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Escolas são importantes no combate à LGBTfobia, defendem especialistas

“Seu viado”, “Fulano é mão quebrada”. Essas são algumas expressões que o professor de artes e teatro Ronei Vieira conta que já ouviu entre os estudantes. Expressões que muitas vezes são naturalizadas, mas que são agressivas e que podem gerar impactos profundos na vida e na trajetória escolar de pessoas LGBTQIA+.

“Eu acho que a escola ainda é um ambiente muito hostil à comunidade LGBT”, diz Vieira, que leciona no Centro de Ensino em Período Integral Edmundo Pinheiro de Abreu, em Goiânia

As impressões do professor são confirmadas em estudos que mostram que a escola muitas vezes não é um ambiente acolhedor. Por um lado, xingamentos que começam como piadinhas e chegam até mesmo a agressões, podem gerar marcas profundas. Por outro, deixar de repreender condutas preconceituosas pode fazer com que essas práticas se perpetuem até a vida adulta, gerando uma sociedade cada vez mais intolerante.

No Brasil, a discriminação de pessoas LGBTQIA+ é crime. Em 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) equiparou a LGBTfobia ao crime de racismo. Nas escolas, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei 9394/1996, a principal lei educacional do Brasil, o ensino nas escolas deve ser feito baseado no “respeito à liberdade e apreço à tolerância”.

Esse preceito, no entanto, nem sempre acontece. A Pesquisa Nacional sobre o Ambiente Educacional no Brasil 2016 – As experiências de adolescentes e jovens LGBT em nossos ambientes educacionais, mostra que estudantes lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais relatam que são agredidos dentro das escolas e que isso atrapalha o rendimento nos estudos. Alguns inclusive declaram que já cogitaram tirar a própria vida por causa das agressões: 73% foram agredidos verbalmente e 36% foram agredidos fisicamente.

Como professor, Vieira diz que deve repreender qualquer tipo de preconceito. “A gente tem que repreender, conversar com o estudante, dependendo do nível. Se for uma agressão física, é [preciso] chamar os pais. Se for mais grave ainda, no sentido de uma agressão mais grave, você tem que chamar o batalhão escolar pra intervir”, diz.

Mas, ao longo da carreira, ele conta já ter presenciado estudantes que buscaram a coordenação por estarem sofrendo bullying e LGBTfobia e acabarem sendo repreendidos. A gestão dizia que isso ocorria por conta do comportamento da própria vítima.

“A gente tá vivendo uma sociedade conservadora e a escola, na verdade, é uma reprodução desse mundo que a gente vê aí fora, infelizmente”, diz o professor. Ele defende que a escola deve ser capaz de trabalhar a educação sexual de forma inclusiva, como uma maneira de formar melhores cidadãos para o país e para o mundo:

“Eu acho que você vai criando uma sociedade mais saudável. Saudável no sentido de lidar com o próprio corpo, saudável no sentido de saber lidar com o outro melhor, de respeitar a diversidade de corpos e existências, né? De formas de existir no mundo. E eu não vejo outra forma da gente criar um mundo melhor se não for olhando para essa diversidade”.

Menos espaço nas escolas

No Brasil, no entanto, temas como a LGBTfobia tem ganhado cada vez menos espaço nas instituições de ensino. O total de escolas públicas com projetos para combater racismo, machismo e homofobia caiu ao menor patamar em dez anos, segundo levantamento do Todos Pela Educação, divulgado em 2023. 

Com base nos dados do Sistema Nacional de Avaliação Básica (Saeb), do Ministério da Educação, a organização mostrou que, em 2011, 34,7% das escolas no país relataram ter ações voltadas para o combate ao machismo e a homofobia. Em 2017, essa porcentagem chegou a 43,7%. Em 2021, no entanto, caiu para o menor patamar, 25,5%, o que significa que três a cada quatro escolas no Brasil não têm ações voltadas para combater esse tipo de preconceito.

“O cenário nunca foi o ideal, mas o que a gente percebeu é que de 2017 até 2021 houve uma queda nesse tipo de projeto nas escolas, o que é muito preocupante. A gente deveria vir numa toada de aumentar o número de projetos, aumentar o número de escolas que estão debatendo esses assuntos, trabalhando esses assuntos com os alunos e, na verdade, a gente vem regredindo”, diz a coordenadora de Políticas Educacionais do Todos pela Educação, Daniela Mendes.

O preconceito, de acordo com ela, pode impactar no processo de ensino e aprendizagem. “Se o ambiente não respeita, dificilmente aquela criança, aquele jovem vai querer continuar na escola e isso vai fazer com que ele abandone a escola e não conclua a educação básica. Isso é um grande problema, não só para a pessoa individualmente, mas para a nossa sociedade como um todo. Afinal de contas, já existem estudos que mostram como a evasão escolar prejudica economicamente o nosso país”, diz.

No Rio de Janeiro, por exemplo, o 1º Dossiê anual do Observatório de Violências LGBTI+ em Favelas, mostrou que a população travestigênere – pessoas trans, travestis e não-binárias – é a que mais sofre com a falta de acesso a serviços públicos, como a educação.

Ao todo, 25,5% de travestigêneres abandonaram a escola antes de concluir os estudos e sequer acessou o ensino médio, enquanto entre o restante dos entrevistados, as pessoas não trans, esse índice é de 8%. “Ninguém pode ser discriminado e ter o seu direito à educação ferido a partir de preconceito, discriminação em relação à orientação sexual ou qualquer outro grupo que essa pessoa faça parte”, ressalta, Mandes.

Espaços de discussão

Maria Sofia Ferreira, 16 anos, é um exemplo de como ter espaços de discussão sobre diversidade nas escolas faz com que estudantes se sintam seguros para se dedicar aos estudos. Ela frequenta a Escola de Referência em Ensino Médio Silva Jardim, no Recife.

Até o ano passado, a escola contava com o núcleo de estudos de gênero Wilma Lessa. “Eu me interessei logo de cara, no meu primeiro ano, porque eu senti que era um lugar de acolhimento, era um lugar que eu poderia me expressar as minhas dores, principalmente sendo um adolescente LGBT”, diz. O nome do grupo de estudos homenageia a jornalista Wilma Lessa, reconhecida no estado pela defesa dos direitos das mulheres.

“Quanto mais você é excluído de um espaço, quanto mais você sofre nesse espaço, menos vai ser sua vontade de estar nesse ambiente. Então, quando a gente encontra um local acolhedor, a gente sente que ali você pode frequentar. Então, realmente, ajuda muito nos estudos, ajuda muito a você querer estar na escola, a participar de projetos, a sentir que você pode se expressar finalmente.”

Sofia está no 3º ano do ensino médio. Ela conta que na escola antiga, uma escola particular, ela não contava com nenhuma rede de apoio e eram frequentes os comentários LGBTfóbicos. “Foi um processo muito difícil pra mim, porque foi um ambiente muito homofóbico, tanto por parte da diretoria, quanto por parte dos alunos, dos estudantes mesmo”.

Quando mudou de escola, Sofia sentiu a diferença no ambiente. “Eu me vi podendo ser quem eu sou, sem me preocupar de ter que me esconder, ter que me armar contra quem quisesse me atingir. Eu encontrei ali um espaço com pessoas iguais a mim e onde, juntos, a gente consegue fazer diferença”.

Uma das coisas que aprendeu no núcleo de estudos é que quando alguém expressa algum tipo de preconceito em um ambiente escolar, não se deve se afastar dessa pessoa, mas trazê-la para perto e buscar conversar e aprender junto.

Neste ano, por conta das mudanças curriculares, com a implementação do novo ensino médio, o núcleo foi desativado. Sofia diz já sentir diferença no comportamento dos estudantes. “Um dos maiores impactos que eu vejo é a volta do preconceito”, diz.

“São jovens carregados de preconceitos e dentro da escola não se tem mais esse espaço, onde a gente vira em conjunto e fala ‘pô, mano, o que tu tá fazendo não é legal. O que tu tá fazendo tem que ser mudado’”. 

O professor Vieira também fala sabe o impacto do acolhimento entre os alunos. Por ser, ele mesmo, um homem gay, ele conta que muitos alunos se sentem à vontade e protegidos simplesmente com a presença dele. Ele diz que certa vez foi abordado por um estudante que perguntou se ele era homossexual. Ele respondeu que sim.

