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Krenak: literatura pode ajudar a propor novas formas de viver na Terra

De forma direta ou indireta, todos estão participando do consumo indistinto do planeta. É o que acredita o escritor e ativista ambiental Ailton Krenak (foto). O líder indígena, autor dos livros Ideias para adiar o fim do mundo e Futuro ancestral, entre outros, afirma que todos participam da bagunça que está acontecendo no planeta, uma vez que “nós somos o corpo da Terra”.

“Se você disser que a sua mão não tem culpa do que o seu pé faz, você está considerando a possibilidade do seu pé se mover sem a ajuda da mão. Algum tipo de ajuda vai ter. Nem que seja a indiferença, a não resposta”, salienta.

Krenak não tira a responsabilidade nem dos povos indígenas. “Os povos originários costumam entender-se como filhos da Terra. E eu incito os meus companheiros dizendo: se ela é nossa mãe, como é que vocês deixam fazer bullying com ela? Se ela é nossa mãe e estão predando-a, que tal a gente partir para cima desses caras?”, sugere.

Ao falar do processo que ele denuncia como “comer a Terra”, o ambientalista cita, em sua opinião, as três expressões mais visíveis de destruição: mineração, devastação das florestas e exploração do petróleo. Dessa última, Krenak acredita que não tem como escapar. Nem os mais remotos povos.

Extrativismo

Para ele, ninguém fica de fora do extrativismo determinado pela escolha do petróleo como matriz energética. E que está presente em todos os lugares e em diversas versões.

“Sabia que a capa do seu celular é feita de petróleo? Que, provavelmente, a minha sandália é feita de petróleo? Que o seu tênis é de petróleo? Os seus óculos, o seu boné?”, provoca.

Krenak foi o autor homenageado da segunda edição do Festival Literário Internacional de Paracatu, que terminou no último domingo (1º). Traduzido para mais de 13 países e imortal pela Academia Brasileira de Letras, ele afirmou que é preciso “ter poesia em nossa experiência de luta”.

“Acho que cada um de nós deve despertar o seu poder interior e pensar como fazer: se vai ser produzindo mais conhecimento, se vai ser produzindo arte, se vai ser escrevendo, falando, desenhando, plantando bananeira. Tem gente que acha que a maneira de fazer isso é plantando floresta, agrofloresta; ou fazendo campanha, cuidando da água, protegendo a vida selvagem. Até ontem, as pessoas achavam que só os humanos pensavam. Hoje, a gente sabe que as árvores, os peixes, todo organismo vivo tem ciência”, garante.

Literatura

Ailton Krenak na 2ª edição do Festival Literário Internacional de Paracatu. Foto: Fliparacatu/Divulgação

Em seu mais recente lançamento, “Kuján e os meninos sabidos”, Ailton Krenak escreve para as crianças. Ele explica que kuján, na língua krenak, significa tamanduá. E que o livro conta uma história da criação da humanidade para que as crianças tenham outra opção de como nós aparecemos na Terra, além da versão de Adão e Eva.

Os meninos sabidos são dois heróis culturais, para quem o criador ensina os artefatos, a pintura corporal, as cantigas. Ao escrever para as crianças, Krenak coloca a esperança em outras formas de viver no planeta, nos pequenos.

“A gente está exatamente pensando que ainda pode ter esperança em outras maneiras de habitar o mundo. E quem pode fazer isso serão as crianças, porque os adultos já estão todos manjados. Os adultos estão tarados por grana, por poder, por disputas”, argumenta.

Leitor, Krenak define o poeta Carlos Drummond de Andrade como seu escudo invisível. Ele diz que o poeta mineiro passou a vida avisando “que a aldeia, a Itabira (MG) dele, tinha se transformado em um retrato na parede. Quer dizer, o chão que ele pisava ruiu”.

Citando o poema “O homem; as viagens”, escrito por Drummond em 1973, Krenak aponta que o que o está no poema – as viagens do homem para habitar outros planetas, a lua e o sol – pode acontecer antes de o homem estar disposto a con-viver, como no verso final.

“A coisa mais simples da existência seria a gente habitar a Terra só com o contentamento de conviver. Um amigo me disse, ‘ah! Krenak, mas se não houvesse essas coisas que a gente julga danosas, ruins, a gente ia chegar em lugares onde não ia ter nada. Você ia chegar não ia ter luz elétrica, não ia ter a internet, não ia ter o carro’. Eu falei ‘mas são essas coisas que estão comendo o nosso mundo’. Seria mais ou menos como você ir passear num jardim e reclamar que está faltando demônios lá”.

