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Lula recebe atletas olímpicos e defende mais apoio público ao esporte

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve encontro nesta segunda-feira (26), no Palácio do Planalto, com cerca de 35 atletas brasileiros, de diferentes modalidades esportivas, que participaram dos Jogos Olímpicos de Paris.

Entre os atletas, estavam presentes a campeã olímpica Bia Souza, ouro no judô, e outros medalhistas, como Caio Bonfim (prata na competição de marcha atlética do atletismo), Edival “Netinho” (bronze no taekwondo), Yasmin Ribeiro (prata no futebol feminino), Augusto Aiko “Japinha” (bronze no skate park masculino) e Julia Soares (bronze por equipes na ginástica). Na França, o Brasil conquistou 20 medalhas em 11 modalidades, com três ouros, sete pratas e dez bronzes, terminando a participação na 20ª posição no quadro geral de medalhas dos Jogos de 2024.

Em discurso, Lula exaltou a participação da delegação brasileira, cuja grande maioria recebe apoio do governo federal por meio do programa Bolsa Atleta, criado em 2010 e que recentemente foi reajustado em 10,86%. Ao citar o programa, o presidente disse que ele ajuda pessoas que estão iniciando o esporte a pelo menos conseguirem comprar os equipamentos, mas que, a partir de agora, vai atuar para que empresas públicas também patrocinem atletas em fase de desenvolvimento.

Brasília (DF) 26.08.2024 –Lula recebe atletas dos Jogos Olímpicos de Paris 2024, no Palácio do Planalto – Valter Campanato/Agência Brasil

“Essa é uma coisa que nós vamos fazer levantamento também, nas empresas públicas brasileiras, quantas delas têm patrocínio para os nossos atletas olímpicos. Porque é muito fácil querer patrocinar um time que é campeão, eu quero ver é patrocinar um menino ou menina da periferia desse país que quer participar do esporte”, afirmou.

Lula também criticou o despreparo do país para fomentar o esporte desde a base, com escolas sem estrutura e sem apoio técnico aos talentos, ressaltando que é preciso aprender uma lição com a última edição olímpica. O presidente afirmou querer participar de uma reunião de planejamento com as entidades esportivas para o próximo ciclo olímpico.  

“Quando eu digo que a gente deve aprender uma lição, é que eu disponho, eu estou me oferecendo aqui publicamente, se o [Paulo] Wanderley, que foi o chefe do nosso Comitê Olímpico, quiser convocar uma reunião, no Rio de Janeiro, com os atletas, com os dirigentes das entidades do judô, do boxe, de qualquer coisa, para gente discutir o que fazer nos próximos quatro anos. Como preparar esse país para dar um salto de qualidade?”

Apoio esportivo

A medalhista de ouro Bia Souza, do judô, afirmou ser uma honra conquistar uma medalha representando o Brasil, e citou a importância do Bolsa Atleta, modalidade Bolsa Pódio (que pode chegar a R$ 16.629/mês).

“Posso dizer que transformou não só minha vida, mas a de todos até aqui. É um grande investimento que a gente pode ter na nossa carreira, nossa vida. Nos ajuda a investir não somente no esporte, que é nossa maior dedicação, nossa maior prioridade na vida. Fazemos muitas abdicações para estar aqui. E nossa grande realização é estar em Jogos Olímpicos representando o Brasil”, afirmou.

Medalha de bronze no Taekwondo, Edival Pontes, o “Netinho”, também destacou a importância da política de apoio aos atletas. “O sentimento é de gratidão, agradecer esse programa do Bolsa Atleta, que no começo da minha carreira foi muito importante. Eu precisei muito de mostrar meu talento, e não era bom de patrocínio, essas coisas, então, o Bolsa Atleta que me ajudou a conseguir viajar, ir bem nas competições”.

Equidade olímpica

Também em pronunciamento, a primeira-dama Janja da Silva, que representou o presidente Lula em Paris, durante os Jogos Olímpicos, exaltou a bela campanha das mulheres brasieiras que, pela primeira vez na história, conquistaram mais medalhas que os homens. Dos 20 pódios, 12 vieram em competições femininas, incluindo os três ouros, além de pódio por equipes mistas, no judô. Dos 60 medalhistas brasileiros em Paris, 48 são mulheres.

“Foi uma Olimpíada da equidade, entre homens e mulheres. Foi um marco na história das Olimpíadas”, afirmou. Segundo Janja, a empresa Itaipu Binacional fará oferta de patrocínio para a equipe da canoagem olímpica.

Ministro defende que G20 garanta orçamento para demandas sociais

Os países que compõem o G20 (Grupo dos 20, que reúne as principais economias do mundo) têm que garantir espaço nos orçamentos para executarem políticas públicas propostas pela sociedade civil. A afirmação do ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Márcio Macêdo, foi feita nesta terça-feira (20), durante evento preparatório para o G20 Social, na Fundição Progresso, espaço cultural independente no centro do Rio de Janeiro.

O G20 Social é um espaço de discussões e participação da sociedade civil criado pelo Brasil, que assumiu a presidência do grupo de países em dezembro do ano passado. Ao longo dos últimos meses, grupos de engajamento e setores da sociedade articulam iniciativas para que sejam tornadas políticas públicas.

Mais de mil representantes populares participaram do encontro, primeira tribuna aberta à participação ativa da população no G20. 

As conclusões do evento preparatório servirão de base para as reuniões do G20 Social, que acontecerão de 14 a 16 de novembro, no Rio de Janeiro. O que for acolhido pelo fórum será entregue aos chefes de Estado e de governo que participarão da reunião de líderes do G20, em 18 e 19 de novembro, também no Rio.

“Esse debate precisa ser livre e soberano”, disse o ministro a jornalistas. “Nós vamos transformar isso em um documento. É óbvio que esses documentos são propostas. Continua o processo de diálogo com os governos, de pressão, de conversa, para que isso se transforme em políticas públicas”, completou.

Macêdo apontou que assuntos como taxação de super-ricos, nova governança mundial e os desafios das mudanças climáticas são temas que permeiam discussões tanto nos governos quanto no G20 Social.