“E ele me disse: ‘Eu gosto de estudar nessa escola porque tem você e tinha mais dois professores gays e vocês falam muito tranquilamente sobre sexualidade e aí eu não sofro homofobia aqui na escola. Eu não sofro porque eu sei que tem quem vai intervir, quem vai, de alguma forma, proteger’. Nesse dia eu fiquei pensando muito sobre isso, sobre a importância de você ter uma referência, porque eu fui um menino gay que eu não tinha referência na escola, nem de professor, nem de estudantes gays”.

Abordagem

Gênero e sexualidade nas escolas são temas que geram polêmica no Brasil. Para a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) essas questões devem ser tratadas a partir do acolhimento da diversidade. “Alguns países do mundo, entre eles o Brasil, enfrentam alguns obstáculos para entender o que é falar sobre gênero e sexualidade na escola. A perspectiva da Unesco é de acolhimento das diversidades. Então, que pessoas LGBT, seja por orientação sexual, identidade de gênero, possam ser acolhidas e tenham direito à educação. Ou seja, tenham direito a completar a sua trajetória educacional”, diz a oficial de programa do setor de Educação da Unesco no Brasil, Mariana Braga.

Segundo levantamentos feitos pelo organismo internacional, muitas vezes estudantes sofrem preconceito por ser quem são e também por se assemelhar ao que seria um padrão LGBTQIA+.

“O fato de você se assemelhar com uma identidade LGBT provoca discriminação. E, sobretudo, população trans, elas são praticamente expulsas da escola. Não há um acolhimento da comunidade escolar e aí dos professores, da diretoria e dos próprios estudantes para que essa população permaneça na escola. Então, o que a Unesco preconiza é o direito à educação dessas populações e o direito de permanecer na escola.”

A organização elaborou o documento Orientações técnicas internacionais de educação em sexualidade: uma abordagem baseada em evidências, que traz instruções sobre como essas questões podem ser abordadas na educação a cada etapa de ensino.

“A perspectiva da Unesco é trazer conteúdos baseados no desenvolvimento de cada indivíduo. Então, trazer os conteúdos apropriados à faixa etária, apropriados àquele nível de ensino, onde a criança possa entender, ter noção do seu corpo, conhecer o outro, se prevenir da violência”, diz Mariana.

Uma das preocupações é também com a violência no ambiente digital. “A Unesco está muito preocupada com as questões de violências on-line. Então, as meninas, e aí sobretudo também meninas lésbicas e travestis, são muito violentadas em espaços digitais. Então, a escola também tem um poder, um papel muito importante de poder educar nesse sentido, educar para levar informação baseada em evidências, informações verdadeiras, para que esses estudantes se protejam, tanto no espaço físico, quanto no espaço virtual, que é um espaço de violência de gênero também cada vez maior”.

O dia 17 de maio é o Dia Internacional de Combate à Homofobia. Nesta data, em 1990, a Organização Mundial de Saúde (OMS) retirou o termo homossexualismo da lista de distúrbios mentais do Código Internacional de Doenças. Sem o sufixo “ismo”, que remete à doença, o termo passou a ser homossexualidade, que deixou de ser relacionada a qualquer patologia.

Especialistas alertam: hipertensão arterial também ocorre na infância

 Embora a hipertensão arterial seja doença de maior prevalência em adultos, afetando cerca de 30% da população brasileira, o presidente do Departamento de Cardiologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Jorge Afiune, advertiu que a pressão alta também ocorre na infância.

Segundo Afiune, por não ser prevalente em crianças, a doença, às vezes, não é rotineiramente investigada. “Isso pode trazer retardos diagnósticos em menores que tenham problemas que podem ser corrigidos ou, até mesmo, começar tratamentos para permitir que essa hipertensão seja controlada antes de se tornar mais grave no futuro”.

Para marcar o Dia Mundial da Hipertensão Arterial, comemorado nesta sexta-feira (17), a diretora médica do Pro Criança Cardíaca – projeto que cuida de portadores de doenças cardiovasculares em situação de vulnerabilidade – ,Isabela Rangel, alertou pais e profissionais de saúde sobre a importância da detecção precoce e da prevenção da hipertensão arterial em crianças e adolescentes. “É muito importante que haja a conscientização de que criança também pode ter hipertensão arterial e que o diagnóstico deve ser feito precocemente. Toda criança que vai ser avaliada pelo pediatra deve medir a pressão arterial”, afirmou Isabela. Essa conduta deve ser feita também no período neonatal.

Para ela, a medição da pressão arterial deve ser conduta rotineira nas consultas de crianças e jovens. “Muitos pacientes, às vezes, são atendidos e não é aferida a pressão arterial durante a consulta. Se você não faz essa medição, muitas vezes a criança já tem essa condição que passa desapercebida pelo profissional de saúde porque, com frequência, o paciente é assintomático”, destacou Isabela Rangel, em entrevista à Agência Brasil.

Tipos

A diretora do Pro Criança Cardíaca explicou que o diagnóstico correto de hipertensão arterial permite uma investigação para saber se a doença é primária ou secundária. Ela pode ser classificada como primária, que é multifatorial, onde há uma história familiar em geral positiva, associada a fatores ambientais, como obesidade, por exemplo, ou secundária, quando é causada por doenças identificáveis, como estenose da artéria renal ou coartação da aorta. A partir do resultado dessa investigação, poderá ser determinado o tipo de tratamento.

De acordo com Isabela, o diagnóstico precoce é fundamental e pode ser feito por meio da análise da pressão arterial em consultas pediátricas de rotina. A hipertensão arterial secundária pode atingir, inclusive, recém-nascidos e, dependendo da gravidade do problema, é preciso atuar nos primeiros dias de vida.

Estatística

Estatísticas nacionais mostram que entre 3% e 15% de crianças e adolescentes brasileiros são afetados pela hipertensão arterial, embora Jorge Afiune avalie que o número mais aproximado seria entre 3% e 5%, dependendo da fonte, da população analisada e da prevalência. O aumento do percentual para até 15%, em especial entre os adolescentes, estaria ligado aos fatores de sobrepeso e obesidade, cuja prevalência já está perto de 25% ou 30%, segundo o pediatra. “É como se a hipertensão fosse a ponta de um iceberg, que é mais complexo e tem a ver com o estilo de vida da nossa sociedade, o que está afetando cada vez mais cedo as crianças com as doenças de adulto”.

Jorge Afiune esclareceu que o modelo da doença de hipertensão do adulto está chegando mais cedo hoje, muito provavelmente pela mudança do estilo de vida da sociedade. Os fatores de risco incluem sedentarismo, sobrepeso, obesidade, excessivo tempo de tela, poucas políticas públicas voltadas ao estímulo de atividades físicas e ao esporte. Acrescentou que esses são problemas mais ligados às classes sociais média e baixa, porque a classe alta tem a possibilidade de buscar soluções para o problema.

O médico explicou que em crianças abaixo de 3 anos de idade, a medida da pressão arterial não faz parte do exame de todas, mas somente daquelas em que o pediatra tem suspeita de doença cardíaca, renal e quando se trata de prematuro. Depois dos 3 anos, a orientação da SBP é que a criança mantenha acompanhamento pediátrico anual, pelo menos, e durante a consulta a aferição seja feita. “A partir dessa aferição, podemos acender alguns alertas”.  Ele lembrou que quando uma criança está com sobrepeso e apresenta pressão alta, acende um alerta de gravidade maior para a situação. Por isso, recomendou que aferir a pressão pode ajudar o médico a detectar mais cedo uma doença e a fazer intervenção mais rápida que, geralmente, é no estilo de vida e na alimentação, antes de medicações.

Guaíba é rio ou lago? Especialistas explicam a polêmica

Um dos mais conhecidos cartões-postais do Rio Grande do Sul, o Guaíba é tema de discussão quando o assunto é a sua classificação. Alguns chamam de rio, outros de lago, mas não há consenso. O debate é antigo, mas por conta das chuvas que atingem o estado desde o fim de abril, o tema voltou à tona já que as águas do Guaíba invadiram o centro da capital Porto Alegre e obrigaram centenas de pessoas a deixarem suas casas. 

Até os anos de 1990, o Guaíba foi considerado rio. A partir daí, passou a ser definido como lago. Oficialmente, a prefeitura de Porto Alegre assumiu recentemente o Guaíba como lago. O executivo municipal criou, inclusive, o Comitê da Bacia do Lago Guaíba.

