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Projeto estimula leitura entre jovens em regime socioeducativo no PR

“Precisamos ampliar nossas poéticas de viver em um mundo que está afundando sob nossos pés. Temos que aprender a amar como uma defesa contra a dor e a violência do mundo.” Com essa saudação por escrito, o líder indígena e escritor Ailton Krenak, da Academia Brasileira de Letras (ABL), dirigiu-se, na última quinta-feira (7), a cerca de 200 adolescentes e 30 professores de 19 unidades socioeducativas no Paraná, que o aguardavam no Clube de Leitura (conferência virtual) para uma conversa sobre o seu livro Um rio um pássaro, com memórias e reflexões sobre a vida e a formação do movimento indígena no Brasil.

Krenak era um convidado especial. Neste mês, faz quatro anos que o Centro de Socioeducação de Londrina II (Cense II) iniciou uma rotina para estimular a leitura entre jovens internados. Desde então, todo mês, professores, psicólogos, assistentes sociais e juízes conversam com os educandos sobre livros com que estes tiveram contato em sala de aula.

O papo é por meio de videoconferência. A tecnologia coloca unidades de internação em rede, e isso permite que os jovens se vejam e debatam sobre as leituras, podendo, eventualmente, ter contato com os próprios escritores.

Desde 2000, o Clube de Leitura recebe escritores como Itamar Vieira Júnior, autor de Torto Arado, vencedor dos prêmios Jabuti e Oceanos; o rapper Edi Rock, do Racionais MC’s, um dos autores do livro Sobrevivendo no Inferno; o jornalista Laurentino Gomes, autor dos três volumes de Escravidão; o padre Júlio Lancelotti, que escreveu Amor à Maneira de Deus; e Ferréz (Reginaldo Ferreira da Silva) autor de Capão Pecado, romance sobre um adolescente que quer sair do lugar muito violento onde vive e cresceu.

Na quinta-feira, Ailton Krenak não pôde participar do Clube de Leitura por causa de uma emergência e perdeu a chance de ouvir diretamente dos meninos, inclusive dois indígenas, e meninas (12, no total) o que aprenderam com a leitura de seu livro. Também não teve oportunidade de saber o que foi discutido em sala de aula sobre projetos pedagógicos que tratavam da língua portuguesa e da indígena, de geografia, história, sociologia, meio ambiente e diversidade cultural – todos conteúdos inspirados no texto do primeiro indígena imortal eleito para a ABL.

“Aprendo com os meninos”

Assíduo participante das videoconferências com os adolescentes leitores, escritores e professores, o desembargador Ruy Muggiat, do Tribunal de Justiça do Paraná, diz que, além do contato com livros e autores, o Clube de Leitura possibilita o compartilhamento de experiências.

A presença do desembargador muda a ótica dos adolescentes sobre os juízes, mas também amplia a visão do desembargador sobre os educandos, afirma Muggiat. “Aprendo muito com os meninos e as perguntas que fazem.”

Aumentar o conhecimento e a experiência profissional também tem dado boas oportunidades no Clube de Leitura para Maria Moreira, professora de literatura dos centros de socioeducação do Paraná, que gostou muito do livro de Krenak. “Foi o livro com que tanto eu quanto os meninos mais nos identificamos”, testemunha a professora.

Segundo Maria, o livro de Krenak “dialoga com a maneira como os meninos veem”, e eles se identificaram muito” com o que o autor aborda, como, por exemplo, os sonhos. “A gente ainda é indígena, sabe? Então os meninos curtiram ler”, comenta a professora.

O projeto é iniciativa da assistente social Andressa Ferreira Cândido, servidora do Estado do Paraná e lotada no Cense II.

Em abril, o Clube de Leitura se prepara para receber a escritora Marina Miyazaki Araujo, que vai falar do seu livro Pai Francisco, sobre a história de um menino que está longe do pai, afastado do convívio social. Para os meses seguintes, Andressa já trata de novos convites para os autores, que falam gratuitamente com os adolescentes.

Enquanto prepara as sessões do Clube de Leitura, a assistente social sonha com alguns convidados. “Eu estou focada no [ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania] Silvio Almeida”, revela. Para Andressa, o autor de Racismo Estrutural seria um ótimo nome para conversar com os adolescentes em uma data próxima ao Dia da Consciência Negra, 20 de novembro.

Segundo Andressa, os jovens querem conversar com Drauzio Varella no Clube de Leitura. “É perfeito porque ele trabalhou dentro de unidade fechada, né?”, comenta ao citar o interesse dos jovens pelo livro Estação Carandiru, em que autor narra sua experiência como médico voluntário, a partir de 1989, na Casa de Detenção de São Paulo.

O direito a atividades culturais, assim como o direito à escolarização, está previsto no Estatuto da Criança e do Adolescentes (1990). O Clube de Leitura do Cense II foi vencedor da primeira edição do Prêmio Prioridade Absoluta, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), na categoria Poder Público em 2021.

Ritmos, poesia e dança marcaram 4ª Conferência Nacional de Cultura

Aos fazedores de cultura: cultura. A 4ª Conferência Nacional de Cultura (CNC) terminou nessa sexta-feira (8) com os clássicos da cantora baiana Daniela Mercury. A rainha do axé eletrizou o público com canções conhecidas, como O Canto da Cidade, Swing da Cor, O Mais Belo dos Belos e Nobre Vagabundo. Daniela dividiu o palco com a conterrânea, a compositora Majur, para cantarem e dançarem juntas A Primeira Vista, do compositor Chico. Daniela também dedicou a canção Mulheres do Mundo como homenagem ao Dia Internacional da Mulher.

Brasília (DF) – Show de Daniela Mercury no encerramento da 4ª Conferência Nacional de Cultura. Foto: Gilberto Soares/Minc

Nos cincos dias de conferência, realizada em Brasília, passaram pelo evento outros nomes da música brasileira: Fafá de Belém, Paulinho da Viola, Diogo Nogueira, Paula Lima, Salgadinho, Renegado e Johnny Hooker.

