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Modalidades e federações ajustam protocolos para diminuir concussões

A morte de José Adilson Rodrigues dos Santos, o Maguila, completou um mês no último domingo (24). O falecimento do ex-pugilista, aos 66 anos, trouxe novamente à tona as discussões sobre a Encefalopatia Traumática Crônica (ETC), doença degenerativa com a qual o campeão mundial de boxe conviveu por quase duas décadas, que atinge as células cerebrais por meio de impactos repetidos na cabeça. O avanço dos estudos a respeito da patologia, auxiliado pela doação de cérebros, tem levado o esporte a desenvolver protocolos para minimizar os traumas.

“Hoje em dia, em escolinhas de futebol dos Estados Unidos, as crianças não treinam cabeceio até uma certa idade”, relatou à Agência Brasil a coordenadora do Departamento Científico de Traumatismo Cranioencefálico da Academia Brasileira de Neurologia (ABN), Maria Elisabeth Ferraz.

“Evitar o cabeceio precoce na escolinha, no recreacional, é uma ótima medida [de prevenção]. Para que ficar submetendo a criança ao cabeceio desde pequena? Mesmo para quem faz boxe ou outras artes marciais, não é necessário chegar às vias de fato no treino. Por que ficar chutando ou dando soco na cabeça se é apenas o treino do movimento? Deve-se evitar esse tipo de coisa o máximo possível, ou pelo menos oferecer a informação de que traumatismo recorrente na cabeça pode levar a esses eventos [ETC], para que a pessoa, de posse da informação, escolha o que fazer”, completou a médica neurologista.

A Agência Brasil procurou algumas instituições esportivas para saber como funciona o protocolo de concussão. Uma delas foi o Comitê Olímpico do Brasil (COB). Segundo Rodrigo Sasson, médico da entidade, o COB segue o modelo chamado SCAT (sigla em inglês para Ferramenta de Avaliação de Concussão Esportiva), também padrão no Comitê Olímpico Internacional (COI) e na Federação Internacional de Futebol (Fifa).

“[O protocolo] começa com a estratificação. A gente tem o basal [quantidade de energia necessária para manutenção das funções vitais] de todos os atletas, avaliação de coordenação motora, reflexo, memória. Existem até protocolos de prevenção de preparação muscular da região cervical. Esse protocolo é revisto anualmente. A última revisão foi antes [dos Jogos Olímpicos] de Paris [França]”, explicou Sasson.

O SCAT também é a ferramenta utilizada pelo Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB). De acordo com o médico-chefe, Hesojy Gley, a entidade segue as orientações relacionadas à prevenção do segundo dano da concussão, que pode causar um dano cerebral grave. O especialista, porém, destacou que o esporte adaptado tem características peculiares para avaliação dos atletas.

“Uma das maiores dificuldades é no esporte para cegos, como o futebol. Aquelas características que dependem de estímulo visual não podem ser utilizadas. É fundamental que a equipe multidisciplinar conheça a dinâmica motora de cada atleta, para que, quando houver um trauma na cabeça, tenha-se o diagnóstico da concussão. Que se possa avaliar, além do risco de concussão aguda, se o atleta perdeu valências, características finas, neurológicas, que denotam uma concussão mais grave ou ainda não recuperada”, detalhou Gley.

“Essa preocupação foi mais levada à tona nos Jogos de Tóquio [Japão, em 2021], nos quais a própria Ibsa [sigla em inglês para Federação Internacional de Esporte para Cegos] adicionou uma substituição por concussão [no futebol de cegos]. O atleta com diagnóstico de concussão dado pelo médico é obrigado a ficar três minutos fora. Se ele mesmo voltar a campo, a substituição [são permitidas seis trocas por tempo de jogo a cada time] não conta”, emendou.

Um dos esportes com mais risco de impacto craniano é o rugby, devido à possibilidade de choques em alta velocidade. Conforme Lúcia Deibler, diretora médica do Programa de Bem-Estar do Jogador na Confederação Brasileira (CBRu), a modalidade trabalha junto à NFL (principal liga de futebol americano do mundo) para potencializar estudos e comparar dados na área de concussão. A pauta, segundo ela, integra uma das forças-tarefa da World Rugby (federação internacional) na área de saúde.

“Hoje, sabemos que o jogador tackleado [que está com posse da bola e sofre o tackle, ou seja, é derrubado pelos adversários] sofre menos concussão do que o tackleador [atleta que realiza o tackle]. Por isso, a gente vem com algumas leis e regras para baixar o nível do tackle o máximo possível. Também sabemos que são três os mecanismos básicos que resultam em concussão: contado direto na cabeça, em outra área do corpo ou simplesmente a mudança de direção”, descreveu Lúcia, que participou recentemente da conferência médica anual da World Rugby em Lisboa (Portugal).

“Dentro desses estudos, temos duas ações básicas quando se identifica ou há suspeita de concussão. A primeira é o reconhecer e remover: o atleta sai do treino ou jogo e não retorna até que se executem os 21 dias do protocolo de retorno. Outro sistema é o HIA [head injury assessment, ou avaliação de lesão na cabeça, na tradução literal do inglês], realizado em quatro estágios: imediatamente após a lesão, dois dias após a partida, entre 36 e 48 horas do evento e quando está para o atleta retornar”, continuou a médica.

