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Jornalistas negras contam como enfrentaram racismo na carreira

Jornalistas profissionais negras que hoje estão em posição de destaque na mídia contaram nesta sexta-feira (26) como é enfrentar o racismo da sociedade para ocupar espaços onde são minoritárias.

A apresentadora Luciana Barreto, que já atuou nos canais Futura, GNT, BandNews e na TV Bandeirantes, e atualmente é âncora do Repórter Brasil, jornal da TV Brasil, contou como foi enfrentar a pobreza e o preconceito para se firmar na carreira.

Apresentadora da TV Brasil, Luciana Barreto. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

“Eu vivi várias situações e várias barreiras para chegar até aqui. Como chegar numa maquiagem de uma emissora e não ter maquiagem para pele preta. Para conseguir vaga de apresentadora, eu ouvi de uma amiga minha, que também estava concorrendo comigo, branca, dizendo quando eu passei: ‘Nossa, que legal que agora eles querem apresentadora negra”, relatou.

Luciana contou sua experiência no debate “Mulheres Negras na Mídia: Inovação e Impacto na Comunicação Pública” no Festival Latinidades 2024, que ocorre em Brasília. De acordo com a jornalista, foi na televisão que ela entendeu o problema com sua autoestima.

“Na televisão eu fui entender o quanto nossos sonhos são podados e violados. O quanto as crianças da década de 70, 80 e 90 sofreram profundamente com a sua autoestima, quanto elas foram impedidas de sonhar por conta da televisão brasileira”, completou, lembrando da falta de pessoas negras nas emissoras.

Também participou do encontro a jornalista Joyce Ribeiro, que hoje apresenta o Jornal da Tarde na TV Cultura e já trabalhou nos principais telejornais do SBT e da TV Record. Joyce foi ainda a primeira mulher negra a apresentar um debate presidencial, em 2018.

Jornalista Joyce Ribeiro (esquerda). Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

“Essa caminhada não foi recheada de facilidades. Muito pelo contrário. Ouvi falas muito duras, muito difíceis ao longo da carreira. Uma vez uma colega me deu uma sugestão, porque era muito minha amiga, dizendo que eu precisava pedir para sair [do trabalho] porque a gente trilhou um caminho grande para estar aqui e, para me preservar, eu tinha que pedir para sair, entre tantas outras coisas”, relembrou.

A jornalista colombiana Mabel Lorena Lara também contou sua experiência na televisão do país caribenho, destacando que alisava o cabelo e tentava esconder a própria personalidade na tentativa de ser aceita em um meio majoritariamente branco.

“Depois de muito tempo e de prêmios e reconhecimentos e de sair na televisão eu disse: ‘Essa mulher que vocês estão premiando como a melhor nas notícias, além disso, tem cabelo encaracolado’”, contou.

Jornalista colombiana Mabel Lorena Lara. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Lana acrescentou que decidiu soltar o cabelo depois que uma garota a questionou em Cartagena, na Colômbia. “Uma garota com seu cabelo natural perguntou: ‘Se você é a negra das notícias por que não se parece conosco?’”, completou. 

Mabel Lorena Lara foi premiada, em 2016, como líder inspiradora pelas Nações Unidas e pelo governo da Suécia. Ela foi ainda negociadora no processo de paz com guerrilhas colombianas.

“Essas experiências de racismo e machismo são amplificadas quando estamos na televisão. As pessoas têm um olhar muito específico em relação a gente, ao nosso corpo, ao nosso cabelo e a nossa bunda”, acrescentou.

O início

As três profissionais tiveram em comum a insegurança no começo da carreira. As três imaginavam que a mídia não era um espaço para elas. Segundo Luciana Barreto, a comunicação entrou em sua vida porque ela percebeu que o meio era uma ferramenta poderosa de transformação.

“Nós éramos muito periféricos e era um bairro até sem asfalto, sem saneamento básico nessa época, quando eu decidi fazer comunicação. Eu via que o jornalismo era uma ferramenta poderosa, mas era uma ferramenta utilizada para poucos”, explicou.

Segundo a apresentadora da TV Cultura, Joyce Ribeiro, o universo da comunicação lhe atraia muito, mas pensava que era algo distante de sua realidade.

“Não fazia parte do que eu achava que poderia sonhar. Isso já me colocava um certo receio em seguir essa carreira. A gente se arrisca em todas as profissões, mas no universo da comunicação, que sempre teve tão fechada à nossa presença, não me via”, contou.

Para a colombiana Mabel Lorena Lara, foi preciso construir uma autoestima e entender que a mídia é um local onde as mulheres negras também merecem estar.

“Em vários momentos eu pensei que não era um lugar para mim. No meu país, por décadas, as mulheres afros representam a servidão, um pouco de exotismo, a utilização dos corpos das mulheres como atraentes e pouco se falava nos meios de comunicação”, destacou.

Negras na mídia

Além do debate sobre a participação de mulheres negras na mídia, o Festival Latinidades 2024 criou o Prêmio Jacira da Silva, em homenagem a jornalista que foi a primeira negra a assumir a presidência do Sindicato dos Jornalistas do Distrito Federal, entre 1995 e 1998, e fundou a Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial (Cojira/DF).

Na categoria Jornalistas Negras, a gerente da Agência Brasil, Juliana Cézar Nunes, recebeu o prêmio ao lado de nomes como Maju Coutinho, da Rede Globo, e Basília Rodrigues, da CNN. 

