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Aterrorizadas, famílias libanesas fogem de bombardeios israelenses

Famílias do sul do Líbano entupiram as rodovias ao norte nesta segunda-feira, fugindo de um bombardeio israelense em expansão para um futuro incerto, com crianças amontoadas no colo dos pais, malas amarradas ao teto dos carros e fumaça escura atrás deles.

Inúmeros carros, vans e caminhonetes estavam carregados de pertences e pessoas, às vezes várias gerações em um veículo, enquanto outras famílias fugiam levando apenas o essencial, enquanto as bombas caíam do alto.

“Quando os ataques aconteceram pela manhã nas casas, peguei todos os documentos importantes e saímos. Havia ataques ao nosso redor. Foi aterrorizante”, disse Abed Afou, cujo vilarejo de Yater foi fortemente atingido na madrugada.

Israel e o grupo Hezbollah, do Líbano, têm trocado tiros através da fronteira desde o início da atual guerra em Gaza no ano passado, detonada após um ataque do Hamas, aliado do Hezbollah, mas Israel intensificou rapidamente sua campanha militar na última semana.

Nesta segunda-feira, quando o bombardeio se intensificou e passou a abranger mais áreas do Líbano, as pessoas receberam ligações telefônicas pré-gravadas em nome das Forças Armadas de Israel, dizendo-lhes para deixarem suas casas para sua própria segurança.

Afou, que permaneceu em Yater desde o início dos combates, apesar de estar a apenas cerca de 5 km da fronteira israelense, decidiu sair quando as explosões começaram a atingir casas residenciais no distrito.

“Eu estava com uma mão nas costas do meu filho, dizendo a ele para não ter medo”, disse. A família de Afou, com três filhos com idades entre 6 e 13 anos, e vários outros parentes, estavam agora presa na rodovia, enquanto o tráfego se arrastava para o norte.

Eles não sabem onde ficarão, disse ele, mas só queriam chegar a Beirute.

O Ministério da Saúde do Líbano disse que mais de 270 pessoas foram mortas no bombardeio e uma autoridade disse que foi o dia mais mortal do país desde o fim da guerra civil em 1990.

Israel disse ter atingido cerca de 800 alvos ligados ao Hezbollah e que os edifícios atingidos continham armas pertencentes ao grupo.

Alguns testemunharam a destruição de perto.

“A força e a intensidade dos bombardeios são algo que nunca testemunhamos antes em todas as guerras anteriores”, disse Abu Hassan Kahoul, a caminho de Beirute com sua família, após prédios serem destruídos perto do bloco de apartamentos onde mora.

“As crianças pequenas não sabem o que está acontecendo, mas há medo em seus olhos”, acrescentou.

Até mesmo em Beirute houve um alarme crescente, e os pais correram para tirar seus filhos das escolas, em meio a alertas de Israel sobre mais ataques.

Após asilo de opositor, Venezuela tenta normalizar relações externas

Após o o opositor Edmundo González conseguir asilo na Espanha, a Venezuela tenta normalizar as relações externas em meio à pressão contrária dos Estados Unidos (EUA), da Europa e de parte dos países latino-americanos.

Depois que González deixou a Venezuela, frustrando expectativas dos opositores com alguma reviravolta política, o país caribenho voltou a ser alvo de sanções econômicas unilaterais dos EUA. Além disso, o governo voltou a ser acusado de violações de direitos humanos durante os protestos pós-eleitorais, e a Assembleia na União Europeia (UE) reconheceu González como presidente da Venezuela.

Enquanto isso, uma operação policial prendeu mercenários acusados de articular o assassinato de Maduro, e foi divulgado documento em que o candidato González acata a decisão do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) que ratificou a reeleição do presidente na votação do dia 28 de julho.

Em meio a esses acontecimentos, o governo venezuelano tem buscado se fortalecer no cenário internacional por meio de aliados imunes à influência dos EUA e de negociações com representantes das Nações Unidas (ONU). Nesse sábado (21), o presidente Maduro se reuniu com Gianluca Rampolla del Tindaro, coordenador residente da ONU na Venezuela.

“Conversamos sobre importantes dados detalhados da conspiração que está sendo promovida desde o território estadunidense para provocar violência e ataques terroristas contra a Venezuela”, afirmou Maduro em uma rede social.

Na última sexta-feira (20), o governo venezuelano afirmou que Maduro e o secretário-geral da ONU, António Guterres, conversaram por telefone em um clima “amigável e fraternal” sobre as tentativas de desestabilizar politicamente o país.

