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Clima: cálculo de riscos desafia política fiscal, diz diretor do BNDES

Com o aumento da frequência de eventos climáticos extremos, calcular os riscos relacionados a esses episódios será cada vez mais fundamental quando se trata de política fiscal. A avaliação é de Nelson Barbosa, diretor de Planejamento e Estruturação de Projetos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Ele lembra que já existe um estudo realizado no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU) no qual se estima que cada R$ 1 gasto em prevenção economizaria R$ 15 em medidas necessárias para a recuperação após um desastre.

“Esse cálculo não é simples. É um cálculo difícil de ser comunicado à população, mas a transição climática chegou. Esse cálculo precisa ser feito e incorporado aos riscos fiscais de todos os países. E ele vai justificar a alocação de recursos”, afirmou Barbosa.

Para o diretor do BNDES, é um cenário que desafia a política fiscal, pois demanda mudanças na forma como ela é elaborada.

“Tradicionalmente focamos ali no aspecto financeiro da meta do primário do ano. Mas a nossa Lei de Responsabilidade Fiscal também tem lá um anexo de riscos. São vários riscos, uma boa parte dele judiciários. Mas têm os riscos climáticos. E ao levar em consideração a probabilidade de um evento extremo acontecer no horizonte de tantos anos, você pode chegar à conclusão que se gastar R$ 1 bilhão, você estará economizando provavelmente R$ 15 bilhões”, acrescentou.

O tema foi pautado nesta terça-feira durante reunião sobre financiamento climático, na sede do BNDES, no Rio de Janeiro. O evento integrou a agenda de esforços da presidência brasileira do G20. Participaram representantes do BNDES, do Ministério da Economia, da organização filantrópica Instituto Clima e Sociedade (iCS) e da Finance in Common (FiCS), uma rede global de bancos públicos de desenvolvimento que visa alinhar os fluxos financeiros em consonância com o Acordo de Paris para as Alterações Climáticas.

A diretora executiva do iCS, Maria Netto, também destacou a necessidade de mudanças. “A forma como a gente trata desses riscos tradicionalmente usa informação histórica, mas não os cenários a futuro”, observa. Ela destaca que, em diversos países, seguradoras estão deixando de cobrir certos tipos de infraestrutura, o que pode gerar grandes perdas econômicas caso ocorre um desastre.

“A consideração do risco climático pressupõe comparar o custo de não fazer nada versus o custo de fazer alguma coisa. Numa concessão do tipo PPP [Parceria Público-Privada] esses riscos hoje são vistos como força maior. Talvez tenham que considerar, pelo menos parte deles, como recorrentes. São mudanças na forma de contabilizar economicamente a mudança do clima”.

Netto faz menção às discussões envolvendo a recuperação do Rio Grande do Sul, após as enchentes recordes que atingiram diversas cidades. Um dos temas que vem sendo abordado por diversos especialistas é a necessidade de termos novas construções capazes de suportar outros eventos extremos.

“Dois dos grupos de trabalho aqui estavam falando de infraestrutura resiliente. Se a gente não quiser ter mais custos do que a gente já está tendo agora, é importantíssimo discutir como a gente vai definir essa resiliência não só na reconstrução do Rio Grande do Sul, mas para todo o país, para todo o plano de infraestrutura do Brasil.”

Bancos de Desenvolvimento

O G20 é formado pelas 19 maiores economias do mundo, além da União Europeia e da União Africana. O grupo se consolidou como foro global de diálogo e coordenação sobre temas econômicos, sociais, de desenvolvimento e de cooperação internacional. Em 1º de dezembro de 2023, o Brasil substituiu a Índia e assumiu a presidência. O mandato é de um ano. É a primeira vez que o país assume essa posição no atual formato do G20, estabelecido em 2008. Em novembro de 2024, está prevista a realização da Cúpula do G20 no Rio de Janeiro.

O financiamento climático é um dos temas que vem sendo tratado com prioridade pela presidência brasileira. Estão sendo elaboradas, por exemplo, propostas para reformar os bancos internacionais de desenvolvimento e os fundos verdes internacionais. Um tema que ganhou relevância no encontro realizado no BNDES envolve as plataformas de investimentos: são sistemas voltados para fomentar o surgimento de novos projetos e permitir que eles sejam apresentados a diversos possíveis financiadores. Embora seja mantida a nível nacional, a troca de experiências entre países tem sido considerada importante para aprimorá-las.

O francês Rémy Rioux, presidente da FiCS, chama a atenção para o protagonismo dos bancos nacionais de desenvolvimento, que têm atuado para além do financiamento, prestando também auxílio para originar mais projetos. “Hoje, ainda não temos projetos de qualidade o suficiente que possam ser financiados”, observa. Segundo ele, a transição energética depende de investimento adequado em nível local.

Criado em 2020, o FiCS surgiu da necessidade de produzir conhecimento e de fomentar a troca de informações entre os bancos públicos de desenvolvimento, sejam eles nacionais, internacionais ou multilaterais. Nesse processo, foram identificadas 530 instituições. De acordo com Rioux, elas somam US$ 23 trilhões em ativos e, anualmente, são investidos US$ 2,5 trilhões. Desse total, 90% são disponibilizados por bancos nacionais e 10% pelos internacionais. “Isso não é uma promessa. É o que já estamos entregando e anualmente”.

Para Maria Netto, o intercâmbio das organizações engajadas no debate climático e os bancos de desenvolvimento precisa ser aprofundado. “Eles têm um mandato público e, ao mesmo tempo, têm essa possibilidade de conhecer bem o mercado privado. Existe obviamente provocações para esses bancos. Como é que a gente pode atrair investimento público e privado para combinar recursos e alavancar investimentos necessários para poder ter uma ambição maior com relação ao que a gente quer fazer para cumprir as metas do Acordo de Paris?”, questiona.

Especialistas debatem riscos de ataques cibernéticos no país

O futuro da segurança cibernética e do compartilhamento de informações entre centros de pesquisa foram alguns dos destaques do Workshop RNP, evento sobre internet e conectividade que começou nessa segunda-feira (20) em Niterói, na região metropolitana do Rio de Janeiro. O encontro é organizado pela Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), órgão ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Pesquisadores, governo, empresas e startups participam de uma série de debates no campus da Universidade Federal Fluminense (UFF).

O diretor de Cibersegurança da RNP, Emílio Nakamura, reforçou a importância de investir no setor para lidar com os novos desafios trazidos pelas tecnologias em rede. Apesar de defender que o país está se movimentando em termos legislativos e estruturais no setor, alerta que as ameaças digitais têm evoluído de maneira mais rápida do que os sistemas de proteção.