“Não só o Brasil como os países têm que estar abertos para garantir o orçamento para que isso possa acontecer, não só no Brasil como nas economias do mundo inteiro”, disse.

O governo brasileiro escolheu três temas prioritários para discussões no G20: combate à fome, pobreza e desigualdades; sustentabilidade, mudanças climáticas e transição justa; e reforma da governança global.

Macêdo destacou que a presidência brasileira do G20 será marcada pelo ineditismo da participação social.

“A fotografia que vem à minha cabeça, sempre que fala do G20, é um retrato de homens engravatados em uma sala, definindo as políticas que vão atingir as populações no mundo inteiro, e o povo a 5 quilômetros de distância, alguns representados com cartazes, fazendo manifestação”, narrou.

“Nós queremos, agora, que a fotografia seja o povo poder estar participando desse processo de construção das políticas públicas que vão atingir as populações das 20 economias e do mundo inteiro,” explicou.

Transição energética

A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, enfatizou que a transição energética para uma economia menos dependente de combustíveis fósseis, causadores do aquecimento global, deve ser feita de uma forma justa.

“Existem aquelas [economias] que emitiram mais historicamente, existem aqueles [países] que ganharam mais transformando natureza em dinheiro e existem aqueles que emitiram menos e que ainda têm problemas sociais gravíssimos para serem enfrentados”, elencou.

Ministra Marina Silva, participa do Encontro preparatório da Cúpula Social do G20 Foto – Tânia Rêgo/Agência Brasil

Para a ministra, os países mais ricos devem fazer a transição primeiro e, em seguida, ajudar os mais pobres. “Países de renda média-baixa têm que ser ajudados”. Seria necessário cerca de US$ 100 bilhões (cerca de R$ 550 bilhões) mundialmente, segundo ela.

Marina Silva defendeu que a transição energética conte com parte de recursos obtidos com a taxação de super-ricos e com dinheiro de empresas.

“O setor privado não pode continuar mais, e tem muita gente que já entendeu isso, fazendo os mesmos investimentos em atividades de altíssimo potencial de destruir o planeta”, criticou.

A ministra destacou que o Brasil tem a vantagem comparativa de possuir energia solar, eólica, da biomassa e de produzir hidrogênio verde, o que pode ser produto de exportação para ajudar a transição de outros países.

Questionada por jornalistas se a exploração de petróleo na Margem Equatorial compromete a liderança mundial do Brasil na área ambiental, ela afirmou que a decisão será tomada de forma técnica.

“Se disser sim, vai ser técnica; se disser não, vai ser uma decisão técnica, porque em um governo republicano não há a interferência que se tentou fazer no governo anterior na decisão do Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis]”, afirmou.

A Margem Equatorial, apontada como o novo “pré-sal”, por causa do potencial de produção de petróleo, é uma área que vai da costa do Rio Grande do Norte à do Amapá. A potencial exploração de óleo na região, que inclui a foz do Rio Amazonas, é criticada por ambientalistas, preocupados com possíveis danos ambientais.

A Petrobras tem interesse em perfurar o leito marinho, mas depende de receber autorização do Ibama.

Combate à fome

Terceiro ministro presente no encontro com as lideranças sociais, Wellington Dias, do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, lembrou do protagonismo do Brasil no combate à fome, ressaltando a criação da Aliança Global, endossada pelo G20 há menos de um mês.

“Não tem nenhuma tarefa social tão potente e tão importante quanto essa”, disse o ministro, que citou avanços do país no combate à fome reconhecidos pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

Sociedade civil

O presidente da Central Única das Favelas (Cufa) no Rio de Janeiro, Preto Zezé, destacou a participação popular no G20 Social, citando que 20 milhões de pessoas moram em comunidades.

“É fundamental que as pessoas que vivem os dilemas e os desafios do Brasil, da desigualdade, dos direitos humanos, da questão ambiental possam participar, ser ouvidas, e as suas ideias chegarem até as mãos dos gestores”, ressaltou. Zezé pediu ainda que a prática se torne permanente mesmo sob outras presidências do G20.

Ao lembrar que apenas três países latino-americanos fazem parte do G20 (Argentina e México, além do Brasil), o representante da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Antonio Lisboa, relatou que recebe pedidos de trabalhadores de outros países da região para que as decisões tomadas beneficiem também populações fora do G20.

Preto Zezé, presidente da Cufa, fala no Encontro preparatório da Cúpula Social do G20, no Rio Foto – Tânia Rêgo/Agência Brasil

“A nossa responsabilidade tem que ser além de nossos países, além de nossos problemas, para o mundo todo”, disse.

A integrante da diretoria executiva da Associação Brasileira de ONGs (Abong), Débora Rodrigues, explica que o momento é de articulação entre as comunidades de base e o G20.

“Esse é o momento em que a gente pensa como a gente segue, mas a gente volta para os nossos territórios, organiza a turma para que a gente volte em novembro”, explicou.

Plataforma online

Nesta terça-feira foi lançada a plataforma online G20 Social Participativo. Por meio da internet, pessoas de qualquer parte do Brasil e do mundo poderão participar de enquetes, enviar propostas, cadastrar propostas autogestionadas e consultas públicas.

Pessoas, movimentos sociais, organizações da sociedade civil e governos de todo o mundo podem enviar propostas até o dia 9 de setembro.

“O objetivo é que até 9 de setembro, a gente agregue as propostas das organizações da sociedade civil e também as propostas de atividades para a Cúpula Social”, detalha o secretário de Participação Social da Presidência da República, Renato Simões.

A Secretaria de Comunicação do governo federal (Secom) anunciou também que o canal de comunicação do G20, que fornece informações, notícias e serviços sobre os eventos, terá conteúdo disponível em linguagem indígena, como o guarani. A iniciativa faz parte da estratégia de convocar “uma grande comunicação colaborativa.”

“Para que a narrativa do G20 seja potencializava pela narrativa dos movimentos sociais”, disse Marcelo Branco, representante da Secom.

Participaram também da abertura do encontro representantes da Marcha Mundial das Mulheres, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e da organização do movimento negro UneAfro.

Mesas de debate abordaram os temas tratados como prioritários pelo Brasil no G20. 

