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Restabelecimento de energia em novembro foi bem-sucedido, diz Enel-SP

Em depoimento nesta quinta-feira (22), na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara dos Vereadores de São Paulo, o presidente da Enel em São Paulo, Max Xavier Lins, disse que o restabelecimento de energia após o apagão ocorrido em novembro do ano passado foi “tecnicamente bem-sucedido”. A Enel é a concessionária de energia que atende a capital paulista e mais 23 municípios da região metropolitana.

É preciso desmistificar os fatos das narrativas, diz o presidente da Enel, Max Lins – Rovena Rosa/Arquivo/Agência Brasil

“A gente precisa desmistificar os fatos das narrativas. Evidentemente, teve, sim, uma quantidade pequena de consumidores [que ficaram dias sem energia). A gente entende o transtorno para esse cidadão. Mas, tecnicamente, foi uma operação bem-sucedida de restabelecimento”, disse Lins.

No dia 3 de novembro do ano passado, 2,1 milhões de clientes da Enel ficaram sem energia elétrica na região metropolitana de São Paulo. Houve casos em que residências e estabelecimentos comerciais ficaram sem luz por dias.

Por causa disso, em fevereiro deste ano, a Enel foi multada em R$ 165,8 milhões pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Segundo o auto de infração feito pela Aneel, a empresa não prestou serviços de forma adequada. A companhia só acionou significativamente as equipes de manutenção – próprias e terceirizadas – em 6 de novembro, três dias após o temporal que derrubou árvores e comprometeu o abastecimento de energia em diversas áreas da capital paulista e dos arredores.

No depoimento de hoje, o presidente da Enel confirmou que houve pessoas que ficaram muitos dias sem energia elétrica, mas ressaltou que a resposta da empresa ao apagão foi “um esforço sobre-humano”. De acordo com Lins, o que ocorreu no dia 3 de novembro na capital e na região metropolitana foi “um evento climático extremo”, acima do que estava previsto.

“A curva do restabelecimento [de energia] pode parecer longa para quem ficou quatro ou cinco dias sem energia. Mas, para o tamanho da dimensão [do evento climático], eu diria que a recuperação, tecnicamente falando, foi um esforço sobre-humano para conseguir isso. Poucas distribuidoras do Brasil teriam conseguido o tempo de restabelecimento que foi obtido”, disse ele. Segundo Lins, em até 24 horas, 1,2 milhão de clientes estavam com a energia restabelecida e, no prazo de 72 horas, 97% da energia estava de volta em toda a região metropolitana de São Paulo.

Em janeiro deste ano, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, recorreu ao Tribunal de Contas da União (TCU) para solicitar uma fiscalização mais rigorosa sobre o serviço prestado pela empresa. O prefeito também pediu a rescisão do contrato com a concessionária. Antes disso, a prefeitura havia entrado com ação na Justiça de São Paulo para pedir à Enel que apresentasse um plano de contingência e um cronograma preventivo para o período de chuvas.

A Change.org, maior plataforma de abaixo-assinados do mundo, informou nesta semana que as interrupções do fornecimento de energia elétrica em São Paulo fizeram disparar o número de reclamações contra a Enel. A maior parte diz respeito à falta de energia e pede que a empresa faça o enterramento da fiação elétrica. “Isso aponta como este se tornou um problema crônico na cidade”, disse a diretora da Change.org Brasil, Monica Souza.

Para ministro, prisão de motoboy no RS foi racismo institucionalizado

O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, criticou, neste domingo (18), a Brigada Militar de Porto Alegre, que foi acionada por um motoboy negro, após ele ser vítima de tentativa de homicídio por parte de um homem branco, ontem. Em sua conta na rede social X, o ministro afirmou que se trata de uma faceta do racismo institucionalizado ainda presente no país.

“O caso do trabalhador negro, no Rio Grande do Sul, que tendo sido vítima de agressão acabou sendo tratado como criminoso pelos policiais que atenderam a ocorrência, demostra, mais uma vez, a forma como o racismo perverte as instituições e, por consequência, seus agentes”, escreveu. 

“É preciso que as instituições passem a analisar de forma crítica o seu modo de funcionamento e aceitar que em uma sociedade em que o racismo é estrutural, medidas consistentes e constantes no campo da formação e das práticas de governança antirracista devem ser adotadas. Em outras palavras, é preciso aceitar críticas e passar a adotar medidas sérias de combate ao racismo em nível institucional”, acrescentou.

