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STF permite vestimentas religiosas em fotos de documentos oficiais

Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira (17) garantir que religiosos podem tirar fotos para documentos oficiais com vestimentas e acessórios relacionados às suas crenças. Com a decisão, os acessórios só poderão ser vetados se impedirem a identificação individual.

A questão foi definida no julgamento de um recurso do Ministério Público Federal (MPF) para garantir a uma freira o direito de tirar a Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Ela foi impedida pelo Departamento de Trânsito (Detran) de Cascavel (PR) de tirar o documento por se recusar a tirar o hábito, vestimenta característica da religião católica.

A proibição foi baseada na Resolução 192/2006, editada pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran). A norma proibiu o uso de vestuário e acessórios que cubram a cabeça ou parte do rosto. No início deste mês, o Contran liberou os itens religiosos.

Nas instâncias inferiores, a Justiça garantiu a utilização do hábito e definiu que a vestimenta não é um acessório estético. 

Em 2014, o caso chegou ao Supremo por meio de um recurso da União. Na época, estava em vigor a antiga regra do Contran que proibia os acessórios.

Em fevereiro deste ano,  a Advocacia-Geral da União (AGU) enviou um documento ao Supremo para informar a intenção do governo federal de alterar as normas sobre trajes religiosos em fotos da CNH.

Nova resolução

De acordo com a Resolução nº 1.006, os itens de vestuário relacionados à crença ou religião, como véus e hábitos, e relacionados à queda de cabelo por causa de doenças e tratamento médico poderão ser utilizados nas fotos usadas para tirar o documento ou renová-lo, porém a face, a testa e o queixo precisam ficar visíveis.

A legislação mantém a proibição para utilização de óculos, bonés, gorros e chapéus nas fotos da carteira de motorista.

Cacique pede atenção para o apoio à produção agrícola indígena

Diante de uma audiência de lideranças rurais da maioria dos países americanos, no primeiro Encontro de Líderes Rurais, a cacique Katia Silene Tonkyre, da aldeia Akratikatejé, do povo Gavião da Montanha, do Pará, chamou a atenção para a necessidade de incentivos para que os povos indígenas desenvolvam os próprios projetos agrícolas.

“Temos vontade de crescer e continuamos ensinando as novas gerações de plantar, de dar continuidade, de se alimentar como se alimentava antes. Nós vivíamos da nossa floresta e tentamos ainda lutar porque o capitalismo invadiu a nossa comunidade, e nós tínhamos um capitalismo diferenciado, que era a economia verde. Então, hoje, o capitalismo invadiu e nós temos que acompanhar”, enfatizou.

Tonkyre recebeu, este ano, o prêmio Alma da Ruralidade, do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), titulação voltada para reconhecer, nos países americanos, o trabalho de lideranças rurais. Esta semana, ela participa junto a outras 41 lideranças rurais do primeiro Encontro de Líderes Rurais. Nas reuniões plenárias, também participam especialistas, técnicos, representantes de fundos de investimentos, com troca de experiências.

Audiência de lideranças rurais dos países americanos, no Encontro de Líderes Rurais – Foto: IICA/Divulgação

“Eu sou Amazônia, eu sou guardiã da floresta. Há mais de 11 mil anos atrás, os povos indígenas, junto com os povos tradicionais, quilombolas, nós vemos segurando a Amazônia. Nosso dever é segurar a Amazônia, é proteger as nascentes, é lutar pelo nosso território, pela nossa cultura. E nós estamos aqui hoje mostrando para vocês, [que] nós somos um povo resistente”, disse.

A terra indígena onde a cacique vive está rodeada por fazendas e pelo garimpo. Apenas em 2021, a terra indígena no município de Novo Ipixuna, próxima à terra indígena Mãe Maria, voltou à posse do povo Akrãtikatêjê, que são os gaviões da montanha, após 17 anos de batalha judicial contra a concessionária Eletronorte. Agora, a cacique, que é a primeira liderança mulher de seu povo, defende que é importante que haja incentivo para que os próprios indígenas possam também gerar riquezas a partir do que produzem.

Segundo Tonkyre, as políticas públicas chegam aos indígenas ainda de forma muito lenta, não possibilitando o desenvolvimento local. “Eu estou aqui pedindo para as pessoas que estão ouvindo, não só o ministro, mas todos aqueles países que estiverem presentes, que vocês também escutem a gente e abracem o nosso projeto, porque nós viemos de longe do Brasil. Assim como as outras pessoas estão aqui, nós estamos em busca de parceria, de montar essa parceria e de dar continuidade”, ressaltou.

Na terra indígena, a produção é diversa, que inclui castanha-do-pará, peixe, óleo de copaíba, açaí, hortaliças, entre outros. Eles conseguem vender os produtos para outras regiões do país. Mas ainda precisam de apoio técnico para que possam ter uma marca e buscar inclusive parceiros internacionais para exportação. 

Cacique Katia Silene Tonkyre, da aldeia Akratikatejé, do povo Gavião da Montanha, do Pará – Foto: IICA/Divulgação

O que ocorre atualmente, de acordo com Tonkyre, é que muitos compram o produto mais barato e os revendem. “Eu não quero que tenhamos atravessador, mas que o meu produto chegue no mercado através da minha própria comunidade. Já fomos muito explorados, fomos muito, muito, eu não quero mais. É por isso que a gente também busca esse tipo de parceria para ter autonomia. De eu mesma estar vendendo meu produto, eu mesma poder falar do meu produto. É isso que eu quero, sabe? Eu não quero viver nessa dependência”, explicou à Agência Brasil.

Produção rural nas Américas

O primeiro Encontro de Líderes Rurais começou na terça-feira (16), na Costa Rica, com visitas técnicas a projetos que adotam práticas sustentáveis. Nesta quarta-feira, tiveram início as discussões plenárias, que seguem até quinta-feira (18). O encontro segue, então, com visitas técnicas até o próximo dia 20. Ao final, os participantes deverão definir diretrizes de atuação conjunta.