Na categoria Mídias Negras, foram premiadas a Revista Afirmativa, a agência de notícias Alma Preta, o Instituto Cultne, o Mundo Negro e o Africanize, veículos de comunicação que priorizam e dão visibilidade às pautas ligadas à população negra brasileira.

Governo assina acordo para construção do Memorial da Luta pela Justiça

O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania firmou, nesta sexta-feira (26), acordo de cooperação técnica para a implantação do Memorial da Luta pela Justiça em São Paulo. O museu será instalado no prédio da antiga sede da Auditoria Militar, onde ocorreram julgamentos de crimes políticos durante a ditadura no Brasil, tornando o local um símbolo da repressão. O objetivo é que o memorial ajude a conscientizar presentes e futuras gerações para que crimes e injustiças do passado não se repitam.

Localizado na Rua Brigadeiro Luiz Antônio, o prédio será transformado em um equipamento sociocultural inédito, dedicado a projetos de pesquisa, educação e cultura. O memorial abrigará exposições, acervos, programas de visitação e debates, entre outras iniciativas, com o objetivo de resgatar, registrar e preservar a história das violações de direitos humanos no Brasil. As obras começam em meados de setembro, e a expectativa é a de que o prédio seja entregue em até dois anos.

A construção do memorial será feita por meio de parceria com a Secretaria de Relações Institucionais da Presidência, a Ordem dos Advogados do Brasil – Seção de São Paulo (OAB-SP) e o Núcleo Memória, organização dedicada à preservação da memória política no país. Diversos atores sociais contribuíram com o projeto, como profissionais do direito, ex-presos políticos, museólogos, arquitetos, historiadores e jornalistas.

O ministro Silvio Almeida e a presidente da OAB de São Paulo, Patricia Vanzolini, assinam acordo para construção do memorial – Rovena Rosa/Agência Brasil

 

O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, destacou que o trabalho das políticas de memória é trazer à tona e mostrar o significado do que o passado representou e como repercute no presente e no futuro. Segundo o ministro, o Brasil precisa muito desse trabalho, a exemplo de outros países, que também passaram por processos traumáticos.

“Isso não é pouca coisa. Pegar um espaço onde as pessoas eram julgadas, condenadas e onde houve prática de tortura, onde a tortura foi mais do que normalizada e transformar em um espaço de reflexão é muito importante. O Brasil é um país que não lida com seus traumas e as políticas de memórias são fundamentais para que possamos lidar com isso”, disse.

O ministro informou que outra iniciativa para estabelecer políticas de memória será a transformação da Casa da Morte em Petrópolis, no Rio de Janeiro, em museu. Segundo Silvio Almeida, também será criada no ministério uma comissão para acompanhar as recomendações da Comissão Nacional da Verdade, colegiado que investiga violações de direitos humanos ocorridas entre 18 de setembro de 1946 e 5 de outubro de 1988. “E, até o fim do ano, nós vamos estabelecer também o Centro de Memória e Documentação de Direitos Humanos, que é para preservar a memória do ministério”, acrescentou.

Mulheres Negras marcham contra o racismo e em defesa da vida em SP

Mulheres negras e movimentos sociais fizeram uma marcha, na noite desta quinta-feira (25), no centro da capital paulista, contra o racismo e em defesa da vida da população negra. A Marcha das Mulheres Negras ocorre todo dia 25 de julho, no Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha. 

“Mesmo sob governos progressistas, nossas vidas continuam sendo negligenciadas na dinâmica da governabilidade, que nos mata para garantir os lucros de grileiros do agronegócio e do capital”, diz o texto do manifesto lido por um grupo de mulheres no início do ato, na Praça da República.

O documento cita ainda que as mulheres negras são a maioria das vítimas dos feminicídios e da violência policial. “Já passou da hora de dar um basta”, acrescenta o texto.

O ato contou com a presença de diversos movimentos sociais, entre eles a Unidade Popular (UP), o Movimento Negro Unificado (MNU), o Craco Resiste, a Afronte! Juventude Sem Medo e a Marcha das Mulheres Negras de São Paulo.

“Todos os anos a gente pauta a conjuntura política. Esse, por exemplo, é um ano em que subiu a taxa de feminicídio, de mortes de mulheres. Em contrapartida, a gente não vê investimento na rede de segurança dessas mulheres. Emprego e renda, educação para os seus filhos, rede de abrigo para as mulheres vítimas de violência, delegacia da mulher 24 horas”, destacou a deputada estadual de São Paulo, Monica Seixas (PSOL), do Movimento Pretas. 

“Esse ano, a Marcha das Mulheres não tem vergonha em gritar pelo aborto legal. Mulheres negras são a maioria das que morrem tentando o aborto clandestino. Pelo direito de parir quando a gente quiser, por educação sexual, por ampla distribuição de contraceptivo. E aborto legal para não morrer em clínicas clandestinas é o que a gente pede hoje, é o que a gente sai em marcha hoje”, disse.

Tramita no Congresso Nacional projeto de Lei 1904/24, que equipara o aborto acima de 22 semanas de gestação ao homicídio, aumentando de dez para 20 anos a pena máxima para quem fizer o procedimento. A proposta tem sido alvo de críticas de organizações da sociedade civil. 