“Hoje, os setores financeiro, de água, de energia, de transportes e de saúde, por exemplo, dependem cada vez mais de elementos digitais. É possível criar um caos ou uma catástrofe realizando ataques cibernéticos que afetam o funcionamento desses setores. No Brasil, ainda vemos poucos incidentes dessa natureza. Mas eles podem acontecer e temos toda uma discussão sobre como os ataques podem afetar a economia e a infraestrutura do país”, diz Nakamura.

Para ele, além dos investimentos em segurança, é preciso avançar no plano nacional de educação cibernética, que contemple todas as pessoas e seja parte importante do currículo em escolas e faculdades.

“Hoje, é mais do que necessário que as pessoas tenham uma educação cibernética. As crianças, os jovens, todo mundo. Sobre como agir no mundo digital para que não seja alvo de tentativas de fraudes e outros ataques”, reforça o diretor do RNP. “Alguns países já lidam com essa educação cibernética com crianças, e o Brasil não tem isso oficializado como parte do currículo. Na graduação, seria importante que esse tema entrasse como parte de todos os cursos, porque é algo que atravessa todas as profissões”.

Conectividade científica

Uma das mesas de debate do dia tratou da Rede de e-Ciência, voltada para a conectividade entre centros de pesquisa, supercomputação, laboratórios multiusuários e infraestruturas científicas. Os conferencistas falaram sobre desafios e detalhes da implantação. O diretor adjunto de Serviços para Experimentação e e-Ciência da RNP, Leandro Ciuffo, explicou o funcionamento e os benefícios da rede.

“A Rede de e-Ciência vai usar a estrutura das infovias. De maneira geral, as infovias vão interiorizar conexão de qualidade em várias regiões do país. Vão ajudar na fixação de professores e pesquisadores em campos do interior e, consequentemente, melhorar a qualidade da educação nessas localidades”, disse Ciuffo. “A ideia é que haja uma redução no tempo dos processos científicos. Compartilhamentos de informações que poderiam levar horas ou dias poderiam ser feitos em minutos. Com isso, também é acelerado o resultado para os cidadãos”.

Um edital está em andamento para selecionar os primeiros centros de pesquisa que vão fazer parte da rede. O diretor cita alguns exemplos de instituições e projetos que poderão ser atendidos.

“Instituições de pesquisa que têm processos para gerar previsão do tempo, para prever desastres ambientais, para fazer vacinas, pesquisar curas de doenças, são alguns que poderão usufruir da rede, porque precisam manipular quantidade muito grande de informações e esses dados, às vezes, são bancos de dados do exterior”, disse Ciuffo.

RS precisa fazer estudos de riscos antes de projetos de novas obras

A reconstrução do Rio Grande do Sul, que sofre sérios danos em consequência das fortes chuvas que atingem o estado desde o fim de abril, terá que ser feita com base nas projeções para o futuro climático. Construções antigas que desabaram ou foram arrastadas pela quantidade e intensidade das águas, como diversas pontes e estradas, não atendiam ao nível de resiliência necessários, na atualidade, diante das mudanças climáticas que provocam os eventos extremos. Especialistas argumentam que, agora, as obras de reconstrução precisam levar em consideração a tendência de eventos extremos, cada vez mais frequentes. Aí se inclui os estudos de engenharia para definir o planejamento urbano das cidades.

Para o professor de Recursos Hídricos da Coppe/UFRJ Paulo Canedo, as soluções que serão dadas para tornar as cidades mais resistentes vão depender de local para local. “Por exemplo, tem pontes que foram levadas e devem ser reconstruídas. Determinadas pontes já estavam mal alocadas, já estavam baixas ou com alicerces em zona de risco. Não se trata de refazê-las tais quais estavam há pouco dias. Elas têm que ser refeitas pensando que eu população, eu governo, fiz errado há 20 anos atrás, e agora não vou refazer com o mesmo erro. Vou corrigir. Outra coisa, é que muitas vezes a pressa em fazer desenvolvimento econômico e social leva a medidas que não tornam resiliente a região para o problema de inundação. Com muita facilidade o ser humano invade terras que pertencem às águas para o seu uso”, explicou à Agência Brasil.

Centro histórico de Porto Alegre permanece alagado devido as fortes chuvas dos últimos dias – Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

“Se sabemos que erramos, está na hora de doravante começar a corrigir e tomar novas atitudes, portanto, respeitar as áreas não apropriadas para intensificar moradias ou estrada. As construções devem ser evitadas para não repetirmos o mesmo erro”, reforça Canedo. 

Na visão do especialista, a tragédia de agora mostrou as diferenças entre as chuvas que caem desde abril com as de 1941, quando o estado sofreu outra inundação intensa.

“A chuva [agora] foi extraordinariamente grande. Se comparar com a década de 40, o progresso no Rio Grande do Sul era muito menor, a quantidade de habitantes era muito menor, portanto, a impermeabilização do solo era muito menor. O que significa dizer que uma mesma chuva caindo hoje já daria danos de inundação muito maiores”, disse, acrescentando que “na etapa de reconstrução se deve ter em mente a ocupação do solo e a capacidade de sua impermeabilização para impedir danos causados pelas enxurradas”.

Centro histórico de Porto Alegre permanece alagado devido as fortes chuvas dos últimos dias- Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

O engenheiro civil especialista em desastres e professor da Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Leandro Torres di Gregório defende a importância de se fazer estudos antes da formulação de projetos de construção. Para ele, é preciso ter uma avaliação preliminar de perigo de destruição, justamente para verificar a capacidade de suportar eventos extremos.

Segundo o professor Gregório, como nesse caso a inundação é a principal ameaça, se faz um estudo que mostra como ficam em diferentes cenários de chuva, os reflexos em termos de inundações.

“Esse é um primeiro ponto. O estudo do perigo visa entender como a ameaça se distribui no território e qual a magnitude. No caso de inundação, qual a altura da lâmina d’água ou coisas assim. Na medida que se tem o estudo, se começa a montar diferentes cenários de obras que possam amenizar as inundações. Depois do estudo do perigo, se começa a montar obras de engenharia ainda em fase de planejamento e se simula como seria com o novo cenário de inundações para ver quais as áreas que deixaram se ser inundadas, ou as que tiveram inundação reduzida. Assim vai se compondo uma série de medidas com a finalidade de mitigar o efeito das inundações”, explicou.

Aeroporto de Porto Alegre alagado pela enchente – Foto: Mauricio Tonetto/Secom

O especialista destacou que nenhuma solução de engenharia atende todo e qualquer caso, e sempre existe o que se chama de risco residual. “Sempre existem cenários para os quais aquela obra não é suficiente, e nesse caso, tem que completar com medidas de desocupação emergencial, monitoramento e alerta”, disse.

Conforme o professor da Escola Politécnica da UFRJ, esse é o exemplo da obra dos diques no Guaíba que não resistiram às enchentes, além das bombas que estavam instaladas em locais que foram alagados e por isso não funcionaram para a redução do nível das águas. De acordo com o professor, no caso dos diques um fator que contribuiu para o não funcionamento previsto foi a falta de manutenção. “No fim das contas não é só um problema de ter a obra de engenharia, tem que ter também a manutenção adequada, porque em uma obra como esta daí se a manutenção falhar, aquele componente não desempenha o papel que deveria ter”, avaliou.

