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Crianças de favelas da Penha vão apresentar balé para a comunidade

O conjunto de favelas da Penha, na zona norte do Rio, vai receber o espetáculo Transformando Através da Arte – Contando a Nossa História. A peça musical, inspirada nas mudanças que a dança traz para moradores de comunidades da cidade, apresentará 100 bailarinas, com idades entre 5 e 12 anos. Elas, durante 1h20, mostrarão dançando tudo que aprenderam.

As coreografias musicais foram divididas em sete atos, e montadas pela professora Telmary Santana Vieira, de 53 anos, que há mais 30 anos atua na educação artística de crianças no conjunto formado por 13 favelas. O espetáculo será apresentado, neste domingo (8), a partir das 17h, no Social Ramos Clube, também na zona norte.

O balé entrou na vida de Telmary, quando tinha 5 anos e, com o passar do tempo, conforme ia se desenvolvendo, quis dividir o seu conhecimento com crianças da sua comunidade. Há dez anos a professora de dança trabalha no Arte Transformadora. “Eu tenho orgulho de mim mesma com as crianças, porque são crianças de comunidade que realmente não têm a condição que eu tive da minha mãe costurar e pagar o meu balé, que na época não era barato, porque era eu e minhas irmãs. Eu tenho muito orgulho de poder ajudar as crianças da comunidade e ensinar para elas tudo que eu aprendi”, relatou.

Dudinha

Maria Eduarda Oliveira dos Santos, a Dudinha, de 10 anos, é uma das bailarinas. Ela fala do seu amor pela dança e o futuro que a dança poderá lhe proporcionar. “Para mim o balé é uma arte muito importante para a minha vida, acho bem legal. Quero ser até professora”, disse à Agência Brasil. “Já fiz várias apresentações e é uma alegria ver tantas pessoas vendo a nossa apresentação. Eu estou evoluindo muito”, completou animada.

Margarete Oliveira da Silva, de 51 anos, mãe da Dudinha, disse que a filha sempre gostou de dançar e com 4 anos já queria fazer balé. Desde lá, após o horário escolar, ela participa do projeto Arte Transformadora, que considera mais que uma ocupação para Dudinha. “Evita de estar na rua, aprende muita coisa, convive com as amiguinhas de lá. Cada vez, elas vão mudando de turma e evoluindo mais conforme vão crescendo”, disse à reportagem, acrescentando que a filha sempre fala em seguir a carreira de bailarina e, também, ser veterinária. “Ela quer exercer as duas profissões como a professora de balé dela que é também cabeleireira. Ela quer fazer o mesmo. Serve como exemplo”.

A manicure fica orgulhosa toda vez que vê uma apresentação da filha. “Eu fico muito emocionada de verdade. Cada apresentação fico muito feliz. Sou uma mãe que o que puder fazer dentro do projeto para ajudar eu estou fazendo e participando, porque é muita criança. Fico muito orgulhosa de ver minha filha ali participando e saber que eu fiz parte daquilo de alguma forma. Outras mães também, estão também sempre ajudando”, revelou, dizendo ainda que, como moradora da comunidade, considera o projeto muito importante.

Futuro promissor

A professora Telmary gosta também de saber que o futuro do projeto é promissor. Hoje, algumas alunas, que começaram com idades mais baixas, estão agora na faixa dos 12 anos, e já conta com ajuda nas aulas. “Eu tenho minha auxiliar que me ajuda. O sonho dela é ser professora de balé. É a Maria Eduarda, que não é a Dudinha. Ela ainda é minha aluna. Está na turma das maiores. Ela me ajuda à beça e montou a coreografia da turminha de duas horas”, afirmou.

Depois da estreia, Telmary e o Arte Transformadora querem estender as apresentações a arenas culturais da cidade, como a Arena Carioca Dicró, e espaços culturais da Baixada Fluminense e da zona norte do Rio. A professora deseja que as alunas de hoje possam fazer como ela, que um dia pensou em dividir com crianças da comunidade a sua experiência com o balé.

“[Espero] que elas realizem o sonho delas e que consigam ajudar outras pessoas como eu. A gente tem um desejo e elas também comigo no nosso projeto, de alguém conseguir enxergar a gente. São tantos anos e elas estão comigo tanto tempo nessa luta de ter patrocínio que a gente não tem e conseguir alcançar isso”, concluiu.

Sustentabilidade

Rio de Janeiro 08/12/2024 Crianças de Favelas da Penha vão apresentar balé para a comunidade. Foto/ Divulgação Arte Transformadora – Foto/Divulgação Arte Transformadora

Um dos pilares do Arte Transformadora é a sustentabilidade, além do espetáculo, o projeto vai mostrar que é possível transmitir cuidados com o meio ambiente e com os moradores do Conjunto de Favelas da Penha no seu dia a dia. Todos os resíduos que resultarem do consumo de água mineral, comida e demais itens da lanchonete serão recolhidos e trocados por um papel semente, que será entregue aos participantes para levarem para casa um pouco dos conceitos do projeto.

O presidente e fundador do Arte Transformadora, Albert Alves, disse que o projeto já desenvolve, com o Smearte, trabalhos desse tipo de consciência dentro da comunidade.

“A gente planta e colhe em cima da laje para mostrar que é possível as pessoas consumirem produtos sem agrotóxico da própria produção, mas como a gente iria incentivar isso nas pessoas? A gente vai fazer o espetáculo e na medida em que as pessoas estiverem consumindo bebidas e comidas com materiais recicláveis, uma equipe vai trocar o nosso papel semente, que é biodegradável e contém semente, para essa pessoa poder plantar e no futuro colher”, afirmou.

“Além de contribuir que esse material não vá para um lugar que não seja o correto. A gente vai fazer a separação de todo esse material e converter em dinheiro para comprar mais papéis sementes para os próximos espetáculos. A gente pretende interagir em todos os espaços de que a gente for”, acrescentou.

O presidente espera um público de 600 pessoas no espetáculo deste domingo. Com esta quantidade, Albert Alves estimou que serão trocados cerca de 300 papéis sementes. O resultado vai servir de base para a quantidade necessária para as próximas apresentações. “A gente está calculando 300, mas vai levar mais, porque este é também o marco zero para a gente saber como vai ser este comportamento nos outros espaços”, indicou.

Projeto

O Projeto Cultural Arte Transformadora foi criado em 2014, para atender à demanda por atividades culturais e de entretenimento no conjunto de favelas da Penha. Atualmente, o projeto atende 332 beneficiários diretos e 1.660 indiretos, que é o cálculo das famílias impactadas pelas ações de arte, esportes, meio ambiente, cultura e educação. O projeto tem oficinas fixas de balé, futsal, jiu-jitsu, capoeira, alfabetização, yoga, jardinagem, além de projetos temporários.

“Entre os espetáculos comunitários já realizados, destacam-se três edições do Festival Revoada Cultural, que reúne talentos de diversas comunidades do Rio, para apresentar livremente diversos formatos, entre dança, poesia, música, humor e qualquer forma de expressão artística”, informou a assessoria do Arte Transformadora.

Museu das Favelas reabre com mostras sobre magia e vida em comunidades

Antes localizado no bairro de Campos Elíseos, o Museu das Favelas reabriu nesta semana, em novo endereço, todas as exposições. O museu agora fica na região do Pateo do Collegio, no centro histórico de São Paulo.