O ministro destacou, ainda, nas postagens, que sua pasta e a comandada por Anielle Franco, da Igualdade Racial, vão entrar em contato com as autoridades locais para acompanhar o caso e “ajudar na construção de políticas de maior alcance”, indicando que podem buscar promover uma campanha de abrangência nacional, com esse propósito. A ministra Anielle Franco também se pronunciou sobre o caso, que gerou grande repercussão nas redes sociais. 

Aqui em POA, o preconceito racial produz cenas revoltantes como essa.

O homem negro, agredido pelo senhor branco e sem camisa, denunciou o caso para os policiais. Mas, no meio da situação, foi preso por “resistência”.

Sei como é, até por que já ocorreu comigo. É um absurdo,… pic.twitter.com/b4XRA7Pgpm

— Matheus Gomes (@matheuspggomes) February 17, 2024

Alguns dos usuários da rede X recuperaram um meme que relaciona a cor da pele da pessoa abordada pela polícia com o tratamento dispensado pelos agentes da corporação. A ferramenta digital já se tornou uma referência no contexto de denúncias de arbitrariedades e truculência praticadas contra pessoas racializadas, pois ilustra o fato de que, quanto mais escura é a pele, maior o grau de violência dos policiais.

“Recebemos com indignação as imagens da abordagem policial no Rio Grande do Sul, onde um motoboy denunciou uma tentativa de homicídio e foi ele, o denunciante, quem saiu algemado, enquanto o homem que teria cometido a agressão dialogava com os agentes, sorrindo. As imagens causaram revolta, com razão, pelos indícios de racismo institucional”, escreveu a ministra. 

Diante do ocorrido, o Sindicato dos Motociclistas Profissionais do Rio Grande do Sul convocou uma manifestação para a tarde de hoje. A concentração está marcada para ocorrer às 15h, na Rua Oswaldo Aranha, na capital gaúcha. No material de divulgação, os organizadores do ato reafirmam o caráter pacífico do protesto e pedem a igualdade de todos os cidadãos.

Em 2023, pesquisa do Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec) demonstrou que nove em cada dez brasileiros (96%) identificam as pessoas pretas como as que mais sofrem racismo no país . Em segundo e terceiro lugares, foram citados os indígenas e os imigrantes africanos, respectivamente, com 57% e 38%. Ao todo, 88% dos entrevistados pelo levantamento, elaborado sob encomenda do Instituto de Referência Negra Peregum e do Projeto Seta (Sistema de Educação por uma Transformação Antirracista), afirmaram concordar que essa parcela da população é mais criminalizada do que os brancos.

Ouça na Radioagência Nacional:

PF prende foragido que foi condenado pela Chacina de Unaí

A Polícia Federal prendeu na madrugada desta terça-feira (13) Hugo Pimenta, condenado pela Chacina de Unaí (MG). O homem, que estava foragido há cinco meses, foi preso em Campo Grande (MS).

Ele foi condenado a 96 anos de prisão por participação no assassinato de auditores fiscais do Trabalho e de um motorista em janeiro de 2004, mas teve a pena reduzida após firmar acordo de delação. Em 2015, durante o julgamento, ele admitiu ter participado do crime. 

De acordo com nota da PF, o criminoso estava com um passaporte falso. 

Em setembro do ano passado, o Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), em Belo Horizonte, determinou a prisão imediata dos mandantes da chacina – os fazendeiros Antério Mânica, que foi prefeito de Unaí, e Norberto Mânica – e de mais dois condenados por terem intermediado a chacina, entre eles Hugo Pimenta. 

 Antério Mânica entregou-se à Polícia Federal em Brasília após 19 anos do crime. Norberto Mânica é considerado foragido.

Relembre o caso 

Em 28 de janeiro de 2004, os auditores fiscais do Trabalho Erastóstenes de Almeida Gonçalves, João Batista Soares e Nelson José da Silva e o motorista Ailton Pereira de Oliveira foram assassinados à queima-roupa em uma emboscada na zona rural de Unaí, cidade no noroeste de Minas Gerais. Eles investigavam denúncias de trabalho análogo à escravidão. O episódio ficou conhecido como Chacina de Unaí.