Meteoro

O ambientalista também cita a obra de Joca Reiners Terron, “A morte e o meteoro”, lançada em 2019. No livro, um mundo distópico em que uma tribo da Amazônia está prestes a desaparecer por causa da destruição da floresta.

Krenak acredita que é como se a gente “estivesse vivendo na era moderna uma literatura de profecia”. Para ele, alguns autores, ao escrever, estão tomados por um sentimento tão poderoso que não estão mais fazendo literatura, mas profetizando, antecipando.

“Nós estamos num tempo onde as pessoas que são criativas, os poetas sempre foram chamados de antena, têm essa capacidade de verbalizar uma tragédia que a gente quer evitar. O sentido verdadeiro de uma literatura que expressa o seu tempo é exatamente mostrar para todo mundo o que eles não querem ver”, argumenta.

O ativista ainda acredita que a literatura pode ser um lugar da proposição e da busca por outras maneiras de conviver com a Terra.   

“É imaginar a possibilidade de a gente habitar outros mundos sem sair da Terra. É diferente do poema do Drummond, que o humano quer sair da Terra para ir para outro lugar. Quando ele fala con-viver, ele está dizendo que não vai ter que aprender a aguentar o balanço da canoa e segurar a onda, viver aqui. A gente vai ter que viver na Terra, não tem outro lugar para o humano viver. O equipamento fisiológico que o humano tem, a nossa anatomia, só dá para viver na Terra”, finaliza.

 

*Repórter viajou a convite da organização do festival

Terra tem agosto com temperatura 1,51 °C acima do nível pré-industrial

A temperatura do planeta ultrapassou no mês de agosto deste ano 1,51 graus Celsius (°C) acima do nível pré-industrial, pelo 13º mês nos últimos 14 meses. Foi o agosto mais quente da Terra da série histórica do Serviço Copernicus para as Alterações Climáticas da União Europeia, com uma temperatura média do ar na superfície 0,71 °C acima da média do período 1991 a 2020.

A média na temperatura global, de setembro de 2023 a agosto de 2024, foi a maior registrada para qualquer período de 12 meses 0,76 °C acima do período entre 1991 e 2020 e 1,64 °C acima da média pré-industrial de 1850 a 1900.

A temperatura média da superfície do mar para agosto de 2024 foi 20,91°C, considerando as zonas Temperadas e Intertropical, a cerca de 10 metros de profundidade. De acordo com Serviço Copernicus para as Alterações Climáticas, esse é o segundo valor mais alto já registrado para o mês, e apenas 0,07°C abaixo de agosto de 2023.

De acordo com o Boletim Agosto de 2024, publicado pela instituição nesta sexta-feira (6), é provável que o ano de 2024 supere as temperaturas registradas em 2023. “Essa sequência de temperaturas recordes está aumentando a probabilidade de 2024 ser o ano mais quente já registrado. Os eventos extremos relacionados à temperatura testemunhados neste verão só se tornarão mais intensos, com consequências mais devastadoras para as pessoas e o planeta, a menos que tomemos medidas urgentes para reduzir as emissões de gases de efeito estufa.”, afirmou a diretora adjunta do Copernicus Climate Change Service, Samantha Burgess.

Na análise hidrológica, a instituição constatou ainda que agosto foi mais seco do que a média na maior parte da América do Sul e registrou a incidência de incêndios florestais no Brasil.

Financiado pela União Europeia, o Copernicus é o principal programa de observação da Terra que utiliza medições de satélites, navios, aeronaves e estações meteorológicas em todo o mundo, para produzir análises de dados sobre da atmosfera, marinho, Terra, alterações climáticas, segurança e emergência.

O programa é coordenado e gerido pela Comissão Europeia e implementado em parceria com Estados-Membros, Agência Espacial Europeia (ESA), Organização Europeia para a Exploração de Satélites Meteorológicos, Centro Europeu de Previsões Meteorológicas em Médio Prazo, entre outros.

Conflito pela terra é causa de um terço das mortes de quilombolas

De janeiro de 2019 a julho de 2024, 46 quilombolas foram assassinados em 13 estados do país. Além disso, de acordo com relatório da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq), cerca de um terço dos casos tinha como contexto a disputa pela terra (34,7%).

O levantamento mostra também que em 29 dos registros (63%) as vítimas foram mortas com arma de fogo. Nesses casos, a Conaq destaca que muitas vítimas foram executadas com tiros na nuca ou na cabeça.

Outras duas partes chamam a atenção, pela brutalidade empregada: a de mortes provocadas por força física puramente, com golpes no corpo da vítima, como socos e chutes, e a de uso de maquinário pesado, que envolveram quatro e dois casos, respectivamente.  

