e Afro-Brasileiras – Divulgação/Editora Aziza

“A gente pode praticar a educação a partir das relações étnico-raciais. A maioria das pessoas fica muito surpresa de pensar a brincadeira por essa perspectiva da valorização da cultura africana e afro-brasileira, e das relações de pertencimento. Brincar é um artefato cultural também, uma expressão dos valores de uma sociedade”, destaca a professora Míghian Danae em entrevista à Agência Brasil. “As informações do livro parecem simples, mas são muito ricas. Ao saber de determinada brincadeira, a criança a vincula a um lugar geográfico, mas também a um lugar político, social e histórico, que guarda relações com o Brasil.”

A produção do material levou dois anos e teve apoio do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert) e do Itaú Social. Ao longo de 2022 e 2023, o projeto foi divulgado em algumas escolas e associações do movimento negro na Bahia, Florianópolis, São Paulo e Rio de Janeiro. E acabou originando um segundo livro, Na Escola se Brinca! Brincadeiras das Crianças Quilombolas na Educação Infantil, feito a partir de duas comunidades de Santo Amaro e São Francisco do Conde, municípios do Recôncavo Baiano.

As autoras queriam tornar mais conhecidos os modos de ser e fazer das crianças quilombolas, mostrar como se desenvolvem nos espaços escolares. Apostar no lúdico, para elas, é uma forma criativa e propositiva para estabelecer relações sociais de reciprocidade, respeito e afirmação da diversidade.

“Pensamos no uso dessas brincadeiras dentro e fora da escola. Tivemos o cuidado de escolher brincadeiras que reafirmassem e valorizassem questões importantes para nós. Sabemos que o racismo também alcança esse universo e fizemos uma curadoria para perceber que valores estavam presentes nas brincadeiras que selecionamos”, diz Míghian Danae. “Queremos dar às crianças o direito de conhecer a diferença, entendida a partir da ideia de celebração. E não de competição ou de inferiorização. Por isso, tanto a teoria quanto a prática são importantes nesse processo, se não o debate é esvaziado.”

Bispos católicos africanos rejeitam bênçãos para pessoas do mesmo sexo

Fridolin Ambongo

11 de janeiro de 2024

 

Os bispos católicos romanos da África emitiram na quinta-feira uma declaração recusando-se a seguir a declaração do Papa Francisco que permite aos padres oferecer bênçãos a casais do mesmo sexo.

Assinada pelo cardeal congolês Fridolin Ambongo em nome do Simpósio das Conferências Episcopais da África e Madagáscar, ou SECAM, a declaração afirma que tais uniões são “contrárias à vontade de Deus”.

A medida ocorre depois que Francisco aprovou, em 18 de dezembro, uma declaração que permite aos padres oferecer bênçãos a casais do mesmo sexo, o que foi bem recebido pelos católicos LGBT+.

Na declaração, o Vaticano reafirmou o ensinamento tradicional da Igreja de que o casamento é apenas entre um homem e uma mulher, mas disse que os padres poderiam oferecer bênçãos não litúrgicas a casais do mesmo sexo.

Os bispos católicos africanos disseram que a declaração do Vaticano contradiz “o costume cultural das comunidades africanas”. A homossexualidade continua ilegal em muitos países africanos.

“A doutrina da Igreja sobre o casamento cristão e a sexualidade permanece inalterada”, afirmou o SECAM num comunicado de Acra, capital do Gana.

“Por esta razão, nós, os bispos africanos, não consideramos apropriado que a África abençoe as uniões homossexuais ou os casais do mesmo sexo”, acrescenta o comunicado.

A resistência sublinha uma lacuna entre a liderança progressista e reformista do papa e os conservadores em grande parte da comunidade católica.

 

Migrantes africanos que usam rota pela Colômbia para chegar aos EU causam caos em aeroporto

28 de dezembro de 2023

 

O aumento do fluxo de migrantes africanos no aeroporto internacional El Dorado, Bogotá, Colômbia, tem causado caos no local. Segundo a imprensa, eles vêm através da empresa aérea turca Turkish Airlines com o objetivo de fazer conexão para El Salvador e depois Nicarágua, de onde pretendem seguir para os Estados Unidos.