Os cerca de 5 mil visitantes do Centro de Convenções Ulisses Guimarães estiveram cercados por toda forma de arte, como saraus, feira de livros, cortejo de uma quadrilha junina, danças folclóricas, apresentação de capoeira, drag queens e bois bumbá, como o Boi do Seu Teodoro e os Bois de Parintins. Em um dos palcos, nomeado de Diversidade e Rural, um veículo Rural Willys foi estacionado e enfeitado com adornos do Peru. 

Diversidade

O palco Diversidade recebeu a cantora Ellen Oléria, capoeiristas, DJs, o cantor de música regional gaúcha, Ernesto Fagundes e as drag queens Organzza e Nágilla Gold Star.

Brasília (DF) – Arte transformista na 4ª Conferência Nacional de Cultura. Foto:José Cruz/Agência Brasil

Representante a arte transformista, Nágilla cantou uma canção de autoria de Ekena, com tema de discriminação à mulher contemporânea. A artista disse à Agência Brasil sobre a importância de ter sua dentro de uma conferência sobre cultura. “Em geral, é uma arte marginalizada e não reconhecida como cultura. E nós estamos aqui marcando lugar e mostrando que a arte transformista pode ter espaço neste país.”

O pianista de jazz Jonathan Ferr, do Rio de Janeiro, apresentou-se com um quarteto formado apenas por mulheres musicistas do Distrito Federal. Para ele, a conferência é o pontapé para um novo momento para os artistas brasileiros. 

“Independentemente do lado político que se esteja, não dá para negar que o Brasil é um dos maiores exportadores de cultura para o mundo. A volta do Ministério da Cultura e, agora, esse grande encontro com as pessoas que fazem cultura em várias partes do Brasil, de vários sotaques diferentes, eu vejo um futuro de caminhos abertos, trilhado pelo Ministério da Cultura. E esse é o pontapé inicial para muita coisa vir a acontecer. O maior desafio é fazer com que a sua arte chegue para o maior número de pessoas possível”, avalia.

A violonista Tatiana Kovalchuk, integrante do quarteto, entende que os participantes estão todos juntos “atrás dessa grande luta, que são a cultura, a educação, que vão, de fato, fazer a diferença para todo mundo.”

Brasília (DF) – Apresentação na 4ª Conferência Nacional de Cultura. Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

De Goiás, o mestre de congado Reginaldo Bernardo trouxe dos terreiros de Catalão, 23 dançarinos que mostraram o sincretismo religioso que teve origem no Brasil, com os escravos negros e a religiosidade católica. “Catalão inteira tem 148 congadas, com mais de 5 mil dançadores. Essa tradição veio de fazendas, de culturas antigas, quando dançadores, os escravos se reuniam para dançar em terreiros. Depois, a Igreja adotou a manifestação e formou essa Congada de Catalão”.

Entre uma discussão e outra, os caminhantes da conferência viraram plateia da apresentação de um grupo de dança folclórica siriri, do Mato Grosso. As saias rodadas das artistas do grupo Siriri elétrico e as várias violas de cocho musicaram o dia dos conferencistas. A dona de uma dessas saias é Karen Amorim, que se apaixonou pela dança, aos 13 anos, na escola e nunca mais parou.

“Agora, a gente veio aqui mostrar a nossa cultura, mostrar a nossa dança, mostrar a nossa viola de coxo”.

Brasília (DF) – Apresentação da dança folclórica siriri, do Mato Grosso – Foto: José Cruz/Agência Brasil

Karen não se separa da amiga de dança Alice Tognoli, que gostou de conhecer outras manifestações.

“A gente está vendo várias culturas diferentes, que a gente nem fazia ideia que existia. Muitos tipos de músicas diferentes também. É uma diversidade maravilhosa. Somos um dos grupos de Cuiabá, que também fazem o mesmo trabalho de estar deixando essa cultura cada vez mais viva, porque a gente tem que representar a cultura popular.”

Todos os dias, os conferencistas foram recepcionados por artistas circenses com pernas de pau. Este foi o caso de Cadu Sales, representante da comitiva de Vitória de Santo Antão (PE) e do setor de Design e Moda do estado. Ao chegar à conferência, Cadu e a delegação do estado entoaram a tradicional canção Madeira que Cupim não Rói, de Capiba, ladeados pelos chamados pernaltas.

Brasília (DF) – Artistas em pernas de pau recepcionavam o público. Foto: José Cruz/Agência Brasil

“O retorno da Conferência de Cultura, após esse hiato grande que se teve, é uma responsabilidade muito grande para todos nós que estávamos participando. Agora, esperamos dar a nossa melhor contribuição possível para a construção desse plano [Nacional de Cultura] sério.”

Artesanato e comida

A conferência abriu espaço para artesanatos, sobretudo de indígenas e afro, e vestimentas típicas do Brasil e até de outros países. Uma forma de divulgar a cultura e ainda gerar renda aos artesãos.

O expositor Gilberto Cruz Fulni Ô, de Águas Belas (PE), trouxe as tradições indígenas em cestarias, colares, brincos, pulseiras e cocás coloridos. “Eu exponho os materiais indígenas para mostrar a cultura, a nossa tradição. Eu trabalho com várias técnicas de artesanato, principalmente o nosso, que é Fulni Ô. Para mim é uma honra estar participando desse evento aqui tão grande”.

Outra indígena era Fernanda Togoe, com o artesanato de seu povo de Barra do Garças (MT). “A gente acha muito boa essa oportunidade de ter vindo aqui, de mostrar as nossas peças, o nosso artesanato, para o pessoal conhecer mais a gente. Eu trouxe colar de miçanga, pulseira e brinco de miçanga, brilho, colar de sementes, além de tucum, morototó, açaí e rapé também e algumas peças de barro. A procura é grande. Muitas pessoas vêm comprar aqui e ajudam a gente.”