Outra medida apontada pelo professor é a remoção de moradores de áreas onde as inundações são recorrentes. “Há situações em que a realocação permanente pode ser necessária. Isso acontece, normalmente, em situações de frequência muito alta de inundações, onde a pessoa mora em um lugar que a qualquer momento pode ter um problema”.

Cidade esponja

Os projetos de “cidade esponja” têm se espalhado pelo mundo como forma de construir áreas com capacidade de absorver a água em casos de inundação. A ação dos reservatórios retarda a vazão da água e evita sobrecarregar os alagamentos nas ruas. Em Nova York e em cidades da Holanda já existem projetos desse tipo, que funcionam com base nas bacias hidrográficas da região.

Imagens aéreas de Porto Alegre e região metropolitana na tarde de terça-feira (14) – Foto: Mauricio Tonetto/Secom

“Ele [reservatório] segura a água do lote e joga no sistema público no momento posterior em que ela cai. É um reservatório de detenção que visa desencontrar os momentos de pico de vazão. É uma solução que ajuda na medida em que a água que cai ali na cidade não vai imediatamente para as galerias. Têm um retardo. Pode ser em piscinões ou em áreas muito maiores que podem funcionar como parques”, esclareceu.

Segundo Gregório, esse tipo de projeto pode dar bom resultado no Rio Grande do Sul. “Quando a gente fala de inundação, não é um problema apenas de uma cidade. É uma abordagem da bacia inteira. Tanto que existem os comitês de bacia hidrográfica que têm essa missão de acompanhar e propor soluções em uma escala de bacia hidrográfica. Tem que pensar no todo”, ressaltou.

“O conceito de “cidade esponja” não tem que ser aplicado em uma cidade só, mas a todas que compõem a bacia. Nesse caso, é o governo do estado que é o agente integrador. Quando um recurso hídrico cruza mais de um município a governança é do estado. Se cruza mais de um estado, já tem atuação do governo federal. O papel do estado é muito importante para reunir os atores necessários e fazer o planejamento integrado da bacia para um não prejudicar o outro na hora de executar as obras”, apontou.

Geografia e falta de gestão de riscos agravam efeitos extremos no RS

Os eventos extremos climáticos têm se intensificado em todo o mundo. No Brasil, os efeitos das ações humanas sobre o meio ambiente ficam evidenciados durante a atuação de fenômenos naturais como o El Niño e La Ninã, que alternam períodos de extrema seca e chuvas intensas sobre o território nacional.

Segundo a diretora do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), Regina Alvalá, desde o início dos anos 2000, o La Niña tem atuado intensamente no Rio Grande do Sul causando sucessíveis longos períodos de seca, até 2023. Ainda no início da configuração do El Niño, em junho daquele ano, o extremo manifestado mudou.

As águas do Oceano Pacífico Tropical, aquecidas pelos efeitos da mudança climática, liberaram mais vapor de água na atmosfera e iniciaram períodos de chuvas cada vez mais intensas. “As chuvas, principalmente na região metropolitana de Porto Alegre, culminaram em 16 mortes. Depois tivemos um outro grande desastre, no início de setembro, que registrou 54 mortes e mais quatro desaparecidos. E agora esse super desastre já com mais de 100 mortes, muitos ainda desaparecidos e com impactos em praticamente quase todo o estado.”

Uma confluência de fatores deixa o estado do Rio Grande do Sul mais suscetível aos extremos causados pela mudança climática. A própria posição geográfica, a configuração das cidades e a falta de um programa eficiente de gestão de risco estão entre os fatores que favoreceram a catástrofe socioambiental vivida pelo estado.

“O Rio Grande do Sul está na extrema parte da região sul do Brasil, com fronteira ainda com países da América Latina. Então, em termos geográficos, está numa região que, quando consideramos a variabilidade climática, é uma região que acaba sendo, de fato, impactada por alternâncias de chuvas e secas”, explica Regina.

Gestão de risco

O diretor de Clima e Sustentabilidade do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Osvaldo Moraes, sugere que uma forma de amenizar esses fatores é a existência de um programa de gestão de riscos e respostas a desastres comandado pela Casa Civil do governo federal para que possibilitasse a articulação entre todos os ministérios que o tema envolve.

De acordo com Moraes, a gestão de riscos é composta por quatro elementos primordiais: monitoramento e alertas, preparação e resposta, comunicação, conhecimento e percepção do risco. “Nós conseguimos fazer a previsão do evento e emitir o alerta de que aquele evento pode ocorrer. E nós também estamos preparados para responder quando o evento acontece. Mas nos outros dois elementos nós não avançamos quase nada no Brasil”, explica.

Criado há 13 anos, o Cemaden é o órgão responsável por monitorar e emitir os alertas. “Nesses anos temos feito isso com antecipação, e encaminhando os alertas para as defesas civis, nacional, estaduais e municipais, gerando previsões de riscos, olhando a região como um todo, disseminando essas previsões no seu site, está tudo disponível para qualquer cidadão entrar e consultar” reforça Regina.

A resposta é dada pelas defesas civis no resgate e socorro às vítimas e no apoio à reconstrução das áreas afetadas. Antes disso, a comunicação precisa ser efetivada, mas atualmente, no Brasil, há apenas um sistema de envio de mensagens por SMS.

Para o diretor do MCTI, a comunicação precisa ir além de simplesmente informar. “Envolve todo um processo de que as pessoas, ao receberem o aviso de que algo pode acontecer, elas têm que compreender claramente qual é o impacto que elas podem ter se aquele evento acontecer. Elas têm que compreender qual é a rota de fuga que elas vão sair”, explica.

Percepção

Ensinar as pessoas a perceberem o risco que correm é fundamental para que a prevenção aconteça, já que, sem essa educação, a própria população se põe em situação crítica.

Um exemplo é a região do Vale do Taquari, atingida por fortes chuvas em setembro de 2023, quando cidades foram arrasadas pela maior enchente registrada, até então, que deixou 54 mortos e quatro desaparecidos. Oito meses depois, a mesma população volta a ser afetada e parte da cidade reconstruída volta a fazer parte do cenário de destruição.

“Se elas compreendessem o risco que elas estão expostas e percebessem esse risco, provavelmente, se continuassem instaladas nas mesmas áreas de risco, elas iriam usar novas tecnologias para reconstruir suas casas, para se prepararem para o evento. Elas iriam acreditar mais quando o alerta chegasse.”, reforça Moraes.

