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Ataques do 8/1 revelaram ódio ao STF, apontam especialistas

Duas virtudes, entre muitas que um jornalista deve ter, são curiosidade e iniciativa. Foram eles que motivaram o repórter da Agência Brasil Alex Rodrigues. Ele interrompeu sua folga de domingo – por vontade própria, sem ter recebido ordem – para saber o que se passava na Esplanada dos Ministérios no dia 8 de janeiro de 2023.

Após ter visto pela televisão as cenas de invasão e destruição do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto e do Supremo Tribunal Federal, o repórter suspendeu seu descanso, pegou sua caderneta de anotações, uma caneta, o crachá e dois celulares, e se deslocou para a Praça dos Três Poderes.

Rodrigues conseguiu acessar o local por uma escada do anexo do STF em momento que a polícia já havia expulsado os vândalos de dentro da sede da Suprema Corte, mas ainda tinha de atuar contra os que permaneciam nas cercanias do prédio. Essas pessoas atacavam os policiais, mas quando o batalhão avançava e ameaçava disparar, os manifestantes radicais se ajoelhavam com os braços estendidos fazendo orações ou cantando o hino nacional.

Após os guardas anunciarem que atirariam se as pessoas não seguissem recuando, Rodrigues, que estava próximo aos manifestantes, se identificou como repórter para não ser alvejado, gritando e mostrando seu crachá de jornalista. Ao dizer que trabalhava para a imprensa, um bolsonarista tentou tomar sua identificação.

O que jornalista da Agência Brasil reteve na memória daquele instante foi que seu agressor parecia não compreender o que estava fazendo, não o ouvia. “Eu falava com ele e ele não olhava para mim. A impressão é que ele não estava entendendo o que estava acontecendo ali”, descreve Rodrigues, que também é psicólogo. “Me chamou atenção uma certa raiva, um ódio, diferente do que estávamos acostumados a ver.”

O repórter Alex Rodrigues foi o primeiro jornalista a entrar no STF após a retirada dos vândalos – Alex Rodrigues/Agência Brasil

Depois de resgatar o crachá, o repórter foi para trás da barreira policial e se dirigiu à sede do STF. Ele foi o primeiro jornalista a entrar no prédio, tirar fotos e fazer imagens da destruição deixada. O ar cheirava a gás lacrimogênio e o chão estava encharcado. “Saí de lá com o tênis todo molhado”, recorda-se.

>> Ouça o podcast Histórias em pauta: grades de janeiro

Alvo prioritário

A destruição do STF, cujo prédio é menor que o do Palácio do Planalto e o Congresso Nacional, causou mais prejuízo aos cofres públicos. Conforme o relatório da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Atos do Dia 8 de janeiro de 2023, os danos ao prédio do Supremo, incluindo equipamentos, mobiliário, obras de arte, relíquias e outros objetos, custaram R$ 11,41 milhões – bem acima do verificado no Senado Federal (R$ 3,5 milhões), na Câmara dos Deputados (R$ 3,55 milhões) e no Palácio do Planalto (R$ 4,3 milhões).

Ao pensar no estrago que presenciou no Supremo Tribunal Federal e do que, posteriormente, soube do acontecido no Planalto e no Congresso, Alex Rodrigues assinala que havia “ódio indiscriminado contra todos os Poderes.” Ele pondera, no entanto, que “o STF era, naquele momento, um alvo prioritário”. Em sua análise, os manifestantes viam o Supremo como legitimador da vitória do PT. “Para eles, foi quem permitiu essa situação, anulando as condenações de Lula e não invalidando os resultados das urnas.”

Para o também jornalista Felipe Recondo – diretor de conteúdo do portal Jota (especializado no Poder Judiciário), autor e coautor de três livros sobre o STF – os ataques dirigidos à Corte têm lastro nos quatro anos de confrontações provocadas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. “Ele construiu uma retórica que muita gente repetia, de que o Supremo não deixava o seu projeto de governo seguir. Acho que isso ficou galvanizado na cabeça das pessoas, e explica tamanho ódio que expunham.”