As investigações apontaram os fazendeiros Antério e Norberto Mânica como mandantes do crime. Os irmãos foram condenados a 100 anos de prisão, mas recorreram em liberdade por serem réus primários.

José Alberto de Castro e Hugo Pimenta foram condenados por terem contratado os atiradores.

Os únicos que cumpriam pena até o momento eram os três pistoleiros, Erinaldo Vasconcelos, Rogério Allan e William Miranda. Presos desde 2004, eles foram condenados em 2013.

Em janeiro deste ano, os crimes completaram 20 anos. A chacina foi o marco para a criação do Dia Nacional do Combate ao Trabalho Escravo.

 

>> Veja reportagem da TV Brasil 

* Com informações da TV Brasil

Janeiro de 2024 foi o janeiro mais quente já registado na História

13 de fevereiro de 2024

 

Janeiro de 2024 foi o janeiro mais quente já registado a nível mundial, com uma temperatura média de 13,14°C, 0,70°C acima da média de janeiro de 1991-2020 e 0,12°C acima da temperatura do janeiro mais quente anterior, em 2020. Os dados são do Copernicus ECMWF, que ainda apontou que janeiro também foi o oitavo mês consecutivo mais quente já registrado para o respectivo mês do ano.

A temperatura média global dos últimos doze meses (fevereiro de 2023 a janeiro de 2024) também foi a mais alta já registrada, 0,64°C acima da média de 1991-2020 e 1,52°C acima da média pré-industrial de 1850-1900. Janeio foi 1,66°C mais quente do que uma estimativa da média de janeiro entre 1850-1900, o período de referência pré-industrial designado.

“Reduções rápidas nas emissões de gases com efeito de estufa são a única forma de travar o aumento da temperatura global”, opinou Samantha Burgess, Diretora Adjunta do Serviço Copernicus para as Alterações Climáticas (C3S).

“A necessidade de ações para conter a mudança climática nunca foi tão clara”, escreveram meteorologistas da UN Climate Change em seu Twitter X ao analisar os dados.

 
 

SP: carnaval na rua como ativo cultural foi chave para festa explodir

O Carnaval de rua de São Paulo tem crescido exponencialmente nos últimos anos. A festa popular, que contava com menos de 50 blocos em 2013, passou a ter mais de 500 cordões cadastrados em 2024 e deverá atrair 15 milhões de pessoas, segundo a prefeitura. 

Segundo o pesquisador Guilherme Varella, o aumento excepcional dos foliões nas ruas paulistanas passou a ocorrer quando a festa foi desburocratizada e vista, pela administração municipal, como um ativo cultural da cidade. “O carnaval de rua é a forma mais radical de ocupação cultural da cidade”, destaca Varella que é professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA). 

O pesquisador foi um dos responsáveis, na gestão de Fernando Haddad na prefeitura de São Paulo (2013 a 2016), pela implantação da política municipal que deu vazão à demanda reprimida dos foliões de ocuparem as ruas da capital paulista. 

“[Antes de 2013] os blocos eram criminalizados, entre aspas, não penalmente, porque não existia uma lei que fizesse isso, mas empiricamente, no cotidiano da gestão. O bloco queria sair, a prefeitura falava: claro, você pode sair, só que para isso você tem que me dar essa autorização, aquele certificado, aquela licença, pedir a autorização do Corpo de Bombeiros, da Polícia Militar, um sem número de documentos que, na prática, impedia que um bloco saísse”, conta Varella, que é autor do livro Direito à Folia – O Direito ao Carnaval e a Política Pública do Carnaval de Rua na Cidade de São Paulo.

De acordo com o pesquisador, nessa época, só conseguiam ir para a rua os blocos que tinham apelo comercial ou apoio financeiro. Os demais cordões tinham duas opções: ou deixavam de sair, ou saíam “irregularmente”, e eram objeto de ação policial.

“Na década de 90, 2000, São Paulo foi muito marcado por uma característica política dos governos locais, que era a de entender a cidade como algo que deveria ser muito normatizado. A cidade como atenção à propriedade privada, a cidade com um recrudescimento policial, porque havia a ideia de segurança pública como esvaziamento da cidade, não como ocupação”.

Varella frisa que o carnaval de rua, como manifestação cultural da cidade de São Paulo, sempre existiu historicamente, desde o início do século XX. No entanto, o poder público ora negligenciava a festa, ora coibia. “Reprimia quando via que essa coisa estava tomando um tamanho que era considerável, que era relevante para a cidade, que de alguma maneira interferia no cotidiano da cidade”.