“Ambos os dignatários coincidiram em apoiar as consultas com distintos setores políticos, sociais e econômicos que impulsiona o Governo Bolivariano olhando para o futuro e dissipando qualquer ameaça de desestabilização na Venezuela”, destacou o Ministério das Relações Exteriores da Venezuela.

Ao mesmo tempo, o chanceler venezuelano, Yvan Gil Pinto, tem divulgado agendas com diplomatas de países como Rússia, Guiné Bissau e Colômbia.

Para o professor de relações internacionais do Ibmec SP, Alexandre Pires, apesar do esforço do governo venezuelano, a situação é de maior isolamento internacional após saída de González. E, apesar do apoio de países como Rússia e China, a Venezuela continua dependente economicamente dos EUA.

“Ela tem aliados políticos, mas não tem aliados economicamente interessantes. Seus principais aliados econômicos sempre foram a América do Norte e a Europa Ocidental. Ela não vai ter como vender o seu gás ou petróleo, por exemplo, para a Rússia, que é um dos grandes produtores e exportadores mundiais. E, mesmo a demanda chinesa, ela é uma demanda por um tipo de combustível que não é um petróleo tão pesado igual ao da Venezuela”, ponderou.

Reconhecimento de González

Na semana passada, o governo venezuelano divulgou carta do candidato opositor Edmundo González admitindo que aceita a decisão do TSJ que ratificou a vitória de Maduro. Até então, Edmundo se negava a reconhecer a decisão e afirmava ter vencido as eleições de 28 de julho.

A carta assinada por Edmundo González foi entregue pelo opositor ao presidente da Assembleia da Venezuela, Jorge Rodríguez, e à vice-presidente da Venezuela, Delcy Rodríguez, em reunião na embaixada da Espanha, onde Edmundo estava hospedado.

Segundo o documento, González afirmou que, “ainda que não concorde [com a decisão do TSJ], a acato”. Após divulgação do texto, o opositor gravou vídeo informando que foi coagido a assinar a carta, o que foi negado pelas autoridades venezuelanas. Jorge Rodríguez divulgou fotos e áudios da reunião para mostrar que ela ocorreu em um ambiente sem pressão ou coação.

Operação contra mercenários

Poucos dias após a saída de Edmundo González, o governo venezuelano informou que prendeu mercenários da Espanha e da República Tcheca, além de um militar estadunidense, responsáveis por organizar uma tentativa de assassinato do presidente Nicolás Maduro. Foram apreendidos ainda 400 fuzis e pistolas que seriam usadas no crime.

O ministro do Interior da Venezuela, Diosdado Cabello, acusou as agências de inteligência dos EUA e da Espanha de estarem por trás do suposto plano de promover “atentados terroristas”. Os governos dos EUA e da Espanha negam qualquer operação violenta na Venezuela.

Sanções econômicas

A saída do opositor Edmundo González da Venezuela também foi marcada com a volta de sanções econômicas unilaterais dos EUA contra 16 autoridades do país sul-americano.

Foram sancionadas autoridades das forças de segurança do país, como o Serviço Bolivariano de Inteligência (Sebin), além de funcionários do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) e do TSJ, incluindo a presidente do Supremo, a ministra Caryslia Beatriz Rodriguez.

“O Departamento do Tesouro está mirando em autoridades-chave envolvidas nas alegações fraudulentas e ilegítimas de vitória de Maduro e sua repressão brutal à liberdade de expressão após a eleição”, disse o vice-secretário do Tesouro, Wally Adeyemo.

As sanções aplicadas após a saída de Edmundo González não afetam o setor petroleiro, apenas bloqueiam as propriedades em nome das autoridades diretamente afetadas. Desde 2017, a Venezuela sofre restrições para atuar no mercado financeiro global por conta das sanções. Entre 2018 e 2019, o setor petroleiro e da mineração também foram alvos de sanções unilaterais dos EUA.

Direitos humanos

Uma investigação independente de peritos ligados ao Conselho de Direitos Humanos da ONU voltou a acusar o governo Maduro de violação de direitos humanos por meio do uso da violência extrema contra manifestações, prisões arbitrárias e tortura.

Para o grupo, a situação representa uma continuidade de padrões anteriores que a comissão independente já havia condenado como possíveis crimes contra a humanidade.

Na última sexta-feira (21), o governo da Venezuela rejeitou o relatório da ONU em discurso no Conselho de Direitos Humanos da ONU. “Informe vulgar e panfletário, relatado por uma missão ilegítima, politizada e ideologizada, criada pelo cartel de governos do fracassado Grupo de Lima com único objetivo de cumprir ordens emanada de Washington”, afirmou o chanceler venezuelano, Yvan Gil Pinto.