Recondo pontua que os embates entre o Poder Executivo e o Poder Judiciário não aconteceram apenas no Brasil. “Não me parece que seja uma novidade só do Brasil. Muito pelo contrário, né? A gente vê esses exemplos em outros países do mundo que passam por esse fenômeno do populismo autoritário”, disse tendo em mente casos recentes de Israel e do México.

Avaliação do jornalista Felipe Recondo é de que os discursos do então presidente Jair Bolsonaro ao longo do seu mandato convergiram para a destruição do prédio do Supremo. – Marcelo Camargo/Agência Brasil

“Pílulas envenenadas”

De acordo com Recondo, cientistas sociais no México descrevem que chefes de governo “oferecem pílulas envenenadas às cortes supremas” em medidas, decretos e leis “escancaradamente inconstitucionais”, já tendo certeza de que a reação será negativa. “Isso cria um antagonismo evidente. E os apoiadores desse presidente, geralmente popular, passam a olhar o a corte suprema do seu país como inimigo.”

Por vezes, “a inação” do presidente da República também provocava o Poder Judiciário como aconteceu no Brasil. “O Supremo se via obrigado a agir e, com isso, angariava as críticas de parte da sociedade, dos apoiadores do presidente Bolsonaro”, descreve Recondo. Ele se referiu, por exemplo, à determinação de vacinação compulsória contra a covid-19 (dezembro de 2020) e à ordem para realizar o censo demográfico (maio de 2021).

Apesar dos embates com Bolsonaro, que culminaram nos ataques de 8 de janeiro, Recondo pontua que “foi a primeira vez na história que o tribunal se manteve de pé diante de uma crise com o Executivo”.

Histórico de embates

Em outros momentos, a Corte sofreu reveses. Como aconteceu, em 1892, quando o STF, após ameaças do “Marechal de Ferro”, recusou a concessão de habeas corpus de detidos durante estado de sítio; e durante a vigência do Estado Novo (1937-1945) e da ditadura militar (1964-1985), quando ministros foram cassados pelos regimes de exceção.

O jornalista aponta que, apesar da vitória institucional, “o STF vai ter que trabalhar para recompor sua imagem, sua legitimidade e tentar convencer essa parcela da sociedade de que não é aquele Supremo que foi pintado pelo bolsonarismo.”

Crimes graves

O desafio se coloca quando o STF tem pela frente a continuação dos julgamentos de pessoas envolvidas no 8 de janeiro. Para o cientista político Antônio Lavareda, o STF deve fazer punição rigorosa. “Tem condições, sim, e deve fazê-lo sob pena e risco de se apequenar dentro de conjunturas políticas. O Supremo tem de cumprir o seu papel. Ele é o guardião final da Constituição. Esses crimes são extremamente graves e contra a natureza da Nova República.”

Para Lavareda, há cinco categorias de responsáveis pelo 8 de janeiro. “Primeiro são os autores materiais dos atentados. Aqueles milhares de personagens que invadiram a Praça dos Três Poderes. Em segundo lugar, obviamente, os promotores e organizadores daqueles atos.” Ou seja, propagandistas pelas redes sociais e quem concebeu e planejou os ataques. “Aquilo teve uma lógica, não foram manifestações espontâneas”, ressalta.

Em terceiro lugar, Lavareda aponta para quem custeou os ataques. “Os financiadores são, em geral, empresários. Pessoas que investiram dinheiro e participaram desse projeto.” O cientista político ainda assinala a necessidade de punir “aqueles elementos que foram uma espécie de garantidores, gente que forneceu infraestrutura e suporte para quem estava na frente dos quartéis. Nesse contingente há muitos militares reformados e muitos militares dentro dos quartéis.”