Museu das Favelas é reinaugurado em novo endereço no centro histórico de São Paulo – Paulo Pinto/Agência Brasil

Nessa retomada, quatro exposições ocupam os imensos salões de um casarão antigo. A principal mostra é Sobre Vivências, que busca resgatar as conexões históricas das favelas e apresentar aos visitantes as inúmeras expressões das pessoas que constroem suas vidas nessas comunidades.

Fazem parte ainda da programação as exposições Marvel – O Poder é Nosso, que compartilha com o público a releitura sobre heróis, agora membros de grupos minoritários, e a itinerante Favela em Fluxo, que é composta por obras de 22 artistas dessas comunidades e desembarca em São Paulo após percorrer Recife, Salvador e Rio de Janeiro. 

Oswaldo Faustino, curador da Favela em Fluxo, uma das quatro mostras instaladas no museu – Paulo Pinto/Agência Brasil

Para Oswaldo Faustino, integrante do grupo curatorial da Favela em Fluxo, entre as qualidades que se acentuam na seleção das obras para a exposição, a mais esparramada de todas foi igualar as contribuições da curadoria às de funcionários do setor educativo.

O setor de pesquisa também participou das decisões. Faustino explica que foi fundamental validar as percepções de quem está simbolicamente nos bastidores, mas, na verdade, é a linha de frente, pois atende os visitantes e os guia pela exposição. 

Quando se transita pelas salas onde estão expostas as obras, nota-se uma multiplicidade de linguagens. Há pinturas a óleo, colagens, arte têxtil e vídeos que utilizam inteligência generativa. Os textos que antecipam algumas das intenções de que estão impregnadas as obras resumem, por vezes, em poucas palavras, como encará-las. 

Deusa da Espreita é como artista Lua Barral chama a pintura que fez este ano no Recife. Em uma cabine escura, é exibido um vídeo de travestis que miram no fundo das lentes da câmera reafirmando quem são. Afinal, travesti é um termo usado para realçar a cápsula que se torna o corpo de quem é sempre oprimido, como é o caso da travesti. Aer favelizada significa ser duplamente forte. E é assim que uma das travestis comemora, segurando um bolo com uma vela de número 2, o aniversário de seu processo de transição de gênero. 

A favela não é uma, são várias, declaram os artistas e servidores do museu. Negros, indígenas e ribeirinhos; palafitas, casas verticalizadas e, ainda assim, precárias, isso tudo pertence ao seu universo.

A exposição Racionais MC’s: O Quinto Elemento celebra os 35 anos da banda de rap – Paulo Pinto/Agência Brasil

Outra obra que chama a atenção tem praticamente uma segunda moldura para a colagem no centro, feita com lâminas de barbear perfiladas. O sentido político continua quando o visitante para para prestar atenção à música que deixa, então, de ser somente um fundo indefinido. É o gargantear dos funkeiros Pétala Lopes, MC Mano Feu e Luiza Fazio, no clipe de Linguadinha na XXT, que pode ser constrangedor para os mais recatados ou conservadores.

Uma das salas abriga um beco com fotografias. Faustino conta que a primeira coisa que lhe ocorreu, quando soube que a exposição teria esse elemento, foi a referência de um lugar sufocante. “Aí, uma mulher trans do nosso grupo virou e disse: ‘Mas também pode ser libertador’. Eu falei: ‘Como libertador?’ Ela respondeu: ‘Quando eu era pequena, estava na favela tal, com a minha tia, eu pulava da janela do quarto e caía no beco. Saía do beco e, de repente, encontrava espaço livre. Então, o beco, para mim, era o caminho da liberdade'”, relata. 

“Eu disse: ‘Olha, a gente está olhando a favela do lado de fora. E você está me dando o olhar de dentro’. Achei maravilhoso”, emenda. 

A palavra “favela” tem relação com o Morro da Favela, hoje chamado de Morro da Providência, no Rio de Janeiro, e que fez parte do contexto da Guerra de Canudos. A etimologia, ou seja, origem do termo, é também lembrada na exposição Sobre Vivências, na forma da planta denominada faveleira, agora estruturada com madeira e um material inusitado em sua copa.

A ideia foi de um coletivo de artistas. “O coletivo olha e me diz: ‘Vamos fazer a copa dessa árvore em crochê. Aí, vira uma árvore estilizada. No tronco, foram feitos em pirografia nomes relacionados às nossas ancestralidades. Ou seja, não tem espinhos. E por que não tem espinhos? Porque nossos ancestrais já apararam. Então, hoje, favela, que nasceu como carência, passa a ser potência'”.

A entrada é gratuita e as exposições no Museu das Favelas poderão ser visitadas até fevereiro do ano que vem.

Senado aprova recursos para regularizar favelas e áreas de invasão

O projeto de lei que destina 2% dos recursos do Programa Nacional de Habitação Urbana (PNHU) para a regularização de favelas e áreas de invasão em grandes cidades foi aprovado nesta quinta-feira (5) pelo plenário do Senado Federal.

O apoio técnico e financeiro às iniciativas de regularização fundiária de assentamentos urbanos está previsto no projeto de lei da Câmara dos Deputados (PLC 64/2016), da deputada federal Soraya Santos (MDB-RJ). A proposta segue, agora, para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Soraya afirma que o programa do governo federal Minha Casa Minha Vida não incorporava a regularização fundiária ao programa, o que prejudicava a destinação de recursos federais para essa política, uma vez que a iniciativa é direcionada apenas à produção de novas unidades habitacionais.

Para a deputada, a regularização fundiária promove o direito à cidade, que “envolve muito mais que a construção de casas”.

Entre as medidas previstas no projeto, estão a garantia de apoio técnico e financeiro para as ações de regularização e a proibição do contingenciamento desses recursos. O texto ainda reserva 2% da verba do PNHU para oferta pública de recursos destinados à subvenção econômica em municípios com até 50 mil habitantes. 

Regulamentação

De acordo com o projeto aprovado, após a sanção, caberá ao Poder Executivo definir regras específicas para seleção dos beneficiários dos recursos destinados pelo projeto.

O regulamento também deve criar regras para a contratação dos financiamentos nas ações de regularização.

*Com informações da Agência Senado

Lula lança programa de urbanização de favelas Periferia Viva

Foi uma conquista bastante comemorada quando a creche Semeando Esperança, na comunidade de Santa Luzia, no Distrito Federal, conseguiu comprar, com doações, uma geladeira nova para atender as necessidades de 30 crianças de famílias em situação de vulnerabilidade no local.

O problema é que, na hora da compra, o diretor da creche, Paulo Lafayete, não tinha o CEP ou endereço formal, como tantas outras favelas brasileiras. Foi necessário dar o código postal de uma pessoa conhecida. “É muito ruim. Todos aqui se sentem excluídos”, disse o educador. Na comunidade, vivem cerca de 20 mil pessoas.

Esse é apenas um dos problemas que o Programa Periferia Viva, lançado nesta quinta (28), pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ministros, tenta reduzir. O projeto CEP para Todos integra o programa e prevê que todas as moradias em favelas tenham código postal até 2026.

O governo federal anunciou que vai investir mais de R$ 7 bilhões em urbanização de favelas, prevenção de desastres em encostas, melhorias habitacionais e regularização fundiária.

“Ficam com o que resta”

No lançamento da política pública, o presidente Lula explicou que o principal fundamento do programa é o de tornar a periferia visível. “Tem gente que pode escolher a sua profissão. Mas tem outra parte da sociedade que fica com o que resta. Da mesma forma, há uma parte do povo que escolhe onde morar. E outros ficam com o que resta”, emocionou-se o presidente.

