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Corporações querem controle sobre debate climático, diz pesquisadora

Termos como transição energética, mudanças climáticas e sustentabilidade socioambiental estão na boca dos porta-vozes de organizações apontadas historicamente como responsáveis por muitos dos problemas que hoje o mundo tenta mitigar, como as mineradoras, a indústria de combustíveis fósseis e o agronegócio. Além de celebrar a mudança no discurso dessas instituições, a pesquisadora Elisangela Paim, doutora em ciências sociais pela Universidad de Buenos Aires e coordenadora latino-americana do Programa Clima da Fundação Rosa Luxemburgo, liderou um trabalho que traz questionamentos sobre as apropriações do discurso verde no cenário atual.

O título do trabalho, Em nome do clima: mapeamento crítico transição energética e financeirização da natureza, dá uma ideia das questões levantadas. A publicação foi lançada em São Paulo no dia 11 deste mês e é dividida em dois eixos: o primeiro discute a transição energética por meio do mapeamento e análise de projetos e políticas associadas às eólicas, hidrogênio verde e mineração no Brasil. O segundo apresenta as iniciativas de redução das emissões por desmatamento e degradação florestal (REDD) na região amazônica.

Com mais de 20 anos de acompanhamento de impactos de grandes projetos sobre comunidades na América Latina, a pesquisa também reflete mais de 15 anos de envolvimento na análise e resistência aos projetos de REDD, proporcionando uma visão crítica da transição energética no Brasil, com destaque para os estados Rio Grande do Sul, Ceará e Pará.

 

A coordenadora latino-americana do Programa Clima da Fundação Rosa Luxemburgo, Elisangela Paim – Aidee Sequeira/Divulgação

Em entrevista à Agência Brasil, Elisangela Paim destaca contradições como o aumento significativo na demanda por novos minerais considerados críticos e estratégicos para viabilizar a produção de equipamentos de alta tecnologia, como baterias, painéis solares, aerogeradores, carros elétricos entre outros produtos.

A entrevista

Agência Brasil: A transição energética se tornou um tema quase onipresente. Há necessidade de cautela para não haver esvaziamento ou desvirtuamento dessa pauta? É isso que vocês procuram alertar com o mapeamento crítico?

Elisangela Paim: O que destacamos no mapeamento é a apropriação, ou melhor, a construção da noção de energia renovável por corporações que buscam se legitimar e expandir o controle sobre o debate climático e do mercado energético. As corporações dos setores de energia e mineração vêm se apresentando como comprometidas com a defesa do meio ambiente, o enfrentamento às mudanças climáticas e o combate à pobreza, com o aval e apoio ideológico e financeiro dos estados e da própria Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática (UNFCCC).
No entanto, o que observamos é que, ao mesmo tempo em que os investimentos em energias fósseis se expandem, as corporações destacam as possibilidades de compensar os impactos negativos desses investimentos com as energias renováveis, como os complexos eólicos e a extração de minerais críticos necessários para projetos de energia renovável. A taxa estimada de crescimento da extração anual de lítio, por exemplo, é de mais de 8.000%. O mineral é um dos componentes usados na bateria de carros elétricos.

Agência Brasil: É comum ver apenas o lado positivo de projetos como usinas eólicas, painéis solares e carros elétricos, mas que problemas iniciativas como essas podem criar ou agravar?

Elisangela Paim: Comunidades atingidas, movimentos e organizações sociais vêm denunciando os impactos socioambientais decorrentes da instalação de megaempreendimentos de energia eólica no Brasil. As denúncias começam logo no processo de planejamento, mas principalmente durante a instalação, devido à privatização dos territórios e pelos impactos na saúde. 

Agência Brasil: Pode dar alguns exemplos?

Elisangela Paim: A implantação de usinas eólicas na zona costeira do Ceará tem alterado significativamente as características ecológicas e morfológicas dos ecossistemas ali presentes, resultando em impactos negativos ao meio ambiente. Além disso, há o bloqueio ao acesso às dunas, manguezais e praias que, devido à privatização de áreas públicas pelas usinas eólicas, resulta em violações de direitos e impacta atividades culturais e econômicas das comunidades.
A pesca artesanal também está ameaçada pela possível instalação de usinas eólicas no mar (offshore) nas costas do extremo oeste (Camocim), oeste (projetos Jangada e Asa Branca), Fortaleza e região metropolitana (Projeto Caucaia).
No Rio Grande do Sul, os projetos eólicos planejados para ser instalados na Lagoa dos Patos podem inviabilizar o modo de vida e sobrevivência de pescadores artesanais, estimados em mais de 13 mil, e das comunidades pesqueiras. São conflitos que nos levam a questionar a própria noção de renovabilidade e de transição.

Agência Brasil: A demanda por minerais que viabilizem essas tecnologias também traz contradições?

Elisangela Paim: No caso dos minerais da transição, destacamos que a Agência Internacional de Energia afirma que a demanda por lítio triplicou entre 2017 e 2022. A principal razão desta alta é a demanda do setor energético pela substância para a fabricação de equipamentos de armazenamento de energia.
Assim, não podemos desconsiderar os impactos relacionados à mineração; aquela mineração que conhecemos como causadora de crimes ambientais, de deslocamentos forçados, de rompimento de barragens de rejeito, de violação de direitos ao território, moradia, ambiente saudável, do racismo ambiental, aquela que resulta na exploração de tantos territórios e corpos.