O G20

A presidência brasileira do G20 vai até a reunião de cúpula de novembro. O G20 é composto por 19 países: África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia, e dois órgãos regionais: a União Africana e a União Europeia.

Os integrantes do grupo representam cerca de 85% da economia mundial, mais de 75% do comércio global e cerca de dois terços da população do planeta. A próxima presidência o grupo caberá à África do Sul.

“Mãe Bernadete, presente”: comunidade defende legado um ano após crime

As marcas de tiros ainda estão na parede que foi pintada de verde claro. Antes, era rosa. Os vestígios do assassinato de Maria Bernadete Pacífico, de 72 anos, líder do Quilombo Pitanga de Palmares, na cidade de Simões Filho, na Bahia, significam mais do que lembranças da dor. “É para que ninguém esqueça. São cicatrizes de uma cena de terror”, diz o neto, Wellington Santos, de 23 anos, que estava em casa quando, por volta das 20h40 do dia 17 de agosto de 2023, dois homens dispararam pelo menos 25 tiros contra a idosa.

O neto, uma irmã e um primo adolescentes foram trancados nos dois quartos. Um ano depois, a família e a comunidade enlutadas buscam honrar o legado de “Mãe Bernadete”, uma mulher que passava seus dias tentando melhorar as condições das pessoas e do lugar em que morava.

A morte da avó, praticamente diante dele, não foi o primeiro trauma na vida de Wellington. Em 2017, o pai dele, Flávio Pacífico, 36 anos, também líder quilombola e defensor de direitos humanos, foi assassinado em uma rua próxima de casa. “Quando a minha avó foi assassinada, eu vi o ciclo se repetir. Eu saí do emprego para poder dar atenção às questões comunitárias”. Ele, hoje, passou a lutar por políticas públicas para a comunidade. “Como minha avó e meu pai fizeram, eu quero continuar a lutar”, diz o rapaz, que tem produzido documentos em nome da comunidade em causas como o pedido para concessão de crédito rural. A comunidade de Pitanga dos Palmares conta com 2.638 pessoas e 598 famílias.

Legado e ameaças

A ideia de que o “legado continua” não sai do coração e das palavras também do filho de Bernadete, Jurandir Pacífico. “Todos nós sabemos que ser de comunidade quilombola é resistir todos os dias”, afirmou, na sexta-feira (16), em evento na comunidade em homenagem à memória de Bernadete. 

“A gente tem essa responsabilidade de continuar com esse legado tão lindo e corajoso”. Ele traz na memória o ideal da mãe de que o legado precisava continuar.  Ele enfatiza que adeptos de religião de matriz africana são perseguidos e que existe temor na comunidade. “Há 40 dias, eu fui ameaçado. Ouvi que eu seria o próximo (a ser vítima)”. Jurandir enfatizou que já denunciou ameaças para as autoridades.

Mesmo enlutados e com temor, família e comunidade resolveram realizar nesse período – que poderia ser apenas de dor – mais um ato de resistência com o 7º Festival de Cultura e Arte Quilombola. São promovidas, até domingo (18), rodas de conversas e debates, oficinas e  apresentações culturais e dos produtos que as pessoas da comunidade aprenderam a fazer. 

Cuidado

Entre as oficinas lembradas e que receberam importante atenção de Mãe Bernadete, houve apresentação do Projeto “Resistência Quilombola”, que tem como motivações a proteção e o autocuidado nos territórios.

O projeto é da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq) e trabalha com protocolos de segurança. “Passou a ser uma das bandeiras de luta também da Mãe Bernadete. O projeto trata de temas sensíveis à realidade. A gente mexe um pouco com a memória afetiva de cada um. Nós participamos do festival, mas nós iremos retornar novamente para trabalharmos”, diz o coordenador, Maximino Silva. O projeto tem atuação em sete estados.

Além dos diálogos, o festival mostrou como as ações e incentivos de Bernadete são a chave da história da comunidade. A hoje artesã Edna Batista, 56 anos, diz que foi a amiga de longa jornada que a incentivou a criar uma nova possibilidade de renda quando ensinou a fazer bonecas e outros artigos com pano e areia. Ela recorda que a amiga sempre cobrava participação de todos. “Antes dela, não tinha luz nem água aqui”, conta Edna.

O artesão Francisco Celestino, 53 anos, afirma que faz parte da primeira família que se instalou no lugar. E que, desde que Bernadete chegou, há 15 anos, houve uma transformação. Foi a idosa que estimulou ele e a esposa, Claudicéa, a aprender a fazer artes com a piaçava, extraída pelos agricultores da própria comunidade.  

O casal faz de brincos a telas, de vasos e adornos. Os dois vendem os produtos nas feiras na cidade e até pela internet. Francisco é o presidente da associação dos artesãos (33 pessoas, só ele de homem) e tenta manter a comunidade empolgada. “Ela nos ajudou muito. Precisamos reconhecer que mudou a vida de todos por aqui”. Trata-se de uma ligação já antiga. Francisco recorda que era professor da creche do distrito e que Bernadete chegava a dormir no local para organizar o atendimento às crianças no dia seguinte.

Perto de onde o casal de artesãos mostrava as artes em piaçava, um grupo de agricultores lembrava que foi Bernadete também que conseguiu equipamentos para uma fábrica de farinha de mandioca. Pedro Almeida, de 60 anos, disse que foi com “imensa felicidade” o dia que recebeu da amiga, há dois anos, a notícia que poderiam trocar a atividade em manufatura por máquinas que tornaram possível fabricar 30 sacos de 50 kg por dia. “Vendemos nas feiras e mais agricultores entenderam o que poderíamos fazer”, afirma.  

Titulação

Sejam os avanços comunitários ou os riscos por quais passam comunidades quilombolas, quem atua na defesa dos territórios enfatiza a necessidade da titulação das terras que pode deixar as populações mais amparadas. “O governo federal vem ajudando a comunidade e acelerou o processo de titulação”, diz Jurandir Pacífico. Em abril, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) declarou as áreas situadas no município de Simões Filho, na Bahia, como territórios pertencentes à Comunidade Remanescente de Quilombo de Pitanga de Palmares. 