Segundo o pesquisador, os primeiros cordões carnavalescos da cidade começaram a ganhar espaço na cidade, principalmente nas várias regiões em que havia a tradição do samba, como na Barra Funda, no Glicério e no Bixiga.

“A cada vez que eles cresciam e também ocupavam a cidade, eles sofriam uma tentativa de controle por parte do poder público. Passavam a ser confinados, ordenados, regrados, institucionalizados, e foi quando eles passaram a se converter em escolas de samba, na década de 40, na década de 50”, conta.

Ressurgimento dos blocos

De acordo com Varella, em 2013, algumas dezenas de blocos carnavalescos criaram o Manifesto Carnavalista, com a reivindicação de direito à folia e de tomar o espaço público. A demanda, segundo ele, encontrou acolhimento em uma nova visão de cidade da gestão de Haddad que, segundo o pesquisador, era baseada na ocupação pública, na abertura dos espaços.

“Tem um fenômeno que é conjuntural também, que é o crescimento da pauta, em todas as grandes cidades do mundo, do direito à cidade. E o carnaval de rua vira propriamente uma pauta de direito à cidade. E essa reivindicação encontra eco na própria agenda política institucional da prefeitura, naquele momento”.

Segundo o pesquisador, outras políticas, nesse mesmo sentido – de dar resposta às demandas da população de mais acesso à cidade – foram implementadas no mesmo período, como a abertura da Avenida Paulista aos pedestres, a instalação de internet em praças públicas, e os coletivos de ocupação noturna da cidade. 

“Esse encontro faz com que a reivindicação do movimento carnavalesco seja atendida como política pública. E se cria propriamente uma política pública para o carnaval de rua de São Paulo”. A nova política, segundo Varella, foi baseada em dois pilares: o carnaval de rua passou a ser visto, pela prefeitura, como um ativo cultural da cidade, um ativo da sua diversidade; e a administração municipal desburocratizou o processo: para saírem, os blocos precisavam basicamente avisar a prefeitura. 

“Essa mudança de chave fez com que o carnaval crescesse exponencialmente. Abriram-se as comportas que estavam represadas. São Paulo tinha um desejo de fazer carnaval que era reprimido. Criou-se um conjunto de fatores que permitiram que os blocos saíssem, no seu protagonismo, com seu conteúdo, sem que a administração interferisse nesse conteúdo”.

Centenas de milhares de pessoas apoiaram o candidato anti-guerra na Rússia, mas ele foi banido das eleições

9 de fevereiro de 2024

 

Boris Nadezhdin e Yekaterina Duntsova foram as principais figuras das eleições russas de março de 2024, embora nenhum deles esteja nas urnas. Em 8 de fevereiro, o segundo candidato anti-guerra, depois de Duntsova, Nadezhdin foi banido das eleições.

Ninguém esperava boas notícias em torno da reeleição de Vladimir Putin, que está no poder (como presidente e – brevemente – primeiro-ministro da Rússia de 2008 a 2012) há 24 anos. Embora, antes da invasão russa da Ucrânia em Fevereiro de 2024, pelo menos alguns vislumbres dos meios de comunicação da oposição e da sociedade civil ainda fossem visíveis na autocracia de Putin, os dois anos de repressão contínua desde então parecem ter espremido até à última gota a dissidência para fora do país ou os aprisionou. Todos os protestos foram proibidos, os meios de comunicação independentes e as redes sociais foram encerrados (além do YouTube e do Telegram, existem apenas plataformas de redes sociais baseadas na Rússia que são fortemente censuradas).

Putin tem disputado as suas eleições com concorrentes falsos há pelo menos uma dúzia de anos. Desta vez, seria a mesma coisa, com apenas os candidatos aprovados pelo Kremlin a poder participar não só nas eleições em si, mas também no período pré-eleitoral de recolha de assinaturas em apoio aos candidatos.