No que diz respeito à autoria dos crimes, aproximadamente metade (48%) dos suspeitos ou responsáveis identificados era ex-companheiros (21,2%), familiares ou conhecidos das vítimas (14,8%), vizinhos/posseiros/proprietários das terras em disputa (12,7%), membro de organização criminosa (6,38%), assaltante (4,26%) e policiais militares/agentes penitenciários (4,26%). As últimas categorias, conforme a Conaq, sugerem que diversos assassinatos foram encomendados. 

Os estados que mais perderam quilombolas foram o Maranhão (14), a Bahia (10) e o Pará (4). Alagoas, Minas Gerais e Pernambuco tiveram três casos cada, assim como Goiás e o Tocantins, cada um com dois, e o Ceará, Paraná, Rio de Janeiro, Santa Catarina e São Paulo, todos com um assassinato. 

Ao comentar os dados apurados, a Conaq distingue como “situações de violência sistemática com assassinatos em série” homicídios ocorridos na região da Baixada Maranhense (Cedro, Fleixeiras, Santo Antonio) e nos quilombos de Rio dos Macacos e Pitanga dos Palmares, na Bahia. Outra situação de desumanidade, lembrada pela organização, foi a chacina que vitimou pessoas de uma mesma família, em novembro do ano passado em Jeremoabo, na Bahia.

O documento ainda revela que quatro em cada dez vítimas (42%) eram lideranças ou pessoas vinculadas a elas. Uma informação adicional sobre o perfil das pessoas que perderam a vida é a sua idade média, de 45 anos, o que mostra as dinâmicas de militância e de transmissão de conhecimento. 

“Querendo ou não, é a juventude que mais toma a frente. Falo jovem como adulto de 30, 40, 50 anos. Porque os nossos ancestrais, os nossos mais velhos têm mais locais de orientação, instrução, espiritualidade e raramente estão ali na primeira linha que vai para o embate, que busca, sai da comunidade, que tem acesso a informações e tecnologias. Isso é um fator determinante”, explica Holdry Oliveira, liderança quilombola da comunidade Carrapatos da Tabatinga, em Minas Gerais. 

“O principal impulsionador dos assassinatos de quilombolas é o conflito pela terra (aproximadamente 35% dos casos), seguido da violência doméstica/familiar (aproximadamente 24% dos casos). Nos casos em que os assassinatos ocorrem devido ao conflito por terra, na data do crime a maioria dos quilombos estava em fase de certificação, com processo de regularização fundiária aberto no Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária], mas sem grandes avanços para obter a documentação. Outros territórios estavam em fase de autoidentificação como quilombo, iniciando o processo de certificação”, diz a entidade.

“Nos casos de conflito pela terra, a média de tempo decorrido entre a certificação e o assassinato é de aproximadamente 10 anos. Em outras palavras, o processo de titulação fica paralisado numa fase por uma década em média, enquanto a situação de violência e o conflito se intensificam e alcançam seu ponto mais trágico, o assassinato das lideranças. A paralisia dos órgãos competentes está na raiz das causas que geram parte significativa dos assassinatos”, acrescenta o relatório.

Fogo como tática

Além de ameaças de morte, intimidações por agentes privados e públicos de segurança, instalação de empreendimentos, registro de denúncia falsa e perseguição, uma das estratégias usadas contra os quilombolas é o incêndio criminoso, que, se não debelado a tempo, é capaz de destruir pertences e mesmo a moradia de muitos. Ao todo, foram contabilizadas oito ocorrências desse tipo pela Conaq, nos estados do Maranhão, da Bahia, do Tocantins, Espírito Santo, de Minas Gerais e do Rio de Janeiro.

“O fogo é uma das artimanhas que eles tentam usar para nos tirar do local que é nosso de fato, para que possam ocupar de outras maneiras”, diz Holdry.

Segundo a jovem líder, embora os quilombolas sofram diversas investidas, a forma como encaram a luta permite que, de certo modo, ainda deem a volta por cima. “O povo quilombola é muito unido. Infelizmente, quando a gente lida com outros, tentam achar nosso ponto fraco. Assim como atacar as terras com fogo, atacar um familiar, um primo, um parente mais próximo também é uma forma de desestruturar nossa luta. Quando a gente perde um líder, perde uma parte de nós, mas a luta continua e outros líderes nascem. Então, podem continuar nos assassinando, mas a nossa linhagem vai lutar, vai permanecer e persistir”, afirma. 