A manifestação em São Paulo integra o Julho das Pretas, calendário de atividades organizado pela Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras (AMNB), a Rede de Mulheres Negras do Nordeste e a Rede Fulanas – Negras da Amazônia Brasileira. A ação propõe a discussão e a articulação de um projeto de reparação histórica pelos danos causados pelo colonialismo e escravização dos negros.

No Rio, ministérios públicos pedem volta do atendimento a imigrantes

A interrupção há, pelo menos, duas semanas, do funcionamento do Centro de Referência e Atendimento ao Imigrante (Crai-Rio), no Rio de Janeiro, que prejudicou os serviços assistenciais prestados aos imigrantes, refugiados e apátridas em situação de vulnerabilidade levou os órgãos de defesa do cidadão a pedir que a prefeitura e a Secretaria Especial de Cidadania permaneçam com as políticas migratórias na agenda governamental.

Assinaram a recomendação conjunta os ministérios públicos Federal e estadual do Rio de Janeiro e as defensorias públicas da União e do Estado.

Criada em janeiro do ano passado, o Crai surgiu como o primeiro centro de acolhimento e cidadania para imigrantes na capital fluminense. Antes da suspensão do atendimento, por duas vezes, foi interrompido o pagamento de salários da equipe, o que provocou instabilidade no funcionamento e na continuidade dos serviços.

Além da abertura do centro, os órgãos pedem, com prazo para resposta estipulado em de 15 dias, que a prefeitura adote as medidas necessárias para retomar o funcionamento do local, com a plena execução de todas as atividades assistenciais prestadas à população de imigrantes, refugiados e apátridas, diz nota divulgada nesta quinta-feira (25) pelas instituições.

Em nota, a procuradora regional dos Direitos do Cidadão, Aline Caixeta, diz que é fundamental reconhecer as necessidades sociais dos imigrantes. Para ela, o centro de referência é um equipamento importante para garantir a proteção e integração da população imigrante, refugiada e apátrida. “Os atendimentos centralizados e especializados com informações para a regularização migratória, orientação jurídica e demais auxílios disponibilizados no Crai-Rio são determinantes para garantir o acesso dessa população aos direitos fundamentais e sociais”, diz ainda a nota.

Números

Dados do Portal de Imigração do Governo Federal indicam que o Rio de Janeiro é o segundo lugar (11,6%) que mais recebe imigrantes no Brasil, atrás apenas de São Paulo (31,5%). Conforme o Ministério Público Federal (MPF), a criação de um lugar adequado para acolher essa população veio após acordo de cooperação firmado entre a prefeitura do Rio e o Instituto Core Brasil, braço brasileiro da Core Community Organized Relief Effort, entidade internacional sem fins lucrativos que atua em favor de populações em situação de vulnerabilidade.

Segundo o MPF, o objetivo do centro é viabilizar a regularização migratória, oferecendo a essas pessoas acesso ao Sistema Único de Assistência Social, acompanhamento psicológico para enfrentar as dificuldades do processo de migração e refúgio, oferecimento de aulas de português e de informática e para promover integração social e econômica. O Crai também busca viabilizar o encaminhamento dos imigrantes para instituições que podem apoiar o atendimento de suas demandas, como Receita Federal, Polícia Federal e Sistema Único de Saúde (SUS), entre outras.

Em fevereiro deste ano, em consequência de decreto municipal, ocorreu a primeira suspensão do pagamento dos salários, que, depois de liberação orçamentária, foi retomado, afastando parcial e temporariamente o risco de prejuízo aos imigrantes, apesar dos serviços assistenciais passarem a funcionar de forma mais precária. No mês passado, o pagamento dos profissionais voltou a ser interrompido. No começo deste mês, uma diligência constatou que o centro estava fechado há pelo menos duas semanas.

“A criação dos Centros de Atenção para Migrantes nos Municípios constitui política pública específica inserida na pauta migratória, sendo certo que, embora não haja um modelo estabelecido na legislação a respeito do formato dos respectivos núcleos de atendimento, não se questiona a relevância do equipamento para a garantia do atendimento adequado e qualificado do público-alvo, destinatário dos serviços assistenciais”, destaca a recomendação das instituições de defesa do cidadão que firmam a nota.

Junto à recomendação, os ministérios públicos federal e estadual buscaram informações da Coordenadoria-Geral de Políticas Migratórias do Ministério da Justiça e Segurança Pública sobre a  elaboração da Política Nacional de Migrações, Refúgio e Apatridia, na forma do Artigo 120 da Lei 13.445/2017. Os órgãos pediram ainda a verificação de eventual medida de cooperação a ser adotada para o fortalecimento do equipamento municipal.

Governo cria agenda de combate à fome com foco em mulheres negras

O governo federal vai adotar uma série de ações de combate à fome com foco nas mulheres negras. O anúncio da agenda de medidas foi feito pela ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, nesta quinta-feira (25), no Rio de Janeiro. A data foi escolhida por ser o Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, criado para dar visibilidade a temas como violência, racismo e sexismo.

O conjunto de ações é uma parceria com o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) e soma R$ 330 milhões em investimentos. A iniciativa está no âmbito do programa Brasil sem Fome, do governo federal.

Durante o lançamento da agenda de enfrentamento à fome, hoje no Palácio Guanabara, sede do governo do Rio, Anielle explicou que a atenção especial às mulheres negras se dá por causa da maior situação de vulnerabilidade dessa população. “Setenta e cinco por cento das casas que estão com insegurança alimentar grave são de pessoas negras. Nas casas chefiadas por mulheres negras, 40% são afetadas pela fome de alguma forma.”

