Skip to content

Preto Téo extravasa identidade trans por meio da poesia

 

Foi no Cursinho Popular Transformação, curso preparatório para o vestibular voltado para pessoas trans, que Teodoro Martins, mais conhecido como Preto Téo, descobriu que os textos que ele chamava apenas de desabafos eram poesia, eram arte. Em 2016, junto com outros escritores, publica em Antologia Trans: 30 Poetas Trans, Travestis e Não Binários. “A partir da publicação dos meus textos nesse livro, eu compreendi que eu tinha muito a contribuir com a poesia e com a arte no geral. E, a partir daí, não parei mais.”

Para Preto Téo, a arte é um chamado diário. “Todos os dias eu penso em uma melodia, todos os dias eu penso em um verso, todos os dias eu penso ou o meu corpo se move de uma maneira que me evoca a algum acontecimento, ou algum acontecimento reverbera no meu corpo, na minha pele, na minha memória e me faz querer transfigurar isso para alguma outra coisa”, diz e acrescenta:

“Eu consigo entender a arte como um sentimento que eu tenho, que eu preciso trabalhá-lo, preciso mantê-lo em movimento, preciso fazer ele acontecer, senão é como se eu sentisse um sufocamento, como se eu me sentisse diminuído, sabe?”

Para Preto Téo, a arte é um chamado diário – Paulo Pinto/Agência Brasil

Preto Téo, 29 anos, é artista e produtor cultural. Além do Antologia Trans, que é a primeira antologia trans de poemas impressa no Brasil, ele participou também do livro Textos para Ler em Voz Alta, publicado em francês. Ele também publicou o próprio livro, EP, pela Padê Editorial.

Enquanto performer, ele estreou, em 2023, o solo Como se (Des)fiz, performance solo acompanhada por beats e por percussão ao vivo. Entre poesias, cantorias e toadas, Preto Teo fala sobre como eu desconstruiu a própria masculinidade.

“No processo de transição de gênero, algumas coisas que já estão engessadas naquilo que se compreende como ser homem acabaram se incutindo em mim. Eu passei por um processo de me permitir me sensibilizar comigo mesmo, retomar as minhas referências de feminilidade que sempre foram as minhas fortalezas, os meus portos seguros, para desfazer um pouco, desmontar essa rigidez, e me permitir ser um pouco mais sensível, dialogar um pouco mais, falar sobre os meus sentimentos, que são coisas que a gente não acessa tão facilmente na masculinidade, sobretudo a negra”, diz o artista.

Em um dos trechos da performance, ele apresenta uma encanteria, que ele explica ser uma “música bem curta que se repete várias vezes”, em homenagem a Demétrio Campos, que foi, nas palavras de Preto Téo, “um homem trans suicidado em 2020”. “Muito se fala sobre a memória de Demétrio e em algum momento eu quis que a gente ressignificasse a memória dele e pensasse não só na tristeza desse acontecimento, mas na transmutação que ele está passando e que todos nós passamos juntos com essa passagem”, diz.

Slam Marginália

Preto Téo é parte também da organização do Slam Marginália, batalha de poesias de pessoas trans em São Paulo. Até 2019, antes da pandemia, o slam acontecia toda primeira quinta-feira do mês. Atualmente, ocorre quando há algum patrocínio que possibilite a estrutura no centro da cidade para que o evento seja realizado e o pagamento dos artistas.

“Um espaço de representatividade para poetas e poetas trans, porque geralmente, nos outros slams da cidade, as pessoas trans não se sentem tão contempladas, porque geralmente são minorias”, diz Téo.