Agência Brasil: Esse uso em armazenamento de energia está ligado aos carros elétricos, por exemplo?

Elisangela Paim: Substituir o carro a combustível fóssil pelo elétrico, além de manter o paradigma do transporte individual, não elimina o problema da extração de recursos e tudo que está associado a isso em termos de conflitos ambientais.
Por exemplo, o estudo destaca que são necessários 236 quilos de alumínio por unidade de veículo elétrico inteligente (EVs), 22 quilos por kw gerado para uma unidade de produção de energia fotovoltaica (placas solares), 3 quilos por kw para suprir a demanda das plataformas de energia eólica offshore, além de cobre, níquel, zinco e cobalto.
A própria Agência Internacional de Energia estima que será necessário triplicar a exploração de recursos minerais para gerar os subsídios necessários para a “transição energética”.

Agência Brasil: A compensação de carbono tem sido suficientemente auditada e regulada para ser mesmo uma alternativa confiável para mitigar as mudanças climáticas?

Elisangela Paim: O problema da compensação de carbono não está na metodologia utilizada. Está na sua fundamentação política e ideológica. Foi construída para possibilitar às empresas o direito de continuar desmatando, degradando, poluindo, gerando conflitos no campo. A fundamentação, sendo problemática, não tem metodologia, monitoramento, fiscalização que garanta um enfrentamento adequado da mudança climática.
Apesar de ser comprovado que as maiores causas da mudança climática e de outros problemas socioambientais no país estão relacionadas com o agronegócio, propostas baseadas em ideias climáticas como o mercado de compensação de carbono florestal, ao lado do discurso do desenvolvimento, estão, na prática, vinculadas a novas dinâmicas, como é o caso do mecanismo de Redução de Emissões do Desmatamento e Degradação Ambiental na Amazônia e a sua relação com o mercado de carbono. Também é importante mencionar que temos visto — aqui me refiro particularmente ao trabalho entre a Fundação Rosa Luxemburgo e o Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, através do trabalho da professora Fabrina Furtado — diversos problemas como “créditos fantasmas”, dupla contagem de redução de emissões.

Agência Brasil: As comunidades tradicionais que habitam áreas de preservação que podem integrar o mercado de carbono correm algum risco? Como elas podem se beneficiar desse processo?

Elisangela Paim: Recentemente estivemos no Acre, junto com a Comissão Pastoral da Terra (CPT), e visitamos comunidades envolvidas em projetos privados, ou seja, projetos “voluntários”, REDD, e foi possível comprovar que há um profundo desconhecimento sobre o tema e, especificamente, dos projetos, revelando a ausência de consulta, prévia, livre e informada como prevê a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, OIT, da qual o Brasil é signatário e com responsabilidade de aplicá-lo em todo território nacional. As comunidades não sabem o que é carbono, mudança climática, mercado de carbono, em resumo, não compreendem o projeto do qual fazem parte. Em resumo, são comunidades vivem em um contexto de insegurança, ameaça e incerteza, sem receber nenhum benefício. É importante destacar que essas famílias e comunidades não são responsáveis pelo desmatamento [na região] e que, portanto, o projeto não está reduzindo o desmatamento. No entanto, já está vendendo crédito e sendo utilizado para compensar as emissões de terceiros. 

Agência Brasil: Quando inserimos as dimensões de classe, gênero e raça nessa perspectiva, como fazer uma transição que seja também para um mundo com menos desigualdades?

Elisangela Paim: É necessário compreender as relações sociais envolvidas na produção de energia [renovável inclusive], seus usos e seus efeitos. A mudança na composição da matriz energética não é uma solução quando mantém as relações de poder desiguais, aprofunda o controle territorial por corporações e destrói territórios e modos de vida. É preciso mudar o modo de produção e consumo na nossa sociedade, principalmente, no Norte global e das elites do Sul. Além disso, é preciso respeitar o direito e autonomia das comunidades sobre os seus territórios.

Saúde vai integrar dados sobre acidentes, lesões e violência no país

No Brasil, lesões e a violência têm sido classificadas como a terceira ou quarta principal causa de morte da população, superadas apenas por doenças cardiovasculares, câncer e doenças respiratórias, segundo dados do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (Proadi-SUS).

O Projeto Trauma – Tecnologia de Rápido Acesso de Dados Unificados para Mitigação da Acidentalidade -, idealizado pelo epidemiologista da equipe de Trauma do Hospital Israelita Albert Einstein, Bruno Zocca, entra agora na fase de aperfeiçoamento, até 2026, quando a principal ferramenta – um banco de dados integrado – será instalada no Ministério da Saúde (MS). A ferramenta permitirá acesso a dados integrados sobre acidentes e lesões ocorridos em todo o país.

O projeto foi desenvolvido dentro do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (Proadi-SUS), no qual são usados valores de isenção tributária para desenvolver avanços para o SUS. O médico Bruno Zocca explicou à Agência Brasil, na última quarta-feira (13), que o objetivo é fazer vigilância em saúde.