“Somos o continente que é o maior exportador de alimentos do mundo, então [pedimos] mais respeito com esse continente, porque somos fortes, às vezes não nos damos conta”, disse no discurso de abertura o diretor-geral do IICA, Manuel Otero. “A agricultura ou será sustentável ou não será”, enfatizou.

Segundo dados apresentados pelo Prêmio Mundial de Alimentação de 2020, Rattan Lal, que participou do evento por meio de gravação, a América Latina e o Caribe têm uma área florestal de 1 bilhão de hectares, que representa 28% do total mundial, e uma biodiversidade que representa 36% das espécies alimentares e industriais do mundo. Nessa região, 38% do uso da terra é agrícola.

Na América Latina existem quase 15 milhões de pequenas propriedades agrícolas, das quais 10 milhões são voltadas para a subsistência. A área voltada para a agricultura familiar é de 400 milhões de hectares. De acordo com Lal, as pequenas propriedades agrícolas desempenham um papel importante na agricultura global, especialmente nos meios de subsistência de milhões de pessoas nos países em desenvolvimento.

Ministro de Pecuária, Agricultura e Pesca do Uruguai, Fernando Mattos, presidente da Junta Interamericana de Agricultura (JIA) – Foto: IICA/Divulgação

O ministro de Pecuária, Agricultura e Pesca do Uruguai, Fernando Mattos, ressaltou a necessidade da valorização das populações rurais. Ele é o presidente da Junta Interamericana de Agricultura (JIA), o órgão máximo de governo do IICA, formado pelos ministros e secretários de Agricultura dos 34 países das Américas que compõem o instituto.

A ruralidade, segundo o ministro, “é um conceito mais amplo, é um estilo de vida. Como defender nossas tradições, nossa história, nossos costumes, produtores que estão muitas vezes com condições de desenvolvimento muito diferentes. Existe em todo o nosso continente, e talvez no mundo, essa condição pela qual a oportunidade daqueles que vivem na zona rural não é a mesma que aos que vivem na zona urbana”, ressaltou.

* A repórter viajou a convite do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA)

Povos indígenas pedem prioridade em proteção, diz presidente da Funai

O Brasil tem cerca de 1,7 milhão de indígenas autodeclarados de 305 etnias, o que representa 0,83% do total de habitantes do país, de acordo com dados do Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Em referência ao Dia dos Povos Indígenas, na próxima sexta-feira (19), a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) promove o chamado Abril Indígena 2024 durante todo o mês, com atividades que vão desde exposições, feiras, a ações de cidadania e inclusão dos povos tradicionais, valorização das culturas e ancestralidade e também marca a resistência e a luta deste segmento da população brasileira. Nesta semana de celebração da data, a presidente da entidade, Joenia Wapichana, concedeu entrevista aos veículos da Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

Ela apontou que desde o início do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2023, a fundação, criada há 56 anos, voltou a cumprir a missão institucional de defender os povos indígenas, após o que ela classifica como desmonte das políticas indigenistas, de proteção ambiental e de assistência a este grupo populacional.

Para Joenia, os desafios dos povos indígenas são, também, os da Funai, que tenta consolidar, principalmente, as demarcações e a proteção e gestão das terras indígenas; defesa de direitos, fortalecimento das comunidades para que possam desenvolver projetos de sustentabilidade e de bem-viver; a garantia de seus modos de vida tradicional, cultura e língua; promoção da segurança física; e proteção de povos isolados e de recente contato.

“A proteção para que os povos indígenas continuem a existir com as suas próprias identidades, e que não sofram violência porque são indígenas, é a grande demanda dos povos indígenas. Creio que continua sendo a número um. E que os direitos alcançados na nossa Constituição não sejam rasgados, nem retrocedidos”, prioriza.

Yanomami

A presidente da Funai, Joenia Wapichana, celebrou que, a partir desta semana, o Ministério dos Povos Indígenas (MPI), com apoio da Funai, iniciou a distribuição de cestas de alimentos aos yanomami, após o encerramento da operação militar pelo Exército, que fazia essas entregas desde o ano passado. As novas entregas vão garantir a segurança alimentar dessa etnia.

“A gente não quer ver ninguém morrendo de fome, quem tem fome tem urgência, e da mesma forma, nós estamos começando a discutir projetos de agricultura, de sustentabilidade, de segurança alimentar, porque a gente sabe que não vai ser só cesta de alimentos. Nós queremos retornar a dignidade do povo yanomami.”

A partir da contratação, por um ano, de uma empresa privada, será feita a distribuição de quase nove mil cestas de alimentos por mês. Ao todo, ao longo do ano, serão cerca de 20 mil horas de voo divididas em várias aeronaves para a entrega das cestas na Terra Indígena Yanomami (TIY), em Roraima, até o povo retome as roças comunitárias sem risco de contaminação.

Mulheres e crianças yanomami em Surucucu, na Terra Indígena Yanomami, em Roraima. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

A presidente esclareceu que as lideranças indígenas estão sendo consultadas para debater quais alimentos devem ser fornecidos. “A gente teve uma discussão recente, em Roraima, para conversar com os próprios yanomami e ye’kwana para falar sobre a composição dessas cestas básicas. Tudo para deixar de forma transparente todas essas operações, fazer o levantamento e estabelecer uma rotina de entrega [de alimentos] às comunidades. As coisas estão andando”.

Em fevereiro, o presidente Lula instituiu a Casa de Governo, em Boa Vista, capital de Roraima, para centralizar as ações do governo federal no território, que abriga a maior população indígena do país. Cerca de 27,15 mil pessoas vivem em 384 aldeias espalhadas em 9,5 milhões de hectares, localizados, entre os estados do Amazonas e de Roraima, na fronteira com a Venezuela.

A Casa de Governo chegou cerca de um ano depois de o governo federal declarar, em janeiro de 2023, emergência em saúde pública na terra yanomami. Desde então, órgãos federais tentam enfrentar a crise, fazer a desintrusão de invasores, e pôr fim às atividades de garimpo ilegal, que destroem o meio ambiente e contaminam os rios da região.