Já expositores do Distrito Federal foram convidados a vender alimentação no local.

A agricultora familiar do assentamento agroecológico José Wilker, de Sobradinho (DF), Paula Tavares, comercializou alimentos orgânicos.

“É uma oportunidade única de expor os nossos produtos para que todos levem para seus estados. Tudo é cultura e alimento também pode ser cultura”, define Paula.

Na banca ao lado, Tereza da Silva Ferreira, da Casa dos Mirtilos, vendia geleias, doces e bolos com a fruta silvestre. O ofício vem de gerações passadas da família, por isso, o modo de cozinhar tornou-se uma forma de cultura. “É um processo que a gente aprende no fogão de lenha. Minha mãe fazia geleia na roça com a gente. Então, quando eu fui me dedicar a isso, eu fui lá atrás, no meu interior”, relembrou Tereza.

Brasília (DF) – Conferência aprovou propostas para plano cultural nacional da próxima década – Foto: José Cruz/Agência Brasil

A 4ª CNC foi a maior conferência cultural já realizada no Brasil. Há mais de 10 anos, o evento de participação popular não ocorria nacionalmente.

A conferência resultou na aprovação de 30 propostas de políticas públicas para basear a construção do próximo Plano Nacional de Cultura, com validade de 10 anos.

Quarta CNC destaca a participação social nas políticas para a cultura

A quarta Conferência Nacional de Cultura (4ª CNC), encerrada nessa sexta-feira (8), voltou a dar destaque à participação social nas políticas públicas sobre cultura, após mais de dez anos desde a última conferência nacional, em dezembro de 2013.

O resultado foi a aprovação de 30 propostas prioritárias que irão compor o documento final do encontro para dar rumo ao setor no Brasil na próxima década. O Plano Nacional de Cultura será escrito com base nas decisões da conferência e com mais debates com os conselhos de cultura nos estados e municípios.

De acordo com o Ministério da Cultura (MinC), responsável pela realização da conferência, quase cinco mil pessoas estiveram no Centro de Convenções Ulysses Guimarães, em Brasília, para o evento.

Brasília (DF) – A ministra da Cultura, Margareth Menezes, durante entrevista coletiva sobre a 4ª Conferência Nacional de Cultura Foto:  Marcelo Camargo/Agência Brasil

Após cinco dias de intensas atividades, como análises, consultas, escutas, sugestões, debates e embates e, por fim, as votações e as aprovações do que teve consenso da maioria dos votantes, as experiências vividas em Brasília, de forma geral, foram bem avaliadas pelos participantes: delegados eleitos de todas as regiões do país, representantes de governos municipais, estaduais e federal e convidados da classe artística e de variados segmentos da sociedade civil.

Na abertura da plenária final, ainda na quinta-feira (7) à noite, a ministra da Cultura, Margareth Menezes, realçou o compromisso da atual gestão federal com a democracia, após dez anos de ausência de um debate nacional mais amplo e participativo. “Foi uma resistência da democracia e nós resistimos, nós merecemos essa Conferência, o setor cultural, a sociedade.”

Em entrevista à Agência Brasil, a presidente da Fundação Nacional de Artes (Funarte), do MinC, Maria Marighella, defendeu o espaço democrático da 4ª CNC, que evidenciou o protagonismo dos fazedores de cultura em suas próprias histórias. “Agente fez uma vitória, primeiro a imensa vitória de reconstituir, de restituir a participação no país, numa conferência histórica maior da história do país. E o setor cultural realmente merecia e precisava do compromisso da democracia com a participação. Depois que não existe política pública sem participação e política pública se conjuga no plural e os fazedores de cultura são parte fundamental da política pública,” disse.

O presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), do Minc, Leandro Grass, comemorou o momento. “É um passo muito importante para consolidar a cultura como política de Estado e não só como política de governo; para fortalecer o Ministério da Cultura, as secretarias [de Cultura] e política cultural.” Grass realçou que a conferência foi histórica para o Brasil. “É um divisor de águas na história do Ministério da Cultura e que renderá frutos no curto, no médio e no longo prazo. Nosso papel é traduzir tudo isso em ações concretas, em orçamento para atender todas as necessidades que o movimento cultural.”

Brasília (DF) 07/03/2024 – Presidente da Fundação Cultural Palmares, João Jorge Rodrigues dos Santos durante 4ª CNC Foto: José Cruz/Agência Brasil

Outro órgão do MinC, a Fundação Cultural Palmares, foi representada pelo presidente, João Jorge Rodrigues. Ele, que também é fundador do grupo afro-percussivo Olodum, na Bahia, falou que a conferência fortalece a instituição que vem sendo reconstruída há pouco mais de um ano, no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “A Palmares tem a missão de apoiar as ações de 102 milhões de brasileiros, os afro-brasileiros pretos e pardos, além de apoiar aqueles que não são pardos,” afirmou.

“A cultura é um vestido ou um paletó com a gravata que um país veste. Se não está bem-vestido, não se apresenta bem. A cultura é isso: é o que nós somos, é o que nós seremos, é o que nós somos”, define o presidente da Fundação Cultural Palmares, João Jorge Rodrigues.

O secretário Executivo do MinC, Márcio Tavares, fez um balanço positivo da conferência. “Foram cinco dias de intenso debate. A plenária final, que é composta pela sociedade civil, pelos delegados que foram eleitos no processo das conferências estaduais e municipais, se expressa, dá sua opinião livremente e, com isso, conseguimos ter um conjunto de propostas que está muito alinhado com aquilo que o governo defende e que vai contribuir muito com as nossas diretrizes de trabalho, de reconstrução do Plano Nacional de Cultura”, afirmou.