A luta pela titulação, no entender do filho, foi o fator principal para a morte dela. “Entendo que esse crime ocorreu a mando de algum interesse. Alguém pode ter usado o tráfico de drogas para executar a mãe Bernadette, ou seja, pagou o traficante”.  As investigações da Polícia Civil atribuíram o crime ao tráfico. O inquérito policial indiciou seis pessoas pelo envolvimento na morte de Bernardete. 

Crime

De acordo com as investigações, foram dois executores, dois mandantes e mais dois participantes (que facilitaram com informações) identificados como responsáveis pela morte. A mais recente prisão, em julho, foi de Ydney dos Santos. A polícia apontou, em abril, que estavam foragidos Marílio dos Santos e Josevan Dionísio. Três homens já haviam sido presos no ano passado. Para defender a investigação, a Secretaria de Segurança Pública apontou que houve 80 oitivas, 20 medidas cautelares e 14 laudos periciais.

Para a superintendente estadual de Direitos Humanos, Trícia Calmon, a violência contra lideranças, defensoras de direitos humanos em suas comunidades, precisa ser combatida de forma urgente. Segundo ela, existem dois momentos em que os riscos das lideranças são aumentados. 

“O primeiro é quando ninguém está olhando. Ninguém está olhando as dificuldades e as lutas que são postas ali naqueles territórios. O segundo, que foi o caso de Dona Bernadete, é quando todo mundo está olhando para aquele contexto, para aquela situação. E aí as forças interessadas naquele território compreendem que estão diante de um risco iminente de perder espaço”, diz Trícia. 

Ela avalia que o crime organizado emite um recado violento para amedrontar comunidades que, geralmente, são afastadas do meio urbano e que precisam de mais serviços públicos. Por isso, Trícia  defende ações de diferentes instituições. “Foi criada uma força-tarefa para a realização fundiária visando tentar um modelo mais célere para a regularização. Nesse sentido a gente verificou um avanço em relação aos procedimentos de regulação fundiária”. 

Ela afirma que a dificuldade da posse do direito à terra, que é uma questão histórica no país, é um problema porque são comunidades invisibilizadas. Na Bahia, há 1.046 comunidades quilombolas. A respeito da responsabilidade do crime, Trícia concorda com a ideia defendida pela família da vítima, segundo a qual a problemática da disputa da terra é o contexto principal do homicídio. 

Sem arredar o pé

Enfática a esse respeito também é a dirigente da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) e assistente social Selma dos Santos Dealdina. “Nós vamos reafirmar hoje e sempre que Dona Bernadete morreu por lutar pela terra, por denunciar vendas de lotes e desmatamento do território. Ela morreu porque cobrava justiça pelo assassinato do filho. A gente não trabalha com essa hipótese levantada pela polícia”.

Selma considera que a situação dos quilombolas não avançou depois do assassinato. “Nós tivemos cinco lideranças executadas nessa luta pela terra. A gente continua com dificuldade porque a lentidão para titular os territórios ainda é muito grande. Não mudou o cenário, pelo contrário”, afirma. 

Ela entende que a ameaça é permanente e contextualiza que há no Incra mais de 1.850 processos para regularização fundiária.

“Estamos aguardando e costuma haver alguma visibilidade para a pauta negra apenas no dia 20 de novembro (dia da Consciência Negra no Brasil). Não dá só para serem entregues portarias e decretos e titulações só no 20 de novembro”. A dirigente diz que as comunidades estão amedrontadas. “Não estamos seguras, mas também a gente não arredou o pé”, confessa.

Bernadete é homenageada na Bahia. Foto:  Alberto Lima/Divulgação

“Agenda nacional”

O secretário nacional de Políticas para Quilombolas, Povos e Comunidades, Ronaldo dos Santos, também reconhece que é preciso intensificar os programas de segurança porque essas lideranças ficam realmente muito expostas e vulneráveis. “E também intensificar a política de regularização fundiária. A gente sabe que a regularização encerra ou protege muito as comunidades dessas ações violentas no campo”.

Ele explica que há hoje cerca de 350 títulos de propriedade definitiva quilombola expedidos no Brasil, que correspondem a cerca de 400 comunidades quilombolas. “Nós temos nos debruçado sobre um plano de ação da Agenda Nacional de Titulação. Temos feito a discussão e buscado saída para pensar como fortalecer os programas de proteção, como fortalecer esses territórios quilombolas com a chegada de políticas públicas e fortalecimento das organizações de base quilombola”, acentua.

Presentes

Enquanto esperam a titulação definitiva, familiares de Bernadete se emocionam, mas apresentam um sorriso no rosto quando falam de tudo o que a matriarca ensinou. “Hoje, eu almejo fazer coisas de direito, de pensar direito, conhecer esse mundo jurídico e ter mais opções para defender os interesses da minha comunidade”, observa o neto Wellington que não deseja ir embora do Brasil. 

“Não conseguiria me olhar no espelho. Espero que um dia eu possa ter segurança de viver em minha comunidade novamente”, diz.

Enquanto percorre a casa em que ocorreu o crime, Jurandir, tio de Wellington e filho da liderança quilombola, não esmorece. “A nossa vida mudou depois dessas covardias que fizeram com minha mãe e meu irmão. Mas eles estão presentes em nós”, finaliza.

*O repórter viajou a convite da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) 

Lula defende fim de imposto sobre PLR de trabalhadores

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou nesta quinta-feira (15) que vai atuar para isentar trabalhadores do Imposto de Renda (IR) sobre os bônus pagos por Participação nos Lucros e Resultados (PLR) das empresas. A declaração foi dada durante discurso após visitar as instalações da fábrica da Renault, em São José dos Pinhais (PR), cidade da região metropolitana de Curitiba.

“Eu só quero dizer para vocês que essa questão do PLR está na minha cabeça há muito tempo. Nós aprovamos uma reforma tributária, ela ainda não foi aprovada totalmente. E vocês podem ter certeza que, pela primeira vez na vida, esse país tem um presidente que tem compromisso de fazer que aquilo que é salário não pode ser tratado como renda”, disse o presidente, arrancando aplausos de centenas de operários que acompanharam a cerimônia de visita à montadora. A pauta é uma reivindicação antiga de sindicatos de trabalhadores.