Por fim, ele espera que o julgamento atinja “o autor intelectual dos atentados”. Segundo ele, para isso, “não precisa fazer aquela apresentação em PowerPoint do [Deltan] Dallagnol, né? Basta uma seta apontando para o Bolsonaro”, opina.

Unidade institucional

Para o jornalista Felipe Recondo, episódio de 8/1/23 uniu os ministros da Corte como pouco havia se visto. Eles deixaram suas diferenças de lado para responder a ameaça sofrida. Foto: Jose Cruz/Agência Brasil

“Os responsáveis devem ser punidos de forma exemplar. A punição não tem só o efeito de reparação. Aos olhos da sociedade, esse é o efeito principal dela, é o efeito dissuasório. É desestimular que atos semelhantes venham ocorrer no futuro”, pontua.

Conforme noticiou a Agência Brasil, o ministro do STF, Alexandre de Moraes, relator das investigações do 8 de janeiro, assegurou que haverá punição para todas as categorias de envolvidos.

“Todos, absolutamente todos aqueles que pactuaram covardemente com a quebra da democracia e a tentativa de instalação de um Estado de exceção, serão devidamente investigados, processados e responsabilizados na medida de suas culpabilidades”, garantiu em discurso ontem (8), durante o ato em defesa da democracia, no Congresso Nacional.

Felipe Recondo acredita que haverá condenação e castigo no inquérito sobre o 8 de janeiro. “A questão pra mim é só tempo.” Ele acredita que o Supremo terá “instrumento total”, inclusive para chegar à classe política.

O jornalista ainda sublinha que os ataques de Jair Bolsonaro contra a Corte e a Constituição durante todo o mandato, bem como os incidentes do 8 de janeiro, tiveram por efeito colateral unir os ministros do STF, sempre apontados como onze ilhas isoladas de decisão.

“Isso refluiu bastante e os ministros passaram inclusive a conversar sobre reações institucionais. Fizeram reuniões formais e informais pra saber como reagiriam aquelas ameaças e mantiveram, durante esses quatro anos, uma unidade institucional que a gente pouco viu no passado”, revela o jornalista que cobre o STF “diuturnamente há 18 anos.”

Brasileiros ainda não sacaram R$ 7,51 bilhões de valores a receber

Os brasileiros ainda não sacaram R$ 7,51 bilhões em recursos esquecidos no sistema financeiro até o fim de novembro, informou nesta segunda-feira (8) o Banco Central (BC). Até agora, o Sistema de Valores a Receber (SVR) devolveu R$ 5,55 bilhões, de um total de R$ 13,06 bilhões postos à disposição pelas instituições financeiras.

As estatísticas do SVR são divulgadas com dois meses de defasagem. Em relação ao número de beneficiários, até o fim de novembro, 17.379.507 correntistas haviam resgatado valores. Isso representa apenas 28,86% do total de 60.225.711 correntistas incluídos na lista desde o início do programa, em fevereiro de 2022.

Entre os que já retiraram valores, 16.504.231 são pessoas físicas e 875.276 são pessoas jurídicas. Entre os que ainda não fizeram o resgate, 39.786.602 são pessoas físicas e 3.059.602 são pessoas jurídicas.

A maior parte das pessoas e empresas que ainda não fizeram o saque têm direito a pequenas quantias. Os valores a receber de até R$ 10 concentram 63,38% dos beneficiários. Os valores entre R$ 10,01 e R$ 100 correspondem a 25,21% dos correntistas. As quantias entre R$ 100,01 e R$ 1 mil representam 9,69% dos clientes. Só 1,71% tem direito a receber mais de R$ 1 mil.

Depois de ficar fora do ar por quase um ano, o SVR foi reaberto em março de 2023, com novas fontes de recursos, um novo sistema de agendamento e a possibilidade de resgate de valores de pessoas falecidas. Em março, informou o BC, foram resgatados R$ 505 milhões esquecidos. Em outubro, foram retirados R$ 178 milhões, queda em relação ao mês anterior, quando tinham sido resgatados R$ 264 milhões.