E no futebol? A International Football Associação Board (Ifab), entidade responsável pelas regras da modalidade, aprovou, em março, um novo protocolo de concussão, que, por aqui, já foi adotado a partir das Séries A e B do Campeonato Brasileiro masculino. A medida autoriza uma substituição extra à equipe que teve o jogador atingido na cabeça. Um cartão de cor vermelha deve ser entregue ao quarto árbitro por alguém do banco. A saída de um atleta por trauma cerebral dá direito, ao time adversário, de também realizar uma troca extra.

Segundo o protocolo utilizado pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF), no caso de atletas de mesma equipe se chocarem e ambos terem identificados sintomas de concussão, a substituição extra se aplica a somente um deles. A recomendação é que o outro seja retirado da partida utilizando uma das cinco trocas permitidas normalmente.

“Os protocolos, certamente, têm estado cada vez melhores e, aos poucos, vêm sendo implementados no dia a dia do nosso esporte profissional. Nos EUA, hoje em dia, eles são muito mais rígidos. Não é aquilo de ‘sai um pouco, joga um soro gelado e volta’. O indivíduo é afastado e passa por avaliações. Dependendo do quadro e das queixas, pode fazer exames de imagem, testes neuropsicológicos e avaliações repetidas até que, de fato, esteja assintomático e seja autorizado a voltar a prática esportiva aos poucos”, concluiu Maria Elisabeth Ferraz, da ABN.

MEC criará protocolos para combater racismo em escolas

O Ministério da Educação (MEC) vai apresentar protocolos de prevenção e resposta ao racismo nas escolas. Os editais com as propostas serão publicados nos próximos meses e poderão ser aplicados em todas as instituições de ensino do país – públicas e privadas. A medida faz parte do desenho da Política Nacional de Educação para as Relações Étnico-Raciais, que deve ser anunciada no próximo dia 14.

Ao todo, a política possui sete eixos, sendo um deles o diagnóstico de monitoramento da implementação da Lei 10.639/2003, que determinou a inclusão obrigatória do ensino de história e cultura afro-brasileira em todas as etapas da educação básica.

O anúncio foi feito em meio a casos recentes de racismo em unidades de ensino. Um deles ocorreu no dia 3 de abril, em Brasília, quando alunos da Escola Franciscana Nossa Senhora de Fátima foram hostilizados com xingamentos racistas por alunos do Colégio Galois, durante uma partida de futsal válida pelo torneio Liga das Escolas. Por causa do episódio, o Colégio Galois – escola privada da capital federal – expulsou alguns dos envolvidos identificados, sendo que outros pediram desligamento da instituição.

Outro caso que teve ampla repercussão foi denunciado pela atriz Samara Felippo, que registrou boletim de ocorrência eletrônico após sua filha, de 14 anos, ter sido vítima de racismo em uma escola de alto padrão em São Paulo.

Segundo a Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP), no registro da ocorrência a atriz mencionou que ofensas racistas foram escritas em um dos cadernos da filha. O caso foi registrado como “preconceito de raça ou de cor” e está sendo analisado pelo 14º Distrito Policial de Pinheiros, na capital paulista. O episódio aconteceu na Escola Vera Cruz, no bairro de Pinheiros, e duas alunas envolvidas foram suspensas pelo colégio.

Uma pesquisa divulgada no ano passado mostrou que 71% das secretarias municipais de Educação não têm ações consistentes para atender a legislação.  Outro estudo divulgado este ano indica que cerca de 90% das turmas de educação de creche e pré-escola igmnoram temas raciais.

Para acelerar a implementação da Lei 10.639/2003, o MEC deve anunciar um trabalho de fortalecimento das redes educacionais por meio de um regime de colaboração e coordenação federativa. Estão previstos incentivos financeiros, técnicos e simbólicos na implementação da política nacional de educação das relações étnico-raciais.

Livros didáticos

Segundo o MEC, uma comissão – formada pela Secretaria de Educação Básica (SEB), Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão (Secadi) e Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) – tem produzido análises para aperfeiçoar editais do Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD).

Esse programa avalia e disponibiliza obras didáticas, pedagógicas e literárias, entre outros materiais de apoio à prática educativa, de forma sistemática, regular e gratuita, às escolas públicas de educação básica das redes federal, estaduais, municipais e distrital e também às instituições de educação infantil comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos e conveniadas com o poder público.

Além dos livros didáticos, a política nacional a ser lançada pelo MEC este mês deve dar destaque à publicação de livros literários direcionados à temática étnico-racial.  

“Uma outra preocupação do MEC em relação ao tema é a formação docente. Entende-se que é necessário que se formem professores, mas, também gestores e técnicos, afinal, os tomadores de decisão no âmbito das escolas são atores importantes neste processo. Neste sentido, o desenho de formação contempla todas estas dimensões”, informou o Ministério da Educação à Agência Brasil.