Ao defender a isenção, Lula comparou com o fato de que acionistas e sócios de empresas já terem esse tipo de benefício fiscal. “Um cidadão que ganha R$ 2 milhões de bônus não paga Imposto de Renda. E o pobre, o trabalhador, aquele que recebe contracheque no final do mês, que não tem como escapar porque vem descontado na folha de pagamento dele. Eu só estou esperando a oportunidade para que a gente possa dar o bote e aprovar o fim do Imposto de Renda no PLR para o povo brasileiro”, destacou.

Um projeto de lei (PL) que tramita atualmente na Câmara dos Deputados, o PL 581/2019, altera a Lei de Participação nos Lucros das Empresas para conferir aos empregados o mesmo tratamento fiscal dado a sócios e acionistas no momento da distribuição de lucros ou dividendos. O texto já foi aprovado no Senado e agora depende da aprovação dos deputados.

Ainda em seu discurso, Lula exaltou os investimentos do setor automotivo no país. “Aqui, na fábrica da Renault em São José dos Pinhais, no Paraná, desde sua instalação, já foram investidos mais de R$ 12 bilhões no país. Agora, no ciclo de 2023 a 2025, serão mais R$ 2 bilhões, com mais de 5 mil funcionários e funcionárias, sem falar dos 25 mil empregos indiretos em todo o estado.” A montadora francesa está presente no país, com sua fábrica no Paraná, há cerca de 25 anos.

Na mesma linha, o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Márcio Leite, celebrou o aquecimento do mercado de venda de automóveis, que atingiu 1,5 milhão de novos carros até este mês, marca que no ano passado só havia sido atingida em meados de setembro, segundo ele.

“Geramos mais de 50 mil novos empregos no setor automotivo, número que não acontecia desde de 2012. Esse é o melhor momento na geração de empregos [no setor automotivo]”, afirmou.

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Durante o evento, o presidente acompanhou a assinatura da ordem de serviço para o início do Lote 2A da BR-487, conhecida como Estrada Boiadeira. O Ministério dos Transportes e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) estão envolvidos na execução da obra, ao custo de R$ 322 milhões.

O lote totaliza 37,39 quilômetros (km). Segundo o governo federal, é o último dos lotes que resta para o fechamento da Estrada Boiadeira. Com a recente federalização da rodovia, ocorrida na semana passada, o Dnit passa a atuar de forma integral na manutenção do Lote 1A, compreendido entre o km 9 e o km 56.

Agenda

Mais cedo, também na região metropolitana de Curitiba, Lula participou de um evento para marcar a retomada da Fábrica de Fertilizantes Araucária Nitrogenados S.A (Ansa), subsidiária da Petrobras. A retomada ocorre após quase quatro anos, quando a unidade teve, em 2020, as atividades suspensas. O investimento previsto para a reabertura da fábrica é de R$ 870 milhões, de acordo com o governo.

Lula segue agora para o Rio Grande do Sul, onde cumpre uma série de outras agendas em Porto Alegre e região metropolitana, ao longo desta sexta-feira (16). Entre os compromissos, estão a entrega de unidades habitacionais do Minha Casa, Minha Vida, a inauguração de uma nova estrutura para tratamento de câncer, na capital gaúcha, e o lançamento de um novo complexo viário em São Leopoldo.

Cármen defende Moraes e rebate crítica sobre acúmulo de cargos com TSE

A ministra Cármen Lúcia, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e integrante do Supremo Tribunal Federal (STF), defendeu nesta quinta-feira (15) a atuação do ministro Alexandre de Moraes, seu antecessor no comando da Justiça Eleitoral e colega no Supremo. Ela disse que o acúmulo de cargos nos dois tribunais não confunde as funções nem deslegitima qualquer atuação.

Ao abrir a sessão plenária do TSE, Cármen Lúcia lembrou que o acúmulo dos cargos é uma determinação da Constituição, que prevê ainda que ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) componham a corte eleitoral.

A ministra abriu sua fala chamando Moraes de “grande ex-presidente” do TSE, que “cumpriu um enorme papel, como é de conhecimento geral do país”. Ela mencionou diretamente as “notícias que vem sendo veiculadas” sobre o ministro.

Ela fez referência a reportagens do jornal Folha de S. Paulo, que entre terça (13) e quarta (14) publicou uma série de notícias segundo as quais Moraes teria utilizado vias informais para pedir a produção de relatórios pelo TSE contra pessoas investigadas em inquérito que tramita no Supremo.

Tais pessoas foram depois alvo de sanções por parte de Moraes, tendo como base os relatórios do TSE, mas sem que os despachos informassem que os documentos foram feitos a pedido do próprio ministro.

Os pedidos para a produção de relatórios do TSE contra alvos específicos no Supremo foram feitos por meio de WhatsApp, segundo o jornal, que publicou diálogos entre assessores direitos de Moraes em ambos os tribunais.

Nesta quinta (15), Cármen Lúcia buscou dirimir dúvidas sobre a atuação dos ministros que acumulam cargos no Supremo e no TSE, afirmando que esse acúmulo “não confunde as funções nem desmerece qualquer tipo de conduta adotada.”

A presidente do TSE negou ainda que os ministros busquem esse acúmulo de funções e poder, ou que se valham da estrutura da Justiça Eleitoral para outras funções que não sejam a manutenção das eleições.

“Notícias têm sido veiculados sobre acumulação de cargos de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e de ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), venho lembrar a todos que esta é uma escolha constitucional que os constituintes vêm fazendo desde a década de 1930 do século passado”, frisou Cármen Lúcia.

“O Tribunal Superior Eleitoral tem o único objetivo de garantir a lisura a transparência e a segurança do processo eleitoral, nós nos comprometemos com isso e assim tem sido feito”, acrescentou.

Antes de encerrar, contudo, a presidente do TSE disse que “aqui todas as condutas devem ser formais, para serem seguras e para garantir a liberdade do eleitor no exercício de seu dever constitucional de votar.”

Após a publicação das reportagens, outros ministros do Supremo saíram em defesa de Moraes, afirmando não haver nenhuma irregularidade na conduta do magistrado, entre eles Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo, Gilmar Mendes, decano, e Flávio Dino.

