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Após proibição, eventos culturais voltam a ocupar o Eixão em Brasília

Uma semana após o Governo do Distrito Federal (GDF) mandar retirar todos os eventos culturais e os ambulantes do Eixão do Lazer, em Brasília, as manifestações culturais Choro no Eixo, Jazz no Eixo, Rock no Eixo, entre outras, voltaram a ocupar a rodovia que corta a capital do país neste domingo (8).

No final de semana passado, uma ação do governo distrital proibiu os eventos musicais e de comércios de ficarem no local, sem aviso prévio, causando revolta na cena cultural de Brasília.

O fundador do Choro no Eixo – que reúne uma multidão todos os domingos –, o músico Márcio Marinho, avaliou que a reocupação do espaço neste domingo foi a resposta da sociedade que vem se apropriando do espaço. “Não se trata mais apenas das manifestações culturais que estão no Eixão, acho que agora a população pegou o Eixão para si, como sempre foi. É um direito de acesso à cidade que a gente não pode retroceder e perder”, destacou.

A proibição reacendeu o debate sobre o uso dos espaços públicos urbanos e os conflitos em torno dessa ocupação, como nos casos do Cais José Estelita, em Recife (PE), e da Orla do Guaíba, em Porto Alegre (RS), onde diferentes grupos sociais buscam consolidar determinado uso dos espaços urbanos.

A professora de arquitetura e urbanismo da Universidade de Brasília (UnB) Maria Fernanda Derntl, especialista em planejamento urbano, avaliou que essa deve ser uma oportunidade para Brasília exercer a convivência entre os diferentes grupos. “Houve uma reação grande e a gente vê a população se apropriando do espaço. O espaço público pode ser ocupado transitoriamente, desde que não se incorra em crime ou em destruição de propriedade. Talvez esse intenso uso do Eixão exija pensar o melhor modelo de convivência. É um exercício de democracia mesmo”, defendeu a especialista.

Eixão

O chamado “Eixão” de Brasília é a rodovia que corta o Plano Piloto, região central da capital. Todos os domingos e feriados essa via é fechada aos carros e tomada pela população local, que costuma praticar atividades físicas no chamado “Eixão do Lazer”. Desde a pandemia, o espaço começou a ser ocupado também por eventos culturais e por ambulantes que vendem desde alimentos e bebidas até artesanato.  

Para o cavaquinista Márcio Marinho, do Choro no Eixo, o espaço deve se consolidar como polo cultural, gastronômico, de esporte e de turismo da capital. “Em vez de se restringir, deveriam expandir esse formato de acesso à cultura e ao lazer para outras regiões do Distrito Federal, como Taguatinga e Ceilândia, e não apenas na área central do Plano Piloto. Isso aqui é um exemplo de como a sociedade pode ter direito à cidade de uma forma democrática”, afirmou.  

Além dos grupos musicais, partidos políticos, parlamentares e movimentos sociais se reuniram neste domingo no Eixão para reivindicar o uso do espaço para a cultura e para o comércio ambulante.

Eixão do Lazer – Jose Cruz/Agência Brasil

 

A trabalhadora Auricélia Rocha, de 37 anos, vende cerca de 120 almoços nos domingos no Eixão. Ela trabalha no local há dois anos e lamentou a ação da semana passada que considerou “truculenta” e que a fez perder a comida que havia preparado para vender.

“Eu dependo do Eixão. Minha fonte de renda é o Eixão. Eu não tenho trabalho formal. A gente produz churrasco durante a semana e no final de semana e vem vender aqui no Eixão. É o meu trabalho e de mais três pessoas”, contou.

Governo do DF

O Governo do Distrito Federal informou que os eventos culturais não serão proibidos no local. Segundo o governador Ibaneis Rocha (MDB), a ação da semana passada atendeu às reclamações de moradores de locais próximos aos eventos.

“[A ação foi orientada] apenas a organizar o comércio no local, que será mais funcional na medida em que possamos cadastrar e regularizar a atividade. Nada que retire do Eixão seu caráter de espaço de convivência democrática, de criatividade, com liberdade e segurança”, comentou Ibaneis em uma rede social.

Após a reação popular, o governador comentou que não se poderia desvirtuar o Eixão do Lazer em um “Eixão da cachaça”. A venda de bebidas alcoólicas às margens das rodovias do Distrito Federal é proibida pela lei distrital 2.098 de 1998.

Novas regras

Na última terça-feira (3), foi publicado um novo decreto para regulamentar o uso do Eixão. De acordo com o texto, o Departamento de Estradas de Rodagem do Distrito Federal (DER-DF) terá 30 dias para elaborar um plano para o uso do Eixão. Não está prevista a participação da sociedade civil na elaboração do plano.