Com esta rota, eles evitam a passagem pela perigosa floresta do Darién, onde anualmente dezenas de migrantes morrem.

Carlos García, do Departamento da Migração da Colômbia, disse que o país deve adotar um “protocolo mais estrito” para receber os africanos.

A maioria deles vêm da Guiné, Eritrea, Camarões, Somália, Angola e Burkina Faso e é retida no aeroporto por falta de documentos obrigatórios que permitam que continuem sua viagem até El Salvador.

O general colombiano José Luis Ramírez disse que haverá uma investigação com ajuda da Interpol para averiguar se há algum tipo de crime envolvido na onda migratória.

 
 

Lula pedirá ao Japão acesso ao mercado de carne bovina do país

Transição energética, proteção da Amazônia, recuperação do Cerrado degradado e o acesso do Brasil ao bilionário mercado japonês de carne bovina estão entre os temas que serão discutidos entre o primeiro-ministro japonês, Fumio Kishida, e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nesta sexta-feira (3), em Brasília.

O governo brasileiro deve aproveitar a visita do chefe do governo japonês, a primeira desde 2014, para estreitar as relações políticas, ambientais e econômicas, o que inclui a histórica reinvindicação para o Brasil participar do mercado de carne bovina do Japão.  

 “O presidente Lula mencionará essa intenção de diversificarmos as trocas comerciais e eu acho que um grande objetivo é obtermos acesso ao mercado japonês para a nossa carne bovina e a ampliação do acesso à carne suína, a qual, por ora, apenas Santa Catarina está habilitada [a exportar para o Japão]”, destacou o embaixador Eduardo Paes Saboia, secretário de Ásia e Pacífico do Ministério das Relações Exteriores (MRE).

De acordo com o Itamaraty, o Japão importa cerca de 70% da carne bovina que consome, o que representa de US$ 3 a US$ 4 bilhões do ano. Desse total, 80% são importados dos Estados Unidos e da Austrália, históricos aliados do país asiático. O MRE conta que, desde 2005, o Brasil tenta, sem sucesso, entrar no mercado japonês de carne bovina.

“Hoje a condição sanitária brasileira é muito melhor do que a de 2005. Inclusive, em matéria de reconhecimento de áreas livres de febre aftosa sem vacinação. Então, essa condição precisa ser reconhecida porque o Brasil exporta para mais de 90 mercados de carne bovina”, completou o embaixador.

Etanol

Outra demanda do Brasil é a ampliação da participação do etanol brasileiro no Japão.  De acordo com o embaixador Saboia, o etanol brasileiro é melhor que o de outros fornecedores do Japão, como os Estados Unidos.

“Todas as medições objetivas e científicas atribuem ao etanol brasileiro, inclusive o etanol de milho, uma eficiência energética maior que de outros fornecedores” comentou.

Ainda segundo o Itamaraty, o Brasil deve solicitar ao Japão que participe dos investimentos na chamada neoindustrialização brasileira, programa do governo federal criado para aumentar a participação da Indústria na economia, e também no novo PAC [Programa de Aceleração do Crescimento], programa de infraestrutura que depende de investimentos privados.

O primeiro ministro Kishida será recebido pelo presidente Lula nesta sexta, às 9h30, no Palácio do Planalto. Ele vem acompanhado por uma comitiva de 35 líderes empresariais japoneses. Em Brasília, estão previstas assinaturas de acordos nas áreas de cibersegurança, ciência e tecnologia, industrial e de cooperação em agricultura e meio ambiente.

Após o almoço no Itamaraty, o chefe do governo do Japão segue para o Paraguai. No sábado, Fumio Kishida retorna ao Brasil para uma agenda com empresários e a comunidade japonesa em São Paulo, que deve contar com a presença do vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviço, Geraldo Alckmin.

Questões ambientais

O governo brasileiro acredita que o Brasil pode ajudar o Japão em sua transição energética. A ideia é que o país asiático invista em energia renovável no Brasil para que o país possa exportar energia limpa para o Japão.