Histórico

Ao longo da série histórica, realizada pelo Cemaden, a intensificação dos extremos climáticos já são bastante evidenciados. Segundo a diretora da instituição, a própria criação do sistema de monitoramento foi motivada por uma das maiores catástrofes socioambientais no Brasil, em termos de vidas perdidas.

Em 2011, 918 pessoas morreram e outras 100 são consideradas desaparecidas desde que a região serrana do Rio de Janeiro foi atingida por fortes chuvas destruindo cidades e transformando grandes áreas de casas, comércios e infraestrutura em cenários de lama e entulhos. Depois desse período, grande parte do Brasil experimentou secas extremas, a exemplo da que foi enfrentada pela Região Metropolitana de São Paulo em 2014, que resultou no colapso do Sistema Cantareira de abastecimento das populações. “De lá para cá nós temos registrados vários desastres deflagrados por mais chuvas, não só no Rio Grande do Sul, mas também, obviamente, em outras partes do Brasil”, afirma Regina.

Tragédias em números

O aumento na frequência dos extremos climáticos fica evidente na série histórica registrada pelo Cemaden, com maior concentração de eventos após o ano de 2020.

Para a secretária nacional de Mudança do Clima no Ministério do Meio Ambiente, Ana Toni, a mudança já é uma realidade que exige, além de ações de mitigação – como zerar o desmatamento, preservar florestas e diminuir emissões – ações para tornar as cidades mais resilientes e mais resistentes.

“O Brasil precisa trabalhar prevenção e preparação aos eventos extremos porque é um país altamente vulnerável às mudanças do clima”, conclui.

Tragédias climáticas no Brasil: confira a linha do tempo

 

 

Confira os números:

Janeiro de 2011 – chuvas na região serrana do Rio de Janeiro registraram 918 mortes e 100 desaparecidos

Janeiro de 2020 – chuvas na região metropolitana de Belo Horizonte

Fevereiro de 2020 – chuvas na região metropolitana de São Paulo, Ceasa foi alagada afetando a oferta de alimentos

Março de 2020 – chuvas no litoral de São Paulo, com impacto em Santos, Cubatão, São Vicente, registrou mais de 43 mortes

Dezembro de 2021 – chuvas no sul da Bahia deixaram 23 mortos

Janeiro de 2022 – chuvas em Belo Horizonte registraram dois mortos

Janeiro de 2022 – chuvas na região metropolitana de São Paulo registraram 34 mortes

Fevereiro de 2022 – chuvas em Petrópolis deixaram 235 mortes

Março de 2022 – chuvas em Petrópolis registraram 7 mortes

Abril de 2022 – chuvas nas cidades da Costa Verde, de Guarapari, Angra dos Reis, no Rio de Janeiro – 20 mortes

Maio de 2022 – chuvas na região metropolitana de Recife, 133 mortes

Dezembro de 2022 – chuvas em Minas Gerais deixaram 13 mortos

Fevereiro de 2023 – chuvas no litoral de São Paulo, em São Sebastião e Ubatuba registraram 65 mortos

Junho de 20223 – litoral do Rio Grande do Sul deixaram 16 mortes

Setembro de 2023 – Vale do Taquari  registrou 54 mortes

Março de 2024 – chuvas na região serrana do Rio de Janeiro com mortes em Petrópolis e Tersópolis  deixaram 8 mortes

Março de 2024 – chuvas no Espírito Santo registraram 18 mortes

Inmet alerta para onda de calor no Rio de Janeiro com riscos à saúde

Moradores de diversos municípios do Rio de Janeiro devem enfrentar uma onda de calor até o domingo (5), inclusive com riscos à saúde. O alerta é do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), que prevê temperaturas 5º Celsius (C) acima da média por período de três a cinco dias, a contar de quarta-feira (1º).

O alerta, classificado como perigo, abrange municípios nas regiões metropolitana, sul, noroeste, norte, centro fluminense e baixadas.

Para o estado do Rio de Janeiro, o instituto prevê para esta quinta-feira (2) temperatura máxima de 37ºC. Na sexta-feira (3), o dia deve ficar mais quente ainda, com máxima de 38ºC.

Com o alerta, o Rio de Janeiro se junta à lista de seis estados que já vivenciavam uma onda de calor ainda mais severa, de grande perigo, iniciada no dia 27 de abril e prevista para durar até o início da noite deste sábado (4): Minas Gerais, São Paulo, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraná.

Cuidados

Ondas de calor podem impactar a saúde de toda a população, em especial idosos, crianças, pessoas com problemas renais, cardíacos, respiratórios ou de circulação, diabéticos, gestantes e população em situação de rua.

Com as ocorrências cada vez mais frequentes desse fenômeno climático, o Ministério da Saúde disponibiliza um portal com orientações para as pessoas se protegerem

Confira as principais recomendações:

Sol e calor

Evite a exposição direta ao sol, em especial, de 10h às 16h;

se expor ao sol sem a proteção adequada contra os raios ultravioleta deixa a pele vermelha, sensível e até com bolhas. Use protetor solar;

use chapéus e óculos escuros (especialmente pessoas de pele clara);

proteja as crianças com chapéu de abas;

use roupas leves e que não retêm muito calor;

diminua os esforços físicos e repouse frequentemente em locais com sombra, frescos e arejados;

em veículos sem ar-condicionado, deixe as janelas abertas;

não deixe crianças ou animais em veículos estacionados.

Hidratação

Aumente a ingestão de água ou de sucos de frutas naturais, sem adição de açúcar, mesmo sem ter sede;

evite bebidas alcoólicas e com elevado teor de açúcar;

faça refeições leves, pouco condimentadas e mais frequentes.

recém-nascidos, crianças, idosos e pessoas doentes podem não sentir sede. Ofereça-lhes água.

Cuidados coletivos

Se possível, feche cortinas e/ou janelas mais expostas ao calor e facilite a circulação do ar;

abra as janelas durante a noite;

utilize menos roupas de cama e vista-se com menos roupas ao dormir, sobretudo, em bebês e pessoas acamadas;

informe-se periodicamente sobre o estado de saúde das pessoas que vivem só, idosas ou com dependência que vivam perto de si e ajude-as a protegerem-se do calor;

mantenha ambientes úmidos com umidificadores de ar, toalhas molhadas ou baldes de água.

Cuidados com a saúde

Mantenha medicamentos abaixo de 25º C na geladeira (ler as instruções de armazenamento na embalagem);

procure aconselhamento médico se sofrer de uma doença crônica condição médica ou tomar vários medicamentos;

busque ajuda se sentir tonturas, fraqueza, ansiedade ou tiver sede intensa e dor de cabeça;

se sentir algum mal-estar, busque um lugar fresco o mais rápido possível e meça a temperatura do seu corpo e beba um pouco de água ou suco de frutas para reidratar;

no período de maior calor, tome banho com água ligeiramente morna. Evite mudanças bruscas de temperatura.