Na avaliação do professor Joel Avruch Goldenfum, diretor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFGRS), não existe consenso científico em torno da definição do Guaíba como rio ou lago, porque o corpo hídrico tem comportamento dual. “As margens se comportam bem como lago, principalmente envolvendo questões de recirculação, baixa profundidade, sendo basicamente bidimensional, ou seja, não existe direção predominante. O rio tem uma direção como se fosse uma linha. No lago, a água fica girando”, afirmou em entrevista à Agência Brasil.

De acordo com Goldenfum, no meio do Guaíba passa um canal grande, de onde vêm águas do Rio Jacuí, que drena 80 mil quilômetros quadrados, ou um terço das águas do estado. “É muita água; então, tem uma corrente importante. Por isso, pessoas argumentam que um lago pode ter um rio passando por ali. Só que, muitas vezes, o comportamento é predominante como rio e, outras vezes, pode ser predominante como um lago.”

Para o professor, em termos de modelagem, de variação de níveis, de como o Guaíba enche ou esvazia, pouco importa se vão chamá-lo de lago ou de rio. O que importa é modelar os processos. “Porque, na verdade, eu vou modelar o sistema considerando todas as influências que ele tem, considerando o que acontece quando ele sobe, onde ele recircula etc.” Goldenfum ressaltou, contudo, que existem outras questões envolvidas que são mais de questão legal e que mudam o problema.

Interpretações

De acordo com a legislação, se o Guaíba for um rio, tem que ter um recuo não edificado muito grande que, dependendo do local, pode variar de 100 a 500 metros. Ninguém tiraria o que já existe, mas não poderia edificar novas construções. Se for considerado lago, a área não edificada varia entre 10 e 30 metros, dependendo das interpretações. “Existem interpretações distintas sob o ponto de vista científico, sem se preocupar com a questão legal, e pessoas que dizem que o Guaíba se comporta predominantemente como rio, ou predominantemente como lago. “Quem chega primeiro dá o nome”, afirma o professor.

Goldenfum lembrou que o nome dos biomas aquáticos é dado pela população. “A população sempre chamou de Rrio Guaíba. De repente, houve essa movimentação, que pode ter tido motivação técnica, no sentido de que o Guaíba seria predominantemente lago, ou pode ter outras motivações”. O consenso não existe, porque o Guaíba tem comportamento dual, reafirmou o professor. Por outro lado, existe um movimento legal, capitaneado pela Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural e o Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais, para que o Guaíba tenha uma faixa de proteção permanente. Há também uma ação civil pública questionando a definição do Guaíba como lago. “Quem vai decidir isso, no final das contas, vai ser a Justiça, e não a ciência”, disse Goldenfum.

Ciência

O  coordenador-geral do Atlas Ambiental de Porto Alegre e também da UFRGS, Rualdo Menegat, disse à Agência Brasil que a polêmica geográfica em torno do Rio ou Lago Guaíba e da Lagoa ou Laguna dos Patos não se justifica. Menegat afirmou que, do ponto de vista da ciência, o correto é Lago Guaíba. “Não temos dúvida sobre isso. Mas há também o nome mais popular, que é Rio Guaíba.”

Segundo o geólogo, nos últimos 20 anos, o nome Lago Guaíba tem sido mais usado porque as pessoas foram se convencendo que ele, na verdade, funciona como um lago. “Também é importante que as pessoas se conscientizem pelo nome correto, porque aquilo que a gente joga em um lago fica ali. Aquilo que se joga no rio, as pessoas pensam que é um problema do vizinho de baixo.”

Por isso, insistiu que do ponto de vista da gestão ambiental, é importante que se usem conceitos corretos porque estes são os que os professores vão ensinar na sala de aula. O Guaíba é definido como um lago aberto que recebe água da rede fluvial, formada por quatro rios (Jacuí, dos Sinos, Caí e Gravataí) que afluem para o Lago Guaíba, que, por sua vez, também escoa essa água para a Laguna dos Patos. “Está conectado com ela.”

Atlântico

A Laguna dos Patos está conectada com o Oceano Atlântico. “Por esta razão, por estar conectada com o Atlântico, é uma laguna, e não uma lagoa. Isso se explica porque tanto escoa água para o Oceano Atlântico, como também recebe água de lá. Existe uma interconexão. A água sai, mas também a água salgada entra e saliniza as águas na região sul da laguna.”

O professor Rualdo Menegat informou que, na região costeira do Rio Grande do Sul, há um complexo sistema de lagos e lagunas, que tem quatro lagoas interconectadas: o Lago Guaíba, a Lagoa do Casamento, a Laguna dos Patos e a Lagoa Mirim. Esse sistema de vasos comunicantes é interconectado, por sua vez, com o Oceano Atlântico, por meio da Laguna dos Patos.

“Isso quer dizer que as lagoas estão no nível do mar. Isso é importante porque, na medida em que o nível do mar sobe, impede a saída de água da laguna. Já, na medida em que o nível do mar desce, permite a saída de águas da laguna e, por conseguinte, de todo o sistema interconectado, que nós chamamos mar de dentro, pela sua grandeza”.

Este é o maior sistema do tipo na América do Sul e um dos maiores do mundo, destaca Menegat.

Confirmação

O professor Jaime Federici Gomes, do curso engenharia civil da Escola Politécnica da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, explicou que laguna é um espaço que está em contato com o mar. Daí, Laguna dos Patos. Lagoa é uma coisa isolada, de água doce. “Já laguna, não, tem contato direto com o mar”, enfatizou, em entrevista à Agência Brasil.

Ao definir o que é um lago, Gomes disse que é quando este tem características que não são totalmente unidimensionais. “Eu prefiro falar Lago Guaíba. Ele tem uma zona central, que parece um rio, mas dos lados, no corpo dele, apresenta escoamento bidimensional, com áreas de recirculação do fluxo e zonas mais paradas.”

Segundo o professor, Rio Guaíba não é uma concepção adequada, porque ele tem mais características de lago do que de rio, com escoamento que tem circulação, acumulação e retenção de água.

Guaíba é rio ou lago? Especialistas explicam a polêmica

Não existe consenso científico em torno da definição do Guaíba como rio ou lago, porque este tem comportamento dual, afirmou nesta quinta-feira (16) à Agência Brasil o professor Joel Avruch Goldenfum, diretor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFGRS). “As margens se comportam bem como lago, principalmente envolvendo questões de recirculação, baixa profundidade, sendo basicamente bidimensional, ou seja, não existe direção predominante. O rio tem uma direção como se fosse uma linha. No lago, a água fica girando.”

De acordo com Goldenfum, no meio do Guaíba passa um canal grande, de onde vêm águas do Rio Jacuí, que drena 80 mil quilômetros quadrados, ou um terço das águas do estado. “É muita água; então, tem uma corrente importante. Por isso, pessoas argumentam que um lago pode ter um rio passando por ali. Só que, muitas vezes, o comportamento é predominante como rio e, outras vezes, pode ser predominante como um lago.”

Para o professor, em termos de modelagem, de variação de níveis, de como o Guaíba enche ou esvazia, pouco importa se vão chamá-lo de lago ou de rio. O que importa é modelar os processos. “Porque, na verdade, eu vou modelar o sistema considerando todas as influências que ele tem, considerando o que acontece quando ele sobe, onde ele recircula etc.” Goldenfum ressaltou, contudo, que existem outras questões envolvidas que são mais de questão legal e que mudam o problema.

Interpretações

De acordo com a legislação, se o Guaíba for um rio, tem que ter um recuo não edificado muito grande que, dependendo do local, pode variar de 100 a 500 metros. Ninguém tiraria o que já existe, mas não poderia edificar novas construções. Se for considerado lago, a área não edificada varia entre 10 e 30 metros, dependendo das interpretações. “Existem interpretações distintas sob o ponto de vista científico, sem se preocupar com a questão legal, e pessoas que dizem que o Guaíba se comporta predominantemente como rio, ou predominantemente como lago. “Quem chega primeiro dá o nome”, afirma o professor.

Goldenfum lembrou que o nome dos biomas aquáticos é dado pela população. “A população sempre chamou de Rrio Guaíba. De repente, houve essa movimentação, que pode ter tido motivação técnica, no sentido de que o Guaíba seria predominantemente lago, ou pode ter outras motivações”. O consenso não existe, porque o Guaíba tem comportamento dual,  reafirmou o professor.

Por outro lado, existe um movimento legal, capitaneado pela Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural e o Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais, para que o Guaíba tenha uma faixa de proteção permanente. Há também uma ação civil pública questionando a definição do Guaíba como lago. “Quem vai decidir isso, no final das contas, vai ser a Justiça, e não a ciência”, disse Goldenfum.