No espaço, é possível entrar em contato com uma poesia que muitas vezes não está nos meios de comunicação de destaque, nos grandes eventos ou na escola. “O que a gente acessou inicialmente, enquanto o que era poesia lá na escola, era a poesia cânone, de poetas que já estão mortos, em sua maioria. Então, no Slam Marginalia, a gente te propõe a escutar poesias de gente que está viva, gente que não é branca, gente que não é cisgênera. E isso tudo afeta nas temáticas e nos conteúdos das poesias. Ali a gente trabalha muito as nossas vulnerabilidades e, para além disso, os nossos sucessos, os nossos desejos, as nossas distopias, as nossas ficções”, explica o artista.

Trans nas artes

Segundo Preto Téo, o cenário brasileiro tem melhorado, e mais pessoas trans têm ganhado projeção, mas ainda faltam políticas públicas direcionadas para pessoas trans que garantam os direitos de sobrevivência e subsistência dessas pessoas por meio de seus trabalhos.

Ele conta que já ouviu pessoas dizerem que não há artistas trans em determinadas áreas. Então, esclarece: “É diferente você não conhecer os artistas trans que fazem as coisas, que produzem essas coisas, de eles não existirem. Eles existem, nós existimos em todos os lugares, estamos em todas as vertentes artísticas. Estamos na poesia, estamos na literatura, estamos nas artes cênicas, nas artes visuais, na direção de arte, estamos na produção, estamos na graça, somos técnicos, somos iluminadores, somos tudo, fotógrafos, diretores, estamos muito, cada vez mais crescendo nos nossos campos, mas o que a gente precisa hoje é de oportunidade, assim, para mostrar a que a gente veio, para que a gente veio, a qualidade e excelência do nosso trabalho.”

Para marcar a visibilidade trans, cuja data é 29 de janeiro, a Agência Brasil publica histórias de cinco artistas trans na série Transformando a Arte, que segue até o dia 31 de janeiro.

Ícone trans, Divina Valéria usou arte para assumir identidade feminina

 

Em uma época em que o Estado perseguia travestis apenas por existirem, foi na arte que Divina Valéria, uma das artistas travestis mais conhecidas e respeitadas no Brasil encontrou um espaço para ser quem era. Durante a ditadura militar no Brasil, ela estreou como cantora na noite carioca e integrou o espetáculo Les Girls, um marco para a cena trans e que ganhou visibilidade no Brasil e fora.

“Eu já tinha me travestido em bailes de carnaval, né? Todo ano me travestia para o baile de carnaval, mas não diariamente. Quando eu fui convidada para esse espetáculo, eu continuava a me travestir apenas no palco. Fora do palco, eu andava de menininho, entende? Porque era a época de ditadura, 1964, e não era permitido estarmos vestidas de mulher no meio da rua, era só no palco”, conta Divina à Agência Brasil.

E esses momentos no palco foram, para ela, muito naturais. “Meu amor, olha, naquela época tudo foi muito natural. Eu nunca tinha pensado em fazer travesti nem nada, quando, de repente, eu fui convidada para um espetáculo que era somente de travesti, que era uma grande produção.”

Com 60 anos de carreira, Divina Valéria coleciona papéis no teatro, na TV e no cinema  – Facebook/Divina Valéria

O espetáculo contou com o roteiro de Mario Meira Guimarães, com a criação musical de João Roberto Kelly e direção de Luís Haroldo, e viria a consolidar um formato de apresentação que seguiria pelas décadas seguintes. Na época, o espetáculo chegou até a reverter a renda para as ações das Irmãs Vicentinas, congregação religiosa feminina católica.

Foi a partir da década de 1970, quando se mudou para Paris, que Divina Valéria deixou de ser travesti apenas no palco e assumiu para o mundo quem ela era realmente.

“Eu assumi viver totalmente de mulher, totalmente minha personalidade feminina, que afluía muito mais em mim. E foi em Paris que tudo isso começou porque, chegando lá, eu fui trabalhar [na casa noturna] Carrousel de Paris, onde tinha as travestis mais famosas e mais bonitas do mundo. Eu fui trabalhar nessa casa e, logicamente, ali com elas, eu peguei todo o know-how e também me transformei em uma mais”, diz.

