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Doação de órgãos: conheça exigências e tire dúvidas sobre transplantes

A cada 14 pessoas que manifestam interesse em doar órgãos no Brasil, apenas quatro efetuam a doação. De acordo com o Ministério da Saúde, um dos principais obstáculos é a recusa familiar. Por esse motivo, no Dia Nacional da Doação de Órgãos, lembrado nesta sexta-feira (27), a pasta encabeça uma campanha com o tema Doação de órgãos: precisamos falar sim. A proposta é alertar para a necessidade de diálogo e da desmistificação do ato de doar órgãos.

Dentre os motivos citados para não autorizar a doação de órgãos, segundo o ministério, estão a não aceitação da manipulação do corpo; crença religiosa; medo da reação de parentes e familiares; desconfiança da assistência médica; e a não compreensão do diagnóstico de morte encefálica, que leva à ideia que, de alguma forma, seria possível reverter o quadro.

“Por isso, falar sobre o assunto é o primeiro passo para se tornar um doador”, destaca a pasta.

Ao longo do primeiro semestre deste ano, 14.352 transplantes foram realizados via Sistema Único de Saúde (SUS). O número é maior que o registrado no mesmo período de 2023, quando foram contabilizados 13,9 mil procedimentos. Os órgãos mais doados foram rins, fígado, coração, pâncreas e pulmão, além de córnea e medula óssea, que são, tecnicamente, tecidos. Ainda assim, mais de 43 mil brasileiros compõem a lista de espera por um transplante.

>> Confira, a seguir, as principais perguntas e respostas envolvendo o processo de doação de órgãos (com base em informações do Ministério da Saúde:

O que é a doação de órgãos?

É o ato por meio do qual podem ser doadas partes do corpo, sejam órgãos ou tecidos, para serem utilizados no tratamento de outra pessoa com a finalidade de reestabelecer a função de um órgão ou tecido doente.

De um único doador, é possível obter diversos órgãos e tecidos, incluindo rins, fígado, coração, pulmões, pâncreas, intestino, córneas, valvas cardíacas, pele, ossos e tendões.

A doação de órgãos como rim, parte do fígado, parte do pulmão e medula óssea pode ser feita em vida. Já a doação de órgãos de pessoas falecidas somente ocorre após a confirmação do diagnóstico de morte encefálica ou de uma parada cardiorrespiratória.

Na morte encefálica, pacientes sofreram um acidente que provocou traumatismo craniano, como acidente com carro, moto e quedas, ou sofreram um acidente vascular cerebral (AVC).

Por que doar órgãos?

Doar órgãos pode salvar vidas em casos de órgãos vitais, como o coração, além de devolver qualidade de vida nos casos em que o órgão transplantado não é vital, como acontece com os rins.

A doação de órgãos prolonga a expectativa de vida de pessoas que precisam de um transplante, permitindo o restabelecimento da saúde e, muitas vezes, até mesmo a retomada de atividades cotidianas.

O que preciso fazer para ser um doador?

Se você deseja ser um doador de órgãos, avisar aos parentes é o mais importante, já que a lei brasileira exige o consentimento da família para a retirada de órgãos e tecidos para transplante.

Não é necessário deixar a vontade expressa em documentos ou cartórios – basta que sua família atenda ao seu pedido e autorize a doação.

Por isso, comunicar à família que você é um doador de órgãos facilita o processo de transplantes. E se você tem um parente doador, respeite a vontade dele.

O que é um doador de órgãos vivo e o que ele pode doar?

Um doador vivo é qualquer pessoa juridicamente capaz, atendidos os preceitos legais quanto à chamada doação intervivos, que esteja em condições satisfatórias de saúde e que concorde com a doação, desde que não prejudique sua própria saúde.

O doador vivo pode doar um dos rins, parte do fígado, parte do pulmão ou parte da medula óssea. A compatibilidade sanguínea é primordial em todos os casos.

Pela lei, parentes até o quarto grau e cônjuges podem ser doadores em vida. Não parentes, somente com autorização judicial.

Nesse contexto, o doador está sujeito a riscos normais de se submeter a uma cirurgia com anestesia geral. Antes do procedimento, entretanto, são feitos exames a fim de minimizar os riscos.

O que é um doador de órgãos falecido e o que ele pode doar?

Existem dois tipos de doadores falecidos:

– doador falecido após morte encefálica: paciente cuja morte encefálica foi constatada segundo critérios definidos pela legislação do país e que não tenha sofrido parada cardiorrespiratória.

O doador falecido, nessa condição, pode doar coração, pulmões, fígado, pâncreas, intestino, rins, córnea, vasos, pele, ossos e tendões. A retirada dos órgãos é realizada em centro cirúrgico. Para que o procedimento aconteça, é necessária a manutenção da circulação sanguínea do paciente até o momento da retirada do órgão a ser doado.