Nesse contexto, Lula lamentou que 4,5 milhões de casas ainda não têm um banheiro. “Eu não imaginei que isso poderia acontecer em 2024. Eu morei em uma casa na Vila Carioca [São Paulo] com 27 pessoas. Nessa casa, não tinha água encanada, nem banheiro com privada. A gente também não tinha geladeira. Eu sei como é a vida daqueles que não têm direito”, afirmou.

O presidente lembrou que o investimento em políticas públicas tem sido com bastante planejamento, uma vez que o governo busca também contenção de despesas. “A gente não pode gastar mais do que o Orçamento”.  Ele defendeu a isenção de Imposto de Renda para pessoas que ganham até R$ 5 mil e, para equilíbrio das contas, defendeu cobrar mais imposto das pessoas “mais ricas”. “Vamos tentar tornar o país um pouco mais justo, humano e fraterno”.

Ele argumentou que as periferias brasileiras foram colocadas em segundo plano historicamente.  “Vocês não serão mais invisíveis. Nós enxergamos vocês.”

Estratégias

No evento, o governo divulgou contratações de R$ 1,4 bilhão em obras de contenção de encostas e R$ 3,3 bilhões em ações de urbanização de favelas, ambas previstas no Novo PAC.

O Executivo defendeu que esse seria o maior pacote de políticas públicas para as periferias do país. O programa Periferia Viva reúne investimentos em infraestrutura urbana realizados pelo Ministério das Cidades e ações de outros 16 ministérios parceiros.

O programa Periferia Viva prevê um pacote de ações para a elaboração de 120 planos municipais de redução de riscos em municípios críticos, com foco em propor obras que reduzam os riscos nas periferias dessas cidades.

Segundo o governo, a perspectiva é que, até 2026, todos os municípios que tenham favelas (em áreas de risco alto ou muito alto) sejam beneficiados com planos municipais de Redução de Riscos financiados pelo governo federal, com investimento de R$ 63 milhões. Além disso, 19 mil contratos de regularização fundiária e melhorias habitacionais, em oito estados brasileiros, terão investimento federal superior a R$ 85 milhões.

Outra ação anunciada foi um convênio entre o Ministério das Cidades e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)  para viabilizar pesquisas e produção de dados sobre favelas e periferias brasileiras.

Reconhecimento

O programa também reconheceu iniciativas sociais nas periferias. Entre eles, o da pernambucana Joyce Paixão, que atua às margens do Rio Capibaribe. “A gente fez um plano de adaptação, e com presença e mitigação para os efeitos das chuvas.”

Outro premiado foi o Favela Gastronômica, da brasiliense Cleide Morais. Trata-se de uma escola de gastronomia social que promove segurança alimentar, combate o desperdício de alimentos nas periferias e gera soluções sustentáveis para enfrentar a fome e reduzir as desigualdades sociais. “Há mais de 20 anos esse trabalho começou e tivemos nossos objetivos reformulados em 2020, durante a pandemia da covid-19″, destacou ela.

“O projeto foi proposto por mulheres da comunidade, do bairro Nossa Senhora de Fátima, em Planaltina [DF]. As pessoas beneficiadas são moradoras das periferias, que vivem em situação de vulnerabilidade. “A gente promove essas formações na área da gastronomia para serem inseridas no mercado de trabalho formal e abrirem o próprio negócio. O projeto está voltado especialmente para as mulheres negras, que são as que mais sofrem de insegurança alimentar”, explicou.

G20 Favelas: segurança e saúde são demandas globais das periferias

Após debates em mais de 3 mil conferências com representantes de favelas, de comunidades e de periferias em municípios e estados do Brasil, além de outros 48 países, a Central Única das Favelas (Cufa) preparou um documento com as demandas desses territórios que será apresentado às lideranças globais do G20 – grupo que reúne as principais economias do mundo, além da União Europeia e União Africana.

O trabalho é fruto da criação do G20 Favelas pela Cufa, com a participação da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) e da London School Economics.

O fundador da Cufa, Celso Athayde, conta que durante os encontros algumas diferenças de demandas ficaram evidentes: enquanto em algumas comunidades constatou-se a necessidade de implantar, por exemplo, linhas de trabalho em presídios – por causa do número de parentes e filhos dependentes de apenados nas comunidades –, em outras o maior problema era a falta de água potável.

Em entrevista à Agência Brasil, Celso Athayde – que também é presidente do Conselho da Cufa e CEO do Favela Holding (conjunto de empresas que sustenta a Cufa) – explica que apesar da diversidade, foi possível observar questões comuns que atingem essas populações.

“A gente fez as conferências [3.007, no total] das favelas nas cidades, depois nos estados, a nacional e a internacional, para trazer aquilo que é mais presente na vida de todos e não apenas o que é mais importante pontualmente. Pelo que eu vi, acho que questões relacionadas à segurança e à saúde são as demandas globais mais expressivas; além da desigualdade, porque em um espaço físico desigual, a desigualdade acaba se desdobrando em fome e desemprego, e faz com que a agenda global precise olhar para isso”.

Letícia Gabriella é coordenadora-geral do G20 Favelas – Letícia Gabriella/G20 Favelas

“Dentro desse processo a gente teve um encontro com as semelhanças. Têm algumas coisas que as favelas passam no Brasil e as favelas do mundo também têm a mesma conexão. Por exemplo, a questão da violência e da discriminação e a questão do combate à fome foram duas pautas que a gente entendeu que são muito parecidas dentro dessa relação do Brasil e fora do Brasil também”, completou a coordenadora-geral do G20 Favelas, Leticia Gabriella da Cruz Silva, à reportagem.

O coordenador-geral do G20 Favelas, Gabriel Oliveira, informou que mais de 50% das pessoas que participaram das conferências afirmaram que é fundamental discutir o combate à pobreza, à fome e às desigualdades sociais. Para ele, este foi o tema que gerou maior interesse das pessoas e mais contribuições e possibilidades de soluções.

“Ainda é um tema central e isso é emblemático. A gente está no ano de 2024, no século 21 e enquanto se debate se a inteligência artificial vai ou não beneficiar o mundo, a gente ainda tem pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza e extrema insegurança alimentar, pessoas que ainda não conseguem ter o mínimo básico de saneamento público, acesso à água potável, à moradia com equipamento de qualidade, com alvenaria correta para situações de extremo frio, extremo calor, todas essas alterações climáticas que a gente tem visto cada vez mais frequentes no mundo”, disse Oliveira à Agência Brasil, lembrando que erradicar a fome e a pobreza no mundo é o primeiro Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) da ONU e até agora tem apenas16% das metas cumpridas.

G20 Favelas

O G20 Favelas é uma das instâncias que compõem o G20 Social, iniciativa proposta pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para ouvir a sociedade civil na definição de políticas públicas entre integrantes do grupo.

O anúncio do presidente brasileiros ocorreu em setembro de 2023, na 18ª Cúpula de Chefes de Governo e Estado do G20, em Nova Delhi, na Índia, quando o Brasil assumiu a presidência do bloco. O Brasil faz parte do G20 desde a sua criação em 1999.

“A gente atuou dentro de 49 países discutindo sobre temas calcados na parte de sustentabilidade, direitos humanos, combate às desigualdades e à fome e também apontando os desafios globais das favelas”, disse a coordenadora, completando que a Cufa atua há mais de 20 anos nesses territórios, defendendo o empoderamento e a potência dessas comunidades no centro desse debate global.