“80% ou mais da energia consumida no Japão é importada e, boa parte dela, é de fontes não renováveis. Então, o Japão também possui capacidade de investir, de apostar na ampliação da energia renovável no Brasil, para que nós possamos também ampliar a nossa vocação de potência de energia renovável”, destacou Eduardo Paes Saboia, secretário do Itamaraty para Ásia e Pacífico.

Além disso, um acordo entre Brasil e Japão deve ser assinado para o país asiático financiar o programa brasileiro de recuperação de áreas degradadas do Cerrado. Outro tema será o investimento para o Fundo Amazônia, que desenvolve projetos para proteção do bioma. O Japão foi o primeiro país asiático a investir no Fundo com um total de U$S 14 milhões. “Mas nós queremos mais, eu acho que é muito pouco”, comentou Saboia.

Geopolítica

O representante do MRE destacou ainda que o governo brasileiro deve aproveitar a visita do primeiro ministro japonês para reforçar as agendas políticas comuns aos dois países, como o pleito para reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU).

“São também países que têm essa aspiração de ocuparem um assento permanente no Conselho de Segurança ampliado e há valores comuns que serão objeto das conversas entre os dois líderes”, disse Saboia.

O embaixador acrescentou que todos os grandes temas internacionais podem estar na mesa de discussão, uma vez que Brasil e Japão são membros do G20, grupo das 20 maiores econômicas do mundo, incluindo a União Europeia e a União Africana.

Financiamento climático para enfrentar as mudanças do clima, combate global à fome e as guerras em curso estão entre os temas possíveis de discussão. “Engajar o Japão na aliança global no combate à fome é algo que certamente estará entre os chamados do lado brasileiro à parte japonesa”, completou.

Relações históricas

O Japão é o segundo principal parceiro comercial do Brasil na Ásia, atrás apenas da China, e o 9º principal parceiro comercial do Brasil no mundo. O fluxo comercial entre os dois países é de US$ 11,7 bilhões, com superávit brasileiro de US$ 1,4 bilhão. O Japão ocupa a posição de 8º maior investidor externo no Brasil, com estoque de cerca de US$ 28,5 bilhões.

O Brasil exporta, principalmente, ferro, frango, café, alumínio e milho e importa do Japão, principalmente, produtos manufaturados, como autopeças, compostos químicos, instrumentos de medição e circuitos integrados.

O Brasil ainda tem a maior população nipodescendente fora do Japão, estimada em mais de dois milhões de pessoas. Já o Japão abriga a 5ª maior comunidade brasileira no exterior, com cerca de 221 mil nacionais.  

Evento do G20 em São Paulo debate informação como bem público

Autoridades brasileiras e estrangeiras se reuniram nesta quarta-feira (1º), em São Paulo, para discutir a importância de ações que fortaleçam o acesso à informação de qualidade como um bem público. Promovido pelo Grupo de Trabalho de Economia Digital do G20 (grupo das 20 maiores economias do planeta, mais União Europeia e União Africana), o seminário sobre integridade da informação contou com a presença de representantes de cerca de 50 países e abordou temas como o enfrentamento à desinformação e aos discursos de ódio, principalmente no ambiente digital.

“As pessoas sempre tiveram discursos de ódio, sempre mentiram, sempre espalharam maledicências, mas [a atual] escala global e nível de sofisticação [com que estes conteúdos são disseminados] é preocupante”, declarou a subsecretária-geral de Comunicações Globais da Organização das Nações Unidas (ONU), Melissa Fleming, na abertura do evento.

Responsável por supervisionar as operações de comunicações estratégicas da ONU, incluindo os serviços de notícias e mídia digital, Melissa comentou que a própria organização composta por 193 Estados-Membros é alvo de campanhas organizadas de desinformação. Para a subsecretária, a divulgação de desinformação e discursos de ódio ameaça as instituições públicas e a democracia em todo o mundo, principalmente em um contexto de crescente uso de ferramentas de inteligência artificial.