No ano passado, o Ministério da Saúde registrou 363 mortes de indígenas yanomami, causadas, sobretudo, por desnutrição e malária. Os óbitos foram 6% maior do que os registrados em 2022, 343 mortes nesta etnia. Joenia Wapichana explicou que o Poder Público tem atuado para reverter a situação e notificou que estes números estão sendo investigados para descobrir se houve subnotificação dos óbitos no governo anterior.

Demarcação de terras

Para a presidente da Fundação, entre os principais desafios da pasta está a demarcação de terras indígenas. Este direito constitucional visa garantir a autonomia e a proteção dos direitos dos povos indígenas, bem como sua participação na gestão e preservação desses territórios.

Joenia garante que, em 2023, a Funai voltou a tratar a demarcação de territórios indígenas como prioridade.

“No ano passado, criamos uma série de grupos [técnicos de identificação e delimitação] para constituir novas terras indígenas que resultaram em três delimitações: uma no Acre, no Pará e outra em Minas Gerais. Encaminhamos uma série de processos que não são de competência da Funai ao Ministério da Justiça. A ideia é, justamente, que não fiquem engavetados e se dê andamento às análises e contestações das áreas que foram publicadas ano passado,” disse.

Dados da Funai, de novembro de 2023, indicam 736 terras indígenas registradas no país. Juntas, as áreas representam aproximadamente 13,75% do território brasileiro, estando localizadas em todos os biomas, sobretudo na Amazônia Legal. Deste total, 132 terras indígenas estão em fase de estudos no processo de demarcação.

O órgão indigenista analisa ainda cerca de 490 reivindicações de povos indígenas.

Violência

Joenia afirma que, nessa segunda-feira (15), foi criado um grupo de trabalho para discutir os conflitos fundiários que envolvem os povos indígenas e aprimorar e padronizar um fluxo de atuação do órgão indigenista em casos de violência contra essa população, e que vai discutir a questão indígena em alguns estados.

“Para aprimorar o nosso relacionamento com outros órgãos, em conflitos, a gente precisa se alinhar [internamente] também e entender como serão nossas respostas, quando há reivindicações de indígenas relacionadas à Funai para dar respostas rápidas também,” afirmou.

Em janeiro deste ano, uma indígena pataxó hã-hã-hãe foi assassinada no município de Potiraguá, no extremo sul da Bahia, após conflito entre indígenas, policiais militares e fazendeiros.

Joenia disse que a Funai tem acompanhado as diferentes situações diretamente e por meio das coordenações regionais. Depois, os casos foram encaminhados para investigação nos órgãos competentes e pelo Ministério da Justiça para combater a impunidade e estabelecer segurança às vítimas e familiares, com apoio do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC).

“A disputa pela terra e a demora na demarcação dos territórios indígenas geram uma vulnerabilidade muito alta. Por isso, a gente prioriza que a demarcação e a proteção sejam consideradas como estratégias para conter a violência”, destacou a presidente da Funai.

O relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil – dados de 2022, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), apontou 158 registros de conflitos por direitos territoriais; e 309 casos de invasões, exploração ilegal de recursos (como madeira e minérios) e danos ao patrimônio, que atingiram 218 terras indígenas, em 25 estados.

De acordo com o mesmo estudo, em 2022, houve 416 casos de violência contra indígenas em 2022, sendo assassinatos (180); homicídios culposos (17); lesões corporais dolosas (17); tentativas de assassinato (28); ameaças de morte (27); ameaças várias (60); violência sexual (20); racismo e discriminação étnico-cultural (38) e abusos de poder (29).

Legislativo

Natural de Boa Vista (RO), Joenia Wapichana foi a primeira mulher indígena eleita deputada federal e exerceu o cargo de 2019 a 2022. Nas eleições de 2022, apenas cinco indígenas foram eleitos para a Câmara dos Deputados, entre eles a atual ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara. Joenia não se reelegeu e, em 2023, assumiu o cargo de presidente da Funai. Ela é a primeira mulher indígena advogada no Brasil e mestra em Direito Internacional pela Universidade do Arizona (EUA). 

Ela avaliou o posicionamento do Congresso Nacional em questões relativas aos povos indígenas.

Entre elas, em outubro passado, o Legislativo aprovou a Lei 14.701/2023, sobre o marco temporal das terras indígenas e, em dezembro, derrubou os vetos do presidente Lula à tese que estabelece que os povos indígenas somente teriam direito à demarcação de terras do Brasil que estavam ocupadas por eles na data da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988. Entidades envolvidas com a luta indígenas classificam o texto como uma negativa do direito de existir destes povos originários.

 Lideranças indígenas fazem passeata contra marco temporal na Esplanada dos Ministérios, em Brasília. Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil

Outra questão aprovada pelos congressistas, em maio de 2023, com impacto nas competências do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), foi a medida provisória (MP) sobre a estrutura ministerial do governo Lula. Pelo texto, o MPI deixou de homologar as terras de povos originários e a função foi devolvida ao Ministério da Justiça e Segurança Pública.

 “Acredito que um dia o nosso país possa ter um Congresso Nacional que possa ver as minorias, reconhecer a importância dos povos originários desse país, que possa, inclusive, respeitar o que aprovaram, naquela Casa, a nossa Constituição Federal. É o mínimo que se espera. Eu sei que às vezes a gente fala que é um sonho, mas é o sonho que a gente compartilha com todos os povos indígenas, que não querem mais do que seus direitos respeitados e implementados,” destacou.

“A vida dos povos indígenas nunca foi fácil, nunca. Isso é histórico. Os povos indígenas têm uma história de resistência no Brasil, desde o primeiro momento em que chegaram os não indígenas. O Brasil sabe somente dessa história do colonialismo. Não sabe a parte que, durante esse tempo todo na história, se romperam muitas barreiras, como as barreiras da sua própria voz de poder falar por si só.”