“A CUFA tem esse trabalho de mais de 20 anos nas cidades brasileiras e temos capilaridade em todos os estados do Brasil. A gente fez uma formação com as lideranças estaduais para que elas pudessem realizar as conferências. O pontapé inicial foi no Complexo da Penha, no Rio de Janeiro, quando a gente lançou o processo”, conta Letícia Gabriella.

“O nosso desafio foi fazer um movimento contrário ao do G20: levar as conferências até as favelas, porque infelizmente há falta de acesso e de informação. As pessoas que moram em territórios de favela e de periferia dificilmente sabem o que significa uma conferência e a importância de uma conferência. A gente foi a esses territórios explicar a importância do G20 e fazer os debates.”

Avançados

Gabriel Oliveira: segurança e combate à fome são demandas das periferias – Gabriel Oliveira/Arquivo pessoal

Para Gabriel Oliveira, como as realidades das periferias dos países que compõe o G20 são muito distintas, qualquer comparação sobre o atendimento das demandas dessas comunidades seria um equívoco

“A gente foi para a França e Suécia, países considerados desenvolvidos e eles também têm as mesmas questões de moradias e saneamento básico. Lógico que a proporção não chega a ser igual, mas ainda assim são verificadas situações, especialmente, depois de migrações principalmente de regiões da Ásia e do Norte da África para o norte da Europa”, explica o coordenador-geral do G20 Favelas.

“É difícil parametrizar quem está mais avançado nessas demandas. Acho que a agenda demonstrou que todos os continentes precisam de algum tipo de atenção em tudo que foi debatido e discutido nas nossas conferências. Aí o nosso ponto central não é tanto quem está à frente, mas como a gente democratiza as formas de combate e a informação e estratégia de solução desses problemas.”

Para Gabriel Oliveira, mesmo nos países ditos “de primeiro mundo”, o desequilíbrio social exige o desenvolvimento de projetos sociais para atender essas comunidades que vivem em territórios periféricos, especialmente nos últimos 20 anos, quando houve um processo de migração por conta da fome, da violência, da perseguição política, de crises globais e guerras: “esses problemas começam a acontecer com maior intensidade”.

Continuidade

O coordenador-geral considera um avanço a proposta brasileira de criação do G20 Social, mas ressalta, a importância de que esse projeto tenha continuidade.

“Não adianta o Brasil fazer o G20 Social e abrir a participação da sociedade civil e na próxima cúpula na África do Sul não existir mais a possibilidade da sociedade civil se inserir”, disse Gabriel Oliveira, acrescentando que essa participação social enriquece o debate, com novos pontos de vista e de atenção.

Communiqué

O documento final elaborado pela Cufa, pela Unesco e London School Economics, recebeu o nome de Communiqué e será apresentado nesta quinta-feira (14), às 10h, no Boulevard Olímpico, região portuária do Rio. Nos próximos dias 18 e 19 será entregue aos líderes do G20 pelo presidente Lula.

STF inicia análise da ADPF das favelas do Rio de Janeiro

O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou há pouco a sessão que vai analisar o processo que trata da letalidade policial no Rio de Janeiro.

O Supremo julga a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n° 635, conhecida com ADPF das Favelas. Na ação, que foi protocolada em 2019 pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), a Corte já determinou medidas para reduzir a letalidade durante operações realizadas pela Polícia Militar do Rio contra o crime organizado nas comunidades da capital fluminense.

Com a ADPF, a Corte já obrigou o uso de câmeras corporais nas fardas dos policiais e nas viaturas, além da determinação de aviso antecipado das operações para autoridades das áreas de saúde e educação para proteger escolas e unidades de saúde de tiroteios entre policiais e criminosos. Agora, o caso é julgado definitivamente. 

Não haverá votação na sessão de hoje. O plenário dará início à leitura do relatório do caso, documento que resume o histórico da tramitação do processo, e às sustentações orais das partes envolvidas no processo. Os votos dos ministros serão proferidos em uma sessão que será marcada posteriormente.

A modalidade de julgamento foi criada pelo presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso. O ministro se inspirou na Suprema Corte dos Estados Unidos, na qual os juízes ouvem as sustentações das partes envolvidas no processo antes de apresentar os votos na sessão.

Diversos representantes de entidades envolvidas no tema vão subir à tribuna e apresentar argumentos sobre a questão, como a Defensoria Pública do Rio de Janeiro, partidos políticos, entidades que atuam em prol dos direitos da população negra e representantes do governo do Rio.

Falta de serviços básicos preocupa periferias, aponta G20 Favelas

A principal preocupação dos moradores de favelas é a falta de acesso a serviços básicos e a instituições estatais adequadas, que resultam em escassez e precariedade da infraestrutura estatal, o que é uma marca central desses lugares. 

Essas ausências fazem parte da vida cotidiana dessas comunidades, que na sequência se preocupam com segurança comunitária, transporte, educação, saúde e acesso às artes e aos esportes. 

A análise faz parte das conclusões do Communiqué G20 Favelas, documento que sintetiza as diretrizes e recomendações às lideranças do G20, para o desenvolvimento sustentável e inclusivo das favelas, com destaque para a importância desses territórios serem protagonistas no cenário global.

O Communiqué foi elaborado pela Central Única das Favelas (Cufa), com a Unesco e a London School Economics, a partir de debates em 3.007 conferências realizadas em cidades do Brasil e de mais 48 países, onde a organização social está presente. 

O documento será entregue ao G20 Social nesta quinta-feira (14). Hoje (13), entretanto, a Cufa fez um pré-lançamento na sua sede, no Conjunto de Favelas da Penha, na zona norte do Rio de Janeiro. Nessa comunidade, os debates tiveram início no dia 29 de abril deste ano e a intenção foi fechar o círculo com a apresentação no mesmo local.

O documento, que será apresentado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva às lideranças na reunião de cúpula do G20, que vai ocorrer nas próximas segunda-feira (18) e terça-feira (19), chama a atenção que “as favelas e as comunidades periféricas identificam a precariedade institucional como uma das principais áreas em que devem ser desenvolvidas políticas públicas voltadas aos direitos humanos e à redução da desigualdade”. 

O Communiqué pede aos líderes do G20 investimentos em políticas públicas que garantam o acesso universal a serviços estatais básicos nas favelas e comunidades periféricas, incluindo transporte público, saúde e educação. “As ações podem incluir a melhoria de hospitais e centros de saúde ao nível de outras regiões da cidade, comprometendo empresas privadas de saúde apoiadas por fundos públicos a oferecer serviços nas comunidades das favelas”.

Outra demanda das populações de periferias é o reconhecimento da necessidade urgente de se ter segurança comunitária nos territórios, além de apoio às vítimas de crimes e da violência com a instalação de centros de apoio com assistência psicológica, social e jurídica. 

O G20 Favelas aponta ainda dificuldades de mobilidade. As comunidades pedem transporte dentro das favelas “para melhorar o acesso ao trabalho, à educação e ao lazer, bem como o direito de ir e vir na cidade”.

O documento pede apoio à educação dentro da favela, acompanhando os jovens moradores em suas jornadas de decisão e instrução para que permaneçam na escola, e deem foco a programas que visem apoiar a díade mãe-bebê e educar para o desenvolvimento infantil e atenção à primeira infância.