Até os anos de 1990, o Guaíba foi considerado rio. A partir daí, passou a ser definido como lago. Oficialmente, a prefeitura de Porto Alegre assumiu recentemente o Guaíba como lago. Inclusive, existe o Comitê da Bacia do Lago Guaíba.

Ciência

O  coordenador-geral do Atlas Ambiental de Porto Alegre e também da UFRGS, Rualdo Menegat, disse à Agência Brasil que a polêmica geográfica em torno do Rio ou Lago Guaíba e da Lagoa ou Laguna dos Patos não se justifica. Menegat afirmou que, do ponto de vista da ciência, o correto é Lago Guaíba. “Não temos dúvida sobre isso. Mas há também o nome mais popular, que é Rio Guaíba.”

Segundo o geólogo, nos últimos 20 anos, o nome Lago Guaíba tem sido mais usado porque as pessoas foram se convencendo que ele, na verdade, funciona como um lago. “Também é importante que as pessoas se conscientizem pelo nome correto, porque aquilo que a gente joga em um lago fica ali. Aquilo que se joga no rio, as pessoas pensam que é um problema do vizinho de baixo.”

Por isso, insistiu que do ponto de vista da gestão ambiental, é importante que se usem conceitos corretos porque estes são os que os professores vão ensinar na sala de aula. O Guaíba é definido como um lago aberto que recebe água da rede fluvial, formada por quatro rios (Jacuí, dos Sinos, Caí e Gravataí) que afluem para o Lago Guaíba, que, por sua vez, também escoa essa água para a Laguna dos Patos. “Está conectado com ela.”

Atlântico

A Laguna dos Patos está conectada com o Oceano Atlântico. “Por esta razão, por estar conectada com o Atlântico, é uma laguna, e não uma lagoa. Isso se explica porque tanto escoa água para o Oceano Atlântico, como também recebe água de lá. Existe uma interconexão. A água sai, mas também a água salgada entra e saliniza as águas na região sul da laguna.”

O professor Rualdo Menegat informou que, na região costeira do Rio Grande do Sul, há um complexo sistema de lagos e lagunas, que tem quatro lagoas interconectadas: o Lago Guaíba, a Lagoa do Casamento, a Laguna dos Patos e a Lagoa Mirim. Esse sistema de vasos comunicantes é interconectado, por sua vez, com o Oceano Atlântico, por meio da Laguna dos Patos.

“Isso quer dizer que as lagoas estão no nível do mar. Isso é importante porque, na medida em que o nível do mar sobe, impede a saída de água da laguna. Já, na medida em que o nível do mar desce, permite a saída de águas da laguna e, por conseguinte, de todo o sistema interconectado, que nós chamamos mar de dentro, pela sua grandeza”.

Este é o maior sistema do tipo na América do Sul e um dos maiores do mundo, destaca Menegat.

Confirmação

O professor Jaime Federici Gomes, do curso engenharia civil da Escola Politécnica da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, explicou que laguna é um espaço que está em contato com o mar. Daí, Laguna dos Patos. Lagoa é uma coisa isolada, de água doce. “Já laguna, não, tem contato direto com o mar”, enfatizou, em entrevista à Agência Brasil.

Ao definir o que é um lago, Gomes disse que é quando este tem características que não são totalmente unidimensionais. “Eu prefiro falar Lago Guaíba. Ele tem uma zona central, que parece um rio, mas dos lados, no corpo dele, apresenta escoamento bidimensional, com áreas de recirculação do fluxo e zonas mais paradas.”

Segundo o professor, Rio Guaíba não é uma concepção adequada, porque ele tem mais características de lago do que de rio, com escoamento que tem circulação, acumulação e retenção de água.

Especialistas em Angola olham com cautela para programa de mais de 100 milhões de dólares para apoiar agricultura

16 de maio de 2024

 

O Governo de Angola em Conselho de Ministros, aprovou em 14 de maio, o denominado Programa de Aceleração da Agricultura Familiar e Reforço da Segurança Alimentar 2023-2026, avaliado em mais de 85 mil milhões de kwanzas (pouco mais de 100 milhões de dólares).

O programa, segundo o governo, terá cobertura do Plano Estratégico do Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Agrário (FADA), definido para o período 2023-2026, e está direccionado para os agricultores individuais, cooperativas, associações agrícolas, micro e pequenas empresas.

O Governo justificou a medida com o facto de “a agricultura familiar desempenhar um papel fundamental no fomento da diversificação da produção agrícola nacional e no reforço da segurança alimentar, sendo responsáveis por mais de 82% dos produtos alimentares que compõem a cesta básica”.

Analista e especialistas manifestam, entretanto, cautela quanto à efectivação do programa, por não ser o primeiro do género a ser aprovado pelo Governo com o mesmo fim.

O engenheiro agrónomo, Fernando Pacheco, alertou para a necessidade de se terem alguns cuidados, afirmando não ser o primeiro programa que o Governo aprova cujo alcance e resultados nunca são devidamente avaliados e publicados.

“Não se sabe quanto e como esse dinheiro foi gasto. Acredito que o valor gasto foi muito inferior `aquele que foi aprovado”, disse o engenheiro Pacheco.

Carlos Cambuta, líder da Acção para o Desenvolvimento Rural e Ambiente (ADRA), também afirma ser necessário que o Governo diga em que medida é que este pacote de financiamento será implementado, para não seguir o destino que tiveram os anteriores.

“Injectar apenas recursos finaceiros não é suficiente apara alcançar o aumento da produção agrícola”, defende o especialista, que afirma ser importante a assistência técnica aos camponeses e agricultores e a tomada de medidas para mitigar as alterações climáticas.

Por sua vez, o economista, Américo Vaz, considera necessária “a formação de técnicos agrários para garantir assistência técnica ao sector assim como a aposta na criação de cooperativas agrícolas”.

Na sua página do Facebook, o Presidente João Lourenço considerou “incontornável” a aposta na produção agrícola. “Um país com solos e rios em abundância deve superar as suas insuficiências alimentares”, precisou.

“É neste sentido que aprovamos ontem o programa de aceleração da agricultura familiar e reforço da segurança alimentar, avaliado em 85 mil milhões de kwanzas, visando a mecanização da agricultura familiar, de cooperativas e associações”, concluiu.

A presidente do Conselho de Administração (PCA) do Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Agrário (FADA), Felisbela Francisco, disse, na ocasião, que o programa tem como objectivos o fortalecimento da aceleração e a diversificação da produção agrícola, com ênfase na mecanização da agricultura familiar e no reforço da capacidade técnica dos agricultores.

É igualmente propósito do programa massificar os financiamentos de uma forma simples, descentralizada e desburocratizada, elevar o rendimento das famílias e contribuir para a criação de emprego, bem como melhorar a segurança alimentar e o alcance da auto-suficiência alimentar.

Para atingir esses objectivos, Francisco disse terem sido definidas algumas medidas, com destaque para a criação de um cadastro único do agricultor familiar, que permitirá o controlo dos agricultores que beneficiam dos apoios do Estado e dos seus parceiros, para evitar a duplicação e que sejam as mesmas pessoas beneficiadas.

O plano visa, igualmente, dinamizar os financiamentos ao setor, recorrendo às linhas de financiamento do Plano Estratégico do FADA, assim como dar continuidade ao processo de financiamento da mecanização da agricultura familiar, cuja primeira fase foi encerrada recentemente.

Felisbela Francisco informou que está em curso a segunda fase, que teve início com o processo de cadastramento de fornecedores de equipamentos, com previsão de financiar mais de três mil equipamentos, entre moto-cultivadoras e tractores.

Até ao final do programa, a previsão é financiar mais de 1.119 cooperativas com caixas comunitárias.

Segundo o Governo, pretende-se, também, criar um pacote tecnológico, no sentido de combinar equipamentos e insumos, onde será disponibilizado um fundo de maneio para os agricultores adquirirem sementes, fertilizantes, e outros produtos.

Será também implementada a figura do agente FADA, que actuará como agente bancário em representação deste fundo a nível das comunidades, e funcionará como um mecanismo de descentralização dos financiamentos do FADA, cuja previsão é de 54 integrantes.

Estabelecer acordos com pelo menos 54 empresas com experiência a nível da actividade agrícola, para que sirvam de âncoras e possam ajudar os agricultores com assistência técnica e garantia da compra da produção, é outro dos objectivos do programa.