Insegurança alimentar grave é quando a pessoa está sem acesso a alimentos e passou um dia ou mais sem comer.

O programa tem frentes que preveem investimento na formação de gestores e profissionais do Sistema Único de Assistência Social (Suas) e do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan) e estudos e pesquisa de dados.

“A gente precisa dos dados para que saber onde está [a população vulnerabilizada] e aonde queremos chegar”, disse Anielle.

A ministra informou que haverá esforços para aprimorar cadastros de populações tradicionais e específicas. “Chegar a esses territórios especificamente para a gente é importante: favelas, periferias quilombolas, povos de terreiros e matriz africana”, listou.

Outra ação é o fomento de cozinhas solidárias e projetos liderados por mulheres negras. “Quem sabe melhor resolver o problema da fome é quem está no dia a dia com isso”, afirmou Anielle.

Lembrando uma citação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que “enquanto houver família sem comida na mesa, crianças nas ruas e jovens sem esperança, não haverá paz”, a ministra defendeu o direcionamento de recursos públicos para o combate às desigualdades. “A gente lança essa agenda com muita certeza de que cada real investido para enfrentar a desigualdade retorna à sociedade, multiplicando a qualidade de vida e direitos”, declarou.

Rio adere ao Brasil sem Fome

Castro quer mais restaurantes populares no Rio – Tomaz Silva/Agência Brasil

 

O evento marcou também a adesão do governo do Rio de Janeiro ao Plano Brasil sem Fome, lançado há um ano pelo governo federal.

Com a formalização, que não envolve transferência de recursos, o estado se compromete com uma série de medidas que buscam acabar com a situação de insegurança alimentar e nutricional grave.

O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, manifestou intenção em aumentar o número de restaurantes populares, que oferecem refeições pelo preço de R$ 1. Atualmente existem 12. “O meu sonho é que ao final do meu mandato [2026] sejam pelo menos entre 35 e 40”, disse.

Castro afirmou que, mesmo o estado tendo as contas deficitárias, ou seja, tendo mais despesas que receitas, terá investimentos para tirar o Rio de Janeiro do Mapa da Fome até o fim de 2026.

“O Rio de Janeiro vive com déficit anual de R$ 8,5 bilhões. Pode faltar dinheiro para tudo, mas não vai faltar para a gente alimentar o nosso povo”.

Busca ativa

Wellington Dias defende “pobre no Orçamento” – Tomaz Silva/Agência Brasil

O ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Wellington Dias, ressaltou que o combate à insegurança alimentar no país é feito de forma conjunta entre complementação alimentar e políticas de transferência de renda.

Wellington Dias defendeu o “pobre no Orçamento”. “Quando a gente dá a mão a essas pessoas para sair da fome e, ao mesmo tempo, o passo seguinte, para tirar da pobreza, a gente tem de efeito o crescimento da classe média, do país”, considerou.

Segundo o ministro, neste ano, R$ 6,6 bilhões do governo federal serão transferidos para pessoas em situação de vulnerabilidade no estado, por meio de programas como o Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC), que garante um salário mínimo por mês ao idoso a partir de 65 anos e para pessoa com deficiência de qualquer idade.

De acordo com Dias, o governo tem a “obrigação” de localizar todas as pessoas em situação de vulnerabilidade que têm direito a transferências e outros programas, como Auxílio Gás, Farmácia Popular e Minha Casa Minha Vida. É a chamada busca ativa.

“Vamos garantir direito a quem tem direito”, disse.

Menos fome

O subdiretor-geral e representante regional da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) para a América Latina e o Caribe, Mario Lubetkin, elogiou o desempenho do Brasil no combate à fome.

Ele se referia ao Relatório das Nações Unidas sobre o Estado da Insegurança Alimentar Mundial, divulgado na quarta-feira (24), que revelou que mais de 14,7 milhões de brasileiros deixaram de passar fome em 2023. Como ainda há 2,5 milhões de pessoas nessa situação no país, o Brasil ainda figura no chamado Mapa da Fome.

Segundo o uruguaio, os números do Brasil são um estímulo. “Foi graças ao Brasil que teve queda na tendência do problema na América do Sul”, afirmou.

Mario Lubetkin considerou a política brasileira de combate à fome “concreta e coesa”. “Muitos milhões voltaram a comer novamente”, enfatizou Lubetkin, ressaltando que deve haver uma conjunção entre enfrentamento à insegurança alimentar e qualidade nutricional. “Tem que garantir que as pessoas comam e comam bem”, acrescentou.

Polícia resgata 6 pessoas em condições análogas à escravidão no RJ

Ação da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ) em Paty do Alferes, na região do Vale do Café, encontrou na última quarta-feira (24) seis pessoas em condições análogas à escravidão. Os trabalhadores, todos paraguaios, estavam alojados em uma fábrica de cigarros clandestina e enfrentavam jornadas excessivas, sem descanso semanal.

Segundo o comando do 10º Batalhão da Polícia Militar, ao entrar no local, os agentes foram recebidos com disparos de armas de fogo. Dois suspeitos que efetuaram os disparos fugiram em direção à mata. 

Além dos reféns, mais de um milhão de cigarros falsificados foram encontrados no local. Segundo a Polícia Militar, a fábrica passará por perícia, e a 96ª Delegacia de Polícia Civil foi acionada para registro da ocorrência.