Mulheres indígenas

Além de uma presidente mulher, a atual diretoria do órgão federal responsável pela política indigenista brasileira é formada por mulheres. Em relação às indígenas, Joenia afirma que a Funai atua para que elas sejam respeitadas, apoia a não discriminação a elas e reforça o papel dessas mulheres e meninas na promoção do bem viver, sempre considerando a diversidade e a especificidade de cada povo.

“Não quero ver as mulheres vítimas de violência, tanto física, moral, social. As mulheres têm um potencial muito grande nas suas lideranças indígenas, para ocupar qualquer espaço que elas queiram como eu ocupei e estou ocupando,” destacou.

“[Quero] que as mulheres indígenas se sintam fortalecidas pela sua luta, pela sua história. Cada uma de nós tem uma história e contribuiu, sim, com o direito dos povos indígenas. Elas sofrem muitas vezes, duas ou três vezes, uma violência por serem mulheres. Mas que estejam convictas, que elas exercem o papel fundamental dentro da nossa sociedade, tanto como indígena também, como não indígena brasileira.”

As mulheres indígenas também estão entre os brigadistas contratados pelo Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo) para atividades de prevenção e combate a incêndios florestais. Do total de contratados em 2023, foram 80 mulheres, sendo 24 indígenas.

Cidadania, autonomia e protagonismo

Joenia destacou que à frente da Funai quer promover também o desenvolvimento sustentável com projetos para garantir a autonomia e protagonismo dos povos. Com esse entendimento, a Funai criou o Selo Indígenas do Brasil, em janeiro deste ano, que atesta que um produto (agrícola, artesanal ou extrativista) foi cultivado ou coletado por um indígena, em uma terra originária.

O objetivo é valorizar e identificar a cultura dos povos originários. O selo informa os nomes da etnia do produtor, seja pessoa física ou jurídica, e identifica a terra indígena onde foi produzido. A iniciativa da Funai, que agrega valor à cadeia produtiva, é conjunta com os ministérios dos Povos Indígenas (MPI) e do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA).

No Concurso Público Nacional Unificado para preencher vagas na Funai, serão oferecidas 502 vagas, entre cargos de níveis médio e superior. Deste total, 30% (150) serão destinados a pessoas indígenas. O objetivo da fundação é ter uma política mais inclusiva e representativa e evitar desistência das vagas por não indígenas.

No Abril Indígena 2024, a Funai tem realizado ainda ações em alguns territórios de acesso à documentação civil para indígenas garantirem direitos sociais e de cidadania, como qualquer outro cidadão brasileiro.

Números

O Censo 2022 do IBGE retrata que do total de indígenas autodeclarados (1,7 milhão, de 305 etnias), mais da metade deles — 51,25% ou 867,9 mil indígenas — vive na Amazônia Legal.

Os indígenas estão presentes em 86,7% dos municípios. Os dois estados com maior número de pessoas indígenas, Amazonas (490,9 mil) e Bahia (229,1 mil), concentravam 42,51% do total dessa população. No território brasileiro, são falados 274 idiomas pelos povos brasileiros. Antes da colonização portuguesa, estima-se que este número chegou a 1.200 línguas, responsáveis pela transmissão oral de saberes ancestrais.

Justiça torna réus 19 alvos da Operação Fim da Linha em SP

A Justiça de São Paulo aceitou a denúncia feita pelo Ministério Público e transformou 19 alvos da Operação Fim da Linha em réus. Eles agora serão julgados por supostamente terem participado de esquema de lavagem de dinheiro que teria sido utilizado pela facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) no transporte público de São Paulo por meio de duas empresas de ônibus, a Upbus e a Transwolff.

Os réus foram denunciados pelo Ministério Público pelos crimes de organização criminosa, lavagem de capitais, extorsão e apropriação indébita. Como a operação corre sob sigilo, os nomes dos alvos não foram divulgados nem pelo Ministério Público e nem pela Justiça.

A Operação Fim da Linha foi deflagrada na semana passada. A ação resultou na prisão de sete pessoas, sendo que uma delas foi presa ontem, na Operação Muditia. Os agentes apreenderam 11 armas, 813 munições diversas, R$ 161 mil, computadores, HDs e pen drives, assim como dólares e barras de ouro.

Os envolvidos foram acusados de usar o serviço de transporte público por ônibus na capital para esconder a origem ilícita de ativos ou capital provenientes de tráfico de drogas, roubos e outros delitos.

A denúncia feita pelo Ministério Público revela que, entre os anos de 2014 e 2024, uma pessoa que coordenava as atividades de tráfico do PCC e um outro indivíduo injetaram mais de R$ 20 milhões em recursos obtidos de forma ilícita em uma cooperativa de transporte público da zona leste, que viria a se transformar na UpBus.

Isso viabilizou a participação da empresa na concorrência promovida pela prefeitura de São Paulo em 2015. Essas duas pessoas integravam o quadro societário da UpBus.

Já na Transwolff (TW), entre os anos de 2008 e 2023, dez denunciados “constituíram e integraram uma organização criminosa e utilizaram o grupo econômico TW/Cooperpam para cometer os crimes de apropriação indébita, extorsão, lavagem de bens, direitos e valores, e fraudes licitatórias”.

Eles lavaram cerca de R$ 54 milhões de dinheiro do crime, especialmente oriundo do tráfico de drogas, utilizando-se da empresa de transporte, que também precisava de recursos para se qualificar à licitação.

Ambas as empresas sofreram intervenção do município. Em edição extraordinária publicada na semana passada em Diário Oficial do município, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, decretou intervenção, informando que a prefeitura, por meio da SPTrans, assumiria o controle das linhas.

Operação investiga influenciadores suspeitos por falsas rifas no Rio

A Polícia Civil do Rio de Janeiro realizou uma operação nesta quarta-feira (17) contra influenciadores digitais suspeitos de fazer rifas ilegais e manipular resultados. A ação foi desencadeada por agentes da Delegacia do Consumidor (Decon).

Cinco pessoas são alvo da ação. Entre os suspeitos, estão os influenciadores Chefin, Gui Polêmico e Almeida do Grau. Todos têm milhares de seguidores em redes sociais. A confirmação dos nomes foi obtida pela Agência Brasil com a Decon.