Discriminação e estigma

 

Para moradores das favelas, a realidade da discriminação e do estigma é uma preocupação tão grande quanto a precariedade das instituições e dos serviços dentro desses territórios. 

O documento aponta que as comunidades são expostas a um nível de discriminação e estigma que começa com indicadores socioeconômicos, com a fragilidade dos serviços prestados pelo Estado e com a dificuldade de engajar prestadores privados para trabalharem nas favelas. “No dia a dia, as pessoas desses territórios são moldadas por representações negativas da favela e da identidade de serem moradoras de favela”.

“Ser da favela, morar na favela e transitar pela cidade marcado(a) socialmente pela favela são fatos que criam uma identidade construída pela discriminação e pelo estigma, desafiando o direito dos moradores a uma autointerpretação positiva. O estigma associado às favelas continua sendo um determinante importante da vida nesses territórios, criando interseccionalidades com múltiplas identidades”.

Mulheres

Nesse cenário, conforme o G20 Favelas, as mulheres são atingidas diretamente. “A posição das mulheres, especialmente a de mães solteiras e mulheres negras, é uma preocupação chave nas experiências de estigma. Trabalhamos para transformar essas lentes negativas e revelar o potencial, a atuação e a resiliência das favelas, enfatizando a importância de se reconstruir a autoestima e a contribuição dessas comunidades para a sociedade”.

Diante dessa realidade, o Communiqué convoca os líderes do G20 a trabalharem com as favelas e comunidades periféricas na realização de campanhas educacionais que combatam as representações negativas sobre esses moradores e que eduquem o público sobre o valor e a importância dessas comunidades para as cidades e para a sociedade como um todo. 

O resumo das conferências pede também que os governantes desenvolvam “políticas que impeçam o setor privado de discriminar e excluir os moradores desses territórios de processos de recrutamento e seleção de empregos com base em seu endereço”.

Além disso, querem que os líderes reconheçam a importância de se combater a discriminação e a violência contra mulheres, especificamente contra mulheres negras; querem a criação de políticas de apoio às mães solteiras e suporte por meio da educação, da saúde e da segurança social.

“A segurança, a educação e o empoderamento das mulheres sustentam a segurança, a educação e o empoderamento de muitos outros indivíduos, da comunidade como um todo e das gerações futuras”, diz o documento.

Racismo

Outro ponto do documento é que os governantes enfatizem que não há lugar para o racismo e para a discriminação de qualquer tipo em suas sociedades, “educando-as para os direitos e para a humanidade dos moradores de favelas; e promoverem a solidariedade e a igualdade de oportunidades para os moradores, independentemente de raça, gênero, orientação sexual, capacidade física e religião”.

Direitos Humanos

Conforme o documento, a educação sobre os direitos humanos passa pela criação de espaços seguros para pessoas de diferentes orientações sexuais, raças, gêneros, religiões e habilidades se encontrarem, incluindo o desenvolvimento de programas educacionais em escolas e programas de conscientização para as comunidades e para a sociedade em geral. Quanto aos direitos das minorias religiosas e às práticas relacionadas às tradições culturais ancestrais das comunidades, como as tradições afro-religiosas no Brasil, pedem que seja incentivado o entendimento e o respeito pelas práticas religiosas dessas parcelas da população.

Sustentabilidade

A inclusão em ações de sustentabilidade é mais uma demanda. O documento afirma que “a mudança climática e a pobreza urbana colidem de múltiplas formas, afetando de maneira desproporcional e injusta as favelas e as comunidades periféricas”.

Conforme apontou, mais de um bilhão de residentes de favelas e assentamentos informais em todo o mundo “sofrem desproporcionalmente o peso do aquecimento global, sendo os mais expostos às consequências de padrões de chuva alterados, erosão e aumento da temperatura. A precariedade da infraestrutura urbana nesses territórios agrava, ainda mais, sua vulnerabilidade. Enchentes e deslizamentos causam danos permanentes aos meios de subsistência e às habitações dessas comunidades. A falta de serviços públicos adequados obriga muitas pessoas a recorrerem a estratégias de sobrevivência insustentáveis, como o corte de árvores e a construção em áreas sujeitas à erosão”.

O Communiqué observa ainda que a coleta seletiva de lixo e a segurança alimentar, especialmente o acesso a alimentos frescos e com valores acessíveis, são questões centrais para as favelas. “As comunidades exigem soluções urgentes nessa direção, com investimentos em infraestrutura verde e o compromisso dos governos e líderes com a deliberação participativa para a criação de políticas sustentáveis interligadas à redução das desigualdades”.

Também nessa área, além das melhorias em infraestrutura de coleta e reciclagem de lixo nas favelas, regiões ribeirinhas e comunidades periféricas, por meio da implementação da coleta seletiva em pontos acessíveis às comunidades, pedem a criação de programas educacionais que enfoquem a conscientização ambiental e o treinamento para ações sustentáveis adequadas à realidade das comunidades. Querem também o desenvolvimento de políticas para eliminar a insegurança alimentar, enfrentando o desafio dos “desertos alimentares”. 

O G20 Favelas pede recursos para a criação e a alocação de terras para hortas comunitárias, onde “os moradores possam cultivar vegetais e frutas frescas e desenvolver uma economia circular”; e a instalação de infraestruturas verdes, como cisternas para a captação de água da chuva, painéis solares e saneamento ecológico.

Desenvolvimento

O G20 Favelas considera que a combinação da precariedade dos serviços e das instituições com a discriminação e o estigma enfrentados pelas comunidades de favelas, provoca a falta de oportunidades e um ambiente desfavorável para impulsionar o desenvolvimento socioeconômico. “As comunidades das favelas têm plena consciência da presença do ‘Estado mínimo’ em suas vidas cotidianas e demonstram maior conscientização sobre a importância de se criar estruturas e capacidades que possam gerar desenvolvimento socioeconômico em seus territórios”.

As principais preocupações dos moradores são o treinamento profissional e educação, empregabilidade, fortalecimento da economia da favela e aproveitamento de seu poder interno, “com ênfase em questões como a reintegração de ex-presidiários na sociedade e o desenvolvimento de oportunidades econômicas com base nos recursos e nas capacidades dos próprios moradores”.

O documento informa que a Cufa e sua ramificação, a Favela Holding, trabalham para criar motores de desenvolvimento socioeconômico para as favelas, e são exemplos que devem ser seguidos. Pede aos líderes do G20 que “garantam investimentos em capacitação e treinamento profissional para os jovens das favelas; criem programas para o desenvolvimento profissional de mães solteiras, que representam a maioria dos principais provedores e chefes de família nas comunidades; invistam na capacitação de empreendedores sociais nas favelas, com ênfase em atividades que promovam o orgulho e a autoestima nesses territórios”. Quer ainda a criação de projetos de incentivo ao turismo comunitário, com foco no desenvolvimento sustentável, nas economias criativas e no empoderamento da comunidade.

Urbanização

De acordo com o Communiqué, as favelas e os assentamentos informais resultam do crescimento urbano e fazem parte da realidade das cidades no mundo em desenvolvimento. O documento relata questões que se sobrepõem significativamente à mudança climática e à insegurança ambiental nos territórios de favelas, onde os moradores sabem dos perigos de enchentes, deslizamentos de terra e grandes incêndios. 

“Para as favelas, a urbanização continua sendo um grande problema, com a maioria das comunidades enfrentando a falta de saneamento adequado, iluminação, pavimentação e ausência de espaços de lazer, como parques. Habitações irregulares são comuns e uma grande preocupação para seus moradores”.