Sociedade Civil

À Agência Brasil, o ator Francisco Díaz Rocha, conhecido como Chico Díaz, presente à 4ª CNC, considerou fundamental a retomada da construção da integração cultural promovida durante o encontro. E ainda defendeu os direitos dos trabalhadores da cultura. “Há que se reconhecer o terreno onde se vive as agruras do fazer cultural. Mas, há que se reconhecer o terreno que se vive primeiro. E o vasto espectro que a cultura brasileira oferece, da Amazônia a Porto Alegre, do Atlântico ao Peru, à Bolívia. Há que se reconhecer a potência criativa, a potência de como fazer sobreviver esses trabalhadores da cultura. Então, há que se diagnosticar primeiro para poder construir”, declarou o ator de TV, cinema e teatro.

O ator Chico Diaz na 4ª Conferência Nacional de Cultura, por José Cruz/Agência Brasil

A delegada da 4ª CNC de Pedreiras, no Maranhão, Francinete Braga, comemorou os avanços do grande encontro desta semana e fez um balanço, a partir do ponto de vista de quem contribui para escolha do que deve ser priorizado na cultura do Brasil. “Quase todas as propostas de diversos eixos que debatemos contemplam a questão da mulher negra, da mulher de terreiro. Ressalto a questão dos povos indígenas, dos ciganos, que é um povo que está um pouco visibilizado. Logo, esses segmentos, essas culturas, produtores culturais, esses fazedores de cultura, terão recursos para melhorar aquele fazer que eles já sabem tão bem”, projeta Francinete Braga.

Outra delegada e representante dos povos indígenas no Conselho Nacional de Política Cultural Daiara Hori Figueroa Sampaio, do povo indígena Tukano, do Alto Rio Negro na Amazônia brasileira, informou que 60 delegados eleitos nas conferências estaduais, além de convidados que participaram dos conselhos anteriores, representantes de pontos de culturas e museus indígenas e articuladores de cultura indígena de todo o Brasil, reforçaram o diálogo sobre o setor das culturas indígenas.

Brasília (DF) 07/03/2024 – 4ª Conferência Nacional de Cultura Foto: José Cruz/Agência Brasil – José Cruz/Agência Brasil

Para Daiara Tukano, marcar a presença indígena em todos os eixos da conferência surtiu efeito. “Conseguimos aprovar diversos projetos que incluem os povos indígenas, com destaque ao projeto de criar um plano nacional para as culturas indígenas, levando em consideração a transversalidade de nosso setor. Afinal, estamos em todas as linguagens. Somos indígenas artistas, músicos do circo, temos patrimônio material, de patrimônio material”, disse.

A professora Neide Rafael, do Distrito Federal, foi à conferência como convidada e entende que não existe cultura sem educação e vice-versa. Para ela, os desafios na afro educação ainda persistem no Brasil. “Salve toda a possibilidade de continuação de vida para a nossa juventude negra, onde o Hip-hop não será espaço de demérito, mas espaço de cultura viva e que a periferia esteja presente em todas as manifestações culturais no âmbito de respeito da cultura brasileira,” afirmou.

Dentro do Hip-hop, destacado pela educadora, um dos 80 representantes do segmento nesta conferência foi Cristiano Martins de Souza, de Goiânia (GO). Nome de batismo que quase ninguém conhece. Em grupos de rappers, Cristiano é o Mc Baiano. Ele participou de todas as quatro conferências nacionais de cultura e se admira com o crescimento da categoria no evento. “Esta foi uma das melhores conferências de cultura que já participei. O Hip Hop vem aqui como movimento de inclusão social. Nós conquistamos aprovar a cadeira do Hip Hop nos municípios e nos estados. Esse era um dos nossos objetivos”, ressaltou.

A produtora da área de audiovisual e mestra de cultura negra, Ângela Maria do Vale, de São Paulo, destacou o respeito aos elementos orais da cultura, preservados pelas pessoas idosas em vários fóruns de debates da conferência. Apesar dos diferentes pontos de vista em várias questões, Ângela disse que houve sensibilidade coletiva com os guardiões da memória da cultura brasileira. “Hoje, eu vejo resgatado nessas discussões que foram feitas aqui, a questão das matrizes africanas.  Houve respeito pela forma como foram colocados os saberes orais dos mestres de cultura tradicionais,” disse.

A opinião sobre a valorização dos mestres da cultura foi compartilhada com Rita Santos, de Salvador (BA), que exerce o cargo de ekedi na religião Candomblé, que auxilia pai ou mãe de santo e trabalha como uma espécie de zeladora dos orixás, divindades da mitologia africana. “Nós conseguimos fazer a lei de mestres e mestras de culturas. Essa garantia é importante para todos eles. Nós temos muitos mestres que morrem à míngua em lugares distantes. Então, é uma vitória, na preservação dos valores e tradições da nossa cultura”, destacou.

No encerramento da 4ª CNC, os participantes ainda tiveram a oportunidade de assistir ao show da cantora baiana Daniela Mercury, na noite dessa sexta-feira (8), no estacionamento do Centro de Convenções Ulysses Guimarães, gratuitamente.

Direitos das mulheres são conquista, não concessão, diz Lula

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, nesta sexta-feira (8), que os direitos e liberdades adquiridas pelas mulheres foram conquistas de classe e não concessão de governantes. Lula participou de um almoço alusivo ao Dia Internacional das Mulheres, celebrado hoje, em um restaurante na área central de Brasília.

“A liberdade da gente, o bem-estar da gente, a gente conquista, ninguém vai fazer concessão pra nós”, disse. “Nunca se contentem com o que já conquistaram. O que já conquistaram é bom, a gente reconhecer a conquista. Mas é uma coisa que instiga a gente a querer mais, instiga a gente a exigir um pouco mais. E vocês sabem que o sucesso de participação na vida política, no mundo do trabalho, na vida cultural das mulheres não é favor de governo, tem que ser conquista de vocês”, acrescentou.