No entanto, algo deu errado. Primeiro, uma ex-jornalista de uma cidade muito pequena da Rússia, Rzev, anunciou que queria ser candidata e que era contra a guerra Rússia-Ucrânia. Numa questão de semanas, Yekaterina Duntsova tornou-se conhecida por centenas de milhares de pessoas (principalmente através do apoio dos meios de comunicação da oposição no exílio), mas nem sequer foi autorizada a recolher assinaturas. Em 23 de dezembro de 2023, a Comissão Eleitoral Central (CEC) impediu-a de concorrer às urnas após rejeitar os seus documentos de nomeação. Por um tempo, parecia que as surpresas desagradáveis ​​tinham acabado para o Kremlin.

No entanto um candidato que supostamente tinha sido autorizado a concorrer ao lado de Putin, um membro do mesmo grupo de liberais dos anos 90 que Sergey Kirienko (agora no comando da campanha de Putin) e Boris Nemtsov, anunciou que também era um candidato anti-guerra. Boris Nadezhdin recebeu então um apoio esmagador.

A oposição russa – jornalistas, políticos e académicos no exílio – pediu às pessoas que o apoiassem. Os meios de comunicação da oposição no exílio, mesmo aqueles dirigidos por políticos (como Khodorkovsky ou os apoiantes de Navalny), estão agora a desempenhar o papel tanto da oposição russa como da sociedade civil. Eles ainda têm um grande alcance no país através do YouTube, Telegram e daqueles russos experientes em tecnologia que sabem usar VPN.

Quando toda a oposição, unida pela primeira vez, anunciou o seu apoio, as pessoas na Rússia foram aos escritórios de Nadezhdin (cada candidato normalmente tem uma rede de escritórios em todo o país para recolher assinaturas em seu apoio à candidatura) para dar as suas assinaturas em apoio à único candidato anti-guerra.

Foi uma atitude muito corajosa, porque ser anti-guerra é actualmente visto como um crime na Rússia. Mas esta era a única forma legítima de protestar sem ser preso e, apesar de as assinaturas das pessoas serem entregues às autoridades (o objectivo da recolha de assinaturas era entregá-las à Comissão Eleitoral Central), eles ainda fizeram longas filas para mostrar a sua vontade: A vontade de acabar com a guerra, libertar os presos políticos, proteger as minorias, ter dignidade, acreditar que o futuro é possível. Nadezhdin coletou mais de 200 mil assinaturas em diversas regiões da Rússia e muitas mais de pessoas que viviam no exterior.

Em 8 de fevereiro de 2024, Boris Nadezhdin não foi autorizado a comparecer às urnas. A Comissão Eleitoral Central declarou ter encontrado alegada fraude ou inconsistência em cerca de 9 por cento das assinaturas, enquanto apenas 5 por cento são permitidos. Isto deixa as chamadas eleições russas com Putin e três candidatos que o apoiam, embora formalmente sejam de diferentes “partidos políticos”.Ele vencerá definitivamente este espectáculo político na ausência de qualquer oposição, com toda a máquina eleitoral e administrativa do governo a funcionar. para ele.

Mas o apoio dentro do país que foi demonstrado ao candidato anti-guerra já teve o seu impacto. As pessoas viram que muitos deles são contra a guerra, e o mito da propaganda sobre a sociedade unida no seu apoio à guerra de Putin é apenas isso – um mito.

 

Janeiro foi mês mais quente já registrado no mundo, afirmam cientistas

O mundo acaba de ter o janeiro mais quente já registrado, dando continuidade a uma onda de calor alimentada pelas mudanças climáticas, informou o Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus (C3S), da União Europeia, nesta quinta-feira (8).

O mês passado superou o janeiro anterior mais quente, que ocorreu em 2020, nos registros do C3S desde 1950.

O mês excepcional ocorreu depois que 2023 foi classificado como o ano mais quente do planeta em registros globais que remontam a 1850, em meio a mudanças climáticas causadas pelo homem e o fenômeno climático El Niño. O fenômeno aquece as águas superficiais no leste do Oceano Pacífico, elevando as temperaturas.

Todos os meses, desde junho, foram os mais quentes já notificados no mundo, em comparação com o mesmo período dos anos anteriores.

“Além de ser o janeiro mais quente, também acabamos de passar por um período de 12 meses com mais de 1,5°C acima do período de referência pré-industrial”, disse Samantha Burgess, diretora adjunta do C3S.

“As reduções rápidas nas emissões de gases de efeito estufa são a única maneira de impedir o aumento das temperaturas globais”, afirmou.

Cientistas norte-americanos afirmaram que 2024 tem uma chance em três de ser ainda mais quente do que o ano passado e 99% de chance de estar entre os cinco anos mais quentes.