Economicamente, o programa visa alcançar cerca de 196.332 hectares de terras cultivadas. A nível de produção, a pretensão é colher cerca de três milhões 557 mil toneladas de produtos diversos, enquanto que, na área social, prevê-se manter os empregos existentes e criar outras oportunidades de emprego, beneficiando mais de 660 famílias.

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Especialistas apontam vulnerabilidade de áreas costeiras a inundações

As regiões costeiras do Brasil são mais vulneráveis a inundações e deslizamentos, diz o especialista especialista em recursos hídricos Osvaldo Rezende, que é professor da Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Segundo Rezende, de forma geral, a região costeira tem uma propensão muito grande a sofrer inundação, desde Macapá, capital do Amapá, até Pelotas, no Rio Grande do Sul.

“Toda a região costeira do Brasil tem uma propensão natural a ter esses alagamentos. São regiões muito planas, o que dificulta o escoamento da água com bacias hidrográficas que drenam rapidamente água para essa região, e logo na frente tem o mar. Então, o mar é um agente que dificulta o escoamento, principalmente nos momentos de maré alta. Recife e Rio de Janeiro são notórios para esse tipo de alagamento, porque são regiões muito baixas e estão muito próximas do nível do mar”, disse o especialista.

O coordenador geral de Operações e Modelagem do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), Marcelo Seluchi, destaca que deslizamentos de terra preocupam muito em toda a região litorânea ao longo do Brasil por haver concentração de população, topografia em declive e chuvas abundantes. “As regiões litorâneas têm alta vulnerabilidade para deslizamentos de terra.”

“De forma geral, todas as regiões metropolitanas no Brasil têm uma propensão muito alta a sofrer inundação. Se a gente pegar o deslizamento, tem uma região muito propensa, com alto risco, que é a região da Serra do Mar, que pega desde o Espírito Santo, todo o Rio de Janeiro, uma grande parte de Minas Gerais e São Paulo. São áreas que, em todo verão, ocorrem muitos casos de deslizamento”, afirmou Rezende.

Ele explicou que, particularmente, no caso de inundação, o problema torna-se mais acentuado quando se aumenta a urbanização. “[Aí], a gente também intensifica o próprio perigo. Quando tem mais áreas urbanas, menos florestas para reter a água, menos solo permeável, toda essa água escoa mais rápido. Então, tem um perigo maior”, acrescentou o pesquisador.

Marcelo Seluchi destacou que, nas regiões amazônicas, as inundações são muito espalhadas e podem durar meses por serem áreas muito planas. “As bacias dos rios São Francisco, Tocantins, Paraná e Paraguai, são bacias que demoram alguns dias de cheia. Temos microbacias, nas regiões serranas especialmente, por exemplo, a bacia do Rio Quitandinha, em Petrópolis, que transborda em 15 minutos se tem uma chuva muito intensa.”

O coordenador do Cemaden lembra que apenas o Centro-Oeste e parte da Região Norte não sofrem com deslizamentos por terem áreas pouco habitadas e planas.

Extremo climático ou falha humana? Especialistas analisam inundações

Em cenários de crise, é comum a busca por causas e responsabilidades. A tragédia das chuvas no Rio Grande do Sul, que provocaram a morte de quase 150 pessoas até agora, têm levantado diferentes reflexões. Trata-se de um evento natural excepcional, impossível de prever e evitar? Ou há um grau considerável de responsabilidade humana pela forma de ocupação do território, desenvolvimento urbano e uso do solo?

A Agência Brasil conversou com especialistas em recursos hídricos, que pesquisam áreas como geologia, agronomia, engenharia civil e ambiental. Há consenso de que se trata de um evento extremo, sem precedentes, potencializado pelas mudanças climáticas no planeta. Mas quando o assunto é o papel desempenhado pelas atividades econômicas e a ocupação do território, surgem as discordâncias.

Ocupação e desenvolvimento urbano

O geólogo Rualdo Menegat, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), é crítico em relação às políticas de planejamento urbano e econômico no estado. O caso de Porto Alegre, para ele, é o mais emblemático de que há uma desorganização generalizada do território, causado por um conjunto de atividades econômicas. Por isso, defende que não se pode falar apenas em grande precipitação como causadora da tragédia, mas também de problemas graves de gestão que a potencializaram.

“Os planos diretores da cidade foram desestruturados para facilitar a especulação imobiliária. No caso de Porto Alegre, por exemplo, toda a área central que hoje está inundada no porto, foi oferecida para ser privatizada e ocupada por espigões. Houve um sucateamento do nosso sistema de proteção, como se nunca mais fosse haver inundações”, diz Rualdo.

O desmatamento de vegetação nativa para fins imobiliários também é considerado fator que dificulta o escoamento de água da chuva.

“Há uma ocupação intensiva do solo. Em Porto Alegre, em especial na margem do Guaíba, na zona sul, ainda temos um ecossistema mais perto do que foi no passado, com estrutura de zonas de banhado, matas e morros. Mas essas áreas estão sob pressão da especulação imobiliária. E por causa das políticas de uso intensivo do solo urbano, essas áreas estão sendo expostas, em detrimento da conservação dos últimos estoques ambientais, que ajudam a regular as vazões da água”, analisa Rualdo.

O professor de recursos hídricos da Coppe/UFRJ, Paulo Canedo, pondera que ainda é preciso analisar a situação com mais calma. Mas reforça que o desenvolvimento econômico e social, quando não acompanhado de medidas estruturais e preventivas, facilita inundações.

“Nós temos a convicção de que a chuva foi realmente extraordinária. Mas é claro que o progresso da região trouxe dificuldades de escoamento. Isso é a contrapartida do progresso. Criam-se as cidades, as atividades econômicas, novas moradias. Mas tem o ônus de impermeabilizar o solo e gerar mais vazão para a chuva”, avalia Paulo Canedo. “Muitas atividades econômicas podem ter sido desenvolvidas de forma não sustentável. Não criaram condições para lidar com esse aumento de impermeabilização. Isso é algo que devemos ter em mente quando formos reconstruir o Rio Grande do Sul”.

Agricultura

Outro ponto em discussão é se o investimento em determinadas atividades agrícolas, com consequentes alterações da vegetação nativa, ajudaram a fragilizar os solos e o processo de escoamento da água. Para o geólogo Rualdo Menegat, esse foi um dos elementos que aumentou o impacto das chuvas no estado.

“Grande parte do planalto meridional tem sido intensamente ocupada pelas plantações de soja no limite dos arroios, destruindo a mata auxiliar e os bosques. E também os banhados, que acumulam água e ajudam que ela não ganhe velocidade. O escoamento de água passa a ser muito mais violento e em maior quantidade, porque não há tempo para infiltração”, diz Rualdo.

O agrônomo Fernando Setembrino Meirelles discorda do peso dado à agricultura nas inundações recentes. Ele é professor de recursos hídricos na UFRGS e foi diretor do Departamento de Recursos Hídricos do Rio Grande do Sul entre 2015 e 2019. Meirelles defende que as atividades agrícolas não foram um fator de importância para a tragédia, que deve ser explicada pela magnitude das chuvas.

“Tivemos muitos deslizamentos em áreas de matas, que já estavam consolidadas. Na região mais alta e preservada do estado, temos milhares de cicatrizes de escorregamento. O solo derreteu, simplesmente perdeu capacidade de suporte por causa da chuva muito intensa. Na região do Vale do Taquari, a gente vê pilhas de árvores que foram arrancadas. Então, a relação da agricultura com esse evento é zero. Ela não é o motor dessa cheia”, diz Fernando Meirelles.

Doutor em recursos hídricos, o engenheiro civil e professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC-RS), Jaime Federici Gomes, entende que, apesar do papel importante que a vegetação desempenha no escoamento de água, não acredita que as intervenções agrícolas tenham tido influência nas inundações.

“Os tipos de vegetação que estão no solo têm influência em uma das fases do ciclo hidrológico, que é a interceptação de água pelas raízes. Grandes plantas são um reservatório e jogam parte dessa água para atmosfera. As copas das árvores também podem interceptar a água antes de ela chegar ao solo. Mas dada a magnitude das chuvas, eu não sei como regiões mais florestadas poderiam ter diminuído o volume de escoamento. Em um evento desse, com muita água, pode não ter tido quase influência”, diz Jaime.

Sistemas de contenção

Depois de um histórico de enchentes no século 20, a cidade de Porto Alegre desenvolveu uma série de recursos estruturais para impedir enchentes. Nesse ponto, não há divergências: ficou claro que o sistema de contenção de águas apresentou falhas agora.