Organizações de direitos humanos e alguns países têm denunciado uma repressão contra opositores na Venezuela após a contestação do resultado da eleição de 28 de julho com prisões em massa que chegam a 2 mil detidos.

Já as autoridades venezuelanas afirmam que a violência é promovida por grupos de extrema-direita inconformados com o resultado eleitoral. De acordo com o Ministério Público do país, grupos criminosos têm sido pagos para atacar prédios públicos e lideranças chavistas, levando à morte de mais de 20 pessoas e ferindo quase 100 agentes de segurança.

Líderes mundiais adotam pacto com 56 ações para o futuro do planeta

Líderes da maioria dos países reunidos na Cúpula do Futuro, da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, nos Estados Unidos, assinaram um documento com 56 ações para o futuro do planeta, neste domingo (22). De acordo com a ONU, o documento foi adotado por consenso, com apenas sete países resistindo à aprovação do Pacto para o Futuro, entre eles a Rússia.

Entre as medidas previstas no pacto estão agir de forma ambiciosa, acelerada e justa para implementar a Agenda 2030 e atingir os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, “não deixando ninguém para trás”. A erradicação da pobreza está colocada no centro desses esforços, segundo o Pacto.

Também estão previstos a erradicação da fome, a proteção de civis em conflitos armados, a busca por soluções pacíficas para conflitos, o combate a ilícitos transnacionais, o avanço no sentido de um mundo livre de armas nucleares, a proteção aos conhecimentos tradicionais e a transformação do sistema de governança global.

Em relação à reforma do Conselho de Segurança da ONU, há um compromisso em ampliar o número de membros e melhorar a representatividade de nações da América Latina, Ásia-Pacífico e África. “Intensificaremos os nossos esforços no quadro das negociações intergovernamentais sobre a reforma do Conselho de Segurança, como uma questão prioritária e sem demora”, destaca o documento, entre suas ações.

Outra ação do documento é a reforma da arquitetura de financiamento internacional. “Vamos acelerar a reforma da arquitetura do sistema financeiro para que ela possa atender ao desafio urgente das mudanças climáticas”.

O fortalecimento de ações para combater as mudanças climáticas, aliás, é outra das ações previstas no Plano. “Estamos profundamente preocupados com o atual ritmo lento de progresso no combate às mudanças climáticas. Estamos igualmente profundamente preocupados com o crescimento contínuo das emissões de gases de efeito estufa e reconhecemos a importância dos meios de implementação e apoio aos países em desenvolvimento, e a crescente frequência, intensidade e escala dos impactos adversos das mudanças climáticas, em particular nos países em desenvolvimento, especialmente aqueles que são particularmente vulneráveis aos efeitos adversos das mudanças climáticas”, diz o texto.

Leia o texto em espanhol ou em inglês.

Brasil condena explosões de aparelhos eletrônicos no Líbano

O governo brasileiro condenou nesta terça-feira (17) a série de explosões coordenadas e simultâneas de centenas de aparelhos eletrônicos de comunicação no Líbano (pagers), que resultaram na morte de ao menos nove pessoas, incluindo uma menor de idade, além de centenas de feridos na manhã de hoje. Não há registro de brasileiros entre as vítimas. 

“Tais atos conduzem a escalada significativa de tensões na região e exacerbam o risco de alastramento do conflito. Demonstram, também, que, lamentavelmente, têm sido inócuos os múltiplos apelos da comunidade internacional para que atores no Oriente Médio exerçam máxima contenção”, disse, em nota, o Ministério das Relações Exteriores. A embaixada do Brasil em Beirute informa que está prestando as orientações à comunidade brasileira. 

O Brasil também reiterou o caráter imperativo do pleno respeito à soberania e à integridade territorial dos países.

Os pagers são dispositivos eletrônicos usados para contactar pessoas através de uma rede de telecomunicações. O Hezbollah acusou Israel pela ação, dizendo que o país receberá “a punição que merece”.

Equador determina série de cortes de energia por causa de seca severa

 O Equador implementará uma série de cortes de energia noturnos de oito horas em todo o país na próxima semana, anunciou o governo nessa segunda-feira (16), citando a grave seca que fez com que os níveis dos reservatórios despencassem, afetando as usinas hidrelétricas.

O Equador está passando por uma crise de energia, que o governo atribui à falta de manutenção das represas existentes e de contratos para garantir nova geração, além da pior seca do país nos últimos 61 anos.

Os cortes de energia começarão na próxima segunda-feira (23) a partir das 22h (horário local) e durarão até as 6h do dia seguinte, segundo publicação do governo no X. A medida será repetida na terça, quarta e quinta-feira, acrescentou.