O fenômeno El Niño começou a enfraquecer no mês passado, e os cientistas indicaram que ele poderia mudar para a contrapartida mais fria, La Niña, este ano. Ainda assim, as temperaturas médias globais da superfície do mar no mês passado foram as mais altas de todos os meses de janeiro.

Os países acertaram, no Acordo de Paris de 2015, tentar impedir que o aquecimento global ultrapasse 1,5 grau Celsius, para evitar que desencadeie consequências mais graves e irreversíveis.

Apesar de ter ultrapassado 1,5ºC em um período de 12 meses, o mundo ainda não violou a meta do Acordo de Paris, que se refere à temperatura média global ao longo de décadas.

*É proibida a reprodução deste conteúdo.

Bombeiro foi dado como morto após trabalhos de salvamento no Joelma

“Meu nome estava na relação de mortos. É por isso que eu falo que o único bombeiro que tinha falecido nesse incêndio do Joelma era eu”. Naquele dia 1º de fevereiro de 1974, o bombeiro João Simão de Souza, 73 anos, primeiro-sargento veterano, foi dado como morto após ter trabalhado por horas para salvar vítimas do grande incêndio que consumiu o Edifício Joelma, no centro da capital paulista, e que levou à morte 181 pessoas.

A notícia surgiu logo após ele ter conseguido entrar no edifício, já consumido pelas chamas, para fazer uma vistoria. Foi então que ele encontrou um rapaz gemendo no local e tentou retirá-lo pelas escadas. Enquanto fazia esse salvamento, uma laje caiu sobre eles. “Encontrei um rapaz gemendo e resolvi pegá-lo e descer [as escadas]. As águas [usadas para o combate às chamas] que caíam do prédio batiam nas costas e a gente estava sem proteção, só com a roupa, e parecia que ia furar as costas da gente, de tão quentes. Eu estava descendo [com a vítima] e vi uma entrada. Quando cheguei perto era um estacionamento. E pensei em ficarmos por ali. Mas senti um puxão grande atrás de mim e o rapaz acabou caindo do meu braço. Só vi um poeirão e fui apagando. Depois de muito tempo, quando acordei, estava no hospital”.

Joelma em chamas. Imagens feitas pela produtora Souza Lima rodaram o mundo. Divulgação/ Produtora Souza Lima

Foi no hospital que Simão, como é mais conhecido, finalmente descobriu o que tinha acontecido com ele e a vítima, que acabou não resistindo. Foi também no hospital que lhe contaram que ele chegou a ser dado como morto após o acidente. Nesse acidente, Simão quebrou o nariz, os dentes, a clavícula, dois braços, duas pernas e três costelas. Uma dessas costelas chegou a lhe perfurar o pulmão.

“Quando acordei no hospital, estava engessado do pescoço para baixo”, relembra.

Salvamento

O incêndio no Edifício Joelma, atualmente chamado de Edifício Praça da Bandeira, ocorreu na manhã do dia 1º de fevereiro de 1974, provocado por um curto-circuito no sistema de refrigeração do 12º andar. E não foi o único grande incêndio ocorrido na cidade de São Paulo.

Alguns dos bombeiros que trabalharam na tentativa de conter as chamas do Joelma e no socorro às vítimas já tinham enfrentado um evento muito parecido dois anos antes. Em fevereiro de 1972 eles trabalharam no incêndio do Edifício Andraus, também no centro da capital paulista, que provocou a morte de 16 pessoas e deixou mais de 300 feridas. Esse é o caso de Simão e também do primeiro-sargento reformado do Corpo de Bombeiros, Franclin de Jesus Ferreira, de 76 anos.

“Ouvimos no rádio que estava tendo um incêndio no centro da cidade. Não sabíamos o que era, mas quando falou que era em um edifício, logo imaginei o Andraus, onde já tinha trabalhado. ‘Deve ser outro pavoroso’, imaginei”, disse Ferreira.

O trabalho em ambos os edifícios, no entanto, não guardou muitas semelhanças. Se no Andraus muitas das vítimas foram salvas pelo alto, já que o edifício contava com heliponto, no Joelma isso não ocorreu. Pouquíssimas vítimas puderam ser salvas no segundo incêndio dessa forma, já que os helicópteros não conseguiam pousar no local: a cobertura do prédio tinha telhas de amianto e não tinha heliponto.