Operação da PF combate garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami

Quinze mandados de busca e apreensão e cinco mandados de prisão preventiva foram executados nesta terça-feira (3) pela Polícia Federal nos estados de Roraima e Rondônia. A operação Taurus Aerus teve como focos o combate à logística e ao financiamento das organizações que exploram o garimpo ilegal nas terras Yanomami. A PF apreendeu diversos bens, entre veículos e uma fazenda.

As operações da PF estão previstas como meta prioritária do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), que planejou a realização de 32 ações até o final de 2026. As operações desta terça-feira seguem a Operação Libertação, permanente, cujo início foi em fevereiro de 2023, para repressão ao garimpo ilegal e, também, à desintrusão dos invasores de terra.

Ao longo de 18 meses, o governo federal já realizou a desintrusão em três áreas consideradas vitais no Pará – Alto do Rio Guamá, Apyterewa e Trincheira Bacajá – e uma em Rondônia, na Terra Indígena Karipuna.  Segundo dados colhidos pela Casa de Governo de Roraima, 26% dos 9,6 milhões de hectares da terra indígena são afetados pela mineração irregular, mas as iniciativas de repressão produziram uma queda de 91,6% na mineração irregular em relação a 2022.  

Até agora, a estimativa das operações da PF é a de que o prejuízo aos financiadores de garimpos ilegais nas terras indígenas corresponda a R$ 163 milhões. Em março deste ano, a área de garimpo ativo correspondia a 4,57 mil hectares e a área de influência do garimpo era de 2,6 milhões de hectares, mas com as ações como a de hoje nota-se uma redução para 1,5 mil hectares para garimpos ativos e 916 mil hectares de área de influência – esses números são relativos ao mês de agosto.

Desde a implantação da Casa de Governo Yanomami, em Boa Vista, capital de Roraima, em 29 de fevereiro deste ano, já foram inutilizadas 19 aeronaves; mais de 86 mil litros de óleo diesel; 617 motores e 70 antenas Starlink. Foram apreendidas 75 toneladas de cassiterita e 10.848 quilos de ouro. A preços desta terça-feira, com o quilo cotado a R$ 457.320,00 na bolsa de mercadorias, esse montante de ouro apreendido representa quase R$ 5 bilhões retirados dos garimpeiros ilegais. Até agora, 80 pessoas foram presas.

 

MPF move ação na Justiça Federal por demarcação de terra indígena

Indígenas do povo Amanayé, que vivem na reserva localizada no município de Goianésia do Pará, no Sudeste do estado, denunciam a extração ilegal de madeira na região e a ausência do Estado e da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) na proteção e promoção de seus direitos. O Ministério Público Federal move uma ação civil pública pela demarcação do território reservado aos indígenas há 79 anos.

Segundo o líder indígena Ronaldo Amanayé, além dos desmatamentos, uso de agrotóxico, poluição das águas e ameaças pelos invasores, os indígenas ainda enfrentam todas as dificuldades de acesso às políticas públicas. “A Funai nunca atuou na nossa região, a não ser quando os indígenas vão até a CTL [Coordenação Técnica Local] de Tucuruí para buscar apoio para fazer auxílio maternidade ou aposentadoria”, diz.

Um estudo publicado em julho, pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), a partir de dados por imagens de satélite do Sistema de Monitoramento da Exploração Madeireira (Simex), apontou que nos últimos anos a reserva Amanayé foi a mais afetada pela extração ilegal do recurso. Foram desmatados quase 3 mil hectares da reserva, aponta o estudo.

De acordo com o inquérito civil que tramitou no Ministério Público Federal e subsidiou a ação civil, foram identificados 37 Cadastros Ambientais Rurais (CARs) e arrecadações de glebas para o Estado do Pará, por particulares. “Alguns fazendeiros têm georreferenciado a área e têm se valido da terra para o cultivo de monoculturas, e com isso existe uma dispersão dos próprios indígenas, existe uma saída forçada, até por uma questão de autoproteção, os indígenas acabam se dispersando, saindo do território”, explica o procurador da República responsável por ajuizar o processo, Sadi Machado.

O Censo 2022, apontava uma população de indígenas Amanayé composta por 244 pessoas, mas atualmente vivem na reserva apenas 26 famílias, somando um total de 125 pessoas. Segundo o líder indígena, muitos saíram da região por causa dos conflitos, mas a dificuldade de praticar o manejo sustentável também tem empurrado os aldeados para as cidades em busca de trabalho. “Nossas terras já não são mais autossustentáveis”, denuncia.