Segundo as investigações, os alvos utilizavam artifícios fraudulentos para manipular os sorteios e controlar os resultados, garantindo lucros milionários, que são usados na compra de veículos de luxo e mansões.

As buscas foram realizadas em endereços dos investigados em bairros nobres do Rio de Janeiro e em Niterói, São Gonçalo e Magé, municípios da região metropolitana. De acordo com a Polícia Civil, “a ação tem como objetivo identificar outros integrantes do grupo criminoso e coletar provas de outros delitos, como lavagem de dinheiro”. Os policiais aprenderam maços de dinheiro, relógios e joias.

Ostentação

No Instagram, o perfil Gui Polêmico tem 4,6 milhões de seguidores. A página oferece links para prêmios e sorteios. Almeida do Grau também usa a rede social para divulgar informações sobre sorteios. Em uma publicação na manhã desta quarta-feira, ele diz que “está tudo bem” e “já já vai prestar uma declaração”. Ele compartilhou ainda o endereço de um perfil que mostra sorteios de alguns bens e afirmou que “todos os nossos prêmios foram entregues”.

Os perfis de Almeida do Grau e Gui Polêmico têm publicações que ostentam carros de luxo. Um deles com o capô coberto por notas de R$ 100. Também é possível encontrar postagem de pessoas reclamando que “compraram cotas que não aparecem”. “Eles nem respondem”, complementa outro usuário.

Em um vídeo, Gui anuncia a rifa de uma BMW X1, avaliada em R$ 300 mil, por R$ 0,10. Outro post anuncia uma rifa de R$ 0,02 para um prêmio de R$ 50 mil. A mesma publicação tem uma resposta de uma pessoa que se sentiu enganada. “Eu ganhei o bilhete premiado e até hoje não entraram em contato comigo”, se queixa.

Os investigados respondem pelos crimes de jogo de azar, crime contra a economia popular e associação criminosa. A Agência Brasil fez contato com os três influenciadores e aguarda posicionamento.

Quase 4 bilhões de pessoas correm risco de infecção pelo Aedes

Quase quatro bilhões de pessoas em todo o mundo estão sob risco de infecções transmitidas por infecções do tipo Aedes – seja o Aedes aegypi ou o Aedes albopictus que, juntos, respondem por doenças como dengue, zika, chikungunya e febre amarela. O alerta é da líder da equipe sobre arbovírus da Organização Mundial da Saúde (OMS), Diana Rojas Alvarez. 

Ao participar – por videoconferência – de encontro na sede da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) em Brasília, Diana destacou que a estimativa é que esse número – quatro bilhões – aumente em mais um bilhão ao longo das próximas décadas, sobretudo, por conta de fatores como o aquecimento global e a adaptação do Aedes a grandes altitudes. O mosquito, segundo ela, já pode ser encontrado, por exemplo, em montanhas do Nepal e da Colômbia, além de países da região andina. 

Surtos

A OMS monitora ativamente surtos e epidemias de dengue em pelo menos 23 países, sendo 17 nas Américas – incluindo o Brasil.

Segundo Diana, os casos da doença aumentaram consistentemente ao longo das últimas quatro décadas. Em 2023, entretanto, houve o que ela chamou de aumento muito significativo tanto de casos como de mortes pela doença.

“Um novo recorde”, disse, ao citar mais de seis milhões de casos reportados e mais de sete mil mortes por dengue em 80 países. 

Para Diana, a expansão de casos se deve a fatores ambientais como o aumento das chuvas e, consequentemente, da umidade, o que favorece a proliferação do mosquito, além da alta das temperaturas globais, ambos fenômenos provocados pelas chamadas mudanças climáticas.

Ela disse, ainda, que é imprescindível melhorar a comunicação de casos e os sistemas de vigilância dos países em relação a arboviroses para ampliar ações de prevenção e combate em saúde pública.

Indígenas Zoró denunciam aumento de ameaças com chegada de garimpeiros

Lideranças indígenas zoró denunciam o aumento de ameaças e violências em seu território, localizado próximo ao município de Rondolândia (MT). As agressões teriam se intensificado desde que a Agência Nacional de Mineração (ANM) autorizou a entrada de garimpeiros no local, em janeiro deste ano. Os indígenas já sofriam com a exploração de madeira ilegal e, agora, veem o aumento do número de não indígenas à procura de ouro e diamante como um novo desafio a ser enfrentado. 

De acordo com a ANM, os garimpeiros começaram a circular pelo território em 15 de março deste ano. Contudo, os próprios indígenas já tinham denunciado a presença deles em dezembro de 2023.

Conforme apurou a Agência Brasil, o alvará de pesquisa – documento concedido pela ANM para a realização de trabalhos para definir uma jazida – foi apresentado em 2021 e foi aprovado somente em janeiro deste ano. Com validade até janeiro de 2027 (podendo ser prorrogado por mais quatro anos), o alvará foi concedido à Quiuqui Mineração Ltda, registrada como atuante no ramo de extração de areia e cascalho e atualmente com CNPJ baixado, ou seja, que indica encerramento de atividades. A autorização libera o livre trânsito de garimpeiros por 195 hectares do território. A Terra Indígena Zoró tem 356 mil hectares de área total.  

O documento foi concedido pelo gerente da ANM no estado, Levi Saliés Filho – designado ao cargo em novembro de 2021, pouco antes de o requerimento para obtenção do alvará de pesquisa ser apresentado.

Em 2022, o governo de Jair Bolsonaro modificou a legislação e estendeu a validade de autorizações como o alvará de pesquisa. A alteração foi feita pela Lei nº 14.514, que garantiu concessões de quatro anos aos garimpeiros e mineradoras, prorrogáveis por igual período. A norma alterou diversos aspectos do chamado Código de Mineração.