Europa não está preparada para os riscos climáticos crescentes

29 de abril de 2024

 

Seca na Península Ibérica em 2017: região sul da Europa é uma das que mais sofre com as mudanças climáticas

O calor extremo, a seca, os incêndios florestais e as inundações, como os registados nos últimos anos, irão agravar-se na Europa, mesmo sob cenários optimistas de aquecimento global, e afectarão as condições de vida em todo o continente. A AEA (Agência Europeia do Ambiente) publicou a primeira Avaliação Europeia dos Riscos Climáticos (EUCRA) para ajudar a identificar prioridades políticas para a adaptação às alterações climáticas e para os sectores sensíveis ao clima.

De acordo com a avaliação, as políticas e as ações de adaptação da Europa não estão a acompanhar o ritmo dos riscos crescentes. Em muitos casos, a adaptação incremental não será suficiente e, como muitas medidas para melhorar a resiliência climática requerem muito tempo, poderão ser necessárias medidas urgentes, mesmo em relação a riscos que ainda não são críticos.

Algumas regiões da Europa são focos de múltiplos riscos climáticos. O Sul da Europa está particularmente em risco de incêndios florestais e dos impactos da escassez de calor e de água na produção agrícola, no trabalho ao ar livre e na saúde humana. As inundações, a erosão e a intrusão de água salgada ameaçam as regiões costeiras baixas da Europa, incluindo muitas cidades densamente povoadas.

” A nossa nova análise mostra que a Europa enfrenta riscos climáticos urgentes que estão a crescer mais rapidamente do que a nossa preparação social. Para garantir a resiliência das nossas sociedades, os decisores políticos europeus e nacionais devem agir agora para reduzir os riscos climáticos, tanto através de cortes rápidos de emissões como de políticas e ações de adaptação fortes”. disse Leena Ylä-Mononen, diretora executiva da AEA.

Muitos riscos climáticos na Europa exigem medidas urgentes agora

A avaliação identifica 36 grandes riscos climáticos para a Europa em cinco grandes grupos: ecossistemas, alimentação, saúde, infraestruturas e economia e finanças. Mais de metade dos principais riscos climáticos identificados no relatório exigem mais medidas agora e oito deles são particularmente urgentes, principalmente para conservar os ecossistemas, proteger as pessoas contra o calor, proteger as pessoas e as infra-estruturas contra inundações e incêndios florestais, e para garantir a viabilidade da União Europeia (UE), mecanismos de solidariedade, como o Fundo de Solidariedade da UE.

Ecossistemas: Quase todos os riscos no grupo de ecossistemas exigem medidas urgentes ou mais, sendo os riscos para os ecossistemas marinhos e costeiros avaliados como particularmente graves. O relatório da AEA lembra que os ecossistemas prestam múltiplos serviços às pessoas e, portanto, estes riscos têm um elevado potencial de propagação em cascata para outras áreas, incluindo alimentação, saúde, infra-estruturas e economia.

Alimentação: Os riscos decorrentes do calor e da seca para a produção agrícola já se encontram num nível crítico no sul da Europa, mas os países da Europa Central também estão em risco. Especialmente, as secas prolongadas que afectam grandes áreas representam uma ameaça significativa à produção agrícola, à segurança alimentar e ao abastecimento de água potável. Como solução, mesmo uma mudança parcial de proteínas de origem animal para proteínas de origem vegetal cultivadas de forma sustentável reduziria o consumo de água na agricultura e a dependência de alimentos importados.

Saúde: O calor é o fator de risco climático mais grave e urgente para a saúde humana. Em maior risco estão grupos populacionais específicos, como os trabalhadores ao ar livre expostos a calor extremo, os idosos e as pessoas que vivem em habitações mal construídas, em áreas com um forte efeito de ilha de calor urbana ou com acesso inadequado a refrigeração. Muitas alavancas para reduzir os riscos climáticos para a saúde estão fora das políticas de saúde tradicionais, como o planeamento urbano, as normas de construção e as leis laborais.

Infraestruturas: Eventos meteorológicos mais frequentes e extremos aumentam os riscos para o ambiente construído e os serviços críticos da Europa, incluindo a energia, a água e os transportes. Embora os riscos de inundações costeiras tenham sido geridos relativamente bem na Europa, o aumento do nível do mar e as mudanças nos padrões das tempestades podem causar impactos devastadores nas pessoas, nas infraestruturas e nas atividades económicas. No sul da Europa, o calor e as secas causam riscos substanciais para a produção, transmissão e procura de energia. Os edifícios residenciais também precisam de ser adaptados ao aumento do calor.

Economia e finanças: A economia e o sistema financeiro da Europa enfrentam muitos riscos climáticos. Por exemplo, os extremos climáticos podem aumentar os prémios de seguros, ameaçar activos e hipotecas e aumentar as despesas governamentais e os custos dos empréstimos. A viabilidade do Fundo de Solidariedade da UE já está gravemente ameaçada devido às dispendiosas inundações e incêndios florestais dos últimos anos. O agravamento dos impactos climáticos também pode aumentar as lacunas nos seguros privados e tornar as famílias de baixos rendimentos mais vulneráveis.

Uma cooperação mais estreita é fundamental

A UE e os seus Estados-Membros realizaram progressos consideráveis ​​na compreensão dos riscos climáticos que enfrentam e na preparação para os mesmos. As avaliações nacionais dos riscos climáticos são cada vez mais utilizadas para informar o desenvolvimento de políticas de adaptação. No entanto, a preparação da sociedade é insuficiente, uma vez que a implementação das políticas está atrasada em relação ao rápido aumento dos níveis de risco.

A maioria dos principais riscos climáticos identificados no relatório são considerados “co-propriedade” da UE, dos seus Estados-Membros ou de outros níveis governamentais. Para enfrentar e reduzir os riscos climáticos na Europa, a avaliação da AEA sublinha que a UE e os seus Estados-Membros precisam de trabalhar em conjunto e também envolver os níveis regional e local, quando é necessária uma ação urgente e coordenada.

Existem ainda muitas lacunas de conhecimento relativamente aos principais riscos climáticos identificados no relatório da AEA. A UE pode desempenhar um papel fundamental na melhoria da compreensão dos riscos climáticos e da sua apropriação dos riscos, e na forma de os abordar através de legislação, estruturas de governação adequadas, monitorização, financiamento e apoio técnico, afirma o relatório. Esses novos conhecimentos também seriam um contributo fundamental para uma avaliação europeia dos riscos climáticos de acompanhamento.

Sobre o relatório EUCRA

O relatório EUCRA da AEA baseia-se e complementa a base de conhecimentos existente sobre os impactos e riscos climáticos para a Europa, incluindo relatórios recentes do Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas (IPCC), do Serviço Copernicus para as Alterações Climáticas (C3S) e do Centro Comum de Investigação da União Europeia. Comissão (JRC), bem como os resultados de projetos de investigação e desenvolvimento financiados pela UE e de avaliações nacionais dos riscos climáticos. O conhecimento nesta avaliação inédita é sintetizado com o objetivo de apoiar a formulação de políticas estratégicas.