Para Lula, as conquistas das mulheres são recentes e levam tempo para serem implementadas. “A gente não consegue mudar de uma hora para outra, não basta estar na Constituição, é preciso incutir na cabeça das pessoas. Como é bom a gente ser civilizado, como é bom a gente se respeitar, como é bom a gente garantir que não haja diferença de gênero entre nós”, destacou o presidente, lembrando ainda que os homens também devem assumir funções tipicamente “femininas”.

“Mesmo que pela lei seja tudo igual, no dia a dia as mulheres já aprenderam a sair para o mundo, já aprenderam a trabalhar, já foram para o mercado de trabalho, mas nós homens não aprendemos a ir pra a cozinha, não aprendemos a lavar a roupa que a mulher lava, tem que cuidar das crianças que elas cuidam. Então, a gente ainda não compartilha naquilo que diz respeito ao nosso companheirismo”, disse.

O governo federal lançou um pacote de políticas para mulheres, com ações que incluem inaugurações de casas da Mulher Brasileira e centros de referência, investimento em tornozeleiras eletrônicas para agressores e programa de inclusão de mulheres jovens no mercado de trabalho.

O objetivo, segundo a Presidência, é reforçar o enfrentamento a violências – físicas, morais e políticas – e ampliar ações para promoção da autonomia econômica e da participação das mulheres em espaços de poder.

O almoço desta sexta-feira contou com a presença da primeira-dama, Janja da Silva, de ministras de Estado e outras servidoras do segundo escalão do Executivo.

A ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, também destacou a importância de mulheres nos espaços de poder. “Nós precisamos, todas, convencer nossos chefes e todos que as mulheres têm papel prioritário nas políticas públicas”, disse, citando que 80% das pessoas que passam fome no país são mulheres.

“Sabemos que temos muita coisa pra fazer e só venceremos se darmos ao governo federal a cara das mulheres”, acrescentou.

NASA e Marinha dos EUA preparam astronautas para missão lunar

8 de março de 2024

 

O USS San Diego é um navio de guerra projetado para entregar tropas e equipamentos em zonas de combate, algo para o qual a tripulação treina rotineiramente em sua base em San Diego, Califórnia, na costa do Oceano Pacífico.

Mas um olhar mais atento aos remendos e cores de alguns dos uniformes a bordo recentemente são pistas de que uma das suas missões actuais tem objectivos o mais longe possível de um teatro de guerra.

“Esta é uma oportunidade única, mas está dentro do que fazemos todos os dias”, diz o tenente Jackson Cotney, piloto de helicóptero da Marinha dos EUA vinculado ao USS San Diego, conduzindo operações de treinamento de busca e resgate em apoio ao Artemis da NASA. missões tripuladas à lua.

Durante exercícios recentes no Oceano Pacífico, Cotney e centenas de marinheiros trabalharam com a tripulação Artemis II de quatro pessoas da NASA para se preparar para uma parte crítica da complexa operação – o retorno seguro e a recuperação da cápsula Orion e da tripulação assim que completar a reentrada através da Terra. atmosfera.

“Este é o 11º teste de recuperação em andamento”, mas o primeiro com astronautas envolvidos no treinamento, explica o capitão David Walton, comandante do USS San Diego. “Quando a tripulação voltar, sua saúde e bem-estar serão nossa preocupação número um. Nosso objetivo é tirá-los da cápsula e fornecer-lhes tratamento médico rapidamente, e depois recuperar o equipamento para novos voos de volta à Lua ou mais longe.”

Cotney já é um veterano do Artemis. Ele pilotou um dos helicópteros que monitoravam a cápsula Orion não tripulada que pousou no Oceano Pacífico no final da missão Artemis 1 de 25 dias em 2022, que orbitou a Lua e viajou mais longe no espaço de qualquer nave projetada para transportar humanos.

“Fomos a primeira plataforma a 10.000 pés a ver que a cápsula estava intacta quando surgiu no horizonte”, disse ele à VOA durante uma entrevista recente a bordo do San Diego. “É muito emocionante vê-lo sair do céu. Esta missão em si é nova para mim, mas não para a aviação naval. Os aviadores navais e a comunidade de helicópteros navais têm resgatado astronautas, tirando-os da água desde os primeiros dias da Apollo.”

Embora a NASA tenha adiado o lançamento de uma missão tripulada para orbitar a Lua até 2025, no mínimo, já selecionou quatro astronautas para a primeira viagem desse tipo em mais de 50 anos.

“Esta campanha da missão Artemis não se trata apenas de voltar à Lua e de forma responsável e sustentável, trata-se de desenvolver o que aprendemos lá e explorar ainda mais profundamente e responder a algumas das questões fundamentais que todos temos sobre nós mesmos”, diz Christina Koch, que poderia fazer história como a primeira mulher a orbitar a Lua. “O que significa ser humano, estamos sozinhos no universo, como chegamos todos aqui?”

 

Brasil e Espanha buscam avanço para acordo Mercosul-União Europeia

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu, nesta quarta-feira (6), no Palácio do Planalto, o presidente da Espanha, Pedro Sánchez, que está em visita oficial ao Brasil. Durante o encontro, foram assinados acordos bilaterais nas áreas de comunicações; ciência, tecnologia e inovação; administração pública e saúde. Lula e Sánchez manifestaram intenção de ampliar as relações políticas, comerciais e de investimentos.

Os dois líderes estão alinhados para que avancem as negociações do acordo entre Mercosul e União Europeia (UE). Segundo Sánchez, a Espanha não é problema para a conclusão do acordo, que espera ser colocado em breve em vigor. Para ele, após a guerra na Ucrânia, que impactou, entre outros, o fornecimento de energia na Europa, os países do continente aprenderam a lição de que é preciso diversificar e encontrar novas parcerias comerciais. 