No primeiro triênio, experimental, compreendido entre 2021 e 2023, foram acessados dados de alguns locais que viraram parceiros do projeto, para testar tecnologia, sistema e ver se o objetivo pode ser alcançado. “O nosso objetivo é ter a capacidade de contar a história de um acidente ou violência com um mínimo de esforço e recurso possível, só usando os sistemas de informação já ativos e em uso pelo Ministério da Saúde.

A ideia é trazer os dados de vários sistemas de informação diferentes para um banco de dados integrado. Nesse banco integrado, serão normalizados e organizados alguns conceitos como homem e mulher, feminino e masculino, padronizando-os. Outra coisa é identificar a mesma pessoa em sistemas diferentes.

Ferramenta

O médico afirmou que se trata de uma iniciativa “diferente de tudo que o Ministério da Saúde já fez”.  O projeto terminou o primeiro triênio com uma ferramenta funcional que vai se desenvolver em dois grandes eixos.

O primeiro é continuar aperfeiçoando a ferramenta. “Trazer mais locais e mais dados para continuar testando se a ferramenta responde às nossas necessidades. O segundo eixo é passar essa ferramenta efetivamente para dentro do ministério”, disse Bruno Zocca.

De acordo com o Proadi-SUS, atualmente, as informações são disponibilizadas para o SUS por meio de vários sistemas de informação distintos e que não estão conectados. O projeto vai mudar essa realidade e, a longo prazo, vai apoiar na redução da morbidade e da mortalidade associadas às lesões.

Quando estiver instalado no Ministério da Saúde, os dados serão acessados de forma centralizada pelo Departamento de Informática do SUS (Datasus) e ficarão disponíveis para todo o Brasil. De acordo com o idealizador o bando integrado poderá ser acessado por gestores nos níveis municipal, estadual e federal.

“O gestor municipal poderá ver que existe uma esquina com muito acidente de trânsito e colocar um semáforo; o gestor estadual poderá ver que tem um quarteirão ou bairro com muitos casos de violência graves ou não graves, e colocar uma viatura de polícia ali. E o governo federal poderá usar a ferramenta tanto para avaliar suas políticas vigentes como para desenhar novas políticas públicas. Por isso, nossa expectativa é que o projeto Trauma, apesar do nosso parceiro ser o governo federal, o Ministério da Saúde, seja uma ferramenta útil para todos os níveis de gestão, para pesquisa, para organizações não governamentais (ONGs), para quem tiver interesse em acessar os dados integrados.”

Internalização

O médico destacou que o projeto vai apoiar o ministério em sua internalização, com os devidos acordos institucionais e buscas por financiamento. Há uma série de fatores positivos secundários que vão ocorrer por meio do projeto. “O ministério faz auditorias, internações, investigação de óbito para ver se a causa registrada está adequada. O Trauma pode apoiar muitas iniciativas secundárias”.

O objetivo principal é a vigilância em saúde. “É um banco de dados muito grande e poderoso. Temos conversado com muitos parceiros dentro e fora do ministério sobre outros potenciais usos”. Secretarias de Segurança Pública poderão usar os dados, bem como equipes do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e dos bombeiros para melhorar a adinâmica do atendimento pré hospitalar e de ambulância, entre outros segmentos.

A ferramenta estará pronta para ser instalada no Ministério da Saúde em 2026.

“Nosso objetivo é que, ao final do triênio, já esteja pronta a versão final, instalada dentro do ministério, para uso aberto de todos os entes interessados no banco de dados. Quem precisar desses dados vai ter entrada na ferramenta. Inclusive estamos desenhando diferentes entradas para diferentes usuários. Uma das nuances, e que é também um dos desafios, é tomar cuidado com a segurança das informações. Por isso, na hora da liberação para acesso público, deverão ser tomados muitos cuidados com a segurança das informações para manusear os dados e conduzi-los de um lado para outro. Essa continuará sendo uma das preocupações”, disse  Zocca.

Segundo o especialista, a intenção é que todo o país tenha o acesso à ferramenta nos próximos anos para produção de análises de situação em saúde, de modo a permitir, a longo prazo, o monitoramento de 12 milhões de internações, 4 bilhões de atendimentos ambulatoriais e mais de 1,5 milhão de óbitos para cada ano.

Investimento

Bruno Zocca informou que a fonte de financiamento para desenvolvimento do Projeto Trauma é o próprio Proadi-SUS, que reúne seis hospitais sem fins lucrativos, considerados referência em qualidade médico-assistencial e gestão. São eles o Hospital Alemão Oswaldo Cruz, a Beneficência Portuguesa de São Paulo, HCor, Hospital Israelita Albert Einstein, Hospital Moinhos de Vento e Hospital Sírio-Libanês. Os recursos do Proadi-SUS advêm da imunidade fiscal dos hospitais participantes.

No primeiro triênio de desenvolvimento do projeto, os investimentos alcançaram R$ 6,5 milhões. Para a segunda etapa, de 2024 a 2026, a previsão de gastos é de R$ 7,9 milhões.