– doador por parada cardiorrespiratória: paciente cuja morte foi constatada por critérios cardiorrespiratórios (coração parado). O doador falecido, nessa condição, pode doar apenas tecidos para transplante, incluindo córnea, vasos, pele, ossos e tendões.

Em ambos os casos, a doação só acontece mediante autorização da família.

Quem não pode ser um doador de órgãos?

Não existe restrição absoluta para a doação de órgãos. Entretanto, o ato pressupõe alguns critérios mínimos como o conhecimento da causa da morte e a ausência de doenças infecciosas ativas, dentre outros.

Também não poderão ser doadoras pessoas que não possuem documentação ou menores de 18 anos sem a autorização dos responsáveis.

Por que existem poucos doadores de órgãos?

A negativa familiar é um dos principais motivos para que um órgão não seja doado no Brasil.

Atualmente, aproximadamente metade das famílias entrevistadas não concorda que sejam retirados órgãos e tecidos do ente falecido para doação.

Em muitos desses casos, a pessoa poderia ter sido um doador. Daí a necessidade de conversar previamente com sua família sobre o desejo de doar órgãos.

Existe limite de idade para doar órgãos?

O que determina se um órgão é viável ou não para transplante é o estado de saúde do doador. No entanto, algumas condições podem restringir limites de idade em situações específicas.

Para quem vão os órgãos doados?

Para pacientes que necessitam de um transplante e já estão aguardando em uma lista de espera unificada e informatizada.

A posição nessa lista de espera é definida por critérios técnicos como tempo de espera, urgência do procedimento e compatibilidade sanguínea entre doador e receptor.

A compatibilidade genética entre doador e receptores, quando necessária, é determinada por exames laboratoriais. Para alguns tipos de transplantes é exigida ainda a compatibilidade antropométrica (combinação de medidas como peso, altura e circunferências).

Cabe à central estadual de transplantes, por meio do sistema informatizado, gerar a lista de receptores compatíveis com o doador em questão.

Se não existirem receptores compatíveis no estado ou se a unidade federativa em questão não realizar a modalidade de transplante referente ao órgão doado, ele é ofertado à Central Nacional de Transplantes para distribuição nacional.

O que é o Sistema de Lista Única?

O Sistema de Lista Única é constituído pelo conjunto de potenciais receptores brasileiros, natos, naturalizados ou estrangeiros residentes no país, inscritos para o recebimento de cada tipo de órgão, tecido ou célula.

Esse sistema é regulado por um conjunto de critérios específicos para a distribuição a potenciais receptores que constitui o Cadastro Técnico Único (CTU).

A lista é única, organizada por estado ou região, e monitorada pelo Sistema Nacional de Transplantes (SNT) e por órgãos de controle federais, o que impossibilita que uma pessoa conste em mais de uma lista, além de permitir que a ordem legal seja obedecida.

Como se identifica um possível doador?

As Organizações de Procura de Órgãos (OPO) atuam em parceria com as Comissões Intra-hospitalares de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante, junto a hospitais com perfil notificante de uma determinada região geográfica, identificando potenciais doadores e viabilizando o processo de doação.

O que acontece depois de autorizada a doação?

Se existe um doador em potencial, com morte encefálica confirmada e mediante autorização da família para que ocorra a retirada dos órgãos, são mantidos os recursos para a preservação das funções vitais dos órgãos.

As ações seguem a seguinte sequência:

– o hospital notifica a central estadual de transplantes sobre um paciente em morte encefálica (potencial doador de órgãos e tecidos) ou com parada cardiorrespiratória (potencial doador de tecidos);

– a central de transplantes aguarda a confirmação do diagnóstico de morte encefálica e inicia os testes de compatibilidade entre o potencial doador e potenciais receptores em lista de espera. Quando existe mais de um receptor compatível, a decisão de quem vai receber o órgão passa por critérios como tempo de espera e urgência do procedimento;

– a central de transplantes, por meio de um sistema informatizado, gera uma lista de potenciais receptores para cada órgão e comunica aos hospitais onde eles são atendidos;

– as equipes de transplante, junto à central de transplante, adotam as medidas necessárias para viabilizar a retirada dos órgãos (meio de transporte, cirurgiões e pessoal de apoio, por exemplo);

– os órgãos são retirados e o transplante é realizado;

Já nos casos de morte por parada cardiorrespiratória, após avaliação do doador por critérios estabelecidos, também mediante autorização da família, os tecidos são retirados e encaminhados para bancos de tecidos.

Quem retira os órgãos de um doador?

Após a confirmação de morte encefálica, a autorização da família e a localização de um receptor compatível, a retirada dos órgãos para transplante é realizada em um centro cirúrgico, por uma equipe de cirurgiões autorizada pelo Ministério da Saúde e com treinamento específico para esse tipo de procedimento.

Em seguida, o corpo é devidamente reconstituído e liberado para os familiares.

Após a doação, o corpo do doador fica deformado?

Não. Após a retirada dos órgãos e tecidos, a equipe médica recompõe o corpo do doador, sendo visíveis apenas os pontos do local operado, não impedindo a realização do velório.

Para a doação de tecidos oculares, o profissional coloca uma prótese ou outro material como gaze no lugar do globo ocular. Para o fechamento das pálpebras, pode ser usada uma cola apropriada ou pontos internos (não aparentes), de forma que o doador permaneça com o mesmo aspecto, sem qualquer deformidade.

Para a doação de tecidos musculoesqueléticos, são retirados principalmente ossos do braço (úmero) e da coxa (fêmur), além de cartilagens e tendões. Em seguida, a equipe reconstitui o corpo do doador com próteses apropriadas, refazendo as juntas do joelho, quadril, ombro e cotovelo.

Por fim, para a doação de pele, é retirada somente uma fina porção da pele do dorso das costas e das coxas, sem alterações na aparência do doador falecido.

É possível escolher o receptor?

Na doação em vida, sim – desde que atendida a legislação vigente.

Na doação após a morte, nem o doador, nem a família podem escolher o receptor. Ele será sempre o próximo da lista única de espera de cada órgão ou tecido, dentro da área de abrangência da central estadual de transplantes.

O que é morte encefálica?

É a parada definitiva e irreversível do encéfalo, provocando, em poucos minutos, a falência de todo o organismo. O encéfalo inclui o cérebro e o tronco cerebral ou tronco encefálico. Ele é responsável pelas funções essenciais do organismo, como o controle da pressão, da temperatura e da respiração, dentre outras.

Após algumas agressões neurológicas, células do cérebro podem morrer e deixar de cumprir essas funções, apresentando um quadro irreversível. Aparelhos e remédios podem manter a respiração e a pressão do paciente, mas por um espaço curto de tempo.

Quando constatada a morte encefálica, o quadro basicamente significa que a pessoa está morta. Nessa situação, os órgãos podem ser doados para transplante, se a família consentir. Se não houver o consentimento, os aparelhos serão desligados, já que o indivíduo está clínica e legalmente morto.

Posso ter certeza do diagnóstico de morte encefálica?

Sim. O diagnóstico de morte encefálica é regulamentado por uma resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) e realizado por meio de exames específicos, além da avaliação de dois médicos distintos.

O intervalo mínimo de tempo a ser observado entre os exames clínicos é de no mínimo uma hora em pacientes a partir de 2 anos. Além disso, é obrigatória a confirmação do diagnóstico por, pelo menos, um dos seguintes exames complementares: angiografia cerebral, cintilografia cerebral, ultrassom com doppler transcraniano ou eletroencefalograma.

Como o corpo é mantido após a morte encefálica?

Para a manutenção hemodinâmica do corpo após a morte encefálica, o coração é induzido a funcionar por meio da administração de medicamentos; o pulmão funciona com a ajuda de aparelhos; e o corpo continua sendo alimentado por via endovenosa.

Morte encefálica é o mesmo que coma?

Não. A morte do encéfalo não é a mesma coisa que o coma. Algumas pessoas confundem morte encefálica com coma, mas as condições são completamente diferentes.

O coma é reversível, ou seja, a pessoa ainda pode acordar.

Já no caso de um paciente com morte encefálica, não há possibilidade de acordar novamente, já que o cérebro para de funcionar e o sangue deixa de circular, não levando mais oxigênio para as células e acarretando perda irreversível das funções cerebrais.

Fila para transplantes de córnea no país quase triplica em uma década

O número de pacientes na fila de espera por um transplante de córnea no Brasil quase triplicou nos últimos dez anos, passando de 10.734 em 2014 para 28.937 em junho de 2024. São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais lideram o ranking de espera, com cerca de 12,5 mil pacientes. Os dados foram divulgados nesta segunda-feira (2) pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO).

Em nota, a entidade avalia que a pandemia da covid-19 impactou significativamente os procedimentos eletivos. O aumento mais expressivo na fila de espera por um transplante de córnea foi registrado exatamente em 2020, quando o total saltou de 12.212, em 2019, para 16.337, um crescimento de 33%.

Nos anos seguintes, a lista de espera por um transplante de córnea continuou a aumentar: 20.134 em 2021; 23.946 em 2022; e 26.905 em 2023. Os dados se referem ao Sistema Único de Saúde (SUS) e às redes privada e suplementar. 

Além da interrupção de cirurgias eletivas na pandemia, o CBO cita insuficiência de doadores e melhorias na gestão de transplantes.

Número de pacientes

De 2014 a junho de 2024, um total de 146.534 pacientes realizaram transplante de córnea. Atualmente, a Região Sudeste responde pelo maior número de pacientes em lista de espera ao longo dos anos. São Paulo lidera o ranking – no estado, a fila teve um aumento considerável, sobretudo entre 2019 (2.835) e 2023 (4.587).

No Rio de Janeiro, houve um crescimento acentuado da fila entre 2021 (2.898) e 2023 (4.274) – quase 50% em apenas dois anos. Rio Grande do Sul e Pernambuco também mostraram avanço rápido no número de pacientes em espera. O primeiro passou de 52 em 2014 para 1.299 em 2023, enquanto o segundo passou de 86 para 1.272 no mesmo período.

No Ceará e no Amazonas, a lista de espera por um transplante de córnea apresentou queda acentuada de 67% e 77%, respectivamente, durante o período. Amapá e Roraima não apresentaram dados durante o período analisado.

Tempo de espera

Em relação ao tempo de espera para realização dos transplantes, a média nacional é de 194 dias, pouco mais de 6 meses. Dos 26 estados e o Distrito Federal, encabeçam o ranking com maior tempo de espera o Maranhão (595 dias) e Pará (594 dias), ambos com algo em torno de 19 meses. No extremo oposto aparecem Ceará, com 63 dias de espera, Paraná, com 119, e Pernambuco, com 121 dias.

Para o CBO, o modelo vigente tem levado a distorções na assistência, como a existência de filas onde pacientes levam anos para serem atendidos. “Há casos pontuais de pacientes que aguardaram 190 meses, ou seja, 16 anos para realizar uma cirurgia de transplante de córnea, como aconteceu no Rio Janeiro. Também há situações que chamam a atenção como no Ceará (159 meses), no Pará (152 meses), em Minas Gerais (129 meses) e em Goiás (94 meses)”.

Capacidade

O conselho estima que, para zerar a atual fila de espera por transplantes de córnea, seria necessário praticamente dobrar a capacidade anual de transplantes. “No ano passado, o país registrou 16.027 procedimentos, um aumento significativo em relação aos anos anteriores, mas ainda insuficiente para atender à crescente demanda”, informou o CBO.

Este ano, até junho, foram contabilizados 8.218 transplantes de córneas, sendo que quase 3 mil deles em São Paulo.

O Brasil conta, atualmente, com 651 equipes treinadas para realizar transplantes de córnea, distribuídas em 429 serviços habilitados. Alguns, segundo o conselho, destacam-se pelo maior número de especialistas preparados, como o Hospital de Olhos Capixaba, no Espírito Santo, e o Centro Oftalmológico de Minas Gerais, que têm 14 equipes cada um.

“Todos os estados brasileiros contam com times preparados para execução desse procedimento, porém, a maioria dos especialistas está no Sudeste e no Sul”, destacou a entidade. São Paulo registra 210 equipes transplantadoras de córnea, seguido por Minas Gerais (72), Rio de Janeiro (65) e Espírito Santo (31). Fora desse eixo, surgem como destaques Paraná (30), Rio Grande do Sul (28) e Santa Catarina (24).

Demanda

“Apesar da capacidade operacional instalada e dos números crescentes no volume de transplantes, não tem sido possível absorver com rapidez a demanda crescente”, alerta a entidade, ao citar que os números mostram um aumento significativo na fila de espera em comparação aos transplantes efetivamente realizados.

Outra demanda classificada pelo CBO como fundamental é assegurar uma distribuição equitativa dos recursos, sobretudo em regiões onde a infraestrutura de saúde ocular é menos desenvolvida. “A situação atual requer ações coordenadas entre o governo e as organizações de saúde para expandir e otimizar os serviços de transplante de córnea no Brasil”, defende o CBO.

Conscientização

Outra estratégia citada pela entidade no intuito de reduzir a fila de espera por transplantes de córnea consiste em aumentar a conscientização sobre a importância da doação de órgãos e também sobre os investimentos em infraestrutura dos chamados bancos de olhos em todo o país.

Para isso, a entidade defende a continuidade de campanhas educativas sobre o tema e melhorias no sistema de captação e de distribuição de córneas como medidas necessárias para reverter uma tendência preocupante.

Os números e toda a temática envolvendo transplantes de medula serão discutidos durante a 68ª edição do Congresso Brasileiro de Oftalmologia, organizado pelo CBO e que acontece entre os dias 4 e 7 de setembro em Brasília.