Em sessão plenária do Supremo, o próprio Moraes defendeu sua atuação, afirmando que todos os procedimentos foram regulares e que “não há nada a esconder”.

Barroso defende conduta de Moraes e diz que há “tempestade fictícia”

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, e o ministro Gilmar Mendes defenderam nesta quarta-feira (14) a atuação do ministro Alexandre de Moraes na Corte. As declarações foram feitas durante a abertura da sessão desta tarde.

Nessa terça-feira (13), o jornal Folha de S.Paulo publicou uma reportagem na qual acusa Moraes de usar “formas não oficiais” para determinar a produção de informações para investigar aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro durante as eleições de 2022, período em que o ministro foi presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Os dados foram utilizados em inquéritos que investigam a disseminação de fake news e a atuação de milícias digitais durante o governo do ex-presidente. 

Barroso classificou a situação como “tempestade fictícia” e disse que os dados solicitados por Alexandre de Moraes eram públicos, estavam nas redes socais, e se referiam a pessoas que são investigadas pela Corte.

“Não houve investigação de natureza policial. Era acompanhamento de postagens em redes sociais para verificar se havia uma conduta a ser investigada no âmbito dos inquéritos do STF”, afirmou.

O presidente do Supremo também garantiu que não houve pedido de direcionamento a qualquer pessoa e que as solicitações de dados eram oficializadas no momento processual próprio.

“A alegada informalidade é porque ninguém oficia para si próprio. As informações não eram formalizadas no momento da solicitação. Mas, quando as informações chegavam, eram imediatamente formalizadas, inseridas no processo e dada vista ao Ministério Público”, completou.

Gilmar Mendes

O ministro Gilmar Mendes também defendeu a atuação de Moraes e disse que o ministro é alvo de “críticas infundadas” sobre sua atuação na Corte. Segundo o ministro, os ataques direcionados a Moraes buscam fragilizar a democracia.

“A condução das investigações por parte do ministro tem sido pautada pela legalidade, pelo respeito aos direitos e garantias e pelo compromisso inegociável com a verdade”, afirmou.

PGR

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, também defendeu as medidas adotadas por Moraes.

“Eu pude pessoalmente verificar as marcas de coragem, diligência, assertividade e retidão nas manifestações, nas decisões e no modo de conduzir os processos do ministro Alexandre de Moraes”, afirmou Gonet. 

Gabinete

Após a divulgação da reportagem, o gabinete de Alexandre de Moraes afirmou que os procedimentos foram oficiais para requisição das informações ao TSE.

Barroso”Todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com integral participação da Procuradoria Geral da República”, diz a nota.

PGR defende manter prisão de Roberto Jefferson

A Procuradoria-Geral da República (PGR) enviou nesta segunda-feira (29) ao Supremo Tribunal Federal (STF) parecer pela manutenção da prisão do ex-deputado federal Roberto Jefferson.

Jefferson foi preso em outubro de 2022, às vésperas do segundo turno das eleições, após oferecer resistência armada ao cumprimento do mandado de prisão decretado pelo ministro Alexandre de Moraes. O mandado foi expedido depois que o ex-parlamentar publicou um vídeo na internet no qual ofendeu a ministra Cármen Lúcia com palavras de baixo calão.

Durante o cumprimento do mandado em sua casa, no município de Comendador Levy Gasparian (RJ), Jefferson deu tiros de fuzil e lançou granadas contra os policiais federais que foram ao local. Em função do episódio, ele foi indiciado pela Polícia Federal por quatro tentativas de homicídio.

Para a PGR, Jefferson deve continuar preso, mas uma junta médica oficial deverá apontar as condições de saúde do ex-parlamentar.

De acordo a defesa, Roberto Jefferson tem problemas de saúde que impossibilitam a manutenção da prisão. Entre as doenças citadas pela defesa está a colangite, uma inflamação no fígado.

“A manifestação é pela manutenção da prisão preventiva, com a submissão do investigado à junta médica oficial para que aponte, de forma discriminada, quais tratamentos são estritamente necessários à saúde de Roberto Jefferson Monteiro Francisco, bem como eventual contraindicação ao tratamento das enfermidades em ambiência prisional e/ou hospitalar”, diz a procuradoria.

O pedido de soltura será analisado por Alexandre de Moraes, relator do caso. Não há prazo para decisão.

Ministra questiona gastos tributários, mas defende programas sociais

A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, afirmou nesta terça-feira (23) que os programas sociais não são um problemas para o orçamento brasileiro. De outro lado, a ministra defendeu a necessidade de uma revisão dos gastos tributários. As declarações ocorrem em meio à decisão do governo de congelar R$ 15 bilhões do orçamento de 2024.

“O problema dos gastos no Brasil não é o pobre no orçamento. São os privilégios dos ricos que precisam ser checados ponto a ponto. Aquilo que efetivamente se renunciar em forma de receita, deve vir da mesma forma em políticas que atendam o interesse coletivo. Os gastos tributários no Brasil cresceram infinitamente mais do que os gastos com políticas sociais”. Segundo Simone Tebet, a evolução dos gastos tributários vem acompanhando sucessivos governos.

“Há 10 anos, ou um pouco mais que isso, eles representavam em torno de 2% do PIB [Produto Interno Bruto, soma dos bens e serviços produzidos no país]. São renúncias do orçamento que nós fazemos para o setor produtivo, o que é necessário para que ele gere emprego. Mas a pergunta é: quantos desses gastos tributários, quantos desses incentivos fiscais ainda têm eficácia no que se refere à promoção de justiça social? Hoje, esses gastos tributários correspondem a mais de 5% do PIB. Estamos falando de uma renúncia na ordem de R$ 615 bilhões. Vamos lembrar que o Bolsa Família, por exemplo, custa algo em torno de R$ 160 bilhões”, acrescentou.

Após anunciar o congelamento dos R$ 15 bilhões, o governo tem afirmado que a geração de novas receitas pode permitir uma reversão parcial dos cortes. A principal aposta nesse sentido está relacionada justamente com os gastos tributários. Uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) publicada em maio determinou a necessidade de uma fonte de compensação financeira para a desoneração da folha até 2027, que foi prorrogada conforme lei aprovada pelo Congresso no ano passado. Sem a compensação, o benefício concedido a empresas e municípios pode perder a validade. O assunto vem sendo tema de tratativas entre o governo e o Congresso.