Cobertura do prédio tinha telhas de amianto e nenhum heliponto – Bombeiro Mato Grosso do Sul/Divulgação

“Todo mundo [do Joelma] resolveu subir para o telhado porque eles se lembraram do Andraus. Mas o primeiro helicóptero que tentou, não conseguiu [parar] por causa da hélice. Teve um [bombeiro que estava no helicóptero] que tentou pular [do helicóptero para a cobertura]. Mas ele passou pelo telhado e parece que quebrou o tornozelo. Não tinha aquele tipo de salvamento que teve no Andraus”, detalha o primeiro-tenente veterano Roberto Silva, 83 anos.

Já a semelhança entre ambos os salvamentos foi que, nos anos 70, não havia equipamentos adequados para se trabalhar na contenção de incêndios. A começar pela farda.

“Naquela época, a farda era de manga curta”, conta Silva. Por isso, antes de entrar em um prédio em chamas, ele sempre passava Hipoglós em todo o corpo, para evitar que a água quente caísse pela pele desprotegida. “O povo passava no rosto e nos braços. Não era como os equipamentos que existem hoje”.

“No outro dia a gente não conseguia colocar a farda, principalmente a grandona, porque as costas queimaram todas. A sorte é que levamos bastante Hipoglós. Mas ficamos um bom tempo sem por roupa, principalmente nas costas, porque queimou tudo”, acrescenta Ferreira.

“Era uma porcaria as botas que a gente usava. A sola saiu de tanto calor. O que sobrou para a gente trabalhar foi o coração”.

De acordo com Ferreira, as fardas não eram o único problema que os bombeiros enfrentavam naquela época para trabalhar em um incêndio. “O que a gente mais precisava era de viatura, mas elas eram sucateadas e também eram poucas”. Outro problema é que a escada magirus, naquela época, só alcançava até o 14º andar, insuficiente para fazer o resgate em edifícios muito altos.

Essas condições são hoje bem diferentes, contou o major da reserva Eduardo Boanerges Barbosa, 77 anos. “Hoje o bombeiro está muito mais preparado para entrar no incêndio, com capacete, capa americana, bota alemã e cinto alemão”, citou.

Outro fator que contribuiu para que o trabalho de contenção de incêndio aconteça de forma mais eficiente nos dias de hoje são as exigências de segurança predial, que passaram a ser regulamentadas. Em 1974, o Joelma não tinha isolamento entre os andares, nem escadas de emergência, nem brigada de incêndio, aspectos que são obrigatórios em edifícios atualmente. “A sorte que temos dos incêndios atuais não serem iguais ao do Joelma é que hoje a lei obriga que os edifícios tenham brigadas de incêndio, que controlam o fogo e não deixam que ele passe para incêndio. Fogo é controlável. No incêndio, ele está fora de controle”, explica major Boanerges.

Reconhecimento

Anos se passaram da tragédia, mas o trabalho desenvolvido pelos bombeiros nunca deixou de ser reconhecido, apesar das dificuldades encontradas na ocasião. Na tarde desta quinta-feira (1), por exemplo, a Câmara Municipal de São Paulo vai homenagear os bombeiros que trabalharam para salvar vítimas e conter as chamas do Edifício Joelma.

Mas essa não será a única homenagem que esses bombeiros já presenciaram pelo ato. A maior delas não veio de nenhum órgão público, empresa ou instituição: mas da lembrança das vítimas que eles salvaram.

No ano passado, por exemplo, durante entrevista a um programa de TV que tratava sobre o incêndio, Simão foi reconhecido por uma das vítimas a quem resgatou do Joelma: o microempresário Mauro Ligere Filho, de 73 anos, a quem ele salvou do parapeito do 22º andar.

“No ano passado, fui convidado para dar uma entrevista para um programa de TV. Conversando com ele [Mauro Ligere Filho], ele contou que estava naquele beiral”, lembrou Simão. “Ele me reconheceu e, naquela hora, eu senti um arrepio. A gente vai lá e salva, mas não reconhece a pessoa. Mas ele me reconheceu. Eu falei: ‘ganhei outro amigo’. E agora, de vez em quando ele liga para mim”, conta Simão.

“Ele agora é um amigo que eu tenho, que eu ganhei, e que só fui encontrar após 49 anos”, confirmou Ligere Filho, em entrevista à EBC.