Não ficou claro por quantas semanas os cortes de energia serão implementados.

“O cronograma de corte estabelecido foi escolhido com o objetivo de gerar o menor impacto possível sobre as atividades produtivas e o desenvolvimento de dias úteis”, informa a mensagem.

A medida se soma a um corte de energia programado para esta quarta-feira (18), destinado à manutenção preventiva em todas as instalações de transmissão e redes de distribuição em todo o país.

O governo tomou várias medidas para enfrentar a crise, acrescenta o comunicado, incluindo a contratação de um navio gerador, a tentativa de construir geradores permanentes em terra e a melhoria da infraestrutura abandonada, entre outras.

O Equador precisa de mais 1.000 megawatts — ou um gigawatt — de energia para atender à demanda nacional, segundo as autoridades.

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Zelensky anuncia volta de 49 prisioneiros detidos pela Rússia

O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, anunciou nesta sexta-feira (13) o regresso à Ucrânia de 49 prisioneiros de guerra detidos pela Rússia, incluindo antigos combatentes da Azovstal, a siderúrgica sitiada pelo Exército russo em Mariupol (sudeste) na primavera de 2022.

“Quarenta e nove ucranianos [militares e civis] regressaram à casa”, declarou o chefe de Estado ucraniano na rede social Telegram, acompanhando a mensagem com fotografias dos soldados, incluindo mulheres, envoltos em bandeiras ucranianas azuis e amarelas, já em território da Ucrânia.

“Obrigado a toda a nossa equipe, que consegue libertar prisioneiros e reféns do cativeiro russo”, disse Zelensky na mensagem, referindo-se aos civis capturados pelas forças russas nos territórios ocupados que, por vezes, entram nessas trocas de soldados entre Kiev e Moscou.

O chefe de Estado não especificou se essa libertação é resultado de uma troca de prisioneiros com a Rússia, mas tudo indica que se trata de nova iniciativa do gênero, embora Moscou nada tenha informado a esse respeito.

Zelensky agradeceu também às unidades do Exército ucraniano que capturam soldados russos pelo papel na viabilização dessas trocas, aumentando o número de prisioneiros inimigos a serem trocados nesses processos.

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Lideranças negras destacam atuação política de Leci Brandão

Carioca de Madureira, Leci foi a segunda mulher negra a ser eleita deputada estadual em São Paulo. Atualmente está em seu quarto mandato consecutivo na Assembleia Legislativa do Estado (Alesp), onde ingressou em 2010, filiada ao PCdoB.

Na casa legislativa atuou nas comissões de Defesa dos Direitos das Mulheres, de Direitos Humanos e foi vice-presidente da Comissão de Educação e Cultura. Apresentou mais de 100 projetos, 60 dos quais se tornaram leis, a maioria em temas ligados à promoção da igualdade racial, à cultura popular e à defesa das tradições de matriz africana. Hoje exerce também o cargo de Ouvidora da Alesp.

Nesse processo tem apoiado e ajudado a dar destaque a lideranças diversas, no samba, nas religiões de matriz afro, no hip hop e na participação das comunidades de periferias, mas também em organizações não governamentais que constroem a política além dos espaços legislativos, valorizando e qualificando a participação democrática.

Em homenagem aos 80 anos de Leci Brandão, celebrados nesta quinta-feira (12), a Agência Brasil ouviu três lideranças, três mulheres negras, que contaram seus relatos sobre a importância do legado político da artista. Confira:

Nilza Iraci, coordenadora executiva do Instituto Geledés

O papel de Leci na política não se trata apenas do que ela construiu na política institucional, pois ela inaugurou, em sua música, o debate em torno de diversos tabus. Ela cantou – enquanto no mundo ainda havia o Apartheid –, músicas sobre dignidade, sobre cotidiano, que marcaram gerações de mulheres negras. É um enorme desafio falar dessa figura extraordinária, filha deste implacável e não menos generoso orisá, Ogum, e o desafio real é não cair no lugar comum e de clichês da fã para a artista.

Ao pensar nas duas Lecis – a mãe [dona Lecy] e a filha, com y e com i –, nos envolvemos nesse universo abrangente das relações que nos constroem com seus valores, afetividades, e, até por que não, com as nossas singularidades e imperfeições. Temos que romper o mito das guerreiras e ressaltar o papel incrível dessas mulheres negras na nossa formação. Com amor, com respeito e sem o peso que determinadas fantasias nos impõem.