Proadi-SUS

O Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde (Proadi-SUS) foi criado em 2009 com o propósito de apoiar e aprimorar o SUS por meio de projetos de capacitação de recursos humanos, pesquisa, avaliação e incorporação de tecnologias, gestão e assistência especializada demandados pelo Ministério da Saúde.

Os projetos levam à população a expertise dos hospitais em iniciativas que atendem necessidades do SUS. Entre os principais benefícios do programa, destacam-se a redução de filas de espera; qualificação de profissionais; pesquisas do interesse da saúde pública para necessidades atuais da população brasileira; gestão do cuidado apoiada por inteligência artificial e melhoria da gestão de hospitais públicos e filantrópicos em todo o Brasil.

Lesões e a violência têm sido classificadas como a terceira ou quarta principal causa de morte no país, superadas apenas pelas doenças cardiovasculares e pelo câncer até 2015, pelas doenças respiratórias entre 2016 e 2019, e pela covid-19 durante a pandemia. Em 2021, ocorreram 149.322 mortes atribuídas a lesões no Brasil, o que equivale a cerca de 70 mortes por 100 mil brasileiros. Dentre essas causas, prevaleceram os homicídios (30,5%), seguidos pelos acidentes de trânsito (23,5%), outras causas acidentais (23,2%) e suicídios (10,4%). Dados fornecidos pelo Proadi-SUS, por meio de sua assessoria de imprensa, destacam a importância das lesões entre jovens e homens na mortalidade prematura e incapacidades, o que as torna uma questão prioritária no país.

Moraes será relator do inquérito sobre assassinato de Marielle

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), foi escolhido para relatar o inquérito que apura os mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. A escolha foi feita por meio do sistema de distribuição eletrônica de processos.

A investigação chegou ao Supremo na quinta-feira (14), após o surgimento da citação de uma autoridade com foro privilegiado no processo que apura os mandantes dos assassinatos.

O inquérito está em segredo de Justiça, e ainda não é possível obter os motivos que levaram a Polícia Federal (PF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde o processo tramitava, a enviarem o caso ao Supremo.

Nas questões criminais, cabe ao STF o julgamento de autoridades com foro privilegiado, como deputados federais e senadores.

Em 14 de março de 2018, a vereadora e o motorista Anderson Gomes foram baleados dentro do carro em que transitavam na região central do Rio de Janeiro.

Ontem, amigos de Marielle e Anderson e de outras vítimas de violência protestaram contra o crime, que até hoje não foi esclarecido.

Em outro processo sobre a investigação, o policial militar reformado Ronnie Lessa deve ser levado a júri popular. Ele é acusado de ser um dos executores dos assassinatos. Contudo, diante do acordo de delação premiada assinado com os investigadores, ainda não é possível saber se ele continuará preso. 

Rio cria dia estadual para reflexão sobre morte de jovens negros

O governo do Rio de Janeiro sancionou a lei que cria o Dia de Luta Jovem Preto Vivo – João Pedro Matos Pinto, aprovada pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) e encaminhada ao Executivo em fevereiro deste ano. A lei, de autoria do deputado estadual Professor Josemar (PSOL), visa criar uma data comemorativa, a ser celebrada anualmente em 18 de maio, com o objetivo de sensibilizar a sociedade sobre a violência cometida contra jovens negros no estado.

Entre as ações previstas pela lei, está a realização de “eventos e campanhas educativas voltadas à estimulação de debates sobre racismo, encarceramento e genocídio da juventude negra e periférica”, no dia 18 e durante todo o mês de maio. O texto foi publicado nesta quinta-feira (14), no Diário Oficial do Estado.

O Dia de Luta homenageia João Pedro Matos Pinto, adolescente de 14 anos assassinado com um tiro de fuzil, pelas costas, por policiais em 18 de maio de 2020, durante uma operação no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, no Grande Rio.

“De uma certa forma, [a criação da data] é uma reparação, uma forma de manter viva a memória do João Pedro. Para mim é uma vitória diante dessa busca por Justiça que, daqui a pouco, completa quatro anos”, afirma a mãe de João Pedro, Rafaela Matos. “É sempre uma mobilização, porque ainda está muito longe de isso acabar. Todos os dias, morre um jovem preto na favela”.

Os três policiais civis acusados de matar João Pedro foram denunciados por homicídio qualificado. O processo está correndo na 4ª Vara Criminal de São Gonçalo. Em janeiro deste ano, o Ministério Público pediu que o caso seja julgado por um júri popular.

Dados do Atlas da Violência de 2023, divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mostram que, em 2021, 79% dos homicídios no Brasil tiveram como vítimas os jovens negros e que a taxa de homicídios (por 100 mil habitantes) de pretos e pardos era três vezes maior que o restante da população (brancos, amarelos e indígenas).

A diretora-executiva da Anistia Internacional, Jurema Werneck, disse que a criação da data é importante para a reflexão, mas cobra ações efetivas de combate às práticas racistas por agentes do Estado.