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Caso Samarco: e-mail revelado em Londres indica que BHP avaliou riscos

Um e-mail que consta do processo judicial que tramita no Reino Unido sobre o rompimento da barragem da mineradora Samarco vem sendo usado pela defesa dos atingidos para reforçar argumentos.

No episódio, ocorrido em novembro de 2015 na cidade de Mariana, em Minas Gerais, uma avalanche de rejeitos foi liberada no meio-ambiente, causando 19 mortes e gerando impactos para populações de dezenas de cidades ao longo da bacia do Rio Doce. Os atingidos acionam as cortes britânicas visando responsabilizar a BHP Billiton. A mineradora anglo-australiana com sede em Londres é acionista da Samarco, junto com a Vale.

O teor do e-mail foi revelado nessa quinta-feira (18) em audiência no Tribunal de Tecnologia e Construção, na capital inglesa. Ele foi enviado um dia após a tragédia por Marcus Randolph, ex-chefe de divisão da BHP e ex-integrante do conselho de administração da Samarco. Os destinatários eram outros dois executivos da mineradora anglo-australiana: o diretor executivo Andrew Mackenzie e o diretor de minério de ferro Jimmy Wilson.

“Fico muito triste ao ler sobre o rompimento da barragem de rejeitos da Samarco. Há cerca de 3 a 4 anos, a pedido da BHP, o conselho da Samarco fez um relatório independente sobre a segurança da barragem. Seus resultados foram apresentados no conselho da Samarco”, inicia o e-mail.

Responsabilidade

O conselho de administração da Samarco mencionado é composto por representantes da BHP Billiton e da Vale. Ele tem caráter deliberativo e é responsável por tomar decisões estratégicas para os negócios. Randolph, que era diretor de ferrosos e carvão da BHP entre 2007 e 2013, foi um dos integrantes indicados pela mineradora anglo-australiana. Quando ocorreu a tragédia, no entanto, ele já não atuava mais no conselho.

Randolph destaca no e-mail sua atuação e se coloca à disposição para colaborar. “Nós nos empenhamos muito na segurança da barragem. Depois de uma visita ao local, enviei uma nota à Samarco que continha comentários extensos sobre o risco da barragem. Se eu puder ajudar de alguma forma, entre em contato comigo. Enviei várias cartas à diretoria solicitando revisões da barragem e me lembro muito bem dos acontecimentos. Acredito que também havia alguns documentos no registro de riscos da BHP e nossos nossos comitês tiveram discussões sobre o risco”, acrescenta o texto.

No processo que tramita no Reino Unido, cerca de 700 mil atingidos são representados pelo escritório Pogust Goodhead e cobram indenização por danos morais e materiais. São listadas perdas de propriedades e de renda, aumento de despesas, impactos psicológicos, impactos decorrentes de deslocamento e falta de acesso à água e energia elétrica, entre outros prejuízos.

No caso de indígenas e quilombolas que também figuram na ação, são mencionados os efeitos para as práticas culturais e os impactos decorrentes da relação com o meio ambiente.

Há ainda reivindicações de 46 municípios, além empresas e instituições religiosas. As audiências que avaliarão as responsabilidades pela tragédia estão marcadas para outubro deste ano.

O e-mail chegou ao processo através de um instrumento previsto no direito processual inglês, pelo qual o escritório Pogust Goodhead foi autorizado a acessar alguns documentos internos da BHP Billiton. Em meio a eles, encontrou a correspondência de Randolph. Os advogados dos atingidos sustentam que o achado reforça o entendimento de que a BHP Billiton foi alertada dos riscos de colapso da barragem e afasta alegações de que a mineradora não se envolvia na operação diária da mina da Samarco. Eles pleiteiam agora acesso aos documentos citados no e-mail.

Procurada pela Agência Brasil, a BHP Billiton destacou, em nota, que a audiência foi procedimental e não discutiu o mérito do caso. “Discussões sobre produção de provas e documentos são usuais na atual fase do processo inglês e não se confundem com a apreciação de alegações acerca da responsabilidade da BHP, que serão objeto das audiências designadas para outubro de 2024 com duração de 14 semanas”, registra o texto.

Tramitação

O processo começou a tramitar no Reino Unido em 2018. Desde o início, a BHP Billiton alegou haver duplicação de julgamentos e defendeu que a reparação dos danos deveria se dar unicamente sob a supervisão dos tribunais brasileiros. A ação chegou a ser suspensa na etapa inicial, quando ainda se discutia se o caso poderia ser analisado no país.

Em 2020, sem entrar no mérito da questão, o juiz inglês Mark Turner acatou os argumentos da BHP Billiton e considerou que havia abuso, entre outras coisas, porque poderia haver sentenças inconciliáveis com julgamentos simultâneos no Brasil e no Reino Unido. A defesa dos atingidos, no entanto, conseguiu reverter essa decisão em instâncias superiores.

Com o avanço do processo, a BHP Billton decidiu mover uma ação para reivindicar que a Vale também fosse incluída. A mineradora anglo-australiana passou a sustentar que, em caso de condenação, sua sócia deveria arcar com pelo menos 50% do valor fixado. A Vale também buscou questionar a competência das cortes britânicas para analisar o caso, mas o pedido da BHP Billiton foi acatado e ela passou a ser considerada ré.

O processo ainda deve se arrastar. Mesmo que a responsabilidade das mineradoras seja reconhecida em outubro deste ano, o cronograma do tribunal inglês indica que a análise dos pedidos de indenização individual poderá ocorrer apenas no fim de 2026.

Reparação no Brasil

No Brasil, o processo reparatório gira em torno do Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) – firmado entre as três mineradoras, a União e os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo. Com base nele, foi criada a Fundação Renova. Ela assumiu a gestão de mais de 40 programas, cabendo às mineradoras o custeio de todas as medidas.

Porém, passados mais de oito anos, a atuação da entidade é alvo de diversos questionamentos judiciais por parte dos atingidos, do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e do Ministério Público Federal (MPF). Há discussões envolvendo desde a demora para a conclusão das obras de reconstrução dos distritos arrasados na tragédia até os valores indenizatórios. Uma tentativa de repactuação do processo reparatório, capaz de apontar solução para mais de 85 mil processos sobre a tragédia, está em andamento desde 2022. Até o momento, não houve sucesso.

Diante desse cenário, em janeiro desse ano, a Justiça Federal condenou a Samarco, a Vale e a BHP a pagar R$ 47,6 bilhões para reparar os danos morais coletivos causados pelo rompimento da barragem. As mineradoras recorrem da decisão.