“Quero agradecer ao presidente Lula pela liderança em avançar nesse acordo. É uma iniciativa que reforça nossos vínculos comerciais e de investimento e contribui com benefícios sociais e de meio ambiente. América Latina e União Europeia são aliados naturais”, disse Sánchez, ressaltando ainda a visão comum de Brasil e Espanha na defesa de temas como justiça social, transição verde e justa e a cooperação internacional com um sistema financeiro reformado.

Lula ressaltou que uma das travas para a finalização do acordo Mercosul-UE vem da França, que é protecionista em termos de interesses agrícolas. “Não é mais questão de querer, ou de gostar, nós precisamos, politicamente, economicamente e geograficamente, de fazer esse acordo e dar sinal para o mundo de que precisamos andar para a frente”, afirmou Lula.

Aprovado em 2019, após 20 anos de negociações, o acordo Mercosul-UE precisa ser ratificado pelos parlamentos de todos os países dos dois blocos para entrar em vigor. A negociação envolve 31 países. O acordo cobre temas tanto tarifários quanto de natureza regulatória, como serviços, compras públicas, facilitação de comércio, barreiras técnicas, medidas sanitárias e fitossanitárias e propriedade intelectual.

Investimentos

A agenda de Sánchez está voltada para investimentos do país europeu no Brasil e inclui visita ao estado de São Paulo amanhã (7). Após o encontro bilateral de hoje no Palácio do Planalto, Sánchez e Lula participaram de reunião com empresários espanhóis, conduzida pelo vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, também no Palácio do Planalto.

De acordo com o Ministério das Relações Exteriores, o volume de investimentos espanhóis no Brasil é expressivo. “Pelo critério de controlador final, a Espanha consolidou-se como o segundo maior investidor no país [atrás dos Estados Unidos], com presença nos setores energético, bancário, de telecomunicações e de seguros, entre outros.”

Mais de mil empresas espanholas estão presentes no mercado brasileiro, como a Telefônica e o Banco Santander.

O estoque total de investimentos do país europeu no Brasil é estimado em US$ 59 bilhões, com fluxo anual de cerca de US$ 3,3 bilhões nos últimos anos.

“O Brasil é um destino muito atrativo para as empresas espanholas, especialmente as que tratam de transição energética e também mitigação e enfrentamento às mudanças climáticas”, disse Sánchez, lembrando de ações do Estado brasileiro para a estabilidade política e econômica, como a aprovação do arcabouço fiscal e da reforma tributária.

O presidente Lula acrescentou que o Brasil apresenta “um rosário de boas qualidades” e conseguiu fazer o necessário para atrair o interesse de investidores de outros países. “A Telefônica sabe que valeu a pena investir no Brasil, o Santander sabe, e outras empresas sabem que e querem oportunidade de fazerem novos investimentos”, afirmou.

Relações políticas

Pedro Sánchez também destacou a consolidação da relação política e diálogo permanente entre Brasil e Espanha. Para o presidente espanhol, os dois países devem “seguir firmes na defesa da democracia e defendê-la de extremismos, como os eventos de 8 de janeiro [de 2023]” em Brasília. Na ocasião, vândalos invadiram as sedes dos Três Poderes, na capital, federal, na tentativa de um golpe de Estado.

Já Lula disse que Brasil e Espanha enfrentam “o extremismo, a negação da política e o discurso de ódio, alimentados por notícias falsas”. “Nossa experiência no enfrentamento da extrema direita, que atua coordenada internacionalmente, nos ensina que é preciso unir todos os democratas. Não se pode transigir com o totalitarismo, nem se deixar paralisar pela perplexidade e pela incerteza ante essas ameaças.”

Para o brasileiro, a defesa da democracia está “inevitavelmente” ligada à luta contra todas as formas de exclusão. Lula citou casos de racismo, como os que envolveram o jogador brasileiro Vinicius Júnior, do Real Madri.

“Brasil e Espanha têm registrado episódios de racismo, de discriminação racial e de xenofobia, inclusive na área de esportes de grande público. Só um projeto social inclusivo nos permitirá erigir sociedades prósperas, livres, democráticas e soberanas”, afirmou Lula.

Além da agenda bilateral, os chefes de governo trataram de temas como a reforma da governança de instituições multilaterais e outras questões globais, entre elas a crise no Oriente Médio, em particular a grave situação humanitária em Gaza e as perspectivas de avanço de uma solução de dois Estados, e o conflito entre Rússia e Ucrânia.

Após os atos no Palácio do Planalto, Sánchez foi recebido por Lula para um almoço no Palácio do Itamaraty, do qual participaram diversas autoridades, como o presidente do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso. Ainda hoje, o presidente espanhol irá ao Congresso Nacional para encontro com o presidente do Legislativo, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

Em abril do ano passado, Lula fez visita oficial à Espanha, ocasião em que foram  assinados acordos para cooperação nas áreas de educação, trabalho e pesquisa científica.

Rio: três suspeitos de envolvimento na morte de advogado estão presos

A Polícia Civil do Rio de Janeiro prendeu os três homens identificados como suspeitos de envolvimento na morte do advogado Rodrigo Marinho Crespo, atingido por pelo menos dez tiros no último dia 26, a poucos metros da sede da Ordem dos Advogados do Brasil fluminense (OAB-RJ). O último procurado, Eduardo Sobreira Moraes, se entregou na Delegacia de Homicídios da Capital (DHC), na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio, na tarde dessa terça-feira (5).

Os outros dois presos são o policial militar (PM) Leandro Machado da Silva, que também se entregou na DHC, e Cezar Daniel Mondego de Souza. Desde segunda-feira (4) a Polícia Civil estava à procura dos três.

Leandro Machado da Silva é lotado no 15º Batalhão de Polícia Militar (BPM), em Duque de Caxias, na região metropolitana do Rio. Ele já tem histórico de prisão pela prática de homicídio e por integrar milícia em Duque de Caxias.