“Os sistemas de proteção foram projetados na década de 1970, por causa das cheias de 1941 e de 1967. Ele foi o mais economicamente viável. Tecnicamente é bastante adequado e eficiente. Em Porto Alegre, tem também vários diques compatíveis com a cheia de 1941. Mas, desta vez, na hora de fechar as comportas, quando a água ficou acima de quatro metros, elas começaram a vazar, tiveram problemas de vedação e acabaram abrindo. E as casas de bombas, que drenam as águas dentro da cidade, devem ter falhado”, analisa o engenheiro Jaime Federici.

“Os sistemas de proteção falharam aqui em Porto Alegre por falta de manutenção. Ele não foi superado pela água, já que ela entrou por baixo. Agora em outros sistemas, como os das cidades de São Leopoldo e de Canoas, houve uma passagem da água por cima deles. Ou seja, os critérios de projeto que foram utilizados considerando o passado, agora não têm mais validade. Eventos estão mostrando que, por causa das mudanças climáticas, devemos considerar outras métricas e estatísticas”, complementa o professor Fernando Meirelles.

Para Rualdo Menegat, a negligência política ajudou a enfraquecer a capacidade estrutural do estado de lidar com fenômenos climáticos mais intensos.

“Nas cidades e nos campos, a infraestrutura de energia elétrica, de água e de proteção contra as inundações estão sendo sucateadas nos últimos três governos estaduais. A companhia de energia elétrica e de abastecimento de água foram privatizadas. A Secretaria de Meio Ambiente foi incorporada a outra e assumiu papel secundário. O estado não desenvolveu capacidade de inteligência estratégica para diminuir os riscos e nos tornamos mais vulneráveis”, diz Rualdo.

Conhecimento e prevenção

Quando se fala em prevenção e redução de danos, os especialistas entendem que é possível ao menos minimizar as consequências dos fenômenos climáticos com treinamento adequado de profissionais e da população.

“Não temos uma Defesa Civil eficiente. O que vimos foi que ela está desestruturada, com dificuldades, mal aparelhada, sucateada. E sem mecanismos de alerta. Além disso, temos uma população que, por não haver programas estratégicos para ela, tem problemas de acesso às informações de prevenção”, diz Rualdo.

“As defesas civis de alguns municípios, principalmente desses que foram afetados, têm uma ou duas pessoas. Poucos têm uma Defesa Civil consolidada. E a população precisa de treinamento para saber se defender”, diz Jaime Federici. “Mas, economicamente, não vejo soluções definitivas para esse tipo de evento. Vamos imaginar o exemplo do Japão, que lida com furacões, terremotos e maremotos, e tem toda uma estrutura para conviver com esses eventos extremos. Isso é algo que temos que começar a estabelecer na cultura. Precisamos aprender a nos defender, lidar com essas situações e, aos poucos, fazer as adaptações estruturais”.

Em apenas um ano, Rio Grande do Sul enfrentou dez episódios de chuvas extremas, analisa especialista em recursos hídricos da Unesp

9 de maio de 2024

 

Nesta terça-feira, 7 de maio, a Defesa Civil do Rio Grande do Sul atualizou para 95 o número de mortes em razão dos temporais que atingem o estado. O boletim também aponta que há outros 4 óbitos sendo investigados. O estado registra 131 desaparecidos e 362 feridos. Cerca de 204 mil pessoas estão fora de casa. Desse total, são 48,2 mil em abrigos e 156 mil desalojados (pessoas que estão nas casas de familiares ou amigos). Dos seus 497 municípios, o RS tem hoje 401 com algum relato de problema associado ao temporal, com mais de 1,4 milhão de pessoas afetadas.

O prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo (MDB), recomendou que moradores dos bairros Cidade Baixa e Menino Deus deixem a região. O aviso foi feito na tarde da segunda-feira (6), após a água começar a subir novamente no local. A Arena do Grêmio, em Porto Alegre, afirmou que não tem mais estrutura para acolher desabrigados. Além do gramado alagado, a administração afirma que está sem água e luz e, por isso, faz o translado de mais de 300 pessoas a abrigos municipais. Em meio ao caos que tomou conta da região, inúmeros moradores têm fugido às pressas para o litoral em busca de água

Segundo a nova atualização, são 451 mil pontos sem luz no estado. Na área da CEEE Equatorial, são 206 mil imóveis sem energia. A RGE Sul tem 245 mil imóveis afetados. De acordo com os institutos meteorológicos, a previsão de chuva persiste durante a semana em áreas já atingidas por temporais e volta a deixar o estado em alerta.

A Corsan (Companhia Riograndense de Saneamento) totaliza 649 mil clientes sem abastecimento de água no estado. Em Porto Alegre, o Departamento Municipal de Água e Esgoto (DMAE) informou que religou a Estação de Tratamento de Água (ETA) São João na manhã desta terça (7). Trinta e cinco bairros da Zona Norte são abastecidos. Outras quatro estações estão fora de operação.

A operadora Tim afirma que há 20 municípios sem serviços de telefonia e internet. A cobertura da Vivo está prejudicada em 172 cidades. Na Claro, são 19 municípios sem sinal. As operadoras liberaram pacotes de internet grátis para clientes no Rio Grande do Sul para permitir que a comunicação seja mantida em meio aos temporais que atingem o estado desde 29 de abril.

O governo do RS afirmou que 790 escolas de 216 municípios foram afetadas: 388 sofreram danos e 52 servem de abrigo. Também foram registrados problemas de transporte e de acesso, e estima-se que 273 mil estudantes foram impactados. As regiões de Porto Alegre, São Leopoldo, Estrela, Guaíba, Cachoeira do Sul e Canoas não têm previsão de retomada das aulas.

O governo decretou estado de calamidade, situação que foi reconhecida pelo governo federal. Dessa forma, o estado fica apto a solicitar recursos federais para ações de defesa civil, como assistência humanitária, reconstrução de infraestruturas e restabelecimento de serviços essenciais. A Defesa Civil colocou a maior parte das bacias hidrográficas do estado com risco de elevação das águas acima da cota de inundação.

Rodrigo Lilla Manzione, professor e especialista em gestão de recursos hídricos da Unesp em Ourinhos, faz um panorama do estado de devastação que o Rio Grande do Sul enfrenta, e aponta aspectos geográficos, climáticos e administrativos que geram desastres dessa magnitude.

Dez eventos extremos em um ano

Manzione relata que o Rio Grande do Sul, especificamente, sofreu dez eventos de chuvas extremas apenas no último ano, entre junho de 23 e maio de 24, sendo um em junho, um em julho, dois em setembro, um em outubro, dois em novembro, um em janeiro e outro agora em abril / maio. Porém, as centenas de municípios afetados na última semana equivalem a três vezes o montante impactado pelo evento ocorrido em setembro, que já foi catastrófico.

“Existem cidades que estão passando pela quarta vez consecutiva por eventos como esse, de chuvas extremas e consequentes alagamentos. Os eventos que eu citei primeiro ocorreram em regiões específicas, alguns mais concentrados. Mas, o que chama atenção nesse evento que está ocorrendo agora é a dimensão. Ele se espalhou por vários municípios. Já são, infelizmente, quase 100 óbitos segundo números oficiais, e muitos desaparecidos. Esses óbitos são por diferentes razões: soterramento, afogamento, choque elétrico. É realmente uma barbaridade o que está acontecendo no RS. Sem contar as 12 barragens sob pressão, duas em estado de emergência, cinco em estado de alerta e cinco em atenção. Uma delas, a Barragem 14 de Julho, rompeu parcialmente, e houve necessidade de evacuar dez municípios.”

De acordo com o pesquisador da Unesp, a calamidade ocorre porque a região possui muitos rios meandrantes e também muitos rios de serra. Essas características acabam dando uma velocidade para essas águas maior do que rios de planície. E quando eles encontram a planície, ali próximo da Baía dos Patos, na região de Porto Alegre, a água para, pois os rios de planície tem uma vazão menor. E quando a água para, a tendência é que ela se espalhe.

“Vários municípios do Rio Grande do Sul acabaram sendo criados nas curvas desses rios. Com as barragens e as benfeitorias ao longo do tempo, foi passada uma falsa sensação de segurança para a população. E esses municípios foram aumentando sem que medidas próprias e adequadas para a contenção das cheias fossem feitas. E nesse evento específico vemos um daqueles cenários em que vários componentes se unem para aumentar sua potência”, explica.