Guerra Mundial: entenda riscos de um conflito entre Israel e Irã

O risco de uma nova guerra mundial existe caso o conflito Israel e Irã se consolide, o que pode arrastar o planeta para uma crise econômica de grandes proporções, segundo especialistas entrevistados pela Agência Brasil.

O mundo aguarda qual o desfecho do conflito após Israel ser atacado pelo Irã em seu próprio território. O Irã, por sua vez, revidou o ataque à sua embaixada em Damasco, na Síria. Os aliados de Tel Aviv apelam, publicamente, para que o país não amplie a guerra no Oriente Médio. 

O doutor em história pela Universidade de São Paulo (USP), José Arbex Junior, avalia que estamos caminhando para um cenário que, se não for contido, pode levar a uma guerra mundial.

“Quando você engaja o Irã no conflito, você está mexendo com toda a estrutura geopolítica de poder e, historicamente, os Estados Unidos mantém uma relação bastante hostil com o Irã desde pelo menos 1979, quando teve a Revolução Iraniana”, comentou.

Jornalista José Arbex explica origem do Hamas. Foto: Damião A. Francisco

Para o especialista, os Estados Unidos (EUA) e seus aliados vivem agora um novo impasse. “Eles não têm como entrar com tudo em uma guerra contra o Irã. Afinal, isso arruinaria a economia mundial e arruinaria as chances do [Joe] Biden se reeleger presidente dos EUA”, destacou.

Arbex lembrou que o Irã controla o Estreito de Hormuz, pequeno pedaço de oceano por onde passa boa parte do comércio mundial de petróleo. “Imagina se o Irã, em uma situação de conflito, resolve fechar o Estreito de Hormuz? O preço do barril do petróleo sobe, tranquilamente, para 150 dólares ou mais. Isso explode a economia europeia. Por isso que os europeus estão em pânico”, completou.

O professor de jornalismo da USP, que foi correspondente internacional em Moscou e Nova Iorque, citou ainda que o Irã é fundamental para economia chinesa.

“[O petróleo do Irã] é o sangue da economia chinesa. Então, se for interrompido o fornecimento de petróleo para a China, por força da guerra, não tenho dúvida nenhuma de que a China vai se alinhar com o Irã”, completou José, acrescentando que, diplomaticamente, Pequim já é próximo de Teerã.

A professora de Relações Internacionais do Ibmec de São Paulo, Natalia Fingermann, também avaliou que a guerra, hoje regional, pode escalar para uma guerra global devido ao cenário de grande instabilidade, que vem se agravando desde a Guerra na Ucrânia.

Professora Natália Fingermann. Foto:  Arquivo pessoal

“O risco existe. Não é uma coisa totalmente distante, louca ou sem sentido nenhum. O risco existe e acho que ele nunca foi tão possível, pelo menos nos últimos 40 anos”, destacou a professora, acrescentando que há ainda o risco do uso de armas nucleares.

Fingermann lembrou que a escalada do conflito pode aumentar a inflação global, afetando todo o mundo. “[Se o conflito aumentar], vamos ter um aumento do preço do petróleo e, consequentemente, um processo de inflação global porque, querendo ou não, o petróleo ainda é a principal fonte de energia e de transporte do alimento do mundo”, acrescentou

Israel e EUA

O professor José Arbex avaliou que Israel atacou a Embaixada do Irã, em Damasco, com objetivo de envolver Teerã no conflito para, com isso, tentar trazer os EUA para mais perto de Tel Aviv.

O especialista argumentou que Israel estava isolado internacionalmente e, internamente, o governo vinha sofrendo pressões pela saída do primeiro-ministro, Benjamim Netanyahu, que corre o risco ser preso se deixar o poder. Além disso, citou a econômica do país, parcialmente paralisada pela guerra, como outro fator preocupante para Israel.

“Netanyahu jogou todas as fichas no agravamento do conflito com o Irã para puxar apoio dos Estados Unidos, que ele estava perdendo por causa das eleições nos EUA.” Ele acrescentou que Gaza tem afetado a perspectiva eleitoral de Biden.

A professora Natalia Fingermann lembrou que, oficialmente, Israel justificou o ataque contra a embaixada do Irã para desarticular o apoio que do país ao Hezbollah, grupo do Líbano em conflito na fronteira Norte de Israel. Porém, ela avaliou que Netanyahu teve outros ganhos com o envolvimento direto do Irã.

“Primeiro, ele tira o foco sobre Gaza, que sai da pauta internacional, e ele volta a ter apoio internacional e doméstico. Então, em certa medida, ele consegue fazer a sua manutenção de poder”, resssaltou.

Questão palestina

Fingermann disse ainda que a entrada do Irã pode ter consequências negativas para causa palestina. Para a especialista, Netanyahu foi quem mais tirou vantagem na nova situação.

“Quando todos os grandes aliados de Israel, como Estados Unidos, França e Inglaterra, param de olhar para Gaza e focam mais no Irã, a gente tem, assim, o receio de que aquela população fique abandonada.”

Para o professor José Urbex, a questão palestina se fortalece, pois mostra que eles não estariam sozinhos contra Israel. Ele citou ainda a manifestação da presidente da União Europeia, Ursula von der Leyen, que, apesar de condenar o Irã, pediu que a questão palestina seja resolvida.

“Não é por acaso que ela faz uma declaração dessa. O Irã demonstrou que, se essa coisa prosseguir e a guerra prevalecer, a coisa vai ficar muito feia”, disse. Além disso, Arbex avaliou que o ataque do Irã revelou certa fragilidade de Israel, que precisou dos aliados para conter os drones de Teerã.

“[Ajudaram Israel] os Estados Unidos, Inglaterra, Jordânia, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e a fragata francesa, que está estacionada lá perto. O que sobrou para Israel fazer? Sobrou pouquíssima coisa. Israel é integralmente dependente desses aliados externos”, acrescentou.

Rio: maiores riscos de alagamento estão em Petrópolis e Baixada

A cidade de Petrópolis, na região serrana do Rio de Janeiro, e a Baixada Fluminense, na região metropolitana, são as áreas do estado com maiores riscos de alagamentos provocados por temporais. O alerta é do professor Paulo Canedo, do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ), no contexto em que o estado se prepara para fortíssimas chuvas, previstas para esta sexta-feira (22).

Canedo coloca Petrópolis no topo da lista de preocupação. A cidade tem histórico de tragédias causadas pela chuva, como a que deixou mais de 230 mortos em fevereiro de 2022.

A alerta se dá pelo fato de três rios correrem para o centro da cidade. “Dos três, somente um corre, mais ou menos, dentro da sua calha normal, é o rio que aguenta um extravasamento, o Piabanha. Os rios Quitandinha e Palatinato não aguentam, extravasam com facilidade, mesmo com chuvas não muito grandes”, explica à Agência Brasil o especialista em gestão de recursos hídricos.