Cezar Daniel era funcionário nomeado da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) desde 2019. Ele deixou o cargo no começo deste mês e seria substituído por Eduardo. Mas a portaria sobre a mudança foi tornada sem efeito. Segundo a Alerj, Cezar segue exonerado e o cargo está vago. O motivo da exoneração e de onde partiu a nomeação não foram informados.

Investigação

De acordo com a Polícia Civil, Cezar e Eduardo foram responsáveis pela vigilância e monitoramento do advogado nos dias que antecederam o crime – na parte da manhã e no início da tarde do dia do assassinato.

A dupla usava um Gol branco, parecido com o dos executores, flagrado por câmeras de segurança. O carro foi entregue para Eduardo pelo PM Leandro Machado. Os investigadores afirmam que Leandro é o responsável por coordenar toda a logística do crime.

A Polícia Civil segue na apuração para identificar os demais envolvidos e a motivação do crime.

Crime

Rodrigo Marinho Crespo foi atingido por tiros às 17h15 do dia 26 de fevereiro. Ele tinha acabado de sair do escritório de advocacia Marinho & Lima Advogados, do qual era um dos sócios. O prédio fica a poucos metros da sede da OAB-RJ. Na mesma rua ficam o Ministério Público do Rio e a Defensoria Pública do estado.

Rodrigo Marinho Crespo tinha ampla experiência em direito civil empresarial com ênfase em contratos e em direito processual civil.

PM envolvido

Em nota, a Secretaria de Estado de Polícia Militar informou que o PM Leandro Machado já estava afastado do serviço nas ruas, pois responde a outro inquérito por participação em organização criminosa. Ele foi preso preventivamente em abril de 2021.

A corporação acrescenta que a Corregedoria Geral já havia instaurado procedimento administrativo disciplinar em relação ao policial, que pode terminar em expulsão.

ABL lança, no Rio, avatar de Machado de Assis

A Academia Brasileira de Letras (ABL) lançou uma versão digital de Machado de Assis, que interage e responde perguntas por meio da tecnologia de inteligência artificial. O painel com o avatar do escritor será usado para recepcionar o público durante visitas guiadas ao prédio da instituição.

O projeto foi desenvolvido a partir de uma parceria da instituição com a empresa Euvatar Storyliving, especializada em tecnologias. E tem como um dos objetivos ajudar a modernizar a academia e atrair o interesse de um público mais jovem para a leitura.

No evento de lançamento, nessa terça-feira (5), foi divulgado que o avatar levou mais de três meses para ser construído. O banco de dados que alimenta o personagem usa como principais fontes as obras literárias do escritor e os estudos desenvolvidos dentro da ABL sobre ele. Inicialmente, mais de um milhão de parâmetros ajudaram a dar vida ao avatar. Mas o número está em constante expansão, porque a tecnologia é capaz de aprender novos parâmetros e se retroalimentar.

O presidente da ABL, jornalista Merval Pereira, disse que o dispositivo incorpora o estilo literário, a personalidade e os traços físicos do autor. Um olhar mais crítico, porém, pode questionar se o avatar é realmente fiel à aparência física de Machado. A versão digital traz um homem com a pele mais clara e rosada.

Identidade étnico-racial

Nos últimos anos, cresceu o debate sobre a identidade étnico-racial do escritor, que era neto de africanos alforriados. Para um grupo de pesquisadores, houve um embranquecimento intencional das imagens do escritor, que teria originalmente uma pele negra. Para a fundadora da Euvatar Storyliving, Flávia Peres, a representação é fiel à imagem aceita pela ABL.

“Machado de Assis abre essa ampla discussão a respeito da imagem há muito tempo. Se assumiu dentro da academia que Machado é mulato. E foi o que nós traduzimos aqui. Nós vemos que ele não é um homem branco, mas também não é um homem completamente negro. Ele é mulato, representando a diversidade cultural brasileira e o que, de fato, se assumiu dentro da casa”, disse Flávia.

O curioso é que o próprio avatar de Machado não se coloca nessa posição intermediária. Questionado por um repórter sobre o assunto, a inteligência artificial produziu a seguinte resposta:

“Como homem negro, nascido de origem pobre no Rio de Janeiro do século 19, eu enfrentei desafios e preconceitos ao longo do tempo devido à minha raça, classe social e até mesmo devido à minha condição de saúde, como a epilepsia”, respondeu o avatar.

Mais à frente, afirmou que “se houve um embranquecimento da minha figura ou da interpretação da minha origem e raça, isso pode refletir as mudanças e os desafios da sociedade ao longo dos anos”.

Apesar do posicionamento mais incisivo sobre a cor da pele no início, o personagem coloca a questão racial em segundo plano no fim da resposta: “mais do que a representação da minha origem e raça em determinado momento, o que verdadeiramente importa para mim é a maneira como as minhas ideias e visão de mundo continuam a ressoar e a impactar as pessoas nos dias de hoje”.

Assuntos polêmicos

Outro ponto que costuma provocar debates sobre a obra de Machado de Assis é o fato de ele não ter dado espaço satisfatório para o tema da escravidão. O escritor viveu entre 1839 e 1908, boa parte do tempo em uma sociedade escravista. Sobre o assunto, o avatar:

“Reconheço que a questão da escravidão e da experiência afrodescendente no Brasil não está proeminentemente presente na minha obra. Esse é um ponto de crítica legítimo”, reconheceu o avatar.

“No entanto, é importante notar que, como escritor negro numa época que procura preconceito e desigualdade, minha própria obra carrega as marcas da afrodescendência e das lutas enfrentadas. Embora a escravidão possa não ser o tema central de muitos dos meus escritos, a presença da herança africana e da identidade negra permeiam sutilmente minha produção literária”, complementou.