“Temos apresentado uma série de recomendações às autoridades para interromper a violência cometida pelos agentes do Estado, especialmente aquelas cometidas pela polícia em serviço. E lamentamos constatar que as autoridades seguem liderando as violações de direitos humanos e não tomando as medidas necessárias. Não à toa, tanto o STF quanto a Corte Interamericana de Direitos Humanos tomaram decisões contundentes sobre isso”, disse Jurema.

*Colaborou Rafael Cardoso

Ex-comandante do Exército confirma reunião com Bolsonaro sobre golpe

O ex-comandante do Exército Marco Antonio Freire Gomes disse, em depoimento na Polícia Federal (PF), que o ex-presidente Jair Bolsonaro lhe apresentou pessoalmente, em reunião na biblioteca do Palácio da Alvorada, no dia 7 de dezembro de 2022, uma minuta de decreto para consumar um golpe de Estado.

O teor do documento foi lido na ocasião por Filipe Martins, então assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência, disse Freire Gomes. Também estavam presentes o ex-comandante da Aeronáutica Almir Garnier e o ex-ministro da Defesa Paulo Sergio Nogueira de Oliveira.

Conforme transcrição do depoimento do general Freire Gomes, ele diz “que se recorda de ter participado de reuniões no Palácio da Alvorada, após o segundo turno das eleições, em que o então presidente da República, Jair Bolsonaro, apresentou hipóteses de utilização de institutos jurídicos como GLO [Garantia da Lei e da Ordem], estado de defesa e estado de sítio em relação ao processo eleitoral”.

Freire Gomes afirma que, em reunião posterior, deixou evidenciado ao presidente Jair Bolsonaro que “o Exército não participaria da implementação desses institutos jurídicos visando reverter o processo eleitoral”.

O sigilo sobre o depoimento do ex-comandante do Exército foi levantado nesta sexta-feira (15) pelo ministro Alexandre de Moraes, relator no Supremo Tribunal Federal (STF) do inquérito que apura a suposta tentativa de golpe de Estado promovida por Bolsonaro e auxiliares diretos, incluindo militares do alto escalão de seu governo.

O depoimento de Freire Gomes coincide com o relatado pelo ex-comandante da Aeronáutica Carlos de Almeida Baptista Júnior, que também contou sobre reunião de Bolsonaro com os três comandantes das Forças Armadas após o segundo turno das eleições de 2022.

Os ex-chefes da Forca Aérea Brasileira (FAB) e do Exército disseram, em separado, terem se manifestado contra qualquer tipo de golpe, e que o único a ter colocado “as tropas à disposição” de Bolsonaro foi o então comandante da Marinha, Almir Garnier.

Garnier chegou a comparecer para depor na Polícia Federal, em 22 de fevereiro, mas na ocasião permaneceu calado.

Confrontado com a minuta de golpe que foi apreendida na casa do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Anderson Torres, Freire Gomes confirmou se tratar do mesmo documento apresentado nas reuniões com Bolsonaro.

Freire Gomes disse Torres participou de reuniões junto a Bolsonaro para explicar “o suporte jurídico para as medidas que poderiam ser adotadas”. Logo em seguida, o general disse que “sempre posicionou que o Exército não atuaria em tais situações”.

“Que inclusive chegou a esclarecer ao então presidente da República Jair Bolsonaro que não haveria mais o que fazer em relação ao resultado das eleições e que qualquer atitude, conforme as propostas, poderia resultar na responsabilização penal do então presidente”, disse Freire Gomes à PF.

Em paralelo, o ex-comandante da Aeronáutica Baptista Jr. disse aos investigadores que Freire Gomes chegou a ameaçar prender Bolsonaro, caso o ex-presidente fosse adiante com os planos para um golpe de Estado.

PF: Valdemar afirma discordar de Bolsonaro sobre fraude nas urnas

Em depoimento à Polícia Federal em fevereiro deste ano, o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, disse discordar da hipótese levantada à época pelo então presidente Jair Bolsonaro sobre fraude nas urnas eletrônicas nas eleições de 2022.

“Respondeu que não concorda com a fala do presidente Bolsonaro, pois já participou de várias eleições e nunca presenciou nada que desabonasse o sistema eleitoral brasileiro. Inclusive, orientou a bancada do partido a votar contra a implementação do voto impresso” diz o relatório sobre o depoimento de Valdemar Costa Neto.

O informação foi dada no inquérito sobre uma trama golpista elaborada na cúpula do governo de Bolsonaro. O sigilo sobre as declarações foi tirado nesta sexta-feira (15) pelo relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Alexandre de Moraes.

Questionado se o PL chegou a contratar algum tipo de verificação relacionada ao funcionamento das urnas, Valdemar respondeu que foi solicitada “uma verificação extraordinária”, mas, a princípio, somente para os cargos de presidente e governador.

Ainda sobre o relatório fruto da “verificação extraordinária”, Valdemar diz que a contratação foi ideia de deputados do PL e do próprio Bolsonaro. Segundo ele, o partido pagou cerca de R$ 1 milhão pelo serviço.

Quando indagado se cumpriu orientação de Bolsonaro para questionar a segurança das urnas eletrônicas e validar a narrativa de possíveis fraudes nas eleições de 2022, o presidente nacional do PL respondeu que nunca recebeu orientação do então presidente para questionar as urnas eletrônicas, apenas para fiscalizar.