“A Cufa busca enfatizar as soluções criativas desenvolvidas pelas comunidades das favelas; reconhece que as favelas não desaparecerão no futuro próximo e acredita que a formulação de políticas para melhorar seu habitat deve ser realizada em parceria com as comunidades locais e de modo a aprender com as soluções criadas pelos próprios moradores”, aponta, acrescentando nas recomendações aos governantes que “comprometam institutos de pesquisa nacionais, como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) brasileiro, a firmarem parcerias com as comunidades para mapear a realidade desses territórios, a fim de obter evidências sólidas e fundamentadas para orientar o desenvolvimento de políticas de urbanização”.

Desigualdades

O documento ressalta que o combate à desigualdade continua sendo uma preocupação central das favelas e das comunidades periféricas. “A desigualdade é vivenciada, antes de tudo, como pobreza e pela necessidade de se ter acesso à renda básica e à alimentação. Tanto a renda básica quanto o combate à fome ilustram bem as prioridades estabelecidas por essas comunidades em relação às desigualdades. Tais prioridades são expressas em relação à importância da democracia participativa no enfrentamento das desigualdades”.

A luta contra a desigualdade, para o G20 Favelas, é também “marcada pela necessidade de ações afirmativas, direitos trabalhistas, uma rede de segurança social e acesso às artes, todos elementos vistos como partes essenciais da luta contra a desigualdade”. E pede reconhecimento da importância “de uma renda básica e da luta contra a fome nas favelas e periferias, apoiando assim os fluxos de renda e entrada de recursos nesses territórios por meio de programas que garantam suporte e transferências de renda emergenciais, especialmente para aquelas pessoas em condição de extrema pobreza”.

O G20 Favelas quer ainda que seja facilitada a participação das comunidades e de seus representantes nos processos de tomada de decisão, relacionados à formulação de políticas voltadas para esses territórios “e desenvolvam protocolos de consulta que incorporem as vozes das favelas e periferias nos debates sobre questões que afetam essas comunidades”. Também no combate à desigualdade pede o investimento no trabalho cultural das favelas e garantia de acesso a espaços de arte e esporte.

Violência policial

O policiamento e a violência policial que impactam o dia a dia das comunidades, é um dos principais temas levantados pelas comunidades das favelas. “Experiências de violência, discriminação e falta de confiança na polícia são recorrentes nessas áreas. A exposição à violência e ao crime é uma experiência frequente na vida de seus moradores; faz parte do seu cotidiano e pertence ao conhecimento implícito que eles têm sobre suas comunidades. A maioria dos residentes desses territórios já foi diretamente afetada pela violência policial e manifesta a importância de se reformar a polícia por meio da introdução de novos marcos legais para o policiamento e, mais relevante ainda, treinar as forças policiais e modificar atitudes e percepções negativas que estas têm sobre aqueles”, relata o documento.

Para solucionar esse problema, o G20 Favelas pede aos líderes que desenvolvam programas de policiamento comunitário com investimentos no treinamento de policiais comunitários, incluindo o conhecimento sobre direitos humanos, diversidade humana e as necessidades dos diferentes grupos, além da mediação de conflitos. Formem e treinem todas as forças policiais que atuam nas favelas em direitos humanos e nas consequências da prática do racismo no policiamento. Acabem com as políticas de hiper encarceramento, desenvolvendo outras que identifiquem formas alternativas de punição”.

Conclusões

No Communiqué, o G20 Favelas procurou identificar a realidade das comunidades de favelas da forma como é apresentada pelas vozes e pelas experiências cotidianas dos próprios moradores. “Ao fazer isso, a iniciativa foi guiada pela crença de que, apesar da precariedade de seu habitat e de sua infraestrutura básica, as favelas são espaços de potência, soluções, adaptação e vibração cultural.

“Esperamos que essas vozes inspirem os países do G20 em seus processos de tomada de decisões. O G20 Favelas está comprometido em trabalhar com todos os parceiros e líderes do G20 para contestar as representações negativas que ainda estão ligadas ao território das favelas e alavancar o potencial de seus habitantes, garantindo assim que eles tenham os recursos, as capacidades e o apoio necessários para realizar plenamente esse potencial”, concluiu.

Conferências

As 3.007 conferências realizadas para ouvir as comunidades sobre as questões que mais atingem as favelas, reuniram mais de 10 mil moradores de favelas e periferias. Eles participaram de discussões coletivas em quatro dimensões políticas: redução de desigualdades para a erradicação da fome e o combate à pobreza; sustentabilidade; desafios globais enfrentados pelas favelas e periferias; e direitos humanos, com recortes de gênero e raça.

Favelas

O documento destaca que, conforme a UN-Habitat 2022, mais de 1 bilhão de pessoas vivem em favelas e assentamentos informais em todo o mundo. “No Brasil, as favelas são o lar de cerca de 17,1 milhões de pessoas, que vivem em mais de 5 milhões de domicílios distribuídos em mais de 13,1 mil favelas (Data Favela, 2022; IBGE, 2020). A rápida urbanização, o planejamento ineficaz e a falta de habitação acessível são os principais fatores desses números, especialmente nos países em desenvolvimento. Se a tendência atual não for revertida, o futuro das cidades será marcado pelo que a ONU-Habitat chama de ‘mega favelas’, locais onde os moradores experimentarão múltiplas privações que impedirão a mobilidade socioeconômica e um futuro urbano melhor”.

Parceria

Há quase uma década, a Cufa tem atuado em parceria com a London School of Economics (LSE) e a Unesco em uma série de atividades de pesquisa e eventos internacionais que enfatizam a importância de entender e se associar de maneira eficaz com organizações de base das favelas, a fim de transformar comunidades e trajetórias de vida em territórios de exclusão. 

Uma questão central tem sido como alavancar o conhecimento, as ações e a experiência das comunidades de favelas para influenciar, em âmbito institucional, os formuladores de políticas públicas e políticas de Estado, informa o Communiqué, acrescentando que o pressuposto que orienta o trabalho é que “o reconhecimento da voz e do potencial das pessoas, da cultura e da economia das favelas são centrais para a luta contra a pobreza e as desigualdades, para o desenvolvimento de uma governança inclusiva, processos de tomada de decisões mais justos e eficientes, e um desenvolvimento social, econômico e ambiental sustentável.

STF começa a julgar processo sobre letalidade em favelas do Rio

O Supremo Tribunal Federal (STF) começa a julgar nesta quarta-feira (13) a ação conhecida como ADPF das Favelas, o processo que trata da letalidade policial no Rio de Janeiro.

O plenário dará início à leitura do relatório do caso, documento que resume o histórico da tramitação do processo, e às sustentações orais das partes envolvidas no processo. A data da votação será marcada posteriormente.

A modalidade de julgamento foi criada pelo presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso. O ministro se inspirou na Suprema Corte dos Estados Unidos, onde os juízes ouvem as sustentações das partes envolvidas no processo antes de apresentar os votos na sessão. 

Diversos representantes de entidades envolvidas no tema vão subir à tribuna e apresentar seus argumentos sobre a questão, como a Defensoria Pública do Rio de Janeiro, partidos políticos, entidades que atuam em prol dos direitos da população negra e representantes do governo do Rio.

O Supremo julga a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n° 635, conhecida com ADPF das Favelas. Na ação, que foi protocolada em 2019 pelo PSB, a Corte já determinou medidas para reduzir a letalidade durante operações realizadas pela Polícia Militar do Rio contra o crime organizado nas comunidades da capital fluminense.