O decreto diz ainda que, até que seja aprovado o plano, o DER-DF deve conceder autorização em caráter provisório para os ambulantes, excluídos que vendem bebidas alcoólicas.   

Um dos organizadores do Ocupa Eixão, o articulador cultural Leonardo Rodrigues, defendeu que a sociedade deve participar da elaboração do Plano para o uso do Eixão. “Isso a gente precisa construir conjuntamente, com moradores, população, interessados e governo. Deve-se estabelecer um diálogo antes das ações”, comentou.

Para Maria Fernanda Derntl, a convivência nos espaços públicos envolve lidar com a diferença e a diversidade, mas esses conflitos não devem ser considerados como algo ruim, mas como uma oportunidade para a sociedade praticar a democracia.  “A ocupação da cidade e dos seus espaços é, por natureza, problemática. Nesse caso, houve uma ação unilateral, que não foi feita com os vários grupos interessados em ocupar a cidade. Mas essa é uma excelente oportunidade para criar espaços mais amplos de discussão das questões e dos problemas da cidade”, destacou a especialista.

Professora e pesquisadora na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília, Maria Fernanda Derntl, defende diálogo na construção das novas regras. Foto: Center for Latin American Studies/Divulgação

 

Estudantes voltam a ocupar prédio principal da Uerj

Estudantes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) voltam a ocupar o Pavilhão João Lyra Filho, prédio principal do campus Maracanã. Eles protestam contra mudanças nas regras para a concessão de bolsas e auxílios de assistência estudantil que excluem mais de 1 mil estudantes de benefícios. As atividades acadêmicas e administrativas no Pavilhão foram suspensas nesta quarta-feira (21).

A ocupação do edifício ocorreu na noite desta terça (20). No último dia 14, os estudantes já haviam ocupado o Pavilhão e a ação acabou em confronto com seguranças e servidores da universidade. O grupo acabou recuando, mas agora voltou a ocupar o edifício.

Para a Uerj, a ocupação é inaceitável. “A reitoria entende como inaceitável e descabido o sequestro de um prédio público, com claros e imediatos prejuízos a toda comunidade acadêmica, por um grupo que já deu todas as provas de não querer negociar”, diz a universidade em nota.

A Uerj acrescenta que os manifestantes já haviam usado de violência, chegando a suspender uma sessão do Conselho Universitário.

“Eles invadiram o plenário, chegando à Secretaria dos Conselhos e tentando impedir a saída dos conselheiros, fazendo uso do mesmo expediente do “cordão humano”. O gesto inaceitável, por cercear o direito de ir e vir dos participantes, deixou pessoas feridas – um conselheiro e um membro da equipe da Reitoria –, que registraram boletins de ocorrência sobre o fato.”

A universidade apela pelo fim do movimento: “A reitoria espera que a razão prevaleça e o movimento recue na posição de sequestrar os espaços que não pertencem exclusivamente a ele mas a toda a comunidade uerjiana, composta por 35 mil alunos, 3 mil docentes e quase 6 mil servidores técnicos administrativos”.

Os estudantes negam que tenha havido qualquer início de violência por parte deles e dizem ainda que durante a sessão do Conselho Universitário respeitaram as falas dos presentes. Segundo os alunos, um professor chegou a agredir um aluno e o estudante fez também um boletim de ocorrência. O movimento diz ainda que a reitoria não entrou em para que houvesse uma negociação e que a última reunião com a reitoria, enquanto ocupação, ocorreu no dia 6 de agosto.

Manifestação

Os estudantes ocupam a reitoria da Uerj há três semanas. Eles pedem a revogação do Ato Executivo de Decisão Administrativa (Aeda) 038/2024, que estabelece, entre outras medidas, que o auxílio alimentação passará a ser pago apenas a estudantes cujos cursos tenham sede em campi que ainda não têm restaurante universitário. O valor do auxílio alimentação será de R$ 300, pago em cotas mensais, de acordo com a disponibilidade orçamentária.

Além disso, o ato estabelece, como limite para o recebimento de auxílios e Bolsa de Apoio a Vulnerabilidade Social, ter renda familiar bruta, por pessoa, igual ou inferior a meio salário mínimo vigente, no momento da concessão da bolsa. Atualmente, esse valor é equivalente a até R$ 706. Para receber auxílios, a renda precisa ser comprovada por meio do Sistema de Avaliação Socioeconômica (ASE).

As novas regras, segundo a Uerj, excluem 1,2 mil estudantes, que deixam de se enquadrar nas exigências para recebimento de bolsas.

Entre as razões pelas quais as regras foram modificadas está a falta de orçamento. Os estudantes pedem que a reitoria se empenhe em conseguir recursos e que priorize a assistência estudantil. “Nós não somos inimigos, mas a reitoria está nos tratando com se fôssemos.”