Machado destaca que a ausência do estado e a omissão da Funai representam, nesse caso, não apenas uma violação dos direitos ao usufruto da terra por essa comunidade, previsto na Constituição Federal, mas também viola o direito do povo Amanayé de existir. “Essa desintegração do grupo, a perda dos vínculos da comunidade entre si, e esse deslocamento forçado são violações graves. Eles acabam tendo que migrar para outros locais, às vezes, inclusive, para outros territórios indígenas, o que gera, inclusive, conflitos entre as comunidades indígenas”, destaca.

Segundo Machado, a ação foi ajuizada na última semana com um pedido liminar de urgência, para que seja iniciado imediatamente a identificação, delimitação e demarcação da área e que o processo seja finalmente homologado. Além disso, o procurador entende que a demora no cumprimento das obrigações do Estado geraram danos morais a essa população e que cabe um pedido de reparação financeira no valor de R$ 3 milhões, a serem revertidos em ações de políticas públicas em atendimento aos indígenas. “A omissão do Estado e da União, especificamente da Funai em relação à demarcação, todo o argumento de que não há recursos ou de que o orçamento não está disponível para tanto, faz com que o poder público tenha uma perda significativa com a apropriação dessa área por particulares, considerando que as terras indígenas são bens federais. Além do prejuízo ambiental que toda a sociedade acaba sofrendo”, conclui.

Reserva

Criada em 1945, a reserva indígena Amanayé foi reconhecida pela Funai em 1994, com a publicação de uma portaria que designou um grupo de trabalho para identificação e levantamento fundiário para definição da área indígena. O trabalho não foi finalizado e em 1989, uma nova portaria para continuidade do estudo foi publicada e, na época, na área que havia sido reservada para os indígenas de 163 mil hectares, foram identificadas invasões por não indígenas e crimes contra a fauna e flora.

Sem a conclusão do processo, em 2020, os indígenas voltaram a denunciar a apropriação das terras por fazendeiros que faziam uso dos CARs para grilar as terras públicas e conseguir título sobrepostos. Em resposta aos Amanayé, a Funai informou não dispor de recursos orçamentários e pessoal para dar continuidade ao processo.

A reportagem da Agência Brasil entrou em contato com a Funai e até o momento da publicação da matéria não houve resposta.

Terra Yanomami terá R$ 32 milhões para investimento em educação

O território etnoeducacional Yanomami Ye’kwana será o primeiro a receber, neste ano, o apoio do Ministério da Educação (MEC) por meio das universidades e institutos federais.

Ao todo, R$ 32 milhões serão repassados para a construção de escolas e formação de professores no território desses povos, de forma emergencial.

A Universidade Federal de Minas Gerais ficará responsável por executar as obras, enquanto a formação de professores será conduzida pelo Instituto Federal de Roraima. Aliás, R$ 18 milhões serão destinados à formação dos docentes.

As ações para a educação dos Yanomami e Ye’kwana foram discutidas com lideranças indígenas em encontro, na terça-feira (21), com o ministro Camilo Santana, em Brasília.

Os Yanomami são a etnia brasileira com o menor número de profissionais formados pela educação superior — menos de 1% tem formação neste nível. A ideia é fortalecer o Programa Saberes Indígenas no Território, responsável pela formação continuada e pela produção de material didático voltado a esse público.

Como parte da Política Educacional Indígena, o MEC vai retomar a construção de 74 escolas indígenas em vários territórios do país, com investimento de R$ 195 milhões. Também estão previstas a criação de 113 novas escolas indígenas, pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Pelo Programa Nacional de Formação de Professores da Educação Básica, na modalidade Equidade, o ministério aprovou a criação de 39 cursos de licenciatura intercultural indígena, com 2.412 vagas.

Ouça na Radioagência Nacional

Leonardo Boff comenta novo livro e Carta da Terra no Trilha de Letras

A TV Brasil exibe uma entrevista exclusiva do célebre teólogo, escritor e professor Leonardo Boff para a apresentadora Eliana Alves Cruz na edição inédita do Trilha de Letras desta quarta-feira (21), às 23h. A atração literária tem transmissão simultânea na Rádio MEC.

Gravado na BiblioMaison, o Trilha de Letras fica disponível em formato podcast nas plataformas digitais. O conteúdo também pode ser acompanhado no app TV Brasil Play e no canal do YouTube da emissora pública.

No programa, o experiente autor de 85 anos destaca os temas tratados no mais recente livro, o lançamento Cuidar da Casa Comum (2024), e na premiada obra Ecologia: Grito da Terra, Grito dos Pobres, reconhecida com o Prêmio Sergio Buarque de Holanda, da Biblioteca Nacional, como ensaio social do ano.