Operações sem efeito 

Os zoró pangyjej tem, atualmente, uma população de cerca de 700 pessoas, que vivem em 32 aldeias. Lideranças denunciam aumento do grau de tensão com a chegada de garimpeiros e madeireiros que têm invadido áreas de usufruto exclusivo dos indígena. Para o enfrentamento às atividades ilegais e a retirada de invasores, eles afirmam depender de um esquema que considere as terras indígenas adjacentes, como as dos cinta larga e surui paiter.

Um problema adicional, no caso dos zoró, é o aliciamento de membros das aldeias por garimpeiros e madeireiros. 

O coordenador regional da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em Ji-Paraná, Leandro Mangã Arara, confirma que esse é um dos principais obstáculos. 

Segundo ele, com frequência, os zoró conectados com os invasores vazam informações sobre as operações das forças de segurança, como a que a Polícia Federal e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) realizaram em meados de fevereiro deste ano.  Em nota, divulgada à época da operação, a PF afirmou que “durante a incursão foram verificados diversos pontos de desmatamento, com corte raso e queimada, porém, não foram encontradas extração ilegal de madeira ou atividade de garimpo no momento da operação”. 

“A gente sabe que é muito complexa a situação e que não vale a pena só ir lá e voltar e, sim, fazer uma operação que venha de fato a surtir efeito”, afirma Mangã Arara.

O coordenador da Funai destaca ainda o desfalque de pessoal como um problema a ser solucionado. “A gente está com falta de servidor e isso acaba dificultando nosso trabalho. O transporte também tem limitado muito nosso serviço. Mas a gente está aqui para tentar reverter essa situação e tentar resolver, para que nosso trabalho consiga surtir efeitos, principalmente lá na TI Zoró, que é muito grande e tem se intensificado mais ao longo dos anos”, pontua, revelando que tem improvisado soluções como puxar para seu quadro funcional servidores de outros órgãos e instituições públicas. 

“Não é de agora essa situação [no território zoró], é de longa data, só tem se agravado. A gente tem recebido informações deles [os líderes zoró] e tentado acionar as autoridades competentes, para que consiga resolver ou pelo menos minimizar a situação”, emenda.

Com um alvo no corpo

Diversas lideranças zoró que denunciam o que se passa em seu território continuam sob a mira de madeireiros e garimpeiros. Um dos líderes zoró teve o carro incendiado pelos invasores, no dia 29 de março. 

Líder zoró teve o carro incendiado em março deste ano. Foto: Divulgação

Os indígenas relatam que o automóvel parou de funcionar quando o líder fazia o trajeto até a zona urbana para fazer compras. Ele se deslocava à noite e, com a pane, acabou pegando carona depois de abandonar o automóvel a muitos quilômetros de sua aldeia. Pela manhã, recebeu de amigos mensagens com fotos de seu carro destruído pelas chamas. 

No dia seguinte, dois homens armados foram à aldeia procurando pelo líder. 

“A gente precisa de um posicionamento dos órgãos competentes sobre o que está acontecendo ultimamente. A situação está ficando cada vez mais difícil”, afirmou uma das lideranças ouvidas pela reportagem e que pediu para não ser identificada. 

Uma das sugestões dos zoró é a instalação de, pelo menos, duas bases de vigilância permanente na TI, nos moldes das existentes na Terra Indígena Sararé, também situada no estado de Mato Grosso. Uma proposta nesse sentido foi encaminhada à Funai, mas não foi acatada pela autarquia. 

Vítimas da atividade minerária

Somente em 2022, o Brasil registrou 932 conflitos por mineração, segundo o relatório do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente à Mineração, divulgado em dezembro de 2023. Os indígenas estão entre os grupos mais afetados (15,1%). Naquele ano, pelo menos 155.983 indígenas sofreram as consequências dos conflitos gerados pela mineração, estando envolvidos em 141 ocorrências, sendo mais da metade delas (55%) travadas com garimpeiros.  

Outro lado

A Agência Brasil tentou contato com o gerente da ANM no Mato Grosso, Levi Saliès Filho, e com a empresa mineradoraa, mas não teve retorno de nenhum deles. A reportagem também procurou a Funai, o Ministério da Justiça e Segurança Pública e o Ministério dos Povos Indígenas, mas ainda não obteve retorno. 

Canal do Panamá atingido pela seca pode aliviar as restrições de trânsitos diários

17 de abril de 2024

 

O número de navios autorizados a atravessar todos os dias o canal do Panamá, que tem sido atingido pela seca, pode aumentar devido aos sinais de uma melhoria nos níveis de água nos dois lagos artificiais, disseram autoridades na segunda-feira.

O Canal Interoceânico é um ponto de trânsito fundamental para a carga internacional, mas os baixos níveis de água atribuídos às alterações climáticas e ao fenómeno El Niño no ano passado levaram as autoridades a limitar o número de navios que o utilizam.

O Chefe do Canal do Panamá, Ricardo Vasquez disse na segunda-feira que informou aos clientes que permitiria gradualmente a passagem de até 32 navios por dia, em comparação com um limite de 27 anunciado há um mês, dos 36 a 39 em condições normais. Ele disse que “A gestão e a administração da água têm sido muito eficientes, e chegada da estação chuvosa também deveria ajudar”.

As restrições à profundidade máxima do calado dos navios que passam pelas maiores eclusas serão aumentadas em meados de junho de 13,4 para 13,7 metros, disseram as autoridades.

A hidrovia centenária de 80 km de comprimento, que normalmente lida com cerca de 6% do comércio marítimo global, é usado principalmente por clientes dos Estados Unidos, China e Japão, e possui um sistema de eclusas para levantar e baixar navios que utiliza águas pluviais armazenadas em dois lagos artificiais.

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Justiça reconduz presidente do Conselho de Administração da Petrobras

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), em São Paulo, derrubou a decisão da primeira instância, do juízo da 21ª Vara Cível Federal, e reconduziu à presidência do Conselho de Administração da Petrobras, Pietro Adamo Sampaio Mendes. Ele foi afastado do cargo na semana passada. A Advocacia-Geral da União (AGU) recorreu da decisão. 