Resultados

Com a ADPF, a Corte obrigou o uso de câmeras corporais nas fardas dos policiais e nas viaturas, além da determinação de aviso antecipado das operações para autoridades das áreas de saúde e educação, a fim de proteger escolas e unidades de saúde de tiroteios entre policiais e criminosos.

Segundo a nota técnica elaborada em julho deste ano pelo Supremo, as decisões liminares, que foram tomadas a partir de 2020, contribuíram para a diminuição da letalidade, conforme dados do Ministério Público do Rio.

Em 2020, 1,2 mil pessoas morreram durante intervenções policiais. No ano passado, o número passou para 871. Nos primeiros quatro meses de 2024, foram registrados 205 óbitos.

No caso das câmeras, 100% do efetivo do Batalhão de Operações Espaciais (Bope) já utiliza o equipamento. Mais 13 mil câmeras estão à disposição da PM do Rio.

A nota também sugere a fixação de uma meta anual de redução da letalidade policial, para tornar obrigatório o acompanhamento psicológico para policiais envolvidos em mortes durante operações.

Também foram sugeridos a criação de um protocolo para realização de operações em regiões próximas às escolas e unidades de saúde, o treinamento de policiais para atendimento médico à população e a criação de normas para garantir a participação dos familiares de vítimas nas investigações.

Censo revela quais são as 20 maiores favelas do país; veja a lista

Com mais de 72 mil moradores, a comunidade da Rocinha, na zona sul do Rio de Janeiro, é a maior favela do país. A constatação faz parte de um suplemento do Censo 2022, divulgado nesta sexta-feira (8) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O levantamento demográfico identificou no país 16.390.815 habitantes em 12.348 favelas, distribuídas por 656 municípios.

Os pesquisadores do IBGE consideram favelas e comunidades urbanas localidades com características como insegurança jurídica da posse, ausência ou oferta precária ou incompleta de serviços públicos, padrões urbanísticos fora da ordem vigente e ocupação de áreas com restrição ou de risco ambiental.

Se a Rocinha fosse uma cidade, os 72.021 moradores a colocariam como a 459ª maior do Brasil. Em 2022, o país tinha 5.570 municípios, ou seja, a Rocinha tinha mais habitantes que 5.112 cidades.

As 20 maiores favelas brasileiras agrupam 858,6 mil moradores, representando 5,2% do total da população residente em comunidades pelo país. Dessas mais populosas, oito estavam na região Norte; sete, no Sudeste; quatro no Nordeste; e uma no Centro-Oeste.

Veja a lista das 20 maiores em quantidade de moradores:

1) Rocinha – Rio de Janeiro (RJ), 72 021
2) Sol Nascente – Brasília (DF), 70 908
3) Paraisópolis – São Paulo (SP), 58 527
4) Cidade de Deus/Alfredo Nascimento – Manaus (AM), 55 821
5) Rio das Pedras – Rio de Janeiro (RJ), 55 653
6) Heliópolis – São Paulo (SP), 55 583
7) Comunidade São Lucas – Manaus (AM), 53 674
8) Coroadinho – São Luís (MA), 51 050
9) Baixadas da Estrada Nova Jurunas – Belém (PA), 43 105
10) Beiru / Tancredo Neves – Salvador (BA), 38 871
11) Pernambués – Salvador (BA), 35 110
12) Zumbi dos Palmares/Nova Luz – Manaus (AM), 34 706
13) Santa Etelvina – Manaus (AM), 33 031
14) Baixadas da Condor – Belém (PA), 31 321
15) Colônia Terra Nova – Manaus (AM), 30 142
16) Jacarezinho – Rio de Janeiro (RJ), 29 766
17) Vila São Pedro – São Bernardo do Campo (SP), 28 466
18) Cidade Olímpica – São Luís (MA), 27 326
19) Chafik / Macuco – Mauá (SP), 26 835
20) Grande Vitória – Manaus (AM), 26 733
 

Paraisópolis, favela localizada na zona sul paulistana. Foto: Espaço do Povo Paraisópolis

Domicílios

O Censo também traz o ranking das 20 maiores favelas em número de domicílios particulares permanentes ocupados. Elas representam 5,3% do total de 295.009 domicílios nas comunidades espalhadas pelo país.

Novamente, a Rocinha lidera o ranking com mais que o triplo de domicílios da 20ª colocada (Colônia Terra Nova, Manaus). Apenas as paulistas Vila São Pedro, Chafik/Macuco e Jardim Oratório não estão localizadas em capitais.

Veja a lista das 20 maiores em quantidade de domicílios:

1) Rocinha – Rio de Janeiro (RJ), 30 371
2) Rio das Pedras – Rio de Janeiro (RJ), 23 846
3) Sol Nascente – Brasília (DF), 21 889
4) Paraisópolis – São Paulo (SP), 21 442
5) Heliópolis – São Paulo (SP), 20 205
6) Coroadinho – São Luís (MA), 16 741
7) Cidade de Deus/Alfredo Nascimento – Manaus (AM), 15 872
8) Beiru / Tancredo Neves – Salvador (BA), 15 618
9) Comunidade São Lucas – Manaus (AM), 15 469
10) Pernambués – Salvador (BA), 14 649
11) Baixadas da Estrada Nova Jurunas – Belém (PA), 13 077
12) Jacarezinho – Rio de Janeiro (RJ), 10 936
13) Vila São Pedro – São Bernado do Campo (SP), 10 273
14) Zumbi dos Palmares/Nova Luz – Manaus (AM), 9 720
15) Baixadas da Condor – Belém (PA), 9 638
16) Santa Etelvina – Manaus (AM), 9 301
17) Jardim Oratório – Mauá (SP), 9 189
18) Chafik / Macuco – Mauá (SP), 9 158
19) Cidade Olímpica – São Luís (MA), 8 923
20) Colônia Terra Nova – Manaus (AM), 8 692

Extensão

O IBGE apontou também as favelas com maiores extensões territoriais. Nesse ranqueamento, o Censo ressalta que “não existia uma relação direta entre as áreas territoriais das favelas e comunidades urbanas e o número de residentes e de domicílios nesses territórios”.

Ou seja, ter mais área não significa necessariamente ter mais casas, assim como ter mais casas não é certeza de ter mais moradores. A Rocinha, por exemplo, apesar de ter o maior número de domicílios e de moradores, sequer consta na lista das 20 maiores favelas em extensão territorial.

Veja a lista das 20 maiores em área (quilômetro quadrado):

1) 26 de Setembro – Brasília (DF), 10,5
2) Sol Nascente – Brasília (DF), 9,2
3) Morro da Cruz I e II – Brasília (DF), 5,9
4) Invasão Água Limpa – Itabirito (MG), 5,7
5) Valéria – Salvador (BA), 5,5
6) Coroadinho – São Luís (MA), 5,4
7) Santa Etelvina – Manaus (AM), 4,8
8) Parque Estrela – Magé (RJ), 4,6
9) João de Barro – Boa Vista (RR), 4,6
10) Jardim Progresso – Natal (RN), 4,5
11) Cidade de Deus/Alfredo Nascimento – Manaus (AM), 4,3
12) Baía do Sol – Belém (PA), 4,2
13) Residencial Tiradentes – São Luís (MA), 4,2
14) Gapara – São Luís (MA), 4,1
15) Vila Nestor – São Luís (MA), 4,1
16) Nacional – Porto Velho (RO), 4,1
17) Santa Rita – Feira de Santana (BA), 4,0
18) Barra Alegre – Ipatinga (MG), 3,9
19) Comunidade São Lucas – Manaus (AM), 3,8
20) Água Boa – Belém (PA), 3,8

 

Quase 16,4 milhões de pessoas moram em favelas no Brasil, revela Censo

O Brasil tem 16,390 milhões de pessoas que moram em favelas e comunidades urbanas. Isso representa 8,1% do total de 203 milhões de habitantes no país, ou seja, de cada 100 pessoas, oito vivem nesses locais. Os dados fazem parte de um suplemento do Censo 2022, divulgado nesta sexta-feira (8) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A pesquisa apontou que há 12.348 favelas em 656 municípios Brasil afora.