*Estagiária sob supervisão de Vinícius Lisboa

Violência política de gênero e raça é tema de encontro no Rio

O Instituto Marielle Franco (IMF) e a Asociación de Mujeres Afrocolombianas promovem, nesta quinta-feira (25), o 2º Encontro de Congressistas e Lideranças Políticas Mulheres Negras 2024, com  o tema Nossa força move a América Latina. O evento, que celebra o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, que pretende reforçar o enfrentamento à violência política de gênero e raça, será no Museu da História e da Cultura Afro-Brasileira (Muhcab), na Gamboa, região portuária do Rio, com entrada gratuita.

O objetivo do evento é intensificar o debate sobre violência política e desafios à representação política de mulheres negras na América Latina, aproveitando a oportunidade da discussão dessas questões no contexto pré-eleitoral brasileiro, que ocorre neste momento.

A diretora executiva do Instituto Marielle Franco, Lígia Batista, destaca que ainda existem muitas barreiras para serem enfrentadas, mas ressalta que as discussões estão avançando com a atuação de movimentos negros. “Os movimentos negros na América Latina tiveram, e seguem tendo, uma grande responsabilidade de mover as estruturas de poder e disputar uma agenda de direitos, justiça e dignidade, particularmente no Brasil e na Colômbia, países com maior porcentagem de população negra no mundo. Porém, ainda são muitos os obstáculos que enfrentamos, muito em função da sub-representação de pessoas negras, em particular mulheres, na política”, afirma Lígia, em nota do IMF.

Segundo o instituto, a representação de mulheres (18%) e de pessoas negras (26%) na política aumentou depois das eleições de 2022, mas o avanço foi “tímido para a proporcionalidade de pessoas negras e mulheres da população brasileira”. O IMF não informou qual era a representatividade anterior.

O encontro terá a participação da ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, e das deputadas federais Erika Hilton (PSOL-SP), Talíria Petrone (PSOL-RJ), Reginete Bispo (PT-RS), Carol Dartora (PT-PR), Dandara Tontzini (PT-MG) e Daiana Santos (PCdoB-RS).

Entre as representantes da Colômbia que participarão do encontro estão líderes políticas, empresariais e sociais, como Yania Rivas Perea, Maria Victoria Palacios Romaña, Yisel Carabali Renteria, Iselis Cassiani, Marcia Santacruz, Dorina Hernández Palomino, Ana Rogelia Monsalve Álvarez, Astrid Sánchez Montes De Oca, Marelen Castillo Torres e Sandra de las Lajas Torres.

Segundo Lígia Batista, a Colômbia viveu mais de 50 anos em conflito interno e, nesse período, as mulheres e jovens afro-colombianas foram consideravelmente atingidas. “Isso as coloca em maior situação de vulnerabilidade, sujeitas à violência e à desproteção de seus direitos humanos. Nesse contexto, atores ilegais armados recrutam meninas, jovens e mulheres com o objetivo de usá-las como empregadas domésticas, escudos de guerra e objetos sexuais.”

De acordo com o IMF, como consequência, a situação de meninas, adolescentes e mulheres afrodescendentes naquele país tem sido marcada por violência, estigmatização, racismo e discriminação. A questão se agrava porque para tentar uma qualidade de vida aceitável, elas “enfrentam obstáculos como baixos níveis educacionais, uma identidade fragilizada pelo racismo, violências urbanas e falta de garantias de vida”, ressalta a instituição.

“Para enfrentar tais problemáticas, existem processos organizativos que servem de refúgio e instrumento para que as mulheres afro-colombianas somem forças para alcançar uma mudança real que melhore suas condições de vida e mude essa realidade discriminatória e racista”, afirma Lígia.

Ela ressalta que, no Brasil, a realidade não é muito diferente. “Por isso, precisamos unir nossas forças para mitigar a falta de políticas públicas que protejam nossas mulheres.” Ela destaca ainda  a necessidade de manter uma articulação ativa em rede de parlamentares e representantes de alto escalão do executivo federal, que resultem em colaborações e no fortalecimento político entre as lideranças dos dois países.

“É necessário o desenvolvimento de uma análise conjunta sobre a conjuntura política e estratégias de enfrentamento à violência política de ambos os países, em diálogo com a sociedade civil”, acrescenta.

No ano passado, em parceria do Instituto Marielle Franco com a Asociación de Mujeres Afrocolombianas, a então candidata a vice-presidente do país, Francia Marquez, realizou duas agendas relacionadas à construção de redes e intercâmbio de experiências entre mulheres que eram autoridades e líderes sociais negras, membros do Executivo e do Legislativo Federal dos dois países.

Além de uma reunião fechada com delegações de autoridades brasileiras e colombianas, que compartilharam suas experiências, houve o Encontro de Líderes Afrodescendentes. Nesses eventos estavam líderes sociais de diferentes territórios da Colômbia, além da delegação oficial do Ministério da Igualdade Racial do Brasil e de representantes da Embaixada brasileira na Colômbia e da Open Society Foundations na África e na América Latina.

O encontro começa às 18h desta quinta-feira, com recepção musical, boas-vindas e, na sequência, os debates com ativistas, congressistas e autoridades brasileiras e colombianas. O encerramento vai ser animado pela roda de samba do grupo Odaraô e, nos intervalos, pelo DJ Rafé. Para recreação das crianças, haverá o Espaço Coruja.