O ponto de inflexão na trajetória da Leci e de tantas de nós, mulheres negras, é que não se trata de um modelo de superação – aliás nem gosto dessa palavra quando associada a nós e à nossa gente. Nunca foi sorte, né Leci? Ogunhê! O que quero ressaltar, é que  essa mistura de coragem, ousadia e uma boa dose de brabeza de nossas ancestrais, nos trouxeram até aqui hoje, belas, orgulhosas e potentes.

Sua arte, o seu canto, como instrumento de libertação, nos salvou em momentos muito singulares. Estava presente quando gravou Ombro Amigo, desnudando o preconceito e a solidão contra a comunidade LGBTQIA+, em um momento [que o tema era] tabu. Quando cantou Talento de Verdade e nos resgatou, a todas, do jogo perverso da mulatice misógina e racista, escancarada.

Lembro do show de 40 anos no Ibirapuera em SP, épico, em que Leci, assim como o Zé do Caroço, anunciava novos tempos. Se desenhava ali, um novo desafio para Leci: o da deputada. E o seu novo palco: o político.

Aliás, política essa que já estava fazendo por todas nós na cultura e nas artes. Tornou-se nossa porta-voz, muito nos orgulhando e fazendo aquele mundo branco, cis, hétero, datado e ultrapassado, entender como a arte do samba, essa maestria da cultura popular negra, nos transforma até hoje.

Segue sendo esse legado de esperança que se realiza na defesa da arte, da juventude, de nós mulheres negras, enfim das populações, onde insistem em confundir direitos com meritocracia. A voz e as ações de Leci no parlamento têm feito a diferença para todas nós e nossas comunidades.

Em março de 2023, Leci Brandão (PCdoB) toma posse para seu quarto mandato como deputada na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo – Fernando Frazão/Agência Brasil

Lúcia Xavier, coordenadora geral do Criola, organização de mulheres negras

Leci vem, em sua trajetória, construindo a participação através de uma organicidade de movimentos sociais suprapartidária. Ela é um exemplo de mulher negra que constrói, há muito tempo, mecanismos de participação política para garantir direitos, se inserindo em espaços fechados para as mulheres, abrindo caminhos.

Ela traz uma pauta consistente sobre quais são as legislações que podem sustentar políticas públicas para a população negra em São Paulo, que não é pequena e é muito representativa para a população negra no Brasil, como um todo.

No caminho contrário, traz uma linguagem que não é muito comum na área da cultura, que é essa linguagem do Legislativo, e com isso constrói a articulação da comunidade com o Legislativo. Além disso, não há nenhum debate nacional no qual ela não esteja presente, em relação às questões raciais – como cotas, como saúde da população negra e da periferia e, especialmente, em relação ao racismo religioso, tema relacionado diretamente às dinâmicas de negação da cultura negra a partir da agressão aos espaços de religião, o que caminha muito próximo e tem em Leci uma liderança importante.

Em relação a seu legado, a juventude vê na sua presença inspiração, chegando aos 80 anos como uma pessoa muito importante para o movimento e suas pautas, junto com outras mulheres, entre as quais destaco Benedita da Silva que, como ela, tem um importante histórico na política partidária e representativa.

Ambas aceleram esse processo de chegada de representantes das novas gerações ligadas às pautas indenitárias e às pautas do movimento negro, aos espaços de poder e resolução. Elas são duas mulheres que possuem trajetórias diferentes, mas que trazem essa questão do enfrentamento às barreiras como algo que não é intransponível, e um legado ancestral do qual são defensoras e estão dispostas a passar adiante.

Isso é muito significativo e se constitui como um legado que ajuda a consolidar trajetórias como a de Marielle Franco e outras mulheres que estão chegando recentemente no campo da política.

Entre suas pautas, na saúde, tem uma estreita relação com as mulheres negras, assim como percepção singular das ferramentas que precisam para ampliar seus direitos e melhorar suas vidas. Sua representatividade faz com que tenha pautas muito assertivas em relação às necessidades dessas populações, com mulheres e suas comunidades. Fala também para diferentes grupos populacionais, como as mulheres negras encarceradas, trabalhadoras e mães.

Jurema Werneck, ativista e diretora-executiva da Anistia Internacional no Brasil

Para falarmos sobre a importância política de Leci temos de dar conta de diferentes camadas da importância dela nesse campo.

Leci está, desde a década de 1960, em público. O surgimento dela na esfera pública se dá em um programa de televisão [A Grande Chance, de Flávio Cavalcante, na TV Tupi]. Aquela figura, a presença dela na televisão como uma vencedora, uma menina negra, franzina, aquilo já tem uma presença política, na minha infância (eu então uma menina negra) muito importante.