Com mais de 120 títulos publicados, o filósofo ainda aborda a maioridade da Carta da Terra, que completa 21 anos em 2024. Ao falar sobre o cuidado, ele defende o equilíbrio entre o homem e a natureza. “Eu acho que nós vamos sair dessas crises todas que estamos vivendo. É um caos destrutivo, mas ele também é generativo. Quando é grande a ameaça, maior ainda é a chance de salvação”, afirma.

Escritor Leonardo Boff apresenta novo livro no Trilha de Letras – TV Brasil/Divulgação

 

No quadro Dando a Letra, espaço do programa com indicações de leituras, a booktuber Martha Ribas recomenda o livro Louvor à Terra, escrito pelo ensaísta sul-coreano Byung-Chul Han. Ele relata sobre o trabalho que fez de plantio e cuidados com um jardim. O texto traz uma reflexão singela sobre o processo.

Carta da Terra

Durante o papo com a também escritora Eliana Alves Cruz no canal público, o pensador reflete sobre a importância da Carta da Terra. Ele recorda a experiência de integrar o grupo que preparou o documento, lançado no início dos anos 2000.

“Foram oito anos de trabalho para identificar os princípios e valores que seriam universais que salvariam a vida, a Terra e a nossa civilização”, pontua Leonardo Boff ao indicar a essência daquela declaração: “como salvar o nosso futuro porque ele está ameaçado”, define.

Esse processo é debatido pelo veterano na produção da TV Brasil. “O texto teve longa elaboração. Cada continente apresentou propostas para o documento. Fiz a parte da América. Disso resultou um documento muito discutido que foi aprovado, na verdade, no ano de 2000, em Paris, mas assumido oficialmente pela ONU em 2003”, conta.

Leonardo Boff foi um dos representantes da América Latina e Caribe na Comissão da Carta da Terra, ao lado de personalidades como a cantora argentina Mercedes Sosa. Lideraram a iniciativa nomes como o político russo Mikhail Gorbachev, o diplomata canadense Maurice Strong e o empresário americano Steven Rockefeller.

Ecoteologia da Libertação

Na atração semanal, o pensador brasileiro também comenta a Ecoteologia da Libertação, teoria que atualiza os conceitos teológicos criados na América Latina na década de 1960. Segundo Leonardo Boff, atualmente, é o planeta Terra e o meio ambiente, explorados em excesso e próximos do colapso, que merecem a atenção dos povos e da fé cristã.

A Teologia da Libertação teve grande destaque nos anos 1960 e 1970 ao promover o encontro entre a fé cristã e a justiça social. A proposta reforçava o papel da Igreja Católica em relação aos pobres e oprimidos, especialmente aqueles atingidos pela exploração capitalista e imperialista.

Sobre o programa

O Trilha de Letras busca debater os temas mais atuais discutidos pela sociedade por meio da literatura. A cada edição, o programa recebe um convidado diferente. A atração foi idealizada em 2016 pela jornalista Emília Ferraz, atual diretora da produção que entrou no ar em abril de 2017. Nesta temporada, os episódios foram gravados na BiblioMaison, biblioteca do Consulado da França no Rio de Janeiro.

A TV Brasil já realizou três temporadas do programa e recebeu mais de 200 autores nacionais e estrangeiros. As duas primeiras temporadas foram apresentadas pelo escritor Raphael Montes. A terceira, por Katy Navarro, jornalista da Empresa Brasil de Comunicação (EBC). A jornalista, escritora e roteirista Eliana Alves Cruz assume a quarta temporada, que também ganha uma versão na Rádio MEC.

A produção exibida pelo canal público às quartas, às 23h, tem janela alternativa na telinha de domingo para segunda, à 0h30. Na programação da Rádio MEC, o conteúdo também é apresentado às quartas, no mesmo horário da TV Brasil, na faixa nobre, às 23h.

Ao vivo e on demand

Acompanhe a programação da TV Brasil pelo canal aberto, TV por assinatura e parabólica. Sintonize: https://tvbrasil.ebc.com.br/comosintonizar.

Seus programas favoritos estão no TV Brasil Play, pelo site http://tvbrasilplay.com.br ou por aplicativo no smartphone. O app pode ser baixado gratuitamente e está disponível para Android e iOS. Assista também pela WebTV: https://tvbrasil.ebc.com.br/webtv.