Quem for até lá poderá ainda experimentar o espaço para gastronomia e bar, coordenado pelas integrantes do Festival D’Benguela.

“Aliança Global contra a Fome nos deixa esperançosos”, diz Janja

A socióloga e primeira-dama Janja Lula da Silva avaliou na noite desta quarta-feira (24) que a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza poderá ser um instrumento efetivo para a construção de uma sociedade mais igualitária. A iniciativa envolve um compromisso internacional para a mobilização de apoio político, de recursos financeiros e de conhecimento técnico com um único objetivo: disseminar políticas públicas e tecnologias sociais comprovadamente eficazes para a insegurança alimentar no mundo.

Janja falou sobre o tema durante as atividades que ocorrem no Rio de Janeiro, organizadas pela presidência brasileira no G20. São encontros e eventos que integram uma agenda que se estende por toda a semana. A primeira-dama participou de um painel intitulado “Políticas Públicas de Combate à Fome e à Pobreza: Empoderando Mulheres e Meninas para o Desenvolvimento Sustentável”, que ocorreu no Galpão da Cidadania, sede da organização não governamental Ação da Cidadania. Fundada pelo sociólogo Herbert de Souza ou simplesmente Betinho, ela é desde a década de 1990 um ator central na mobilização nacional contra a fome.

Mais cedo, Janja esteve presente no evento conduzido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em que ocorreu o lançamento da força-tarefa para a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza. Na ocasião, o líder brasileiro disse que o sucesso da iniciativa depende da vontade política dos governantes.

“A fome não resulta apenas de fatores externos. Ela decorre, sobretudo, de escolhas políticas. Hoje o mundo produz alimentos mais do que suficientes para erradicá-la. O que falta é criar condições de acesso aos alimentos”, disse.

A expectativa é de que a Aliança Global contribua para promover experiências bem-sucedidas envolvendo transferência de renda, alimentação escolar, cadastro de famílias vulneráveis, apoio à primeira infância, apoio à agricultura familiar, assistência social, protagonismo das mulheres e inclusão socioeconômica e produtiva, entre outras questões. Lula vem reliazando reuniões e costurando apoios. O presidente do Banco Mundial, o indiano Ajay Banga, elogiou os conceitos da iniciativa. A proposta brasileira envolve também a taxação dos super-ricos para financiar medidas concretas. 

“Será um arcabouço de conhecimento e de novas tecnologias para que a gente possa reunir as políticas públicas de sucesso ao redor do mundo. E o Brasil, graças à visão política do presidente Lula voltada para o combate à desigualdade, formulou políticas públicas que hoje são políticas que já estão na estrutura do Estado brasileiro”, disse Janja.

Usando um vestido produzido por bordadeiras de Bangladesh, Janja afirmou que fazia uma homenagem, considerando que o país asiático foi o primeiro a aderir à Aliança Global proposta pelo Brasil. Ela disse que estará na linha de frente da articulação da iniciativa e que aproveitará a oportunidade de estar em Paris nos próximos dias para tratar do assunto em reuniões com autoridades políticas francesas. A primeira-dama viaja à capital da França para representar o presidente Lula na abertura dos Jogos Olímpicos, que ocorrerá nesta sexta-feira (26).

“O educador Paulo Freire cunhou um verbo que eu não sei como o pessoal vai traduzir em inglês: esperançar. E o lançamento da Aliança Global no dia de hoje nos faz a gente sentir o verbo. Aquece o coração da gente, porque sabemos que a Aliança Global pode ser efetivamente um instrumento para uma sociedade mais justa e igualitária”, acrescentou.

A primeira-dama observou que o Brasil consagra o direito universal à alimentação escolar e também destacou o sucesso do programa Bolsa Família, lembrando que as maiores beneficiárias são mulheres chefes de família. “São mais dedicadas com o sustento dos filhos”, avaliou. Segundo ela, mulheres e meninas são as principais afetadas pela pobreza.

Janja lamentou ainda que em 2022, durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, o Brasil tenha sido incluído novamente do Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas (ONU). Segundo ela, o país precisa trilhar novamente um caminho que já havia ficado para trás. Em todo o Brasil, 14,7 milhões de pessoas deixaram de passar fome em 2023. A insegurança alimentar severa, que atingia 17,2 milhões de brasileiros em 2022, caiu para 2,5 milhões no ano passado. Os dados fazem parte do Relatório das Nações Unidas sobre o Estado da Insegurança Alimentar Mundial (Sofi 2024), divulgado nesta quarta-feira (24). 

As 19 maiores economias do mundo, bem como a União Europeia e mais recentemente a União Africana, têm assento no G20. O grupo se consolidou como foro global de diálogo e coordenação sobre temas econômicos, sociais, de desenvolvimento e de cooperação internacional. Em dezembro do ano passado, o Brasil sucedeu a Índia na presidência. É a primeira vez que o país assume essa posição no atual formato do G20, estabelecido em 2008. No fim do ano, o Rio de Janeiro sediará a Cúpula do G20, e a presidência do grupo será transferida para a África do Sul.

A construção da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza é uma das prioridades do mandato brasileiro. O lançamento da força-tarefa é um primeiro passo. O anúncio oficial da iniciativa vai ocorrer durante a Cúpula do G20, em novembro. 

Painel

Além da primeira-dama, os demais participantes do painel intitulado “Políticas Públicas de Combate à Fome e à Pobreza: Empoderando Mulheres e Meninas para o Desenvolvimento Sustentável” endossaram a proposta brasileira.