Melhorias

A atual fase do SVR tem novidades importantes, como impressão de telas e de protocolos de solicitação para compartilhamento no WhatsApp e inclusão de todos os tipos de valores previstos na norma do sistema. Também haverá uma sala de espera virtual, que permite que todos os usuários façam a consulta no mesmo dia, sem a necessidade de um cronograma por ano de nascimento ou de fundação da empresa.

Além dessas melhorias, há a possibilidade de consulta a valores de pessoa falecida, com acesso para herdeiro, testamentário, inventariante ou representante legal. Assim como nas consultas para pessoas vivas, o sistema informa a instituição responsável pelo valor e a faixa de valor. Também há mais transparência para quem tem conta conjunta. Se um dos titulares pedir o resgate de um valor esquecido, o outro, ao entrar no sistema, conseguirá ver as informações: como valor, data e CPF de quem fez o pedido.

Fontes de recursos

Também foram incluídas fontes de recursos esquecidos que não estavam nos lotes do ano passado. Foram acrescentadas contas de pagamento pré ou pós-pagas encerradas, contas de registro mantidas por corretoras e distribuidoras encerradas e outros recursos disponíveis nas instituições para devolução.

Além dessas fontes, o SVR engloba os seguintes valores, já disponíveis para saques no ano passado. Eles são os seguintes: contas-corrente ou poupança encerradas; cotas de capital e rateio de sobras líquidas de ex-participantes de cooperativas de crédito; recursos não procurados de grupos de consórcio encerrados; tarifas cobradas indevidamente; e parcelas ou despesas de operações de crédito cobradas indevidamente.

Golpes

O Banco Central aconselha o correntista a ter cuidado com golpes de estelionatários que alegam fazer a intermediação para supostos resgates de valores esquecidos. A instituição ressalta que todos os serviços do Valores a Receber são totalmente gratuitos, que não envia links, nem entra em contato para tratar sobre valores a receber ou para confirmar dados pessoais.

O BC também esclarece que apenas a instituição financeira que aparece na consulta do Sistema de Valores a Receber pode contatar o cidadão. O banco também pede que nenhum cidadão forneça senhas e destaca que ninguém está autorizado a fazer tal tipo de pedido.

Aplicativo Celular Seguro ultrapassa 500 mil registros em 3 dias

A plataforma Celular Seguro, aplicativo do governo que bloqueia smartphones e aplicativos digitais, em caso de perda, roubo ou furto do aparelho, ultrapassou a marca de 500 mil cadastros de usuários, até as 15h desta sexta-feira (22), portanto, três dias após o lançamento feito pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), em parceria com a Agência Nacional de telecomunicações (Anatel) e a Federação Brasileira de Bancos (Febraban).. 

O app é gratuito e pode ser acessado pelo site Celular Seguro do Ministério da Justiça e Segurança Pública ou nas lojas de aplicativos online. No Google Play Store, para celulares com sistema operacional Android, foram feitos 465.150 mil downloads. Em aparelhos iPhone (sistema iOS) foram contabilizados 194 mil downloads. Com isso, o aplicativo foi o mais baixado do país por dois dias seguidos.

Ao todo, a ferramenta recebeu 2.544 alertas de usuários referentes a perdas, roubos ou furto de aparelhos, segundo o Ministério da Justiça e Segurança Pública. O secretário-executivo da pasta, Ricardo Cappelli, declarou que esses números demonstram confiança das pessoas nas ações do Ministério diante de problemas.

“Temos o compromisso de resolver os problemas mais graves da população. É assim em relação ao crime organizado, aos crimes violentos letais intencionais e também no combate ao roubo e furto de celulares. Realizamos ações que impactam positivamente o cotidiano da sociedade.”