Com a medida, Pietro Adamo voltará a presidir o Conselho de Administração da estatal, cargo que exerce há um ano. Ele também responde pelo cargo de secretário de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia. Na decisão da 1ª. instância, o juízo apontou conflito de interesses entre o Ministério de Minas e Energia e a Petrobras. 

Na decisão, o desembargador Marcelo Mesquita Saraiva diz que a decisão (ADI nº 7331) afeta diretamente o caso, o que reforça a inexistência do apontado conflito de interesses na indicação de Pietro Adamo Sampaio Mendes como integrante do Conselho de Administração da Petrobras pelo fato de exercer concomitantemente a função de secretário de Petróleo, Gás Natural e Biocombustível do Ministério de Minas e Energia.

Ontem,(15), o TRF3 já tinha determinado que o conselheiro da Petrobras Sérgio Resende Machado também retornasse ao cargo.

Petrobras

Em nota, a Petrobras informou que o desembargador-relator da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em São Paulo, decidiu suspender os efeitos da medida que retirou Pietro Adamo Sampaio Mendes do cargo de presidente do Conselho de Administração da companhia, no âmbito de uma ação popular na 21ª Vara Cível Federal em São Paulo.

A Petrobras continuará defendendo a higidez de seus procedimentos de governança interna. Fatos julgados relevantes sobre o tema serão imediatamente divulgados ao mercado, acrescenta a nota.

Modo não indígena de pensar futuro é alienante, diz Daniel Munduruku

Daniel Munduruku não se ilude. Seja percorrendo o mundo para falar sobre literatura e divulgar os mais de 60 livros que escreveu, seja atuando em uma novela da emissora de maior audiência do país, está consciente de que o livre acesso a espaços até há pouco inacessíveis para indígenas como ele pode ser usado contra a luta secular de seus parentes.

“O fato de estarmos na literatura, na academia, na política, em vários lugares, pode gerar a autoilusão de acharmos que estamos fazendo uma grande coisa quando, na verdade, só estamos ajudando a, de certa forma, alimentar o sistema econômico que rejeitamos”, pondera Daniel.

Convidado a imaginar o futuro dos povos originários para uma série de entrevistas com intelectuais, lideranças e ativistas indígenas que a Agência Brasil publica esta semana, por ocasião do Dia dos Povos Indígenas, na sexta-feira (19), Daniel critica a fixação da sociedade não indígena com o futuro.

“Esse olhar para o futuro aliena as pessoas para a necessidade mais imediata de construirmos nossa existência no presente. É uma visão que educa as pessoas para o egoísmo”, argumenta, afirmando que, tradicionalmente, os povos indígenas concebem o tempo de forma diferente, com foco no passado e no presente, onde buscam respostas para seguir resistindo à destruição de seus territórios e de seus modos de ser.

“O tempo é circular, como a natureza. Ele alimenta a si mesmo, desdobrando-se e se projetando adiante. A história se repete. Neste momento, está se reproduzindo de forma muito dura, muito cruel, e não só para os povos indígenas”, acrescenta.

Nascido em Belém (PA), em 1964, Daniel é formado em Filosofia e doutor em Educação, pela Universidade de São Paulo (USP). É considerado um dos grandes divulgadores da cultura indígena. A maior parte de sua extensa obra é destinada a crianças e adolescentes. Em 2017, ganhou um Jabuti, o mais tradicional prêmio literário do país, na categoria Juvenil, por seu livro Vozes Ancestrais – em 2004, já tinha recebido menção honrosa na mesma premiação, por Coisas de Índio – Versão Infantil. “Minha literatura é uma espécie de choro para sensibilizar adultos”.

Leia, a seguir, trechos da entrevista que Daniel Munduruku concedeu um dia após retornar de viagem à Itália.

Agência Brasil: Em suas palestras, entrevistas e livros, o senhor destaca o fato de que os munduruku e outras etnias indígenas concebem o tempo de outra maneira, pensando o futuro de forma diversa daquela com a qual o pensamento ocidental não indígena está habituado. O senhor pode comentar um pouco mais sobre isso?
Daniel Munduruku: Acho que posso generalizar sem medo de ser injusto. Em geral, os povos indígenas têm uma concepção de que o tempo é circular, como os ciclos da natureza. Eles não veem o tempo como algo linear, mas sim como algo que alimenta a si mesmo, desdobrando-se e se projetando adiante. O passado diz respeito a quem somos, de onde viemos, e o presente é onde vivenciamos o resultado disso tudo. Com isto, esses povos construíram uma visão de mundo que, originalmente, não é baseada no tempo do relógio, da produção, do acúmulo de riquezas materiais. Essa é a visão resultante da concepção linear de tempo, que tem a ver com a certeza de que existe algo além do presente, ou seja, o futuro. Por essa ótica linear, no futuro, as pessoas serão mais felizes. Assim nascem as grandes histórias ocidentais sobre uma busca por algo muito importante: do santo graal a uma vida após esta vida. Esse olhar para o futuro aliena as pessoas para a necessidade mais imediata de construirmos nossa própria existência no presente. É uma visão que educa as pessoas para o egoísmo, para a disputa, para a conquista e a colonização do outro. Toda a pedagogia ocidental está fundamentada na célebre pergunta “o que você vai ser quando crescer?’. Nas comunidades indígenas tradicionais, não se pergunta a uma criança o que ela vai ser quando crescer. Existe a compreensão de que ela já é aquilo que só lhe é possível ser no agora. Cabe à comunidade e aos adultos oferecerem as condições para que ela seja plenamente criança, cresça, se torne um jovem equilibrado e, por fim, um velho consciente do seu papel no mundo. Isso é ligar seu ser presente ao futuro, estabelecendo uma relação de circularidade e educando para o coletivo.