“Se nós juntarmos forças, penso que a comunidade internacional pode combater a pobreza. É uma questão sim de vontade política. E estou convencida que precisamos colocar as mulheres e as meninas como foco principal”, disse a comissária da União Europeia para Parcerias Internacionais, Jutta Urpilainen.

Segundo ela, em 2025, 85% das ações da União Europeia terão algum componente de gênero. Ela avaliou que “as mulheres são o rosto da mudança climática” e destacou a doação recém-anunciada de 20 milhões de euros para o Fundo Amazônia, que é gerido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Para a diretora do Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas (WFP, na sigla em inglês), Cindy McCain, o fomento de programas de alimentação escolar gera impactos positivos para as comunidades e faz diferença na vida das crianças. “A priorização da refeição das escolas na Aliança Global é muito importante”.

Por sua vez, Elisabetta Recine, presidenta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional da Presidência da República (Consea), destacou a capacidade que as organizações comunitárias possuem em apresentar soluções. Em sua visão, o sucesso dos programas brasileiros é também fruto do exercício de ouvir as comunidades. “Elas trouxeram para dentro da discussão da política pública não só o pedido e a demanda, mas também a experiência e a solução”.

Elisabetta cobrou ainda mudanças na arquitetura do financiamento para ações de combate à pobreza no mundo. Segundo ela, instituições financeiras, como o Banco Mundial, precisam ter sensibilidade para lidar com a questão. “Não é uma coincidência que os países que dedicam mais esforços para a questão da dívida são também são os países com mais desigualdade”.

Unicef: práticas de combate à pobreza devem priorizar criança e jovem

A Força-Tarefa para a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza levará para a reunião dos líderes do G20, em novembro, no Rio de Janeiro, propostas de boas práticas para combater esses problemas em todo o mundo. Para o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), a prioridade dessas práticas deve ser a criança e o adolescente.

“Infelizmente, ainda temos muitos desafios em relação à situação das crianças no mundo. E elas são desproporcionalmente impactadas pela pobreza e pela má nutrição”, disse nesta quarta-feira (24) à Agência Brasil a chefe de Política Social do Unicef no Brasil, Liliana Chopitea. Segundo Liliana, a Presidência do Brasil havia colocado no centro desse debate a criança e o adolescente e convidado o Unicef a incluir o tema nas discussões entre os países do G20 que ocorrem desde segunda-feira (22), no Rio, em torno da criação da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza.

Em todo o mundo, 333 milhões de crianças que vivem em extrema pobreza e 1 bilhão, em pobreza multidimensional, isto é, têm privação de algum direito essencial, como moradia, água e saneamento, renda digna, educação. “É importante que as respostas também sejam intersetoriais, porque precisamos que a luta para redução da pobreza entre as crianças tenha esse olhar de política pública intersetorial”.

Liliana Chopitea afirmou que o pré-lançamento da Aliança Global pela Presidência do Brasil visa, justamente, encontrar boas práticas e identificar as políticas efetivas que já existem, para que possam ser compartilhadas e aplicadas em diferentes contextos, naturalmente dependendo das realidades nacionais.

Decisão política

De acordo com Liliana, a presença do Unicef em mais de 190 países faz com que a organização conheça e trabalhe de perto com muitos governos para soluções eficazes da pobreza e da má nutrição. Para ela, não existe nenhum segredo novo. “Já é claro o que tem de ser feito. O que falta é a decisão política”. Liliana destacou que na reunião ministerial de hoje, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva mencionou um compromisso político importante: priorizar a luta contra a fome a pobreza e incluir as crianças nessa agenda.

“O Unicef traz a mensagem clara de que não existe nada novo e que políticas bem-sucedidas foram implementadas em muitos países, inclusive no Brasil, para redução da pobreza. Não temos que inventar nada. [As políticas] estão aí. E é necessária uma decisão política que os membros do G20 estariam assumindo, porque isso é prioridade: as crianças têm que estar no centro da discussão. É importante também que os recursos financeiros sejam aplicados para priorizar as políticas que, efetivamente, ajudem na redução da pobreza multidimensional e da má nutrição”, reforçou.

Ampliação

Segundo a chefe de Política Social do Unicef, a cobertura da proteção social precisa ser mais ampla. A proteção social é um dos caminhos, mas deve ser integrada a vários outros caminhos. No caso da criança e do adolescente, o objetivo é facilitar o acesso à nutrição e a outras necessidades básicas, como água e saneamento, que muitas vezes impedem as crianças de ter as facilidades e de estarem protegidas contra problemas de saúde; facilitar o acesso à educação, à cobertura vacinal. “É uma série de políticas integradas para reduzir a pobreza infantil multidimensional.”

Liliana acentuou também a questão do orçamento, que está sendo analisada no âmbito da Força-Tarefa para a Aliança Global, e a parte financeira, ou seja, como os espaços fiscais estabelecidos dentro dos países de modo que existam recursos suficientes para implementação das políticas.

Ela destacou a apresentação oficial da proposta do Brasil para criação da Força-Tarefa para a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza durante os debates, que já está recebendo adesão de outros países fora do G20. O convite foi feito hoje, e o lançamento oficial da aliança será em novembro, durante a Cúpula dos Líderes do G20, que reúne as 19 maiores economias do mundo, mais a União Africana e União Europeia.