Cadastro

O aplicativo foi criado para prevenir o uso indevido de celulares roubados ou furtados, por meio de notificações da situação de forma mais rápida das operadoras e instituições bancárias e de crédito. Com apenas um clique, o usuário pode preservar dados habitualmente armazenados nos celulares, como número de CPF e senhas.

Para fazer o cadastro o Celular Seguro, antes, o usuário deve acessar a própria conta no portal Gov.br, com login do CPF e senha. Não há limite para o cadastro de números, mas eles precisam estar vinculados ao CPF para que o bloqueio seja efetivado.

A pessoa cadastrada poderá indicar outras de sua confiança, que estarão autorizadas a efetuar os bloqueios, caso o titular tenha o celular roubado, furtado ou extraviado.

De acordo com o MJSP, até a tarde de sexta-feira, 331.470 pessoas de confiança foram incluídas.

Também é possível que a própria vítima bloqueie o aparelho acessando o site por um computador. Além disso, é possível acessar o aplicativo por meio de navegadores, como o Google Chrome e o Microsoft Edge, e registrar a ocorrência, de forma simples.

Bloqueio

Em um processo simples, o cidadão poderá acionar os bancos e sua operadora telefônica para o bloqueio do acesso remoto às contas e o sinal do aparelho. O bloqueio não é imediato e pode variar conforme a instituição bancária, em até 24 horas após o registro do sinistro.

Após o registro de perda, roubo ou extravio do celular, os bancos que aderiram ao projeto farão o bloqueio das contas.

De acordo com a Febraban, o bloqueio dos aparelhos celulares, por meio dos códigos dos IMEIs dos aparelhos, que funcionam como uma “impressão digital” única de cada celular. Este número de identificação, IMEI, permite que as operadoras identifiquem os aparelhos conectados à sua rede de telefonia móvel. O número IMEI pode ser acessado no menu “Configurações” do aparelho e fica disponível na aba “Sobre o telefone”. O número do IMEI aparecerá junto aos números de telefone, modelo e série do aparelho. Outra forma de encontrar o IMEI do celular é procurar na nota fiscal do aparelho ou na embalagem.

O corte das linhas telefônicas, porém, entrará em vigor até fevereiro de 2024.

Para conhecer as empresas que já aderiram ao aplicativo, o usuário pode conferir os termos de uso da plataforma. Até o momento, já aderiram à iniciativa 12 bancos: Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Bradesco, Santander, Itaú, Banco Inter, Sicoob, XP Investimentos, Banco Safra, Banco Pan, BTG Pactual e Sicredi.

Recuperação de dados

O Ministério afirma que não há a opção de bloqueio temporário. Caso o aparelho seja recuperado, o usuário terá que entrar em contato com a operadora de telefonia e com os demais parceiros do Projeto Celular Seguro, como bancos e aplicativos, para reativar seus acessos.

Fake news

Por fim, o Ministério da Justiça e Segurança Pública alerta os donos de celulares para fake news que estão sendo espalhadas na rede sobre o funcionamento do Celular Seguro. Ele afirma que o governo federal não acessa nenhum dado que esteja no telefone do usuário. Nem envia e-mails ou links para que o usuário acesse a plataforma.

Ex-moradores de bairros desativados revelam sentimentos em mensagens

Circular pelos bairros que foram desativados em Maceió é um misto de tristeza e angústia. As casas que antes abrigavam famílias inteiras, têm somente a vegetação como residente agora – trepadeiras de folhas muito verdes que nascem das rachaduras e cobrem muros, paredes, placas e revestimentos.

Os sinais da tragédia anunciada começaram em 2018, após fortes de chuvas de verão em fevereiro daquele ano e quando um tremor de terra foi sentido em alguns bairros de Maceió. As primeiras fissuras foram identificadas em residências e vias públicas do Pinheiro, mas como já se sabe, não seria um caso isolado.