“Nesse caso, esse centro de alta pressão que se formou no centro do Brasil acabou criando o bloqueio atmosférico. A gente aqui no Estado de São Paulo sentiu essa onda de calor nos últimos dias, e continua sentindo. E esse calor bloqueou a passagem das frentes frias. Então, a frente fria avança da Antártica, chega à Argentina. E quando chega ali, na região do Rio Grande do Sul, ela encontra a massa de ar quente. Nesse sentido, a chuva não só acontece como ela para e fica persistente por vários dias. Então, isso tem acontecido. É por isso que há previsão de novas chuvas para os próximos dias, começando provavelmente a partir desta quarta feira. Não há trégua. Vários municípios isolados, várias pessoas passando por resgates cinematográficos, cenas muito tristes”, diz.

O pesquisador compara os acontecimentos no estado gaúcho à destruição ocasionada pelo furacão Katrina nos EUA, em Nova Orleans, em 2005. “Só que o Katrina teve em torno de 2000 óbitos oficiais e foi concentrado numa região. Esse evento no Rio Grande do Sul, embora não tenha causado tantas vítimas fatais, acabou destruindo a infraestrutura do Estado. Devido ao imenso impacto gerado na economia, agricultura e indústria, as cidades vão demorar para serem reconstruídas, e o custo será muito alto”, diz.

Falsa sensação de segurança

Até a última semana, a maior enchente registrada em Porto Alegre ocorreu entre os meses de abril e maio de 1941. De acordo com registros da época, a cidade enfrentou 24 dias de chuvas ininterruptas. Na ocasião, segundo as publicações, o nível do lago Guaíba elevou-se entre 4,75 e 4,76 metros.

No atual episódio, a situação é mais grave. Em 4 de maio, o nível do Guaíba subiu 5 metros pela primeira vez na história, tendo alcançado 5,3 metros no dia seguinte. Registros levantados pelo museu Joaquim Felizardo, apontam que, em 1941, cerca de 70 mil pessoas ficaram desabrigadas. Isso equivalia a cerca de um quarto da população da época. Um terço dos estabelecimentos comerciais ficaram embaixo d’água por cerca de 40 dias.

“A gente tem cheias históricas registradas naquela região, principalmente a registrada em 1941. Só que, desde então, essas barragens conseguiram, bem ou mal, controlar essa vazão, e também o sistema de comportas. Inclusive na região metropolitana de Porto Alegre, que contribui em toda a defesa do município contra as cheias. Mas quando se soma um El Niño poderoso, como esse que se apresentava, o qual também faz parte do cenário crescente de aquecimento global, esses efeitos acabam sendo potencializados. Eles acabam causando mais estragos do que causavam anteriormente”, diz.

Ele pondera que a comparação com a cheia histórica de 1941 é inevitável, pois também ocorreu entre abril e maio e colocou a cidade debaixo d’água. “Só que agora a situação é outra. Atualmente, a cidade é muito maior, tem muito mais gente e o nível de prejuízo econômico tende a ser muito maior. Vai custar muito mais para o RS colocar a casa em ordem, vamos dizer assim. Então, essas regiões precisam realmente de planos eficazes e estratégias para lidar com esses efeitos climáticos extremos. É fundamental pensarmos nas adequações das cidades em relação aos impactos das mudanças climáticas, isso tende a ocorrer com mais frequencia”.

Ainda de acordo com o especialista em recursos hídricos da Unesp, a atual catástrofe é reflexo de um descaso antigo, ausência de medidas políticas, onde gestores de diferentes esferas administrativas deixam as comunidades habitar determinadas regiões de áreas de riscos, o que aumenta a vulnerabilidade das populações e não aplicam verba para a infra estrutura necessária das cidades. Não são problemas que se pode resolver da noite para o dia: é preciso investimento em planos de emergência e de evacuação. Muitos deles já estão sendo discutidos, ideias estão surgindo, mas durante a crise é difícil achar uma solução.

Sistema político não favorece grandes obras necessárias

“Não existe bala de prata nesse tipo de evento. É necessário adotar várias combinações de ações, de medidas estruturais para enfrentar uma catástrofe como essa. É praticamente impossível você se precaver contra algo assim. Porém, uma vez que ocorre, você precisa oferecer soluções rápidas. Falta investimento em projetos que consigam contornar essas situações. Isso também é um dos problemas do nosso atual sistema político, o orçamento. Ele tem sido pulverizado em emendas parlamentares. Então, não sobra dinheiro para grandes obras. Por mais que o pessoal faça planos de aceleração do crescimento, etc. ainda há essa situação de os deputados pegarem as suas emendas parlamentares e dividirem o orçamento. Não sobra muita margem para os próprios governos estaduais receberem dinheiro do governo federal e tocarem essas obras para frente.”

Manzione ressalta a necessidade de um debate lúcido entre parlamentares e sociedade, inclusive com os negacionistas, que se recusam, por razões ideológicas, a aceitar a mudança climática. “Eles têm que perceber que haverá mais de 1 milhão de pessoas diretamente afetadas. Elas vão procurar votar em pessoas que se preocupem com essas causas. Os políticos precisam fazer sua parte e começar a aceitar que o Brasil precisa de investimentos pesados nessa área de contenção de riscos e desastres. Nós temos uma população imensa habitando as costas do país e áreas de riscos. A questão não é se vai acontecer, nem quando vai acontecer, é onde vai acontecer? A situação está ficando cada vez mais preocupante”, diz.

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Brasil: pulverização de lavouras vai ganhar aeronave especializada

29 de abril de 2024

 

O pedido de um produtor de café no centro-sul de Minas Gerais foi a motivação para pesquisadores de uma empresa que desenvolve aeronaves para o agronegócio criarem uma aeronave de decolagem e aterrissagem vertical (VTOL, da sigla em inglês de vertical take-off and landing) para esse segmento agrícola. A demanda do cafeicultor, que via os frutos crescerem em encostas e buscava mais produtividade na pulverização das lavouras, animou os pesquisadores da empresa a encontrar uma solução para esse problema.

Segundo Marcus Prianti, cofundador da empresa Dallas Autonomus, startup apoiada pelo PIPE-FAPESP, o produtor de café relatava que tinha de pulverizar a plantação antes do nascer do sol, para garantir melhor aproveitamento e evitar o impacto direto dos raios solares. A complexidade da topografia da região também dificulta o emprego eficiente de ferramentas de pulverização comuns na agricultura, como o pulverizador autopropelido. “O terreno é muito íngreme e, às vezes, o trator não consegue fazer o trabalho”, afirma Prianti.

A aviação agrícola, por sua vez, não é adequada para áreas de topografia complexa. Sobram, então, os drones. “Eles fazem o trabalho, mas têm limitações de capacidade de carga e autonomia de bateria”, pondera Prianti. “Se o dispositivo carrega 40 ou 50 quilos de carga, por exemplo, a bateria pode acabar antes de concluir a dispersão. Dessa forma, em áreas extensas e complexas, é inviável fazer um trabalho contínuo com eles”, avalia.

Com base nessas constatações, Prianti e seu sócio, Paulo Pinheiro — piloto privado de avião e piloto comercial de helicóptero, respectivamente — desenvolveram um helicóptero autônomo para a tarefa. Com comprimento de quase 6 metros (maior que uma caminhonete de porte grande) e barra de pulverização de 5 metros, o veículo deve conseguir cobertura superior a cada passagem. A expectativa é que ele leve pelo menos 100 quilos de carga e voe por mais de uma hora com peso máximo.

Prianti destaca que o equipamento em desenvolvimento é bastante robusto. “Preciso levar essa aeronave para a fazenda e tenho de garantir que ela não seja frágil”, aponta. “O fazendeiro está acostumado com máquinas e ferramentas robustas e resistentes. Queremos oferecer a ele o trator do ar”, compara.

Componentes de aviação profissional

Segundo Prianti, os sistemas eletrônicos escolhidos para a aeronave são importados. Com certificação aeronáutica, eles são de uso profissional em veículos aéreos não tripulados (VANTs) de grande porte. A propulsão a combustão escolhida é adequada para aviação experimental e pode utilizar etanol ou gasolina comum – o que facilita a logística e a operação em locais remotos e áreas isoladas. Sem contar que o motor a combustão é mais familiar para o produtor: basta colocar gasolina para fazê-lo trabalhar.

Além disso, tem alimentação elétrica por meio de alternador e baterias de polímero de lítio de alta capacidade e autonomia — esses componentes são dedicados à eletrônica embarcada do equipamento.