Serviço

Trilha de Letras – quarta, dia 21/8, às 23h, na TV Brasil 
Trilha de Letras – quarta, dia 21/8, às 23h, na Rádio MEC 
Trilha de Letras – quinta, dia 22/8, às 3h, na TV Brasil 
Trilha de Letras – domingo, dia 25/8, para segunda, dia 26/8, à 0h30, na TV Brasil 

Projeto monitora rios na região da Terra Indígena Yanomami

A qualidade ambiental e a concentração de metais como mercúrio, agrotóxicos e outras substâncias estão sendo analisadas na região da Terra Indígena Yanomami, em Roraima, pela equipe do Projeto Monitora Y. A iniciativa aprofunda o estudo realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em 2022, que identificou a contaminação de peixes amazônicos por mercúrio na Bacia do Rio Branco e, posteriormente, levou à identificação dos efeitos nos povos indígenas.

Ao todo foram realizadas três coletas desde novembro de 2023, quando teve início a pesquisa, sendo duas coletas em março e junho deste ano. A previsão é que haja mais uma coleta em setembro.

De acordo com o pesquisador do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) Romerio Briglia, foram feitas novas coletas de amostras de águas de consumo e fluviais, sedimentos de rios e de peixes na TI Yanomami e em unidades de Conservação federais da região, como as estações ecológicas Maracá e Niquiá, o Parque Nacional do Viruá e a Floresta Nacional de Roraima.

“Nessa nova fase, vamos incluir outros rios e outras unidades de conservação fora da Terra Indígena Yanomami. Começará em 16 de setembro, e deve durar duas semanas a expedição de campo. Em breve, a gente vai ter o resultado, por volta de novembro, e vamos publicar um artigo e socializar essas informações com todos os parceiros interessados”, adianta o pesquisador.

Segundo Briglia, o objetivo do estudo é qualificar as informações sobre os impactos da atividade do garimpo ilegal. “Ainda temos poucas informações sobre quais os efeitos que essas atividades causaram dentro da Terra Indígena Yanomami e nas unidades de Conservação federais contíguas a essa área”, explicou.

O projeto Monitora Y é executado por uma equipe multidisciplinar do Centro de Tecnologia Mineral do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), ICMBio e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). A iniciativa integra a Rede de Monitoramento Ambiental em Terras Indígenas Yanomami e Alto Amazonas, lançada em novembro de 2024, em uma frente que reúne os ministérios do Meio Ambiente e Mudança do Clima, dos Povos Indígenas, da Saúde e a Ciência, Tecnologia e Inovação. O objetivo é gerar dados que orientarão as políticas públicas para sanar a emergência Yanomami.

Alertas

Em julho, o Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia (Censipam), órgão vinculado ao Ministério da Defesa, divulgou uma redução no número de alertas de garimpo na TI Yanomami. De acordo com nota da instituição, no período de janeiro a junho deste ano houve uma redução de 75% da área alcançada por alertas, na comparação com 2023.

Os seis primeiros meses de 2024 registraram alertas em 53,67 hectares da TI, enquanto em 2023 os alertas foram em 219,67 hectares e, em 2022, alcançaram 814,81 hectares.

Imagens do Rio Uraricoera e de um ponto de conexão entre os rios Mucajaí e Couto Magalhães, localizados nas proximidades do território indígena, também foram apresentadas pelo Ministério da Defesa para demonstrar a melhoria na transparência da água. “As águas que tinham aparência mais amarelada, devido à contaminação por resíduos químicos da atividade minerária, estão, gradativamente, voltando à coloração normal”, informou.

Saúde

Na primeira semana de agosto, o Ministério da Saúde entregou 21 câmaras frias de armazenamento de vacinas e soros, 24 geradores de energia, além de formalizar a implantação de 35 leitos exclusivos para atendimento aos indígenas Yanomami no Hospital Universitário da Universidade Federal de Roraima (UFRR). 

“Sabemos como essa grave crise afeta a realidade do povo Yanomami. Estamos empenhados em solucionar as questões de forma persistente e duradoura”, declarou a ministra da Saúde Nísia Trindade, nas redes sociais.

Força Nacional é autorizada a atuar em terra indígena no RS

A Força Nacional de Segurança Pública vai atuar na segurança dos indígenas na Terra Indígena Rio dos Índios, no Rio Grande do Sul, e na preservação da ordem pública. A medida foi autorizada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP, por meio da Portaria nº 735, de 2 de agosto de 2024, publicada no Diário Oficial da União dessa segunda-feira (5).

De acordo com o documento, assinado pelo ministro Ricardo Lewandowski, os militares ficarão na região por 90 dias, auxiliando os servidores da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), com o apoio das forças de segurança estaduais. Por medida de segurança, o ministério não informa o número de agentes mobilizados.