Um estudo realizado pelo Serviço Geológico do Brasil, ligado ao governo federal, investigou as causas da movimentação do solo em parte de Maceió, onde havia a exploração, há mais de 40 anos, de sal-gema no subsolo.

Em 2019, os que viviam nos bairros em torno da Laguna Mundaú, começaram a ser removidos da região por conta do risco de desabamento – literalmente sob os pés da população. Desde então, o risco de afundamento do solo incluiu Mutange, Pinheiro, Bom Parto, Bebedouro e Farol. Este último, parcialmente afetado, mas o suficiente para obrigar que o único hospital psiquiátrico público de Alagoas a mudar de local.

Joicye Evaristo mostra uma parede em sua residência rachada devido ao rompimento da mina n°18 da mineradora Baskem – Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

Nas zonas afetadas, impressão é de que os antigos moradores levaram o que deu. É comum ver que janelas e esquadrias foram arrancadas, tal como o sonho e os investimentos de uma vida de quase 60 mil moradores e comerciantes que tiveram de abandonar suas residências e comércios em cinco bairros condenados à extinção pela atividade de mineração.

A atmosfera das ruas bairros é pesada, como se houvesse um vácuo entre a vida que se costumava ter ali, com sons e vozes, carros passando, crianças brincando, pessoas circulando, e o que se tem agora, um cenário perfeito e real de abandono que parece ter saído de filmes de terror.

Casas e prédios inteiros cercados por tapumes de zinco, portas e janelas seladas por tijolos e cimento, paredes marcadas em vermelhos, com placas da Defesa Civil afixadas, indicando que o imóvel está condenado, deixam claro que aquelas residências, que por muitos anos significaram conforto e segurança para as famílias, agora só oferecem perigo e risco. O cenário se soma às sinalizações de rota de fuga, espalhadas pela região e que dão a sensação a quem passa por ali de ser um clandestino.

Mas, embora esses cinco bairros tenham sido sentenciados a se tornarem obsoletos e desertos, por conta da exploração de minério realizado pela Braskem em 35 minas, ainda é possível ver e ouvir a voz desses milhares de desabrigados como num brado de resistência, nos muros, nas calçadas, no asfalto. Mensagens deixadas pelos moradores compartilham um misto de dor, revolta, tristeza e saudade do lugar que um dia chamaram de lar.

Vista de casas no Bairro Flexal de Baixo, nas proximidades da mina n°18 da mineradora Baskem – Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

Monitoramento

Após a conclusão dos estudos por parte do Serviço Geológico do Brasil, em 2019, as atividades de exploração do sal-gema foram paralisadas. No mesmo ano, foram implementadas as ações emergenciais no Pinheiro e a instalação de um serviço de monitoramento, sob a coordenação da Defesa Civil de Maceió.

Desde então, o monitoramento da região que apresenta afundamento de solo e também das minas é feito diariamente e de forma ininterrupta.

Recentemente, com o colapso de parte da mina 18, na Laguna Mundaú, um dos equipamentos foi perdido. No entanto, segundo a Defesa Civil, o acompanhamento das áreas foi adaptado para continuar sendo feito.

Em nota, a instituição afirmou que um novo equipamento já foi providenciado e instalado e que em cerca de 10 dias estará apto para medir a movimentação do solo de forma precisa. Enquanto isso, o local está sendo monitorado pelos demais instrumentos de medição.

Sinalização nas imediações da mina 18 da Braskem – Foro: Joédson Alves/Agência Brasil

Acordos

Desde 2019, foram fechados cinco acordos de reparação e indenização entre a mineradora Braskem e a Prefeitura de Maceió. Esses acordos, no entanto, estão sendo questionados na Justiça.

A Procuradoria-Geral do Estado de Alagoas entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal para questionar algumas cláusulas dos pactos fechados entre 2019 e 2022. A arguição de Descumprimento de Preceitos Fundamentais, a ADPF, quer garantir que a mineradora seja punida pelos crimes ambientais.