“Para isso, contrataram os serviços da empresa IVL – Instituto Voto Legal para acompanhar o desenvolvimento da eleição e se havia segurança”, destaca trecho do depoimento à PF.

“Indagado se o então presidente Jair Bolsonaro insistiu com o declarante para ajuizar ação no TSE [Tribunal Superior Eleitoral] questionando o resultado das urnas eletrônicas, respondeu que, quando houve o vazamento do relatório do IVL, os deputados do Partido Liberal e o então presidente Bolsonaro o pressionaram para ajuizar tal ação no TSE”.

Entenda

O ministro do STF Alexandre de Moraes levantou hoje o sigilo dos depoimentos colhidos no inquérito sobre uma suposta tentativa de golpe alegando que tomou a decisão “diante de inúmeras publicações jornalísticas com informações incompletas sobre os depoimentos prestados à autoridade policial”. Trechos dos depoimentos prestados nas últimas semanas por investigados e testemunhas vinham sendo publicados por diferentes veículos de imprensa.

Moraes tira sigilo de depoimentos em inquérito sobre golpe de Estado

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), levantou nesta sexta-feira (15) o sigilo dos depoimentos colhidos no inquérito sobre uma suposta tentativa de golpe de Estado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e auxiliares próximos, incluindo militares do alto escalão do governo dele. 

Moraes afirmou ter tomado a decisão “diante de inúmeras publicações jornalísticas com informações incompletas sobre os depoimentos prestados à autoridade policial”. Trechos dos depoimentos prestados nas últimas semanas por investigados e testemunhas vêm sendo publicados por diferentes veículos de imprensa. 

Após a decisão, o STF informou que trabalha para disponibilizar o mais breve possível todo o material, que inclui dezenas de horas de depoimentos. O ex-comandante do Exército, Marco Antonio Freire Gomes, por exemplo, respondeu a perguntas da Polícia Federal (PF) por mais de sete horas e apontou o envolvimento de Bolsonaro na trama golpista, segundo as informações publicadas até o momento. 

Outros depoentes preferiram ficar calados. É o caso do próprio Bolsonaro e de seu ex-ministro da Defesa Walter Braga Netto. Entre os depoimentos liberados por Moraes não constam os prestados pelo tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro que fechou acordo de colaboração premiada. 

Nesta sexta (15) foi tirado o sigilo sobre o depoimento dos seguintes investigados:: 

Jair Messias Bolsonaro, ex-presidente da República 

Augusto Heleno Ribeiro Pereira, ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI)

Anderson Gustavo Torres, ex-ministro da Justiça e Segurança Pública

Walter Souza Braga Netto, ex-ministro da Defesa e ex-candidato a vice-presidente 

Paulo Sérgio Nogueira De Oliveira, ex-ministro da Defesa

Filipe Garcia Martins Pereira, ex-assessor especial de Bolsonaro 

Carlos De Almeida Baptista Junior, ex-comandante da Aeronáutica

Marco Antonio Freire Gomes, ex-comandante do Exército

Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha

Estevam Cals Theophilo Gaspar De Oliveira, ex-chefe do Comando de Operações Terrestres do Exército

Valdemar Costa Neto – presidente do PL, partido de Bolsonaro

Marcelo Costa Câmara, coronel do Exército

Ailton Gonçalves Moraes Barros

Amauri Feres Saad, advogado

Angelo Martins Denicoli

Bernardo Romão Correa Netto

Cleverson Ney Magalhães

Eder Lindsay Magalhães Balbino

Guilherme Marques Almeida

Helio Ferreira Lima

José Eduardo De Oliveira E Silva

Laércio Vergílio

Mario Fernandes

Rafael Martins De Oliveira

Ronald Ferreira De Araújo Júnior

Sérgio Ricardo Cavaliere De Medeiros

Tercio Arnaud Tomaz

TV Brasil exibe debate sobre os 10 anos da Lava Jato

Para marcar os 10 anos da Operação Lava Jato, a TV Brasil exibe neste sábado (16), às 22h, um especial conduzido pelo jornalista investigativo Leandro Demori, ex-diretor do The Intercept Brasil e coordenador da Vaza Jato, cobertura que revelou as conversas entre a cúpula da operação.

Demori, que já apresenta um talk show na emissora pública, recebe como convidados Marcelo Semer, desembargador, escritor, mestre em direito penal e doutor em criminologia; Dora Cavalcanti, advogada criminalista, diretora fundadora do Innocence Project Brasil e conselheira do Instituto de Defesa do Direito de Defesa; o jornalista e colunista de economia, Luis Nassif; Carla Jimenez, jornalista e editora-chefe de notícias do UOL e Florestan Fernandes Júnior, jornalista e diretor de redação do Brasil 247.

“O programa fará uma autopsia da Lava Jato, dos seus mecanismos e das suas consequências”, destaca Demori.

O grupo de especialistas que acompanhou de perto as denúncias, decisões e bastidores da Lava Jato, disseca a operação mais famosa da Justiça brasileira. “Depois da Lava Jato, a gente precisa refletir que não precisamos de uma peça de marketing, nem de heróis para que se faça justiça”, comentou durante o debate a jornalista Carla Jimenez, que também foi diretora e cofundadora do jornal El País Brasil.