Na avaliação de Prianti, a opção por sistemas profissionais já certificados vai tornar a homologação mais ágil na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). “Aplicamos tecnologias já maduras de comunicação e navegação em um equipamento que nós mesmos projetamos. Isso melhora a confiabilidade e a segurança de voo”, explica.

A empresa está instalada na região de São José dos Campos e tem colaboração, por exemplo, com o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA). Atualmente, a aeronave está entre a prova de conceito e o produto mínimo viável (MVP). A previsão é que o equipamento comece os testes de voo entre julho e agosto deste ano.

Nos testes de estresse, pode haver a necessidade de substituição de peças. “Não sabemos qual vai ser a resposta dos componentes quando a aeronave passar por esses testes nem quantas vezes o sistema terá de ser desmontado, recalculado e remontado”, detalha Prianti. “A ideia é, ao longo deste ano, corrigir as possíveis falhas e fazer os ajustes necessários.”

Outro aspecto do projeto é o desenvolvimento de caldas específicas para o equipamento em parceria com o produtor para obter melhor resultado final na aplicação. “É comum que o fazendeiro esteja acostumado a pulverizar com um determinado produto, mas ao usá-lo no drone não obtenha resultado adequado. Isso ocorre porque aquele líquido não foi feito para pulverização aérea nas condições de densidade, velocidade e deslocamento de ar da aeronave em que foi usado.”

Mais oportunidades

Nesse segmento, é importante combinar capacidade de carga e autonomia de voo. “Não adianta carregar 100 quilos, mas voar 15 minutos e esse tempo não ser suficiente para fazer o trabalho”, explica Prianti. “É melhor levar 50 quilos e voar 50 minutos, por exemplo, enquanto varia a velocidade de dispersão. Por isso, queremos ter a melhor combinação do mercado entre tempo de voo e capacidade de carga.”

No decorrer da pesquisa, que tem o apoio do programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), da FAPESP, a equipe descobriu outras oportunidades de uso do helicóptero. “Uma delas é a pulverização em florestas: um drone elétrico tem certa limitação, por exemplo, para chegar até um ponto específico de uma floresta, executar a dispersão [de líquidos ou sólidos] e retornar. A bateria é um limitador de tempo de voo, especialmente se o equipamento estiver com carga.”

A escolha de um helicóptero tem outro aspecto interessante: o efeito downwash. Nesse processo, o ar é jogado para baixo e há menor desvio das gotas, uma vez que a velocidade dessa aeronave é menor do que a de um avião. “Em velocidades mais baixas, as gotas quebram menos e, como o vento tende a carregar as partículas mais finas, a deriva diminui, o que reduz o desperdício.”

Além dos cafezais, a aeronave desenvolvida poderá ser usada em lavouras de cana-de-açúcar, soja, laranja e outras. “Às vezes, não é possível utilizar aviação agrícola porque há limitações: pode haver dificuldades meteorológicas, por exemplo, ou não haver uma pista para pouso da aeronave.”

O VTOL, por sua vez, faz decolagem e pouso verticais e não requer pista para isso. “O espaço necessário para esse processo é relativamente pequeno, o que dá flexibilidade de uso”, afirma Prianti. “Estamos desenvolvendo uma plataforma bem flexível. Na restauração de florestas, por exemplo, podem ser usados drones, mas isso é inviável em áreas muito grandes. Nosso helicóptero vai poder chegar a áreas restritas ou de difícil acesso de forma autônoma e com grande capacidade de carga, o que garante maior cobertura.”

E não é só isso: a equipe avalia que a plataforma pode ter múltiplas aplicações. “Com boa autonomia de voo e alta capacidade de carga, é possível transportar ferramentas, apagar incêndios, levar vacinas a lugares remotos e assim por diante. Ou seja, não ficamos restritos ao segmento agrícola. Além disso, como o helicóptero é autônomo, não há um piloto em risco.”

De acordo com Prianti, existe um tamanho mínimo para as propriedades que vão se beneficiar do uso da aeronave. “Pelo porte do nosso equipamento, nos interessam propriedades a partir de 100 hectares. Nesse segmento, o drone elétrico não consegue atender e, a depender da região e da topografia, a aviação agrícola também não — isso faz o produtor ficar sem alternativa para pulverização aérea eficiente”, diz. “Para propriedades menores, por outro lado, é mais viável usar o drone elétrico.”

A próxima etapa do projeto é a da estruturação operacional. A ideia não é colocar o equipamento à venda, mas ter bases perto de grandes centros de operação. “No sul de Minas Gerais, por exemplo, há muita demanda para as plantações de café”, aponta. “Queremos oferecer um serviço para atender às necessidades do agronegócio.”

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Os textos publicados no Portal da FAPESP e pela Agência FAPESP podem ser reproduzidos com citação da fonte.

Uso de ChatGPT no ensino exige cuidado, alerta especialista

A utilização da inteligência artificial na elaboração de materiais didáticos, como pretende fazer o governo do estado de São Paulo, demanda cuidados e não pode deslocar os professores do papel central na educação. A avaliação é de Ana Altenfelder, presidente do Conselho de Administração do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), organização da sociedade civil que promove a equidade e qualidade na educação pública brasileira.

“A inteligência artificial pode ajudar a planejar, a fazer a gestão da aprendizagem. Isso eu acredito que potencialmente pode acontecer. Mas é alguma coisa muito nova que precisa ser investigada, ser pesquisada. E o que nós não podemos esquecer, de jeito nenhum, é o papel central do professor”, destaca a pesquisadora.

A Secretaria de Educação do estado anunciou nesta semana que planeja implementar um projeto-piloto para incluir a inteligência artificial como uma das etapas do processo de “atualização e aprimoramento de aulas” digitais do terceiro bimestre dos anos finais do ensino fundamental e do ensino médio.

“Acho que muitas vezes comete-se um equívoco, imaginando que o professor é um simples aplicador de material didático. Nesse sentido, a decisão da Secretaria Estadual de Educação causa preocupação pelo histórico. Nós temos visto várias decisões, projetos, propostas da Secretaria de Educação de São Paulo que não consideram o papel fundamental do professor”, ressalta Altenfelder.

Ela cita a decisão da secretaria, tomada no ano passado e criticada pelos professores, de substituir os livros didáticos físicos do Programa Nacional de Livros Didáticos (PNLD), oferecido pelo Ministério da Educação, por materiais digitais, como a exibição de slides aos alunos. Após o protesto dos docentes e a repercussão negativa da medida, a secretaria recuou e manteve os livros físicos nas salas de aula

“Eram materiais que foram feitos sem nenhuma qualidade, em detrimento dos livros didáticos que estão aí há muitos anos, que é um programa nacional, que tem um trabalho contínuo, elaborado e analisado por especialistas, professores, e que são de qualidade”, disse a pesquisadora.

Uso gradativo

Altenfelder chamou a atenção ainda para os cuidados que devem ser tomados no processo de implantação da inteligência artificial no ensino. Segundo ela, o correto seria passar a utilizar a tecnologia, como o ChatGPT, gradativamente. 

“Quando houve esse movimento dos slides, foi na rede inteira de ensino e foi de uma vez só, sem um período de teste, sem um período de experimentação. Nós sabemos que toda estratégia, toda política pública precisa de um tempo para ser aplicada, observada, e os rumos serem corrigidos”.

Papel do professor

Em nota, a secretaria de Educação disse que os professores não serão substituídos pela inteligência artificial e que a pasta planeja implementar um projeto-piloto para inclusão da tecnologia.

“As aulas que já foram produzidas por um professor curriculista e já estão em uso na rede são aprimoradas pela IA [inteligência artificial] com a inserção de novas propostas de atividades, exemplos de aplicação prática do conhecimento e informações adicionais que enriqueçam as explicações de conceitos-chave de cada aula”.

Segundo a secretaria, o conteúdo produzido será avaliado e editado por professores curriculistas em duas etapas diferentes, além de passar por revisão de direitos autorais e “intervenções de design”. “

Se essa aula estiver de acordo com os padrões pedagógicos, será disponibilizada como versão atualizada das aulas feitas em 2023”.  

Professores estaduais criticaram o projeto de uso do ChatGPT na produção de conteúdo digital. A segunda presidenta do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) e deputada estadual, Professora Bebel (PT), argumenta “que as tecnologias e informação e comunicação (TICs) são ferramentas auxiliares no processo educativo e jamais podem substituir o trabalho do professor”.

Em nota, a parlamentar informou ter protocolado uma representação no Ministério Público Estadual contra a iniciativa. 

*Colaborou Dimas Soldi, da TV Brasil.