Mas, de acordo com a procuradoria, a forma como o pacto foi firmado, beneficia e traz ganhos financeiros à Braskem, já que futuramente ela terá direito à titularidade à exploração econômica de toda a área que foi desapropriada por causa dos impactos da extração do minério sal-gema.

Entrada principal da mineradora Braskem – Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

A procuradoria pede ainda que sejam declaradas inconstitucionais as cláusulas que deram a quitação irrestrita à Braskem e que autorizam a transferência da titularidade de imóveis públicos e particulares à mineradora como medida compensatória de eventual indenização paga às vítimas.

Em nota, a Braskem disse que firmou cinco acordos com autoridades federais, estaduais e municipal que estão sendo cumpridos integralmente. A mineradora disse ainda que todos eles foram fruto de ampla discussão, baseados em dados técnicos, têm respaldo legal e foram homologados na Justiça. E que vai se manifestar somente nos autos do processo quando for notificada.

Desigualdade de acesso aos direitos humanos começa no nascimento

A Declaração Universal dos Direitos Humanos completa 75 anos neste domingo (10) e destaca as crianças como detentoras do direito a “cuidados e assistência especiais”, como expresso no próprio texto, em seu Artigo 25. Porém, já ao nascer, elas são alvo de desigualdades que influenciarão em toda a trajetória de suas vidas.

A diretora do Centro Internacional de Estudos e Pesquisa sobre a Infância (Ciespi) da PUC-Rio, Irene Rizzini, destaca que a declaração afirma que todas as pessoas devem ter capacidade de gozar dos direitos previstos no texto, como diz o Artigo 2, “sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição”. Entretanto, isso não ocorre nem mesmo nas primeiras horas de vida.

“Ao nascer, a criança precisa ser muito bem cuidada, porque ela nasce com muitos potenciais. Mas para atingir esses potenciais, precisa comer bem, precisa de afeto, de cuidados, ela precisa se sentir protegida, se sentir segura, né? O dinheiro é importante para assegurar que ela tenha uma casa, que nessa casa ela tenha alimentação para o corpo desenvolver, para o cérebro desenvolver”, diz Rizzini.

De acordo com Rizzini, que também é professora do Departamento de Serviço Social da PUC, há uma impressão de que apenas os mais necessitados precisam ter os direitos expressos, quando, segundo a diretora, a responsabilidade é compartilhada por toda a sociedade.

 Foto Rovena Rosa/Agência Brasil

“Há uma distorção muito grande sobre isso no próprio entendimento dos direitos. É como se só aqueles que são mais pobres e que têm seus direitos mais claramente violados precisassem desses direitos. Não é isso que a Declaração Universal diz. A nossa desigualdade mostra a nossa ignorância em relação à possibilidade de compartilhar e viver em sociedade”, explica.

Crianças

Quanto à infância, especificamente, a professora relembra que a primeira Declaração dos Direitos da Criança é de 1924, e que os estatutos das agências especializadas colocam que “a humanidade deve à criança o melhor de seus esforços”. Enquanto no Brasil, a legislação ainda criminalizava as crianças pobres, com o Código de Menores de 1927.

“Três anos depois da Declaração Universal de Direitos da Criança, o Brasil ainda estava no minorismo, né? A criança enquanto menor abandonado e delinquente. Nós precisamos sair dos anos de ditadura militar, voltar toda a discussão de uma nova Constituição, com uma militância muito forte em relação à população infantil e adolescente. Principalmente porque nós tínhamos ainda grandes orfanatos lotados de crianças que não eram órfãs, eram apenas pobres e vistas como menores. Essa virada só foi acontecer, marcadamente, com a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente”.