Brasil quer taxar super-ricos para financiar Aliança contra a Fome

O Brasil conta com recursos vindos da taxação de grandes fortunas, os chamados super-ricos, para financiar iniciativas da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza. A afirmação foi feita pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, nesta quarta-feira (24), durante o pré-lançamento da iniciativa, no Rio de Janeiro. A Aliança é uma das prioridades da presidência brasileira do G20 (grupo das 19 maiores economias do planeta, mais União Europeia e União Africana). 

“Ao redor do mundo, os super-ricos usam uma série de artifícios para evadir os sistemas tributários. Isso faz com que no topo da pirâmide, os sistemas sejam regressivos e não progressivos [quando mais ricos pagam menos impostos]”, afirmou.

O ministro da Fazenda citou um estudo do economista francês Gabriel Zucman, feito a pedido do Brasil, que estima uma arrecadação de até US$ 250 bilhões por ano, caso bilionários fossem taxados em 2% das riquezas.

“É aproximadamente cinco vezes o montante que os dez maiores bancos multilaterais dedicaram ao enfrentamento à fome e à pobreza em 2022”, comparou Haddad.

Segundo o ministro, a Aliança Global parte da premissa de que a comunidade internacional tem todas as condições para garantir a todos condições dignas de vida. “O que tem faltado é vontade política”. O ministro explicou que a Aliança será “agente catalizador dessa vontade”.

“É imperativo nos mobilizarmos para aumentar os recursos disponíveis internacionalmente, direcionados a enfrentar a fome e a pobreza. Precisamos buscar inovações em instrumentos de financiamento para o desenvolvimento”, pediu o ministro. Ele citou parcerias público privadas e reformas de bancos multilaterais.

Articulação de recursos

Haddad defendeu também que haja a articulação de recursos provenientes de bancos multilaterais de financiamento ao desenvolvimento, como o Banco Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), além da facilitação de acesso a recursos, promovida pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Haddad citou o mecanismo de canalização do Direito Especial de Saque (DES), que possibilita que países obtenham recursos com o FMI.

O presidente do BID, o brasileiro Ilan Goldfajn, e o presidente do Banco Mundial, o indiano Ajay Banga, participaram do evento de pré-lançamento e manifestaram apoio institucional à iniciativa.

Goldfajn afirmou que o BID está comprometido a erradicar a pobreza extrema na América Latina até 2030.

Ajay Banga, do Banco Mundial, não informou quanto o banco aplicará no combate à fome, mas afirmou que será “parceiro líder” na Aliança Global. O indiano informou ainda que o banco se esforçará para que ações de financiamento cheguem a meio bilhão de pessoas até 2030.

Outra frente de ação do Banco Mundial é por meio de investimento na agricultura de países africanos. “Com investimentos em fertilizantes e irrigação, podemos ajudar pessoas a produzir mais”.

Proposta endossada

A Aliança Global consiste em um conjunto de medidas que visam canalizar recursos e trocas de experiência para erradicar a insegurança alimentar no mundo.

Apesar de ter sido lançada no ambiente do G20, a iniciativa é aberta a países de fora do grupo, além de organismos internacionais. Nesta etapa, acontece a formalização dos termos e abre-se caminho para a adesão de países interessados.

Durante o evento desta quarta-feira, países-membros do G20 endossaram os termos da proposta brasileira.

“Essa é uma aprovação histórica. Se concluída, altera a vida de milhões de pessoas no mundo”, celebrou o ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Wellington Dias.  

O endosso na reunião desta quarta-feira não significa que os países aderiram ao compromisso. De acordo com o ministro Dias, países que aderirem precisam tratar o combate à fome como política de Estado, estabelecer metas e levar em consideração experiências bem-sucedidas em outros países, como programas de transferência de renda e alimentação escolar.

O lançamento final da Aliança Global deve ser concluído na reunião de cúpula do G20, nos dias 18 e 19 de novembro, também no Rio de Janeiro.

O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, disse que a Aliança Global “responde a anseios das populações dos países e expectativas das sociedades”.

“Os olhos do mundo estão sobre nós. Não podemos fracassar nesse processo”, declarou.

Mapa da Fome

O lançamento foi no Galpão da Cidadania, aos pés do Morro da Providência, no Centro do Rio de Janeiro. O endereço é sede da organização não governamental (ONG) Ação da Cidadania, fundada em 1993 pelo sociólogo Herbert de Souza. A ONG é referência no combate à fome, tendo criado a campanha Quem Tem Fome Tem Pressa.

Horas antes do pré-lançamento da Aliança Global, também no Galpão da Cidadania, a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) divulgou a atualização do relatório sobre o Estado da Insegurança Alimentar Mundial. De acordo com o documento, entre 713 milhões e 757 milhões de pessoas podem ter enfrentado a fome em 2023 – uma em cada 11 pessoas no mundo. 

No Brasil, entre 2022 e 2023, a insegurança alimentar severa cai de 8% para 1,2% da população. Em números absolutos, passou de 17,2 milhões para 2,5 milhões de brasileiros.

Pela metodologia da FAO, a insegurança alimentar severa é quando a pessoa está de fato sem acesso a alimentos e passou um dia inteiro ou mais sem comer.

Segundo a diretora executiva do Fundo da ONU para a Infância (Unicef), Catherine Russell, a Aliança Global proposta pelo Brasil é um dos meios para direcionar recursos a fim de combater a fome no mundo.