A representação e validação de ver ela lá, tão franzina e vencedora, o que isso coloca é muito potente, desse sujeito que a sociedade recusa, mas que se destaca. Isso já tem uma importância política gigantesca.

Ela é vencedora também na construção do processo de uma carreira artística. Lança o foco da comunidade negra, não apenas retratando o cotidiano dessa comunidade, de todos os seus personagens, mas fala de aspectos mais amplos, como dos direitos das trabalhadoras e trabalhadores, dos diferentes trabalhadores, de sem-terra, de professores, e também de mulheres e de comunidades.

É mais do que uma validação, a presença cultural ela prescreve, ela diz que essa postura é um caminho mais do que válido, necessário.

Leci é uma das primeiras também a falar da pauta LGBT, quando essa sigla nem existia. Ela é realmente grande. Foi também a primeira mulher a ser oficialmente compositora. No cotidiano, nas escolas e rodas, a gente sabe que outras já o faziam, há tempo, mas ela teve registro, teve lá a carteirinha, em uma escola de grande repercussão, que é a Mangueira (em 1972).

Ela sempre se juntou, sempre apoiou as causas sociais. Ela sempre esteve também ao lado das organizações e movimentos. E com tudo isso também aceita concorrer ao parlamento e constrói uma história que só vem crescendo. Precisa ser celebrada, por todas essas camadas.

Nesse caminho ela não quebra arquétipos, rompe estereótipos. Não se imagina que uma mulher negra, lésbica, macumbeira é também parlamentar, compositora, artista. Ela afirma também arquétipos, ela é uma mulher de Ogum, guerreira, que lidera. Como essa mulher negra, lésbica, da periferia carioca, se esperava que fosse lá para trás, que estivesse escondida, mas não, é liderança.

Em relação a seu legado e em relação a como abre caminho, a performance musical dela, o canto e o ritmo, isso já aproxima, já fala com essas novas gerações. Elas já são herdeiras desse tempo em que essa figura faz sentido. Esse é o legado, ela é parte dessa coisa. Diante das novas gerações não há estranhamento em relação ao que ela representa. Ela existe, e com isso torna natural um coletivo de gente que surge e é inconformista.

Outra coisa interessante sobre Leci é que já faz muito tempo ela toca o tambor, o que em muitas casas religiosas é papel de homem. Mesmo nas escolas é uma presença que não tem a proporção necessária, nas baterias, de mulheres. As novas gerações tem isso de forma diferente, como um caminho já aberto, naturalizado por pessoas como ela.

Quando pensamos o papel de Leci na representação política, a própria representação é isso, é trazer para dentro a expressão de um grupo. Ela traz as comunidades negras, os baluartes, o povo de santo. Ela representa essa gente, ela traz para dentro, como presença, e é farol (para as novas gerações, na política), não apenas enunciando o problema, mas caminhando ao lado de outros protagonistas.

Dou o exemplo dos rappers. Ela se juntou a eles, se juntou a gente bem mais jovem que ela, mostrando que é desse jeito que é importante fazer: abrindo espaço para outros protagonistas, os mais afetados pelo problema.

Essa é uma fórmula fundamental. Nos espaços institucionais há sempre salvadores da pátria, enquanto ela partilha luta e trajetória.

Essas pessoas como Leci trazem temas como os que trabalhamos na Anistia [Internacional] desde muito antes de os trabalharmos, como o próprio tema da violência contra os negros nas periferias. Ela ajudou a pautar e legitimar esse tema (da violência), e ela é uma voz muito maior. A legitimidade dessas vozes ajuda a dar o peso que o Brasil precisa dar para esse tema, chegando além de onde as falas de instituições como a Anistia chegam.

Tem uma dimensão fundamental, ainda, na trajetória dela que é a da generosidade. Os políticos profissionais vão cada vez mais voltados para seus interesses particulares. O exemplo dela é fundamental na dimensão do serviço público e para o público. Ela tinha uma carreira de sucesso e foi para a carreira política para somar para uma causa de interesse público, vivendo sua carreira só nos finais de semana, e com isso é exemplo para os outros políticos profissionais.

Rio inunda capital do Vietnã e mortos por tufão chegam a 179

Milhares de pessoas que viviam perto do Rio Vermelho, em Hanói, no Vietnã, foram retiradas de suas casas devido às cheias do rio, que atingiu o nível mais alto em 20 anos. Ruas ficaram inundadas com a passagem do Tufão Yagi que afetou o norte do país, matando pelo menos 179 pessoas.