O professor ressalta que o Palatinato recebeu um desvio, que funciona como uma proteção contra transbordamentos, no entanto, ainda não de forma totalmente adequada. “Está protegido com alguma dificuldade porque a proteção não está completa”.

O Quitandinha é considerado o pior de todos, de acordo com Canedo, pois transborda com facilidade em quase toda a extensão. Ele passa por uma das principais áreas do município, onde fica, inclusive, o Museu Imperial, atração turística da cidade.

“Os três rios chegam no mesmo ponto. Qualquer um deles já faz um estrago. Os [transbordos dos] três juntos causam um estrago enorme. Por isso que Petrópolis é uma fragilidade muito grande”, avalia.

Baixada Fluminense

Na sequência das preocupações, Canedo aponta a Baixada Fluminense. São municípios mais próximos da capital fluminense e que sofreram com enchentes há cerca de dois meses.

Ele cita os rios Iguaçu e Sarapuí como principais causadores de enchentes. Uma das características geográficas da região é ter enormes áreas de alagamentos, atingidos diversos bairros.

Paulo Canedo é um dos autores do Projeto Iguaçu, elaborado entres os anos de 2005 e 2006 pela Coppe em cooperação com o governo fluminense, para solucionar o problema das enchentes na região.

Ele explica que a estrutura de proteção contra cheias, formada por diques e bombas, mitigaram o problema por anos, mas deixaram de receber manutenção a partir de 2015.

“Criou-se uma infraestrutura de proteção que era efetiva, protegia a região. Parou de proteger porque não teve manutenção”. Canedo explica que a região tem a presença de diques, que formam pôlderes (uma porção de terrenos baixos, planos e alagáveis), que sofrem uma influência do mar muito grande.

“Mesmo que não tenha chuva forte, ele tende a inundar, porque a água do mar volta. Para que isso seja evitado, constrói-se um dique que impeça a água do mar de invadir regiões onde tenha gente morando”, explica.

Canedo acrescenta que o mesmo dique que impede a água de subir, também impede a água da chuva que vem pelo continente seguir para o mar. “Esse dique deve ter comportas que só permitem fluxo em um sentido, descem a água. Essas comportas precisam de limpeza, manutenção”. Ele lembra que na chuva do começo deste ano, esse sistema não funcionou para evitar inundações.

Assoreamento

Outra apreensão levantada pelo pesquisador da Coppe é a que envolve o rio Acari, que nasce em Bangu, na zona oeste do Rio de Janeiro e segue até o limite com Duque de Caxias, já na Baixada, onde desagua no rio Meriti, que chega à Baía de Guanabara.

“Vem passando por regiões pobres e com ocupação desordenada. É um rio com margens muito habitadas, precisando de obras grandes. Está com certa dificuldade na foz, são assoreamentos que precisam ser corrigidos. Precisa de uma limpeza forte do leito do rio”.

O professor estima que a extensão da área necessitada de dragagem chega a 3 quilômetros. Apesar de o problema principal ser no fim do rio, Canedo faz uma analogia para explicar que as consequências são percebidas ainda na zona oeste carioca.

“Se o ralo está entupido, que é a saída do rio, a água em cima não desce”.

Governo estadual

Procurada pela Agência Brasil, A Secretaria de Estado do Ambiente e Sustentabilidade informou que cadastrou o Projeto Iguaçu no novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo federal, e trabalha com o Ministério das Cidades para obter recursos para financiamento das obras, orçadas em, aproximadamente, R$ 730 milhões. A proposta segue em análise pela União.

Já o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) informa que executa, por meio do Programa Limpa Rio, a limpeza e o desassoreamento do trecho de cerca de um quilômetro do Rio Botas, desde o dia 15 de janeiro, minimizando os possíveis danos de um novo temporal. Desde então, foram removidos cerca de 13,2 mil metros cúbicos de sedimentos.

O Inea informa ainda que duas bombas fixas que compõem o Pôlder do Outeiro estão em funcionamento e que a licitação para a contratação do projeto e construção de uma casa de bombas, um sistema de comportas do Pôlder Pilar e complementação de um parque urbano no Pôlder do Outeiro (Lote XV) – nos limites dos municípios de Duque de Caxias e Belford Roxo – já foi iniciada e está sendo atualizada para atender novos requisitos estabelecidos por lei federal.

Há também um contrato, já assinado, para a manutenção e reparo das bombas e reparos na casa de bombas do Outeiro.

A secretaria e o Inea informam que atualmente há oito bombas em funcionamento no Canal do Outeiro e há a previsão da chegada de outras seis hoje no Canal do Pilar. Os equipamentos não são fixos e atuam de forma emergencial.

Além disso, o Inea disponibilizou maquinário e pessoal que já atuam na região a fim de diminuir os possíveis impactos das fortes chuvas. As equipes dos órgãos ambientais estaduais estarão de plantão 24h por dia durante este fim de semana.

Nível de rio sobe e eleva riscos no Acre, aponta Serviço Geológico

O Rio Acre, na cidade de Rio Branco, atingiu, neste sábado (2), a marca de 17,52 metros (m), a quinta maior da história, o que elevou a tensão em vista dos alagamentos na capital e a situação de emergência em diferentes bairros. Segundo boletim de alerta do Serviço Geológico Brasileiro (SGB), a previsão é que o nível alcance 17,8 m neste domingo (3), o que aumenta riscos de enchentes na capital. A maior marca foi registrada no ano de 2015, quando chegou a 18,35 metros.

O estado contabiliza 17 municípios em situação de emergência e pelo menos 11 mil desabrigados. Conforme foi divulgado pelo SGB, o pesquisador em geociências Marcus Suassuna alertou para os riscos dessa elevação do nível do rio para a população. “Este processo de subida pode durar mais alguns dias e levar a cheia em Rio Branco a ficar próxima das maiores da história”, afirmou.

Força-tarefa

O governo do Acre informou que os ministros da Integração e Desenvolvimento Regional, Waldez Góes, e do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, devem chegar a Rio Branco na próxima segunda (4).  Eles vão visitar as áreas atingidas pelas cheias. “Conforme determinação do Presidente Lula, na próxima segunda-feira irei ao Acre, numa força-tarefa do governo federal para assistência à população atingida pelas enchentes”, afirmou Góes em postagem no X, antigo Twitter. “As intensas chuvas no Acre têm provocado consequências devastadoras”, disse Marina, também no X, nesta semana.

Enquanto a situação se agravou em Rio Branco, no município de Xapuri (AC), a 190 quilômetros da capital, o rio recuou e atingiu a marca de 16,78 metros. A cidade registrou a segunda maior marca da história na sexta-feira (1º), com 17,09 metros. Da mesma forma, em Brasiléia, a 230 quilômetros de Rio Branco, o Rio Acre está em 11,20 metros e com tendência de redução, diferentemente do que ocorreu no dia 28, quando chegou à marca de 15,62 metros.