Aos 79 anos e 60 anos de carreira, Divina Valéria passou por teatros, pela televisão e pelo cinema. “A arte pra mim é tudo. Eu vivo da arte a minha vida inteira, eu sempre vivi da arte”, sintetiza.

As principais referências da artista são as estrelas de Hollywood, como Greta Garbo e Ava Gardner. Os papéis preferidos de sua carreira são aqueles totalmente diferentes de quem ela é no dia a dia. “É bom ver personagens diferentes, né? Fazer a Divina Valéria eu já faço nas 24 horas do dia”, diz.

Divina Valéria é uma das artistas travestis mais conhecidas e respeitadas no Brasil –  Facebook/Divina Valéria

Ela destaca três trabalhos como os mais recentes preferidos: Ema Toma Blues, com texto de autoria de Aninha Franco, espetáculo que ela estrelou em 2005; o filme Nada Somos, ainda em produção, que conta quatro histórias, sendo Divina Valéria a protagonista de uma delas; e Alice Júnior 2 – Férias de Verão, com estreia prevista para 2024. “Nele, eu vivo uma mulher de quase 100 anos, matriarca de uma ilha, não tem nada a ver com a Divina Valéria”, antecipa.

Um papel que ela ainda quer fazer é algo na “linha dramática”, como o de Gloria Swanson em Crepúsculo dos Deuses. “Um personagem talvez mais forte, né? Sempre um personagem que não seja a Divina Valéria”, enfatiza.

No dia a dia, ela é Divina Valéria, que define da seguinte maneira: “Uma pessoa como todo mundo, com momentos felizes, momentos menos felizes, com uma vida um pouco atribulada, porque a vida artística é um pouco assim, seja por muita viagem, seja, às vezes, financeiramente, às vezes está com muito dinheiro, às vezes não está com nada. É vida de artista, é uma corda bamba, mas é a vida que eu gosto de viver e que eu já vivo vai fazer 60 anos agora, em 2024”. 

Para marcar a visibilidade trans, cuja data é 29 de janeiro, a Agência Brasil publica histórias de cinco artistas trans na série Transformando a Arte, que segue até o dia 31 de janeiro.

Termina hoje prazo para estados iniciarem emissão da nova identidade

Termina nesta quinta-feira (11) o prazo para que os estados comecem a emitir a nova Carteira de Identidade Nacional (CIN). Até o momento, 23 estados e o Distrito Federal já emitem o documento. Dados do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) mostram que a CIN já foi emitida para 3 milhões de brasileiros.

A nova Carteira de Identidade adota o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF), o que aumenta a segurança da identificação dos brasileiros, melhora os cadastros administrativos e diminui as fraudes no Brasil.

 A primeira via da CIN é gratuita. Já as carteiras de identidade antigas terão um prazo de dez anos para serem trocadas.

Para a expedição da carteira de identidade, será exigida do requerente a apresentação da certidão de nascimento ou de casamento em formato físico ou digital.

Em caso de dúvida sobre a autenticidade da certidão apresentada, o órgão expedidor poderá exigir a apresentação de outros documentos como a atual carteira de identidade, carteira de trabalho, carteira profissional, passaporte e carteira de identificação funcional.

A validade do novo documento será de cinco anos, para pessoas até 11 anos de idade; de dez anos, para pessoas com idade de 12 anos completos a 59 anos; e indeterminada, para pessoas com idade a partir de 60 anos.

Para a ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, a nova carteira também permitirá que o governo aprimore a oferta de serviços públicos. “A versão digital da CIN, que tem um QR Code, vai dar acesso às informações sobre o cidadão e possibilita, também, a integração com outros documentos, como a carteira de motorista digital. No futuro, teremos outros documentos concentrados no GOV.BR”, explicou a ministra.

Até o momento, a nova carteira de identidade é emitida, além do Distrito Federal, pelos estados do Acre, Alagoas, Amazonas, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins.