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Lula homologa terras indígenas na Bahia e em Mato Grosso

Na véspera do Dia dos Povos Indígenas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou da reunião de reabertura do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) e assinou decreto de demarcação de mais duas terras indígenas. Em evento na sede do Ministério da Justiça e Segurança Pública, nesta quinta-feira (18), foram homologadas as terras indígenas Aldeia Velha, na Bahia, e Cacique Fontoura, em Mato Grosso.

 A expectativa, no entanto, era que o presidente assinasse a homologação de mais quatro terras indígenas, incluindo algumas com longo histórico de disputa pela demarcação, como Morro dos Cavalos e Toldo Imbu, em Santa Catarina, Potiguara de Monte-Mor, na Paraíba, e Xukuru Kariri, em Alagoas.

“O ministro [Ricardo] Lewandowski [da Justiça e Segurança Pública] me levou, na semana passada, seis terras indígenas para que eu assinasse hoje, na frente de vocês. E nós decidimos assinar só as duas. Eu sei que isso frustrou alguns companheiros e algumas companheiras, mas eu fiz isso para não mentir para vocês, porque temos um problema, e é melhor a gente tentar resolver o problema antes de assinar”, disse Lula, na presença de dezenas de indígenas e entidades indigenistas. Segundo o presidente , entre os problemas nesses territórios está a ocupação por não indígenas. Lula admitiu ter atendido pedido de governadores.

“Temos algumas terras ocupadas por fazendeiros, outras por gente comum, possivelmente tão pobres quanto nós. Tem umas que têm 800 pessoas que não são indígenas ocupando. Tem outras com mais gente. E tem alguns governadores que pediram mais tempo para saber como vamos tirar essas pessoas, porque não posso chegar com a polícia e ser violento com as pessoas que estão lá. Tenho que ter o cuidado de oferecer a essas pessoas uma possibilidade para que  possam entrar tranquilamente na terra. Dois governadores são aliados nossos, que pediram um tempo, e nós vamos dar um tempo”, argumentou o presidente.

Lula insistiu na cautela e comparou o caso com a aprovação de um projeto que estabeleceu a tese do marco temporal para demarcação de terras indígenas. O texto foi vetado pelo presidente, mas o veto foi derrubado pelo Congresso Nacional. A tese do marco temporal, que já havia sido declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), deverá ser novamente invalidada pela corte.

“O que nós não queremos é prometer para vocês uma coisa hoje, e amanhã você ler no jornal que a Justiça tomou uma decisão contrária. A frustração seria maior, como foi o marco temporal, como vocês viram. Eu vetei tudo, mas eles derrubaram o meu veto. E agora, nós estamos a continuar brigando na Justiça para manter a decisão que a Suprema Corte já tinha tomado.”

Com as duas novas áreas homologadas nesta quinta, o governo Lula totaliza 10 terras indígenas demarcadas desde o início do terceiro mandato. Ao todo, em 2023, oito territórios já haviam sido demarcados. Os processos estavam parados desde 2018, pois o ex-presidente Jair Bolsonaro afirmou que não faria nenhuma demarcação durante o seu governo.

Durante o evento de reabertura do CNPI, que havia sido paralisado pelo governo anterior, a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, reforçou a luta histórica.

“Em razão dessa diversidade e especificidades culturais dos 305 povos presentes no país, que falam mais de 274 línguas distintas, que nos diferenciam da sociedade nacional, é que os povos lutam por políticas específicas e diferenciadas, que nem de longe podem ser confundidas com privilégios”, disse.

O direito originário de ocupação tradicional indígena é previsto na Constituição Federal de 1988, que garante posse permanente e usufruto exclusivo para esses povos. As terras são consideradas inalienáveis e indisponíveis, e os direitos originários sobre elas imprescritíveis, ou seja, permanentes.

Repercussão

Do lado das entidades indígenas, a não homologação das quatro áreas foi recebida com decepção. “A sensação que nós temos é de frustração. Estamos há mais de 400 dias no novo governo, e foi pactuada, desde a transição, a homologação de 14 terras que estão aptas, livres de qualquer impedimento legal. Não há impedimento legal. Nós pactuamos que essas terras seriam homologadas nos primeiros 100 dias de governo, e isso não aconteceu”, disse à Agência Brasil o coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Dinamam Tuxá.

Tuxá mostrou-se surpreso com a posição do presidente de ouvir governadores sobre o tema, uma vez que a Constituição Federal não prevê esse procedimento. “O que gera maior surpresa é o presidente afirmar que consultou os governadores, e o rito previsto no nosso texto constitucional e no Decreto 1.775 não prevê consulta a governadores. Então, cumpra-se o rito. Sem sombra de dúvidas, vamos continuar vigilantes e atuantes e a demarcação do maior número de terras aptas”, afirmou.

PGR defende no STF derrubada de marco temporal das terras indígenas

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, enviou nessa quinta-feira (11) parecer ao Supremo Tribunal Federal (STF) no qual defende a derrubada do marco temporal das terras indígenas, que foi recriado no ano passado pelo Congresso Nacional, após o próprio Supremo ter julgado a tese inconstitucional. 

Pela tese do marco temporal, os povos indígenas somente teriam direito à demarcação de terras que estavam ocupadas por eles na data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. 

Esse entendimento foi considerado inconstitucional pelo Supremo em setembro de 2023. Entretanto, em resposta, o Congresso aprovou a lei 14.701/2013, restabelecendo o marco temporal para a demarcação de terras indígenas. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou a vetar o dispositivo, mas o veto acabou derrubado por parlamentares. 

Em seguida à entrada em vigor da nova lei, o povo indígena Xokleng pediu a suspensão dos trechos que recriaram o marco temporal, entre outros pontos. A etnia é parte em um processo que trata da demarcação da Terra Indígena (TI) Ibirama La-Klãnõ, em Santa Catarina. 

Os Xokleng argumentam que o artigo que restabeleceu o marco temporal inviabiliza, na prática, a expansão da TI, já aprovada por meio de portaria publicada pelo Ministério da Justiça. Isso porque a etnia não ocupava a área na data da promulgação da Constituição.  

Gonet concordou com os argumentos. Ele afirmou que diversos dispositivos da lei são “capazes de inviabilizar o andamento das demarcações, prejudicando a eficiência e a duração razoável do processo e ofendendo os postulados da segurança jurídica e do ato jurídico perfeito”.

Revisão de terras

Pelo parecer do PGR, devem ser considerados inconstitucionais 17 artigos da nova lei, incluindo o marco temporal propriamente dito e regras que permitem, por exemplo, a volta de processos de demarcação a estágios iniciais e a revisão de terras já demarcadas. 

Entre os outros dispositivos que devem ser suspensos estão aqueles que, na opinião do PGR, dificultam ou inviabilizam o trabalho dos técnicos na produção de laudos antropológicos, documento que comprova o vínculo entre determinada etnia com o território. Também devem ser suspensos dispositivos que adicionam obstáculos às demarcações, segundo o parecer. 

Um desses dispositivos prevê, por exemplo, que eventuais ocupantes das áreas em processo de demarcação podem permanecer no local até o recebimento de eventuais indenizações por benfeitorias feitas “de boa-fé”. A previsão também deve ser derrubada, opinou o PGR. 

“A autorização para que posseiros permaneçam nas terras reconhecidas como indígenas até a conclusão do procedimento e o efetivo pagamento das benfeitorias, sem limitação ao uso e gozo das terras, restringe o usufruto exclusivo garantido pela Constituição aos indígenas sobre as terras que tradicionalmente ocupam”, escreveu Gonet. 

Ele opinou ainda pela derrubada do artigo que veda a ampliação das TI já demarcadas, bem como aquele que permite a instalação de bases, postos militares e redes de comunicação em terras indígenas, entre outros. 

Parecer

Nesta sexta-feira (12), o Supremo começou a julgar se mantém uma decisão do ministro Edson Fachin, relator do processo sobre a TI birama La-Klãnõ, que suspendeu um parecer da Advocacia Geral da União (AGU) de 2017 que impunha diversas regras à demarcação das terras. O caso é julgado no plenário virtual, em sessão prevista para durar até a próxima sexta-feira (19). 

O pedido do povo Xokleng pela suspensão do marco temporal deve ser analisado quando o mérito do processo for a julgamento. Em paralelo, diversos partidos também questionaram a recriação do marco temporal por meio de ações diretas de inconstitucionalidade. 

Em seu parecer, a PGR opinou em relação ao mérito do marco temporal, pedindo que seja, novamente, considerado inconstitucional. Para ela, a tese viola o artigo 231 da Constituição, que confere o direito aos indígenas da posse a suas terras tradicionais.

“Era sonho dela”, diz filho de Mãe Bernadete, após delimitação de terras

Uma mistura de felicidade e frustração. Foi assim que Jurandir Wellington Pacífico, filho da líder quilombola Mãe Bernadete, definiu, nesta segunda-feira (8) o sentimento dele e de toda a comunidade Pitanga dos Palmares, na cidade de Simões Filho (BA), ao receber a notícia de reconhecimento de terras pelo governo federal, com a delimitação da área da comunidade. Ele avalia que o reconhecimento das terras garante autonomia à comunidade. “A titulação é como se fosse um campo de força contra os inimigos”, afirma.

Segundo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), a decisão beneficia 536 famílias remanescentes de quilombos em uma área de 852,2 hectares.

“Era o sonho de Mãe Bernadete titular essa comunidade. Mas, infelizmente ela não está mais aqui”, disse. 

Pacífico diz acreditar que a luta pela titulação acabou provocando as mortes da mãe (em agosto do ano passado), e do irmão dele, Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, conhecido como Binho do Quilombo, em 2017. “A gente fica com esse sentimento que precisou haver derramamento de sangue para ter essa titulação”.

O filho defende que a titulação brindou a comunidade, que, segundo testemunha, vem sofrendo com a especulação imobiliária e com crimes ambientais. “Titulação é garantia de direitos, de agricultura familiar, de esporte, cultura, lazer e saúde”, exemplifica. 

Segurança

Apesar da boa notícia desta segunda, o filho de Mãe Bernadete se queixa da falta de respostas para os assassinatos do irmão e da mãe. Em novembro do ano passado, o Ministério Público da Bahia (MP-BA) denunciou cinco pessoas investigadas por suspeita de participação no assassinato de Maria Bernadete Pacífico Moreira, líder do Quilombo Pitanga de Palmares, localizado entre as cidades de Simões Filho e Candeias, na região metropolitana de Salvador. “As perguntas que não querem calar: quem mandou matar Binho do Quilombo e quais foram os motivos para a Mãe Bernadete?”

Pacífico entende que a titulação dá autonomia à comunidade e garante, com isso,  mais conforto, segurança, capacidade de desenvolver a cultura local, a educação e a agricultura familiar. “Titular é sinônimo de segurança e de prosperidade”, avalia.

A decisão do reconhecimento de terras delimita as áreas privadas que integram o Pitanga de Palmares, de acordo com o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID). Com a portaria, o Incra entra na fase de desapropriação das propriedades particulares. São preparadas as documentações necessárias desses imóveis rurais para envio à presidência da República para as desapropriações por interesse social.

Incra reconhece terras da Comunidade de Pitanga de Palmares

​Quase oito meses após o assassinato da ialorixá e ex-secretária de Promoção da Igualdade Racial de Simões Filho na Bahia, Mãe Bernadete, e mais de seis anos depois da execução de seu filho Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, conhecido como Binho do Quilombo, a Comunidade Pitanga dos Palmares teve suas terras reconhecidas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). A declaração que delimita o território quilombola foi publicada no Diário Oficial da União desta segunda-feira (8).

Localizada nos municípios de Simões Filho e Candeias, na região metropolitana de Salvador, a comunidade teve reconhecida uma área que soma quase 647 hectares, onde vivem 162 pessoas, sendo150 delas declaradas quilombolas, de acordo com o Censo 2022 (IBGE).

Casa da Mãe Bernadete, liderança do Quilombo Pitanga dos Palmares, assassinada na Bahia. Foto Janaína Neri.

Embora a Comunidade Pitanga dos Palmares fosse reconhecida pela Fundação Cultural Palmares, como remanescente de quilombo desde 2004, a população que se estabeleceu ainda no século 19 na fazenda Mucambo, após resistir ao regime escravagista, enfrenta conflitos territoriais desde a década de 1940 com a criação de oleodutos para transporte de petróleo na região.

Outros empreendimentos públicos e privados instalados na região também afetaram a comunidade que se manteve ao longo dos anos de atividades sustentáveis como agricultura familiar, pesca artesanal e manejo da piaçava. Polos industriais, rodovias, ferrovias e a construção da Colônia Penal de Simões Filho atingiram drasticamente o modo de vida da população, que passou a sofrer com a especulação imobiliária.

Um primeiro Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (Rtid) das terras quilombolas foi publicado pelo Incra em 2017, e em 2020, passou por uma retificação com a identificação de novos invasores.

Violência

No dia 19 de setembro de 2017, Binho do Quilombo foi assassinado a tiros dentro de seu carro, em frente à Escola Municipal de Pitanga de Palmares. Mãe Bernardete foi executada também a tiros, quase seis anos depois, na noite de 17 de agosto de 2023.

O filho de Mãe Bernardete, Jurandir Wellington Pacífico, atribui as mortes do irmão a da mãe aos interessados na posse do território tradicionalmente ocupado pelos quilombolas.

Incra reconhece terras de quilombo de mãe Bernadete

​Quase oito meses após o assassinato da ialorixá e ex-secretária de Promoção da Igualdade Racial de Simões Filho na Bahia, Mãe Bernadete, e mais de seis anos depois da execução de seu filho Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, conhecido como Binho do Quilombo, a Comunidade Pitanga dos Palmares teve suas terras reconhecidas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). A declaração que delimita o território quilombola foi publicada no Diário Oficial da União desta segunda-feira (8).

Localizada nos municípios de Simões Filho e Candeias, na região metropolitana de Salvador, a comunidade teve reconhecida uma área que soma quase 647 hectares, onde vivem 162 pessoas, sendo150 delas declaradas quilombolas, de acordo com o Censo 2022 (IBGE).

Casa da Mãe Bernadete, liderança do Quilombo Pitanga dos Palmares, assassinada na Bahia. Foto Janaína Neri.

Embora a Comunidade Pitanga dos Palmares fosse reconhecida pela Fundação Cultural Palmares, como remanescente de quilombo desde 2004, a população que se estabeleceu ainda no século 19 na fazenda Mucambo, após resistir ao regime escravagista, enfrenta conflitos territoriais desde a década de 1940 com a criação de oleodutos para transporte de petróleo na região.

Outros empreendimentos públicos e privados instalados na região também afetaram a comunidade que se manteve ao longo dos anos de atividades sustentáveis como agricultura familiar, pesca artesanal e manejo da piaçava. Polos industriais, rodovias, ferrovias e a construção da Colônia Penal de Simões Filho atingiram drasticamente o modo de vida da população, que passou a sofrer com a especulação imobiliária.

Um primeiro Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (Rtid) das terras quilombolas foi publicado pelo Incra em 2017, e em 2020, passou por uma retificação com a identificação de novos invasores.

Violência

No dia 19 de setembro de 2017, Binho do Quilombo foi assassinado a tiros dentro de seu carro, em frente à Escola Municipal de Pitanga de Palmares. Mãe Bernardete foi executada também a tiros, quase seis anos depois, na noite de 17 de agosto de 2023.

O filho de Mãe Bernardete, Jurandir Wellington Pacífico, atribui as mortes do irmão a da mãe aos interessados na posse do território tradicionalmente ocupado pelos quilombolas.

Força Nacional permanecerá nas terras indígenas Guarita e Nonoai

A Força Nacional de Segurança Pública permanecerá por mais 90 dias atuando em apoio a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) nas terras indígenas Guarita e Nonoai, no estado do Rio Grande do Sul. A medida foi determinada em publicação no Diário Oficial da União desta sexta-feira (5). A região sofre com um histórico de conflitos agrários, disputa de poder e no início deste ano foi atingida por um vendaval que afetou as áreas onde vivem os povos kaingang, guarani-kaiowá, guarani-mbya, guarani-ñandeva e guarani.

A Terra Indígena (TI) Guarita possui uma das maiores populações indígenas do Rio Grande do Sul, reunindo cerca de 6,5 mil pessoas em uma região de Mata Atlântica. Desde 2021, quando a população convocou uma eleição para cacique, que não foi reconhecida pelo então líder da comunidade Carlinhos Alfaiate, os conflitos entre os próprios indígenas resultaram na morte de três pessoas dentro da área de reserva, entre elas, a filha de Alfaiate, de 14 anos.

Desde julho de 2023, o Ministério da Justiça e Segurança Pública já havia autorizado o emprego da Força Nacional em apoio aos órgãos de segurança pública do Rio Grande do Sul, que realizaram uma série de operações para desarmamento dos indígenas. De acordo com a prorrogação, os agentes atuam em “atividades e nos serviços imprescindíveis à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”.

A atuação dos militares se estende às terras vizinhas Nonoai, onde vivem cerca de 2,6 mil indígenas em uma área de 20 mil hectares, ao norte do estado. A região também é área de conflitos com invasores que exploram ilegalmente o uso da terra.

A invasão e arrendamento por produtores de grãos resultou em um processo movido pelo Ministério Público Federal. Em 2022, a Justiça determinou a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), assinado pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e pela Cooperativa dos Trabalhadores Rurais Indígenas de Nonoai (Copinai), para que a posse e usufruto dos ativos ambientais sejam cumpridas de forma sustentável, somente por indígenas.

Terras públicas são destinadas aos povos Kanela do Araguaia e Apurinã

Retomada em setembro do ano passado, por meio de decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Câmara Técnica de Destinação e Regularização Fundiária de Terras Públicas Federais Rurais realizou, nesta sexta-feira (26), as primeiras entregas entre as ações de prevenção e controle do desmatamento na região amazônica.

A medida, que destina à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) pouco mais de 22 mil hectares de terra pública para usufruto de grupos indígenas, está publicada no Diário Oficial da União.

O documento trata de uma área de 2,47 mil hectares da Gleba São Pedro, localizada no município de Luciara, estado de Mato Grosso, que destinada à regularização da Terra Indígena Kanela do Araguaia. Também foi definido o uso de 3,57 mil hectares da Gleba Afluente, e 16,40 mil hectares da Gleba Bom Lugar, totalizando 19,97 mil hectares, para regularização parcial da Terra Indígena Aripunã Valparaíso, localizada no município de Boca do Acre, estado do Amazonas.

A medida define a finalidade para o uso da terra, que deverá ter continuidade com a demarcação e transferência de domínio pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). Durante esse processo, foi recomendado que a Secretaria do Patrimônio da União do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos garanta a segurança jurídica, com a emissão de portarias de declaração de interesse do serviço público e que a Funai manifeste esse interesse, no Sistema de Gestão Fundiária.

Finalidade

A Câmara Técnica de Destinação e Regularização Fundiária de Terras Públicas Federais Rurais é um colegiado do governo federal, de caráter deliberativo sobre a destinação de terras públicas. É coordenada pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar e tem a participação dos ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas, Secretaria de Patrimônio da União, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Serviço Florestal Brasileiro, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e Funai.

A principal finalidade da câmara técnica é a regularização fundiária de áreas da União e do Incra com destinação de terras, que priorizam políticas públicas de conservação ambiental e o uso social da terra, conforme previsto na Constituição Federal.

MST completa 40 anos de luta pela distribuição de terras no país

A luta pela terra sempre esteve presente na história do Brasil, fruto da concentração de terras desde o período colonial. Revoltas, guerras e repressão marcaram a disputa pela sobrevivência no país, como as lutas camponesa, indígenas e quilombolas. 

No final da década de 1970, ressurgiram as ocupações de terra por camponeses, principalmente na região sul, em meio à forte repressão da ditadura. E a sociedade brasileira se organizava pela redemocratização.  

Em 22 de janeiro de 1984, em Cascavel, no Paraná, camponeses, pequenos agricultores, posseiros e excluídos rurais se juntaram no 1º Encontro Nacional dos Sem Terra. Esse evento marcou a fundação do maior movimento social pela distribuição de terras do país, o Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST). 

Para o professor da Universidade de Brasília e pesquisador sobre a questão agrária no país Sérgio Sauer, o MST ampliou as suas lutas ao longo desses 40 anos. “A organização que luta pela terra se ampliou para outras lutas: luta por educação, luta por saúde, luta por condições dignas de vida no campo. A garantia de vida no campo passa pelo acesso acesso à terra, mas acesso com dignidade, crédito, assistência técnica, condições saudáveis de produção, portanto menos violência e assim por diante.”

Mas a violência do campo sempre acompanhou a luta pela terra. Só em 2022, 70 pessoas foram mortas em conflitos agrários, segundo a Comissão Pastoral da Terra. O professor Sérgio Sauer destaca que a impunidade impede a diminuição dessa violência.

Já Ceres Hadich, integrante da Direção Nacional do MST, afirma que essa é uma estratégia do agronegócio contra os excluídos do campo. “Ao longo desses 40 anos, perpassaram a história do nosso movimento, nesse processo de tentar impedir a ação da organização popular a partir do uso da força e da violência. E também seguem resistindo, por meio da ação do estado, seja por meio das milícias organizadas, ou mesmo dos fazendeiros e da força do agronegócio, hoje cada vez mais organizada e violenta no campo brasileiro.”

O pesquisador Sérgio Sauer ressalta que a reforma agrária ainda é uma demanda social frente às desigualdades existentes no campo. “Do ponto de vista mais estrutural, econômico e social, a reforma agrária continua sendo uma demanda social. Onde se tem, de um lado, mais ou menos um milhão de famílias assentadas em projetos de reforma agrária, tem pelo menos outro um milhão, um milhão e meio de famílias sem terra ou com menos terra do que o mínimo necessário para viver.”

E o movimento dos sem terra cresceu e se organiza hoje em 1900 associações, 185 cooperativas e 120 agroindústrias para produzir e comercializar os produtos da reforma agrária. 

Ceres Hadich afirma que o MST amadureceu e adaptou seus instrumentos de luta. “Um amadurecimento do MST em relação à necessidade de calibrar melhor, a gente poderia dizer na roça, né, amolar melhor as nossas ferramentas de luta para poder fazer o nosso pleito render. A cada momento histórico, se organizou para poder fazer com que nossos objetivos de fato se realizassem, a nossa luta fosse cumprida em concordância aos nossos princípios, que também se mantiveram ao longo desses 40 anos.”

Segundo o MST, o movimento atualmente está presente em 24 estados, com 400 mil famílias assentadas e 70 mil acampadas.

Ouça na Radioagência:

 

Força Nacional é autorizada a atuar em duas terras indígenas

A Força Nacional de Segurança Pública vai apoiar a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) em ações na Terra Indígena (TI) Tekoha Guasu Guavira, nos municípios de Altônia, Guaíra e Terra Roxa, no Paraná. A autorização do Ministério da Justiça e Segurança Pública está prevista em portaria publicada, nesta sexta-feira (19), no Diário Oficial da União.

O território, onde vive o povo Avá-Guarani, vem enfrentando conflitos por disputa de terras, desde 2020, quando o relatório que identificou e delimitou a terra indígena, emitido em 2018, foi anulado pela gestão da Funai no governo anterior. Em nota, o Ministério dos Povos Indígenas informou que a anulação foi revista em 2023, e que o processo de demarcação foi retomado.

A pressão no território aumentou e, no início deste ano, em 10 de janeiro, um ataque a tiros deixou três indígenas feridos. A comunidade ingressou com uma ação cível originária que resultou na decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin de suspender qualquer processo judicial que impeça a demarcação. O ministro também determinou à Comissão Nacional de Soluções Fundiárias do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que busque construção de consenso para solucionar os conflitos.

Os militares da Força Nacional atuarão, na terra indígena, articulados com os órgãos de segurança pública do estado do Paraná.

Cana Brava Guajajara

A Funai também continuará a ter o apoio da Força Nacional na Terra Indígena Cana Brava Guajajara, nos municípios de Barra do Corda, Grajaú e Jenipapo dos Vieiras, no estado do Maranhão. A prorrogação também foi publicada hoje no Diário Oficial da União ().

Desde agosto de 2023, os militares atuam na região apoiando também o Ministério Minas e Energia, para garantir a segurança de agentes que trabalham na terra indígena, onde há graves conflitos por disputa de terras.