Tufão mais poderoso da Ásia neste ano, o Yagi levou vendavais e chuvas fortes à medida que se deslocava para o oeste, depois de atingir a terra firme no sábado (7), causando a queda de uma ponte nesta semana, enquanto atravessava as províncias ao longo do Rio Vermelho, o maior da região.

“Minha casa agora faz parte do rio”, disse Nguyen Van Hung, 56 anos, que mora em um bairro às margens do Rio Vermelho.

Em todo o país, o tufão e os deslizamentos de terra e inundações mataram 179 pessoas e 145 estão desaparecidas, segundo estimativas do governo.

A empresa estatal de energia elétrica do Vietnã (EVN) informou que cortou a energia de algumas partes inundadas da capital devido a preocupações com a segurança.

Mai Van Khiem, diretor do Centro Nacional de Previsão Hidrometeorológica, afirmou em comunicado que o Rio Vermelho está em seu nível mais alto em duas décadas e que mais chuvas são esperadas para os próximos dois dias.

Algumas escolas de Hanói pediram aos alunos que ficassem em casa pelo resto da semana, enquanto milhares de moradores de áreas baixas foram retirados, informaram o governo e a mídia estatal.

Mais perto do centro da cidade, a instituição de caridade Blue Dragon Children’s Foundation esvaziou seu escritório nessa terça-feira, depois que as autoridades alertaram sobre os riscos de inundação.

“As pessoas estavam se movendo freneticamente, pegando suas motos, realocando itens”, disse a porta-voz Carlota Torres Lliro, expressando preocupação com dezenas de crianças e famílias que vivem em casas improvisadas à beira do rio.

As autoridades vietnamitas também manifestaram preocupação na quarta-feira sobre as usinas hidrelétricas chinesas que liberam água em outro afluente do Rio Vermelho, o Lo, conhecido na China como Panlongjiang. Segundo Pequim, os dois países estavam cooperando na prevenção de enchentes.

O Yagi causou estragos em muitas fábricas e inundou depósitos em centros industriais costeiros voltados para a exportação, a leste de Hanói, forçando o fechamento de fábricas. Algumas só devem retomar as operações completas depois de semanas, de acordo com executivos.

As interrupções ameaçam as cadeias de suprimentos globais, uma vez que o Vietnã abriga grandes operações de multinacionais que enviam produtos principalmente para Estados Unidos, a Europa e outros países desenvolvidos.

(Reportagem adicional de Phuong Nguyen, Minh Nguyen e Thinh Nguyen)

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Senado do México aprova reforma judicial em vitória de López Obrador

O Senado do México aprovou no início desta quarta-feira (11) uma reforma judicial abrangente que vai alterar o Judiciário do país, com eleição de juízes por voto popular – uma transformação profunda que os críticos temem que possa ameaçar o Estado de Direito e prejudicar a economia.

Em uma sessão que durou mais de 12 horas e teve de ser interrompida e deslocada para outro lugar quando manifestantes invadiram o prédio do Senado, o partido governista Morena e seus aliados obtiveram os dois terços de votos necessários para aprovar a reforma. A aprovação provocou protestos, uma greve de funcionários do Judiciário e volatilidade no mercado financeiro.

O placar da votação ficou em 86 votos favoráveis e 41 contrários e foi aplaudido pelos senadores governistas. A reforma entrará em vigor assim que for publicada no diário oficial do México.

A aprovação ocorreu após um debate tenso e um grande drama político, já que a coalizão governista começou a terça-feira com uma cadeira a menos do que a maioria necessária para aprovar a reforma constitucional.

Mas um legislador da oposição rompeu as fileiras de seu partido para votar a favor do projeto de lei, enquanto outro estava ausente em meio a alegações de que havia sido detido para impedi-lo de votar.

O Morena negou qualquer irregularidade.

“É um dia triste para o nosso México”, disse o senador Alejandro Moreno, presidente do partido de oposição PRI. A reforma “foi aprovada no Senado por meio dos piores truques e sob pressões e coerções inimagináveis”.

A reforma é uma grande vitória para o presidente Andrés Manuel López Obrador, que está deixando o cargo e a considera vital para restaurar a integridade do Judiciário mexicano e garantir que ele atenda ao povo e não aos interesses da elite e dos criminosos.

Os críticos, no entanto, temem que ela coloque uma concentração alarmante de poder nas mãos do Morena.

Repercussão

Os principais parceiros comerciais do México, os Estados Unidos e o Canadá, alertaram que a reforma poderia prejudicar o pacto comercial entre os três países e impactar negativamente os investimentos.

A reforma também assustou os mercados, com o peso mexicano perdendo cerca de 17% de seu valor desde as eleições presidenciais de 2 de junho, que viram o Morena vencer de forma esmagadora.