“Podemos dizer que é um momento de grande ansiedade. Alguns, inclusive, podem dizer que este é um momento temeroso […] Na minha perspectiva, estamos vendo ameaças em todos os cantos do mundo […] Estamos preocupados pois sabemos que a inteligência artificial tem alimentado algoritmos projetados para atrair a atenção de usuários e amplificar postagens que geram ódio e conteúdos racistas, xenofóbicos e antissemitas, por exemplo. Ao mesmo tempo, esses mesmos algoritmos frequentemente limitam o alcance das informações verdadeiras”, comentou Melissa, defendendo o direito de as pessoas obterem informações confiáveis.

“Falamos muito sobre a informação digital porque o ambiente digital, de fato, gera grande parte das toxinas dos nossos sistemas [de informação] e navegar neste ambiente tóxico e polarizado é extremamente difícil, mas precisamos de um ecossistema saudável por inteiro. Estamos especialmente preocupados com o impacto [das campanhas de desinformação] nos processos democráticos. Bilhões de eleitores irão às urnas este ano, em mais de 60 países. Eles tomarão decisões importantes não só para seus futuros, mas que, em um mundo interconectado, importam a todos”, acrescentou Melissa, conclamando todos a conhecerem os princípios que a ONU vem recomendando que os Estados-Membros adotem como forma de aprimorarem suas iniciativas em defesa da integridade da informação. “Temos esperança de que eles sirvam como guias para os países-membros na construção de regulamentações nacionais”, destacou.

Bem público

O diretor-geral adjunto de Comunicação e Informação da Organização da ONU para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), Tawfik Jelassi, também comentou a importância de o acesso a informações de qualidade ser tratado como um bem público.

“Esse conceito da informação como um bem público já foi endossado pela Unesco e seus Estados-Membros. É isso que precisamos promover e proteger, pois não queremos informações que representem uma ameaça pública. A questão é como transformar essa ideia em ações concretas”, disse Jelassi, acrescentando que a Unesco aprovou uma série de sugestões para a efetiva governança das plataformas digitais.

“Sabemos que as plataformas e as mídias sociais criaram oportunidades para democratizar o acesso [da população global às informações e ao conhecimento], mas também sabemos os inúmeros desafios e riscos que elas trazem consigo”, comentou o diretor-geral da Unesco, endossando a preocupação de Melissa Fleming com o eventual impacto do uso indevido da inteligência artificial durante o processo eleitoral.

“Sabemos que, este ano, cerca de 2,6 bilhões de eleitores de diversos países irão às urnas votar. Tememos o risco da desinformação, da [divulgação de] informações erradas que influenciam [a decisão dos] eleitores, isso quando não os impedem de participar de um processo democrático. Obviamente, o resultado destas eleições vão moldar o mundo de amanhã. E serão um teste global para a democracia e para as liberdades de expressão e de acesso à informação em todo o mundo”, afirmou Jelassi.

Brasil

O ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Paulo Pimenta, destacou algumas das ações que o governo brasileiro vem implementado, como a estratégia nacional de educação midiática. Nesta quarta-feira, a Secom lançou o primeiro vídeo da campanha contra a desinformação e o discurso de ódio na internet.

“Acreditamos que a integridade da informação depende do fortalecimento do jornalismo público, comunitário e privado. Estamos trabalhando na expansão da rede nacional de comunicação pública, em parceria com as universidades e institutos federais, o que vai triplicar a rede de rádios e pode duplicar as emissoras de televisão. Ampliamos os mecanismos de sustentabilidade de emissoras comunitárias e estamos caminhando para fortalecer a sustentabilidade de produtores de conteúdo jornalístico”, disse Pimenta.

“Além disso, entendemos que é fundamental avançar na regulamentação democrática das plataformas digitais. O modelo de negócios das empresas favorece a disseminação da desinformação e do discurso de ódio. As plataformas precisam ter mais responsabilidade para garantir que o ambiente digital não seja usado para a disseminação de conteúdos ilegais”, acrescentou o ministro, defendendo que a regulação deve ser “equilibrada para promover a liberdade de expressão e, ao mesmo tempo, proteger outros direitos fundamentais para os cidadãos”.

Paulo Pimenta também destacou que esta foi a primeira vez que o tema da integridade da informação foi pautado em um evento do G20, que este ano está sendo presidido pelo Brasil. “Este é um reconhecimento de que os impactos da desinformação e dos discursos de ódio são enormes”, avaliou.