Embora tenha defendido os programas sociais, a ministra afirmou ser necessário garantir a sua boa aplicação. A equipe econômica do governo tem deixado claro que um dos esforços alinhados ao congelamento orçamentário envolverá uma revisão sistemática da concessão de serviços previdenciários, do Benefício de Prestação Continuada (BPC), do Seguro Defeso, do Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro) e de outras medidas.

“É preciso avaliar se há erros, fraudes ou irregularidades porque a gente teve uma pandemia que bagunçou um pouco as políticas públicas. Mas aquilo que está sendo destinado de forma certa para aquelas famílias que efetivamente precisam, esses programas têm que ser fortalecidos. Este não é o problema do déficit fiscal ou do crescimento da dívida brasileira em relação ao PIB. Não iremos descontinuar essas políticas públicas. Iremos atacar a eficiência desses gastos”, reiterou Tebet.

Detalhamento dos cortes

O congelamento foi oficializado pelo governo nesta segunda-feira (22). Dos R$ 15 bilhões a serem suspensos, R$ 11,2 bilhões serão bloqueados; e R$ 3,8 bilhões, contingenciados.

Tanto o contingenciamento como o bloqueio representam cortes temporários de gastos. O novo arcabouço fiscal, no entanto, estabeleceu motivações diferentes. O bloqueio ocorre quando os gastos do governo vão além do limite de 70% do crescimento da receita acima da inflação. O contingenciamento ocorre quando há falta de receitas que comprometem o cumprimento da meta de resultado primário (resultado das contas do governo sem os juros da dívida pública).

Segundo a ministra, o governo deve detalhar no dia 30 de julho as medidas previstas. “Onde vai cortar e quem vai ter o maior corte vai ser estabelecido por um decreto presidencial”, informou. Simone Tebet também disse que haverá em breve, em data a ser divulgada, uma apresentação sobre as revisões dos gastos com vistas à meta de déficit zero neste ano. Na mesma ocasião, será divulgado um maior detalhamento do corte de R$ 25,9 bilhões no projeto de lei orçamentária de 2025, que havia sido anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

G20

As declarações da ministra ocorreram ao final de sua participação na mesa “Combater as desigualdades e erradicando a pobreza, a fome e a desnutrição”, que integra a programação paralela da Reunião Ministerial de Desenvolvimento do G20. Em sua exposição, SimoneTebet apontou contradições globais.

“Enquanto a ciência busca alternativas, vacinas, remédios para combater doenças, nós ainda temos milhões de pessoas no planeta morrendo porque não têm acesso a água potável ou mesmo água para tomar banho. Enquanto nós estamos em pleno século 21, enquanto nós estamos falando da era digital, da internet, do celular, da inteligência artificial, temos lamentavelmente milhões de pessoas morrendo de fome todos os anos. Não é à toa que o presidente Lula escolheu como pautas principais da presidência brasileira no G20 a erradicação da miséria, o combate à fome e a desigualdade social”, afirmou.

Tebet sustentou que a redução das desigualdades sociais no Brasil depende da valorização do salário mínimo. “A prioridade da nossa equipe econômica, do Ministério da Fazenda e do Ministério do Orçamento, é que o salário mínimo sempre cresça acima da inflação”. A ministra afirmou ainda que o Brasil vem tentando fazer o seu dever de casa.

“Em apenas um ano e meio, este governo retirou da situação de insegurança alimentar grave 24 milhões de brasileiros e brasileiras. É verdade que temos algo em torno de 60 milhões com algum tipo de insegurança alimentar no Brasil. E é importante lembrar que a desigualdade é tão perversa que ainda escolhe gênero, idade, cor e raça. A cara mais pobre do Brasil é sempre a cara de uma mulher, é sempre a cara de uma mulher cheia de filhos, é sempre a cara de uma mulher preta ou parda do Norte ou do Nordeste”.

Também presente no evento, o ministro Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Wellington Dias, cobrou maior responsabilidade dos estados. “Há dois séculos, a renda dos mais ricos era 18 vezes maior do que a dos mais pobres. Hoje, a renda dos mais ricos é 38 vezes a dos mais pobres. Os 10% mais ricos do mundo detêm 76% da riqueza do planeta. Enquanto isso, os 50% mais pobres têm apenas 2%. Mais de 700 milhões estão passando fome em um planeta que produz amplamente a comida necessária para o sustento de todos”, afirmou.

Presidência brasileira

A presidência brasileira no G20 realiza, no decorrer de toda esta semana, uma intensa programação. A Reunião Ministerial de Desenvolvimento do G20, que começou nesta segunda-feira (22), é parte dessa agenda. Na manhã de hoje (23), ocorreu a segunda sessão , cuja pauta envolveu temas relacionados com o combate às desigualdades. O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, avaliou que os desafios colocados demandam esforços conjuntos de curto prazo.

As 19 maiores economias do mundo, bem como a União Europeia e mais recentemente a União Africana, têm assento no G20. O grupo se consolidou como foro global de diálogo e coordenação sobre temas econômicos, sociais, de desenvolvimento e de cooperação internacional. Em dezembro do ano passado, o Brasil sucedeu a Índia na presidência. É a primeira vez que o país assume essa posição no atual formato do G20, estabelecido em 2008. No fim do ano, o Rio de Janeiro sediará a Cúpula do G20, e a presidência do grupo será transferida para a África do Sul.

Grupo de engajamento do G20 defende remuneração do cuidado familiar

O trabalho de cuidar de familiares, como crianças, idosos e doentes, deve ser valorizado, remunerado e não exclusivo de mulheres. Essa é uma das reivindicações do W20 (Women 20 – Mulheres 20, em português), um dos 13 grupos de engajamento que fazem parte da agenda do G20 e se reuniram, nesta segunda-feira (22), com representantes de ministérios das finanças e de bancos centrais dos países-membros.

O evento faz parte de uma semana decisiva para a presidência brasileira no G20. A prioridade do W20 foi repassada a jornalistas pela líder Ana Fontes, fundadora e presidente da Rede de Mulheres Empreendedoras.