Enquanto os senadores discutiam a reforma na terça-feira, manifestantes invadiram o prédio do Senado agitando bandeiras mexicanas e gritando “traidores”, forçando a sessão a ser interrompida e transferida para outro local.

A espinha dorsal da reforma constitucional, que a câmara baixa aprovou na semana passada, exige a eleição por voto popular de mais de 6,5 mil juízes e magistrados, incluindo para a Suprema Corte.

A reforma também reduz o número de juízes da Suprema Corte de 11 para 9, diminui a duração de seus mandatos para 12 anos, elimina a exigência de idade mínima de 35 anos e reduz pela metade, de 10 para 5 anos, a experiência profissional necessária para o cargo.

A futura presidente do México, Claudia Sheinbaum, que assume o cargo em 2 de outubro, terá a tarefa de administrar as consequências da reforma, que corre o risco de dominar os primeiros meses de seu mandato.

*Reportagem adicional de Natalia Siniawski

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Austrália processa rede social X em casos de abuso sexual infantil

A atuação da rede social X em relação a casos de exploração sexual infantil e de aliciamentos de crianças e adolescentes por meio da plataforma que substituiu o antigo Twitter é tema de audiências na Justiça Federal da Austrália nesta semana.

O caso foi parar nos tribunais devido à fiscalização da Comissão de Segurança Eletrônica (eSafety) da Austrália – órgão responsável por regular o ambiente online no país da Oceania. 

“Nos três meses após a mudança de propriedade do Twitter/X em outubro de 2022 [quando o empresário Elon Musk comprou a rede social], a detecção proativa de material de exploração sexual infantil caiu de 90% para 75%”, diz a investigação da Comissão australiana

A rede social controlada pelo empresário Elon Musk foi multada, em setembro de 2023, em US$ 610 mil por não responder a notificações da instituição australiana em relação a como a plataforma combate o abuso sexual infantil na internet.

Após recorrer da decisão, a rede social X argumentou, na audiência da Justiça nessa segunda-feira (9), que não respondeu aos questionamentos porque a notificação, feita em fevereiro de 2023, foi dirigida ao antigo Twitter que, em março de 2023, se transformou em X. A mudança na composição da companhia foi a justificativa dos advogados para não responderem aos questionamentos da Comissão eSafety.  

Elon Musk, – REUTERS/David Swanson/Proibida reprodução

Devido ao comportamento da companhia, um processo específico foi aberto apenas contra a X em dezembro de 2023. “O que estamos falando aqui são crimes graves acontecendo nessas plataformas, cometidos por adultos predadores contra crianças inocentes, e a comunidade espera que todas as empresas de tecnologia tomem medidas significativas”, disse Julie Inman Grant, chefe da eSafaty.

A Comissão afirmou que enviou questionamentos a diversas plataformas. Além da X, foram notificados o Google, o Tiktok, a Meta (dona do Facebook, Instagram e Whatsapp), entre outros. O eSafery exigiu respostas de como as empresas detectam e combatem conteúdos de abuso sexual infantil e de aliciamento de menores na internet.

De acordo com Julie Inman Grant, a rede X e o Google não responderam corretamente uma série de perguntas que foram formuladas.

“A não conformidade do Twitter/X foi considerada mais séria, com a empresa falhando em fornecer qualquer resposta a algumas perguntas, deixando algumas seções inteiramente em branco. Em outros casos, o Twitter/X forneceu uma resposta que estava incompleta e/ou imprecisa”, informou a eSafaty.

A Comissão de Segurança Eletrônica da Austrália acrescentou que a rede social X não disse quanto tempo a plataforma leva para responder a denúncias de exploração sexual infantil; nem quais medidas implementou para detectar esse tipo de crime em transmissões ao vivo; nem quais ferramentas e tecnologias usam para encontrar materiais de exploração sexual infantil.

Atritos no mundo

Desde que o multibilionário Elon Musk comprou o antigo Twitter, ele tem colecionado atritos com autoridades ao redor do mundo. A rede social X é investigada na União Europeia (UE) por supostamente violar as leis digitais do bloco.

No Brasil, a plataforma foi suspensa por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) depois que a empresa se negou a suspender contas e perfis envolvidos na investigação das milícias digitais, que apura supostas organizações criminosas que atuam nas redes para atacar autoridades e o sistema eleitoral brasileiro.

No Brasil, como na Austrália e na UE, o bilionário Elon Musk acusa as autoridades de praticarem censura. Por outro lado, em países como Índia e Turquia, contas e perfis são suspensos a pedido de autoridades sem que o empresário ataque essas decisões judiciais.