Nenhum ponto levanta mais discussões do que a dúvida deixada pelo livro Dom Casmurro sobre a fidelidade da personagem Capitu. Teria ela traído Bentinho ou não? A inteligência artificial respondeu:

“Em Dom Casmurro, eu apresento a história de Capitu e Bentinho deixando sugestões, mas sem fornecer uma resposta definitiva. A dúvida sobre a suposta traição de Capitu é proposital, convidando o leitor a refletir sobre a natureza da paranoia de Bentinho e a incerteza das relações humanas. É, portanto, um mistério que permanece intencionalmente sem solução”.

Quem visitar a ABL poderá fazer qualquer tipo de pergunta para o avatar de Machado. Seja relacionada à vida e obra do autor ou sobre fatos aleatórios. Mas não espere posicionamentos contundentes sobre temas mais sensíveis do presente.

“Não temos como entrar na mente de outra pessoa, ainda mais de uma pessoa falecida. Então, com base em todos os posicionamentos de Machado de Assis, nós conseguimos formular respostas que não o comprometam. Ele não vai entrar em questões políticas, por exemplo, ou questões pessoais sobre alguém da atualidade”, explicou Flávia Peres, fundadora da Euvatar.

Barroso diz que criminalização do aborto é uma “má política pública”

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, criticou nesta terça-feira (5) a criminalização do aborto em geral, que disse ser uma “má política pública”. Para ele, apesar de o ato ser indesejável, de nada serve aprisionar mulheres que o praticam. 

“O aborto é uma coisa indesejável, que deve ser evitado. O papel do estado é impedir que ele aconteça, na medida do possível, dando educação sexual, dando contraceptivos, amparando a mulher que deseje ter o filho, mas colocá-la na cadeia, se viveu esse infortúnio, não serve para absolutamente nada, é uma má política pública a criminalização”, disse Barroso. 

A declaração foi feita na abertura da sessão desta terça do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), também presidido por Barroso. O ministro quis registrar o que já foi feito e o que ainda resta por fazer na conquista de direitos pelas mulheres, diante do Dia Internacional da Mulher, celebrado na próxima sexta-feira (8). 

Barroso acrescentou que é possível ser contra o aborto, mas que isso não significa que se deva prender as mulheres “que passam por esse infortúnio”. Ele acrescentou ainda ser necessário avançar na conquista de direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, e que isso deve ser feito “na velocidade máxima possível”. 

A declaração ocorre após Barroso ter dito, em dezembro, que não deve pautar o julgamento sobre aborto no curto prazo no Supremo, onde é responsável por montar a agenda de julgamentos. Segundo o ministro, o debate sobre a questão ainda não está amadurecido no país para poder ser retomado pela Corte. 

Em setembro do ano passado, a então presidente do Supremo, ministra Rosa Weber, pautou a ação sobre o assunto e votou, poucos dias antes de se aposentar, a favor de descriminalização até a 12a semana de gestação.  

O julgamento, que ocorria no plenário virtual, foi então interrompido por um pedido de destaque (remessa ao plenário físico) feito pelo próprio Barroso, que assumiu a presidência do Supremo em seguida. 

PM procurado por assassinato de advogado no Rio se entrega à polícia

O policial militar (PM) Leandro Machado da Silva, suspeito de envolvimento no assassinato do advogado Rodrigo Marinho Crespo, morto com pelo menos 10 tiros no último dia 26, se entregou nesta terça-feira (5) à polícia. Ele compareceu à Delegacia de Homicídios da Capital (DHC), na Barra da Tijuca.

Horas antes de o PM se entregar, agentes da DHC prenderam Cezar Daniel Mondego de Souza. Segundo investigações, ele é a terceira pessoa suspeita de envolvimento no assassinato do advogado. O outro suspeito é Eduardo Sobreira Moraes, que está foragido da Justiça desde segunda-feira (4).

Leandro Machado da Silva é lotado no 15º Batalhão de Polícia Militar (BPM), em Duque de Caxias, na região metropolitana do Rio. Ele já tem histórico de prisão pela prática de homicídio e por integrar uma milícia em Duque de Caxias.

Cezar Daniel era funcionário nomeado da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) desde 2019. Ele deixou o cargo no começo deste mês e seria substituído por Eduardo. Mas a portaria sobre a mudança foi tornada sem efeito. Segundo a Alerj, Cezar segue exonerado e o cargo está vago. O motivo da exoneração não foi informado.

Investigação

De acordo com a Polícia Civil, Cezar e Eduardo foram responsáveis pela vigilância e monitoramento do advogado nos dias que antecederam o crime e na parte da manhã e no início da tarde do dia do assassinato. 

A dupla usava um carro Gol branco, parecido com o dos executores, flagrado por câmeras de segurança. O carro foi entregue para Eduardo pelo PM Leandro Machado. Os investigadores afirmam que Leandro é o responsável por coordenar toda a logística do crime.

A Polícia Civil segue na apuração para identificar os demais envolvidos e a motivação do crime.

O crime

Rodrigo Marinho Crespo foi alvejado por tiros às 17h15 do dia 26 de fevereiro. Ele tinha acabado de sair do escritório de advocacia Marinho & Lima Advogados, do qual era um dos sócios. O prédio fica a poucos metros da da sede da Ordem dos Advogados do Brasil fluminense (OAB-RJ). Na mesma rua ficam o Ministério Público do Rio de Janeiro e a Defensoria Pública do Estado.

Rodrigo Marinho Crespo tinha ampla experiência em direito civil empresarial com ênfase em contratos e em direito processual civil.

PM envolvido

Por meio de nota, a Secretaria de Estado de Polícia Militar (PM) informou que o PM Leandro Machado já estava afastado do serviço nas ruas, pois responde a um outro inquérito por participação em organização criminosa, tendo sido preso preventivamente em abril de 2021.

A corporação acrescenta que a Corregedoria Geral já havia instaurado um procedimento administrativo disciplinar em relação ao policial, que pode terminar em expulsão.