A empreendedora citou como exemplo o modelo argentino, em que os anos que as mulheres se dedicam à criação de filhos pequenos conta para a aposentadoria. Mas Ana Fontes destaca que é preciso que seja algo direcionado para os dois gêneros, e não apenas mulheres.

Ela defende que seja repensado o modelo de como a “economia do cuidado” é vista e remunerada. “Se a gente não paga, ninguém valoriza”, avalia. “Socialmente, as pessoas não olham para a economia do cuidado. Ela vai adicionar dinheiro na economia”, acrescenta.

“Tem gente que pergunta de onde vai sair esse dinheiro. O mundo não tem falta de dinheiro. O mundo tem falta de ações direcionadas. O que é preciso é organizar essa questão financeira”, defende.

Prioridades

Ana disse que outra prioridade do grupo é “olhar a justiça climática com lente e perspectiva de gênero”. Segundo a empreendedora, são as mulheres as que mais sofrem em situação de emergência climática.

“Quando falta água, quem vai buscar são as mulheres, com a lata na cabeça. Quando tem problema de saneamento e as crianças ficam com dor de barriga, quem sofre com isso são as mulheres”, exemplifica.

Os dois temas são a novidade da edição brasileira do W20. Outras reivindicações são herdadas de edições anteriores como melhorar situação de mulheres empreendedoras por meio de acesso ao capital; o enfrentamento à violência contra as mulheres; e aumentar a participação de mulheres e meninas nas áreas de stem (sigla em inglês para ciência, tecnologia, engenharia e matemática).

As representantes brasileiras no W20 ainda buscam consenso para que, em todas as cinco reivindicações, haja a perspectiva de raça e etnia.

“A questão das raças acaba sobrepondo todas as outras questões, e as vulnerabilidades vão se somando”, explicou a líder do W20. No entanto, ainda não há consenso entre todos os países com representantes no W20.

Ana Fontes disse que percebeu boa recepção dos representantes dos ministérios de finanças e de bancos centrais. Ela faz parte de discussões desde 2017 e ressaltou que nunca tinha visto iniciativa como a da presidência brasileira do G20, que, por meio do G20 Social, possibilitou o diálogo prévio entre os representantes da sociedade civil e autoridades.

“Fiquei impressionada com a aderência ao tema. Obviamente a gente espera que essa aderência não seja só achar bacana, mas que aconteça na vida real também”, disse.

B20

Líder do B20, Constanza Negri, durante reunião do G20 com representantes de ministérios das Finanças e bancos centrais – Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Outro grupo da sociedade civil que participou da reunião nesta segunda-feira foi o B20 (Business 20, reunião de representantes empresariais).

Segundo Constança Negri, líder do B20, um dos temas prioritários levado às autoridades da Trilha de Finanças do G20 é o financiamento para acelerar a transição energética para uma economia com menos emissão de gases do efeito estufa.

“Que se busque mais formas de facilitar a participação e atração do capital privado”, defende.

A líder do B20, que representa também a Confederação Nacional da Indústria (CNI), detalhou que a intenção do setor privado é investir em transição energética cinco vezes mais do que o poder público. “Mas para que isso aconteça, é preciso de algumas medidas para facilitar a forma de operar, seja dos bancos multilaterais e de agências [de fomento ao investimento]”, ressaltou.

Na visão da líder empresarial, houve entre líderes públicos e representantes dos grupos de engajamento “uma grande sintonia na questão do papel que o financiamento privado tem para alavancar e poder concretizar essa contribuição para a transição energética”.

G20

A presidência brasileira do G20 vai até a reunião de cúpula em novembro. O ponto alto do mandato brasileiro é a reunião de cúpula, nos dias 18 e 19, quando se reunirão no Rio de Janeiro chefes de Estado e de governo.

O G20 é composto por 19 países: África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia, e dois órgãos regionais: a União Africana e a União Europeia.

Os integrantes do grupo representam cerca de 85% da economia mundial, mais de 75% do comércio global e cerca de dois terços da população do planeta. A próxima presidência do grupo caberá à África do Sul.

Após apagão, Pacheco defende regulação da Inteligência Artificial

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), comentou nesta sexta-feira (19) o apagão cibernético global que impactou sistemas operacionais de empresas e serviços de diversos países, incluindo companhias aéreas, bancos, hospitais e canais de mídia. Uma falha na atualização de conteúdo relacionada ao sensor de segurança CrowdStrike Falcon, que serve para detectar possíveis invasões de hackers, e é utilizado por empresas como a Microsoft, proprietária do Windows – usado largamente em computadores – foi a causa da pane, que gerou caos em aeroportos da América do Norte e Europa.

Apagão cibernético: diversos países, incluindo companhias aéreas, bancos, hospitais e canais de mídia, foram atingidos – Marcello Casal JrAgência Brasil

O Brasil também foi atingido, com falhas em aplicativos bancários e sistemas de hospital, mas em muito menos escala do que em outros continentes.

“Causa-nos apreensão os efeitos do apagão cibernético que atingiu operações de transporte, saúde e bancárias em regiões do planeta e no Brasil. Que os responsáveis atuem de maneira célere e transparente para o restabelecimento dos serviços e, principalmente, da segurança adequada aos usuários. A conectividade contribui para a amplitude de serviços essenciais do cotidiano. Mas quando há uma falha, a reação em cadeia é prejudicial a milhares de pessoas.”, afirmou Pacheco, em declaração oficial.

Autor do projeto que regulamenta a inteligência artificial no Brasil (PL 2.338/2023), Pacheco pediu que o país aprove uma legislação para o setor. A própria empresa CrowdStrike, empresa responsável pela falha nos sistemas Windows, utiliza inteligência artificial no aperfeiçoamento dos seus serviços de segurança cibernética.   

“Esse ambiente nos alerta para os riscos da segurança cibernética, e nos lembra ser essencial a regulamentação da inteligência artificial, projeto de minha autoria, para que tenhamos um cenário mais claro, seguro e adequado em relação ao uso de ferramentas virtuais e seus efeitos práticos sobre a sociedade”, acrescentou.