No programa, os participantes relembram os principais fatos e analisam as consequências da operação, que perduram até os dias de hoje. “Importante lembrar a intersecção da Lava Jato com o impeachment da ex-presidente Dilma. O vazamento da conversa entre Lula e Dilma foi o último prego no caixão do impeachment. E o ‘tchau, querida’, retirado daquele diálogo, se tornou o slogan daquele movimento”, destaca o desembargador Marcelo Semer.

O especial sobre os desdobramentos e consequências da operação Lava Jato, uma década depois de sua deflagração, foi gravado em São Paulo. A produção será exibida na TV Brasil e ficará disponível no canal da emissora no Youtube e no aplicativo TV Brasil Play.

Serviço

Especial – 10 anos da Lava Jato, na TV Brasil

Sábado,16 de março, às 22h

Investigação sobre morte de Marielle Franco é enviada ao Supremo

O processo que apura os mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF). A investigação procura saber quem atuou como mandante das mortes.

Há seis anos, em 14 de março de 2018, a vereadora e seu motorista foram baleados dentro do carro em que transitavam na região central do Rio de Janeiro.

O inquérito está em segredo de Justiça e ainda não é possível obter detalhes sobre os motivos que levaram a Polícia Federal (PF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde o processo tramitava, a enviar o caso ao Supremo.

Nas questões criminais, cabe ao STF o julgamento de autoridades com foro privilegiado na Corte, como deputados federais e senadores. Dessa forma, uma das justificativas para a remessa da investigação pode ser a citação do nome de alguma autoridade com foro na Corte. Contudo, o motivo da movimentação da investigação não foi confirmado pela Polícia Federal.

Em outro processo sobre a investigação, o policial militar reformado Ronnie Lessa deve ser levado a júri popular. Ele é acusado de ser um dos executores dos assassinatos.

Hoje, mais cedo, no centro do Rio, familiares, amigos e outras vítimas de violência protestaram contra o crime, que segue até hoje sem o esclarecimento sobre os mandantes. 

Decisão sobre Brumadinho causa indignação a parentes de vítimas

A decisão dos desembargadores da 2ª turma do Tribunal Regional Federal da 6ª região (TRF-6) de conceder habeas corpus ao ex-presidente da Vale, Fábio Schvartsman, indignou movimentos sociais que representam familiares de vítimas do rompimento, no dia 25 de janeiro de 2019, da barragem Mina Córrego do Feijão, na cidade de Brumadinho, Minas Gerais, pertencente à empresa.

“É com perplexidade que recebemos a notícia da votação sobre o habeas corpus do ex-presidente da Vale, Fábio Schvartsman. É revoltante saber que desembargadores do TRF-6 reconheceram, deram efetividade ao habeas corpus apresentado pelo ex-presidente da Vale, que, sim, era conhecedor de que a barragem era instável, que a barragem não oferecia estabilidade e que não tomou nenhuma atitude e permitiu que 272 pessoas fossem assassinadas”, disse a presidente da Associação dos familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão (Avabrum), Andresa Aparecida Rocha Rodrigues, em vídeo encaminhado à Agência Brasil, no qual leu a nota da entidade.

Na tragédia, Andresa perdeu o filho Bruno que, segundo ela, “foi assassinado junto com 271 jóias [como os familiares tratam os parentes mortos em consequência do rompimento] pela Vale, pela Tüv Süd [empresa alemã contratada pela Vale para avaliar a barragem da Mina Córrego do Feijão] e seus aliados”

“Venho, nesse momento, repudiar e demonstrar a nossa insatisfação e tristeza em dar conhecimento aos votos que foram proferidos em favor de Schvartsman, inocentando o mesmo de toda a responsabilidade de conhecimento das instabilidades da barragem. Schvartsman se livra de um processo sem mesmo respondê-lo e faz isso através do habeas corpus”, destacou.

A presidente da Avabrum acrescentou que os familiares ainda aguardam que sejam encontradas três pessoas ainda não localizadas após o rompimento. “Seguimos ainda aguardando o encontro de três vítimas, de três jóias. É esse o parâmetro que nós temos”, concluiu.

O Instituto Camila e Luiz Taliberti (ICLT), fundado em 2019 em homenagem aos irmãos que perderam a vida com o rompimento, indicou em nota que vai lutar contra a decisão. “Nós, que prezamos pela memória dos mortos na tragédia de Brumadinho, não vamos nos calar”.

A entidade também reforçou que a falta de conhecimento das condições da barragem, justificada no pedido de habeas corpus, não corresponde à realidade. “O ICLT, como parte da sociedade civil organizada, repudia a falta de responsabilização por um desastre que destruiu tantas famílias, sob a alegação de falta de conhecimento dos eventos pelo réu”, observou.

“Acreditamos na Justiça brasileira e no comprometimento das instituições que colaboraram com as investigações e apontaram os indícios que resultaram no indiciamento do então presidente da empresa. Em nome da memória de centenas de famílias, mães, pais, filhos e amigos dos mortos, pedimos que os desembargadores repensem os seus votos e que o réu seja julgado, respeitando o devido processo legal”, defendeu o ICLT.