Rizzini destaca que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de julho de 1990, só foi aprovado após a Declaração dos Direitos da Criança, proclamado pela ONU em 1989, e da Constituição Federal de 1988, que previa a criança e o adolescente como sujeitos de direitos, em seu Artigo 227, além de incluir a responsabilidade da família, da sociedade e do Estado pelo bem-estar deles.

“Esse é o grande salto do ECA e dos anos 80, de dizer ‘não vamos culpabilizar a família’. Se essa família não está conseguindo prover tudo que aquela criança precisa, ela também precisa ser cuidada, ela precisa ter trabalho, ter uma moradia digna. Ela não pode ficar todos os dias preocupada se a casa vai cair, se amanhã não tem comida na mesa. Esse tipo de coisa é responsabilidade do Estado”.

Ela destaca o avanço legislativo do Brasil com a aprovação, em 2016, do Marco Legal da Primeira Infância, que determina atenção especial aos primeiros anos de vida.

“É uma coisa muito nova, em que o Brasil começa a dizer que as crianças, quando são pequenininhas, se elas não tiveram um bom começo de vida, se elas não se alimentarem, não puderem ter acesso à saúde, à educação, vai ficar mais difícil para elas. Isso é política pública pensando também no futuro do país. Nós estamos falando em transferência de rendam, em redistribuição de renda que precisa ser feita nesse país”, explica.

Defensora pública do estado do Rio de Janeiro Andréa Sepúlveda – Tânia Rego

Porém, mesmo com tantas declarações e leis determinando o acesso aos direitos mínimos para cada pessoa viver dignamente, nem todos conseguem acessar questões básicas como alimentação e água potável. Para a defensora pública Andréa Sepúlveda, os direitos no papel são importantes para que se possa exigir, até mesmo na Justiça, que eles sejam cumpridos.

“Eu falo que os direitos são como superpoderes, porque eles são instrumentos. Se eles fossem totalmente implementados, a gente teria a sociedade ideal. Mas a gente vive em sociedade onde tudo se relaciona a poder, então quanto mais poder um determinado grupo tem na sociedade, mais os direitos daquelas pessoas são assegurados. As pessoas que estão vivendo na pobreza, que não têm o poder político ou econômico, não conseguem virar essa chave. Por isso é muito importante que a gente tenha movimentos sociais, que a gente tenha educação para a política, para os direitos, para que as pessoas saibam que elas podem lutar pelos seus direitos”, defende.

Conferência

Irene Rizzini destaca a participação dos jovens e crianças na elaboração das políticas públicas. Em abril, será realizada em Brasília a 12ª Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, organizada pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).

“Em todo o município tem um conselho, e tem uma conferência livre, onde as crianças podem inclusive organizar sua conferência. Depois tem as conferências municipais que vão discutir o que as crianças acham que é importante incluir. E aí são eleitos delegados, os representantes de cada estado que vão estar em Brasília. Vai estar lotado, são centenas de crianças e adolescentes que participam com adultos, é uma coisa muito linda, que dá muita esperança pra gente, apesar dos imensos desafios desse país”, disse.

Podcast

Para marcar os 75 anos da Declaração dos Direitos Humanos, a Radiogência Nacional lançou neste domingo o podcast Crianças Sabidas. Neste primeiro episódio da produção, que vai trazer o formato jornalístico voltado para o público infantil, o tema é a declaração.

Com produção e roteiro da jornalista da Agência Brasil Akemi Nitahara, que é autora da série de livros infantis Naomi e Anita, o podcast explica de uma forma lúdica e com linguagem acessível para as crianças o que são os direitos humanos e os artigos da declaração. A menina Maria Eduarda, de 8 anos de idade, neta da jornalista da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) Beatriz Arcoverde, participa da locução do podcast.

O trabalho vem consolidar o formato de podcast no jornalismo da EBC, inovando com a linguagem destinada ao público infantil. Crianças Sabidas está disponível na página da Radioagência Nacional, nos tocadores de áudio e com interpretação em Libras no Youtube.