Os pesquisadores do IBGE consideram favelas e comunidades urbanas localidades com características como insegurança jurídica da posse, ausência ou oferta precária ou incompleta de serviços públicos, padrões urbanísticos fora da ordem vigente e ocupação de áreas com restrição ou de risco ambiental.

Veja o perfil dos moradores de favelas

Até o Censo anterior, de 2010, o instituto adotava a expressão “aglomerados subnormais” para se referir às favelas. Em 2010, o IBGE tinha identificado 11,4 milhões de pessoas em 6.329 aglomerados subnormais, o que equivalia a 6% da população.
 

O IBGE detalhou que 43,4% dos moradores de favelas estão na região Sudeste. Arte/Agência Brasil

Os pesquisadores advertem que é preciso cuidado ao fazer a comparação entre 2010 e 2022, pois nesse intervalo de tempo aconteceram melhorias tecnológicas e metodológicas na identificação dos recortes territoriais.

A analista do IBGE Letícia de Carvalho Giannella explica que os avanços técnicos resultaram no mapeamento de áreas não identificadas anteriormente e no ajuste de limites. Dessa forma, ressalta ela, “a comparação entre o resultado das duas pesquisas apresenta limitações e não deve ser realizada de forma direta”.

“Quando a gente olha a variação de população, o aumento de território, sem essa crítica, o que pode parecer como um simples crescimento demográfico pode ser fruto, na realidade, de uma melhoria do mapeamento, das condições de classificações dessas áreas”, completa.

Distribuição

O IBGE detalhou que 43,4% dos moradores de favelas estão na região Sudeste. São 7,1 milhões. No Nordeste estão 28,3% (4,6 milhões); no Norte, 20% (3,3 milhões); no Sul, 5,9% (968 mil); e no Centro-Oeste, 2,4% (392 mil).

O estado de São Paulo tem a maior população de residentes em favelas, 3,6 milhões, seguido por Rio de Janeiro (2,1 milhão) e Pará (1,5 milhão). Os três estados juntos respondem por 44,7% do total de habitantes de comunidades do país. A maior favela é a Rocinha, no Rio de Janeiro, com 72.021 moradores.

Em proporção, o Amazonas tem a maior parcela de pessoas morando em favelas (34,7%). Isso equivale dizer que praticamente um em cada três moradores do estado vive em alguma comunidade.

O Amapá aparece na sequência com proporção de 24,4%. Pará (18,8%), Espírito Santo (15,6%), Rio de Janeiro (13,3%), Pernambuco (12%), Bahia (9,7%), Ceará (8,5%), Acre (8,3%) e São Paulo (8,2%) completam a lista de estados em que a proporção é maior que a média nacional (8,1%).

O Mato Grosso do Sul tinha a menor parcela de pessoas vivendo em favelas (0,6%), seguido por Goiás (1,3%) e Santa Catarina (1,4%).

Fenômeno urbano

O Censo observou que nas 26 grandes concentrações urbanas do país – espécie de região metropolitana que tenha mais de 750 mil habitantes – viviam 83,6 milhões de pessoas. Dessas, 13,6 milhões residiam em favelas, ou seja, 16,2%, o dobro da proporção de todo o país (8,1%).

O IBGE destaca também que os moradores das 26 grandes concentrações urbanas eram 41,2% do total da população brasileira, enquanto os moradores de favelas dessas regiões específicas somavam 82,6% do total de residentes em comunidades Brasil afora.

De acordo com a analista Letícia Giannella, a comparação é uma demonstração de que as favelas são um fenômeno marcadamente urbano. “É um indicativo que mostra a concentração dessas áreas e dessas populações nas regiões mais urbanizadas”, pontua.

As grandes concentrações urbanas com maior proporção de habitantes morando em comunidades eram Belém (57,1%), Manaus (55,8%), Salvador (34,9%), São Luís (33,2%), Recife (26,9%) e Vitória (22,5%). A concentração do Rio de Janeiro figurava na 11ª posição (14,8%); e a de São Paulo na 13ª (14,3%).

Já as grandes concentrações urbanas com os percentuais mais baixos eram Campo Grande (0,9%), São José dos Campos/SP (1%), Goiânia (1,5%) e Sorocaba/SP (1,8%).

 

Rio de Janeiro – Comunidade da Rocinha (Fernando Frazão/Agência Brasil)

 

Domicílios

O Censo 2022 identificou que 72,5% das favelas brasileiras tinham até 500 domicílios, enquanto 15,6% possuíam de 501 a 999, e 11,9% tinham mais de 1 mil domicílios.

Ao todo, o IBGE contou 6,56 milhões de domicílios nas favelas brasileiras, o que representava 7,2% do total de lares do país. Desses, 5,56 milhões foram classificados como domicílios particulares permanentes ocupados (DPPO), onde moram 99,8% da população de favelas.

A pesquisa mostra que o número médio de moradores dos domicílios em favelas era de 2,9 pessoas, levemente acima da média do total da população brasileira, 2,8. Em 2010, a média nas favelas era 3,5 pessoas; e a do país como um todo, 3,3.

Os recenseadores identificaram que 96,1% dos domicílios em favelas são casas, incluindo as de vila ou em condomínios. No total da população brasileira, a proporção é de 84,8%.

O IBGE coletou informações sobre as condições dos lares em favelas. Em relação ao abastecimento, identificou que 89,3% dos domicílios particulares permanentes ocupados tinham ligação com rede geral de distribuição. No total do país, esse percentual é menor, 87,4%.

Os pesquisadores fazem a ressalva de que o total do país inclui áreas rurais, que podem dispor de formas próprias de abastecimento de água, esgotamento e coleta de lixo, fazendo com que números relativos a características dos domicílios das favelas sejam melhores que o do total nacional.

Em relação ao esgotamento, 61,5% dos domicílios nas favelas tinham ligação com rede geral ou pluvial e fossa séptica ou filtro ligada à rede. No total do país, o percentual é de 65% nessas condições. Praticamente todos os lares em favelas (99%) tinham banheiro de uso exclusivo.

Enquanto no total do país 83,1% dos lares possuem coleta de lixo no domicílio, nas favelas o percentual cai para 76%. Para outros 20,7%, a destinação do lixo é via depósito em caçambas.

Estabelecimentos

As favelas brasileiras possuíam 958 mil estabelecimentos em 2022. A grande maioria, 616,6 mil, era classificada como “outras finalidades”, o que inclui atividades como comércio e serviço. Havia 50,9 mil estabelecimentos religiosos; 7,9 mil de ensino;  2,8 mil de saúde e 995 agropecuários. Cerca de 280 mil estavam em construção ou reforma.