O Instituto, que luta por justiça, para que a tragédia jamais seja esquecida e para que não se repita, como forma de honrar a memória das 272 pessoas mortas, é presidido por Helena Taliberti, mãe dos irmãos. “Inspirada no legado de Camila e Luiz, a entidade tem como missão a defesa dos direitos humanos por meio de duas vertentes principais: a proteção do meio ambiente e o empoderamento de grupos em situações de vulnerabilidade, especialmente mulheres”, informou o ICLT.

MAB

O coordenador nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Joceli Andrioli, disse à Agência Brasil que a entidade classificou como vergonhosa a decisão dos desembargadores da 2ª Turma do TRF-6 na concessão do habeas corpus, referente ao que chamam de crime cometido pela Vale em Brumadinho.

“Isso é indignante frente a um fato monstruoso que foi o massacre, a morte, o homicídio das 272 pessoas. Isso causa e gera um indício de impunidade sobre esse que é um dos maiores crimes socioambientais em massacres humanos no Brasil no último período. Classificamos de vergonha a posição do judiciário e estamos juntos com as vítimas, junto com a Avabrum, reforçando esta luta para que no Brasil a gente possa ter justiça. Um dos fatos da Justiça é condenar, prender, inclusive essas pessoas, pelo crime que cometeram para que novos crimes não venham a ocorrer em nosso país. Vamos cobrar das instituições para que recorram dessa decisão e para que de fato a Justiça seja alcançada no nosso país”, afirmou.

Decisão

Na decisão, os desembargadores consideraram que o MP não apresentou indícios de autoria contra Fábio Schvartsman no caso do rompimento da Barragem de Brumadinho. No entanto, seguem as ações penais relacionadas a outros quinze acusados.

“Cabe destacar que essa decisão não se estende aos demais réus das ações penais, cujo trâmite segue normalmente na Justiça Federal de primeiro grau. As ações penais envolvem outros quinze réus, que permanecem respondendo a acusação de crimes de homicídio qualificado e de crimes ambientais”, informou o TRF-6 em resposta à Agência Brasil.

Os integrantes da 2ª Turma concordaram com o voto do desembargador Flávio Boson Gambogi, relator do caso, que propôs o trancamento das ações penais exclusivamente em relação ao ex-presidente da Vale, Fábio Schvartsman.

O TRF-6 esclareceu que este julgamento “não discutiu se o réu é culpado ou inocente, mas analisou se a denúncia foi acompanhada de indícios mínimos de conduta criminosa”. Os desembargadores entenderam que, até o momento, o Ministério Público não apresentou indícios mínimos de envolvimento do ex-Presidente da Vale no rompimento da Barragem.

Ainda na decisão, os desembargadores informaram de forma unânime que o Ministério Público poderá oferecer nova denúncia ao ex-presidente da Vale baseada em novas provas, que, até o momento, não estão nos autos.

“Nesse momento clamamos ao Ministério Público Federal que ofereça nova denúncia baseada nas inúmeras provas que se tem dentro do inquérito da Polícia Federal sobre o conhecimento que o Schvartsman tinha e segue tendo sobre a instabilidade da barragem. Infelizmente essa decisão é uma decisão que ofende o Brasil, que ofende a memória das vítimas e nos coloca enquanto familiares prisioneiros porque diante de toda essa aberração, de todo esse crime, os únicos prisioneiros, até o momento, somos nós familiares, que seguimos presos à lama de sangue, à lama de dor e à lama de injustiça que assola as nossas vidas dia após dia”, diz Andresa Aparecida Rocha Rodrigues.

A expectativa da presidente da Avabrum é de que o MPF apresente a nova denúncia o mais rápido possível. “Esperamos que haja celeridade no Ministério Público Federal em oferecer a denúncia pautada em todo o inquérito da Polícia Federal. Se não houver justiça, matar em nome do lucro terá, sim, cada vez mais crescimento no Brasil. 272 pessoas morreram e nada foi feito. Em Mariana, 20 pessoas morreram, nada foi feito. Quem será a próxima vítima? Precisamos que a justiça faça seu papel e dê o recado para que matar em nome do lucro cesse, que as fiscalizações de fato aconteçam e que não haja maquiagem. Para que ninguém passe a dor que eu, mãe de um único filho, e mais 271 familiares passamos no dia a dia”, apontou.

Defesa

Para os advogados Pierpaolo Bottini, Maurício Campos e Paulo Freitas Ribeiro, que defendem o ex-presidente da Vale, a decisão da 2ª Turma do TRF-6 reconhece que não houve omissão do cliente. “A defesa de Fábio Schvartsman ressalta que a decisão do Tribunal Regional Federal da 6ª Região pelo trancamento da ação penal reconhece a inexistência de qualquer ato ou omissão do ex-presidente da Vale que possuam algum nexo causal com o rompimento da barragem de Brumadinho. A defesa sempre confiou no reconhecimento de que Fábio Schvartsman foi diligente no cumprimento de seu dever à frente da companhia”, indicaram em nota assinada pelos três.