Rio dos Índios

Localizada no município Vicente Dutra, no norte do estado, próxima à fronteira com a Argentina, a Terra Indígena Rio dos Índios abriga a cerca de 230 kaingang, distribuídos por 711 hectares (cada hectare corresponde, aproximadamente, às medidas de um campo de futebol oficial).

A área da União destinada ao usufruto exclusivo dos kaingang foi homologada em abril de 2023, por meio do Decreto Presidencial nº 11.505, após décadas de luta das comunidades que reivindicavam o direito a parte do território antes ocupado por seus antepassados.

Com a homologação da área, a Funai pode dar início ao processo de retirada dos não indígenas do território, indenizando as benfeitorias resultantes da ocupação de boa-fé. De acordo com a fundação, a saída dos ocupantes não indígenas é fundamental para assegurar a posse plena e o usufruto exclusivo do território pelo povo kaingang, “contribuindo também para a mitigação de conflitos fundiários e para o reparo de injustiças, violências e esbulho perpetrados historicamente”.

Ainda segundo a fundação, a homologação da terra indígena se deu após extenso e criterioso processo administrativo de identificação e delimitação, respeitado o direito ao contraditório. 

Após dois meses, desintrusão na Terra Indígena Karipuna é finalizada

O governo fez nesta terça-feira (30), na aldeia Panorama, em Rondônia, entre a capital Porto Velho e o município de Nova Mamoré, uma cerimônia para marcar a conclusão da operação de retirada de invasores da Terra Indígena Karipuna. 

O processo de desintrusão, que é a retirada dos invasores ilegais, começou em junho e marca o retorno dos povos originários. Os karipuna já têm direito homologado à área desde 1998, mas somente, em 2020, conseguiram, no Supremo Tribunal Federal (STF), a retirada definitiva dos madeireiros e grileiros que ocupavam a região. 

Essa é a quarta desintrusão realizada pelo governo federal desde 2023, conforme o secretário-executivo do Ministério dos Povos Indígenas e atual ministro em exercício, Eloy Terena. Também ocorreram operações nas terras indígenas Apyterewa, Trincheira Bacajá, Alto Rio Gama, no Pará. Na Terra Indígena Yanomami, em Roraima, a operação ainda não foi finalizada.

Nova Mamoré (RO) 31/07/2024 – Ministro interino dos Povos Indígenas, Eloy Terena, durante ato para marcar a entrega da Terra Indígena Karipuna. Foto: Bruno Peres/Agência Brasil

“Proteger terra indígena é compromisso constitucional do Estado brasileiro”, afirmou Eloy Terena.

Histórico 

O povo indígena Karipuna, que já contou com uma população de cerca de 5 mil pessoas, no momento do primeiro contato com os não indígenas, ocupava uma área de mais de 200 mil hectares. Em 1988, a área foi reduzida para 153 mil hectares, um pouco menor que Altamira, no Pará, a maior cidade do país em extensão territorial, que conta com 159 mil hectares.

O contato com os não indígenas e a chegada de doenças virais, como gripe, coqueluche e catapora, levou ao povo quase à extinção, com apenas sete indivíduos. Agora, são 63. 

Nova Mamoré (RO) 31/07/2024 – Cacique André Karipuna posa para foto após ato para marcar o fim da desintrusão da Terra Indígena Karipuna, na Aldeia Panorama. Foto:Bruno Peres/Agência Brasil

“No passado, muitos faleceram através das doenças e por causa do contato. Quase fomos extintos”, conta André Karipuna, cacique da Aldeia Panorama.

“É a nossa missão institucional manter essa terra livre, fazer com que essa população aumente, fazer com que os direitos sociais cheguem, fazer com que todo esse quadro do passado não se repita”, destacou Joenia Wapichana, presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, ao participar da cerimônia que marcou o fim da desintrusão do território. 

Desintrusão 

A operação para retirar grileiros e extrativistas ilegais contou com a participação de mais de 20 órgãos federais. Foram apreendidos 54 metros cúbicos de madeira ilegal e foram destruídas 25 edificações,17 pontes e seis acessos à terra indígena. 

 

Nova Mamoré (RO) – 31/07/2024 – Presidenta da Funai, Joenia Wapichana, celebra desintrusão da Terra Indígena Karipuna. Foto: Bruno Peres/Agência Brasil

De acordo com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a terra indígena Karipuna foi a mais invadida no estado de Rondônia ao longo dos anos. A conclusão do processo de desintrusão vai trazer mais proteção e segurança para essa população.

A próxima fase é o processo de consolidação do território, que envolverá o Ministério dos Povos Originários e a Funai para a regularização fundiária e implementação de políticas públicas indigenistas.