Agência Brasil: Mas, hoje, os próprios indígenas demandam que pensemos no futuro, reivindicando políticas públicas que, necessariamente, precisam ter metas e avaliação de resultados. Não é importante pensar o futuro como forma de responder aos problemas presentes?
Daniel Munduruku: O que os indígenas querem é viver uma vida longa. Para isso, precisamos das condições adequadas. E uma condição é não viver em constante disputa uns com os outros. Ao disputarmos, a gente destrói, domina, escraviza, mata. E nem todos conseguem ser felizes desta maneira. Daí a crítica a esse modo de ver o futuro, que resulta, como disse, em um olhar que aliena e educa para o egoísmo. Para resolver os problemas presentes dos povos indígenas – problemas que se desdobram a partir do passado –, teriam que demarcar todos os territórios e dar aos indígenas autonomia para decidir o que fazer com as terras homologadas. Caberia aos indígenas resolver o melhor caminho a seguir. Repito: não se trata apenas de modos de vida. Trata-se de como a economia governa o mundo. Embora exista o conceito de economia circular, a economia que efetivamente governa o mundo é linear. Seria necessário e urgente dar aos indígenas a oportunidade de decidirem como fazer a junção entre a economia circular indígena e a economia linear.

Agência Brasil: Feitas essas considerações, como o senhor imagina o futuro dos povos indígenas? O senhor concorda com a tese de que o futuro é ancestral ou não haverá futuro?
Daniel Munduruku: Gosto da ideia de o futuro ser ancestral. Seria a comprovação de que o que está por acontecer já aconteceu e de que o tempo é circular. De que a história se repete e que, neste momento, ela está reproduzindo um momento muito duro, muito cruel, não só para os povos indígenas.

Agência Brasil: Duro e contraditório, não? Ao mesmo tempo em que os territórios indígenas são alvo da cobiça de garimpeiros, madeireiros e da expansão das fronteiras agrícolas e que testemunhamos crises humanitárias como as que atingem os yanomami, na Amazônia, e os guarani e kaiowá, em Mato Grosso do Sul, a população indígena segue crescendo e há cada vez mais indígenas ocupando espaços até há pouco inacessíveis.
Daniel Munduruku: Mas a contradição não é nossa. É do sistema que olha e sempre olhou para os povos indígenas como um problema. Há milhares de anos, nós, indígenas, temos construído respostas para parte dos graves problemas que a humanidade está enfrentando. Existem, no Brasil, 300 povos indígenas lutando bravamente para se manterem vivos. O que envolve também a luta pela demarcação de territórios. Óbvio que não há soluções fáceis.

Agência Brasil: O senhor acaba de retornar da Itália, onde participou da Feira do Livro Infantil e Juvenil de Bolonha. A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, acaba de retornar dos Estados Unidos, onde, entre outras coisas, participou de um evento em Harvard. O Ailton Krenak tornou-se, na semana passada, o primeiro indígena a ocupar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras. Pela primeira vez, a Funai é comandada por uma indígena, a advogada Joênia Wapichana. Há cada vez mais escritores indígenas, alguns com relativo sucesso comercial. A sociedade está ansiosa por conhecer o que o senhor acaba de chamar de “respostas indígenas para parte dos graves problemas que a humanidade enfrenta”?
Daniel Munduruku: Eu diria que estão tentando impingir na gente a obrigação de dar respostas, de dar solução à crise que o próprio homem branco gerou. Claro que os indígenas estão buscando se fazer cada vez mais presentes, pois não há outro caminho. Ou a gente se apresenta como parte dessa sociedade à beira da destruição e da loucura, ou a gente é engolido por ela sem ter nem sequer direito a falar. A questão é que, às vezes, o que pode parecer uma grande coisa pode ser um engodo. O fato de estarmos na literatura, na academia, na política, em vários lugares pode gerar a autoilusão de acharmos que estamos fazendo uma grande coisa quando, na verdade, só estamos ajudando a, de certa forma, alimentar o sistema econômico que rejeitamos.

Agência Brasil: O senhor acabou não completando a resposta sobre quais são, a seu ver, as possibilidades de futuro para os povos indígenas?
Daniel Munduruku: Como eu disse, as soluções para os problemas não são fáceis. Existe futuro para os povos indígenas neste sistema em que vivemos? Um futuro em que possamos manter parte de nossas tradições, incluindo a opção de seguir vivendo na floresta se assim quisermos? Não sei. Temo que isso acabe logo. Porque o sistema, guloso como só ele, vai querer devorar tudo, como vem acontecendo há séculos. Há 524 anos os indígenas travam uma guerra contra esse sistema, preservando seus territórios. Não sou um bom profeta, mas acho que o que se desenha para nós é, pouco a pouco, irmos cada vez mais para os centros urbanos sob risco de morrermos em confrontos.

Agência Brasil: O senhor, portanto, é pessimista quanto ao futuro dos povos indígenas?
Daniel Munduruku: Não digo pessimista. É que a esperança é uma ficção. E uma ficção é uma forma de embarcarmos na ideia de futuro sobre a qual já falamos. De buscar, no futuro, respostas para os problemas presentes, quando a realidade é muito mais cruel e o inimigo, muito mais forte do que a gente imagina. Às vezes, o inimigo vai transformando nossa esperança em um produto com o qual acaba nos iludindo. Se admitir isso é ser pessimista, que seja, tudo bem.

Agência Brasil: Por outro lado, boa parte de sua obra literária é destinada a crianças e adolescentes, o que comporta boa dose de otimismo.
Daniel Munduruku: Sim, há algo de utopia nisso. Uso minha escrita para crianças como forma de atingir os adultos. Imagino que um adulto vai ler um livro antes de oferecê-lo a um filho e procuro atingir o adulto por meio de temas universais. Às vezes, a gente precisa usar o choro das crianças para sensibilizar os adultos, que são, de fato, quem precisa de remendo. Minha literatura é isso: uma espécie de choro para sensibilizar adultos.

*A primeira entrevistada para esta série especial que a Agência Brasil produziu para o Dia dos Povos Indígenas foi a demógrafa Rosa Colman, primeira e, possivelmente, única especialista em estudos populacionais a se autodeclarar indígena no país. Nos próximos dias serão publicadas as entrevistas com a escritora Eliane Potiguara e com a ministra Sonia Guajajara.