Dever cumprido

Passados 50 anos, o que ficou para a equipe foi o sentimento de que cumpriram o trabalho da melhor maneira que podiam. “Dever cumprido. Fizemos o que nosso coração mandou. Éramos tão pequenininhos, ínfimos. Mas diante da quantidade de bombeiros que estavam lá, juntos nos tornamos grandes”, se orgulha Ferreira.

Também ficou o sentimento de tristeza. “Foi um pedacinho do ar-condicionado perto de um prédio daquele. Me emociono ao lembrar disso depois de 50 anos. Cheguei a sonhar muitas vezes o mesmo sonho. É duro lembrar tudo aquilo, dá vontade de esquecer”, disse Silva.

Entre essas memórias e sentimentos que os quatro compartilham, ficou também um desejo comum. “Depois de 50 anos do incêndio do Joelma, tenho isso comigo: que um incêndio como esse nunca mais se repita em São Paulo”, reforçou Simão.

A TV Brasil preparou um especial sobre os 50 anos do incêndio do Joelma, que vai ao ar no Caminhos da Reportagem, no dia 4 de fevereiro, às 22h

Abin foi usada para monitorar promotora do caso Marielle, diz PF

As investigações da Polícia Federal (PF) envolvendo o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) revelam que a estrutura da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) foi usada para monitorar a promotora responsável pela investigação do assassinato da vereadora do Rio de Janeiro Marielle Franco, além de outras autoridades. Os crimes teriam ocorrido no durante o governo de Jair Bolsonaro, quando Ramagem foi diretor da Abin. Marielle foi morta em março de 2018.

Mais cedo, a PF realizou buscas e apreensões contra Ramagem e outros investigados. Agentes estiveram no gabinete do parlamentar na Câmara dos Deputados e nas residências dele em Brasília e no Rio de Janeiro. A operação foi autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), relator das investigações na Corte. 

De acordo com a decisão de Moraes que embasou as buscas, Ramagem, policiais e delegados da PF que estavam cedidos para a Abin, além de servidores do órgão, teriam participado de uma organização criminosa para monitorar ilegalmente autoridades públicas. O caso é conhecido como “Abin paralela”.

O monitoramento ilegal ocorria, segundo as investigações, por meio do uso do programa espião First Mile. Produzido por uma empresa israelense de defesa cibernética, o equipamento permite monitorar os passos dos alvos escolhidos por meio da localização do celular. O software foi comprado no governo Michel Temer. 

Segundo os investigadores,  foram monitorados a promotora do Ministério Público do Rio de Janeiro Simone Sibilio, que atuou na investigação inicial do caso Marielle, o então presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, e Camilo Santana, que era governador do Ceará e é o atual ministro da Educação.

“Em outra oportunidade, novamente, ficou patente a instrumentalização da Abin, para monitoramento da promotora de Justiça do Rio de Janeiro e coordenadora da força-tarefa sobre os homicídios qualificados perpetrados em desfavor da vereadora Marielle Franco e do motorista que a acompanhava, Anderson Gomes”, diz o relatório de investigação.

Ministros do STF

O grupo também teria atuado para difundir informações falsas e vincular os ministros do STF Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes a uma facção criminosa. As suspeitas estão em um arquivo eletrônico apreendido na primeira fase da operação, realizada no ano passado.

“O arquivo ‘prévia Nmni.docx’ mostra a distorção, para fins políticos, da providência, indicando a pretensão última de relacionar a advogada Nicole Fabre e os ministros do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes com a organização criminosa Primeiro Comando da Capital – PCC, alimentando a difusão de fake news contra os magistrados da Suprema Corte”, complementa o relatório.

Interferência

As investigações também indicam que a Abin teria sido usada para interferir em investigações envolvendo os filhos de Bolsonaro, Jair Renan e o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).  Ramagem e os outros acusados também teriam atuado para abafar as investigações internas sobre o uso ilegal do órgão.

“A alta gestão interferiu nas apurações disciplinares para que não fosse divulgada a instrumentalização da Abin”, completou o relatório.

Defesa

Pelas redes sociais, Bolsonaro não fez comentários relacionados à operação, mas publicou um vídeo antigo no qual Ramagem informa que o programa espião foi comprado na gestão do presidente Michel Temer.

Valdemar Costa Neto, presidente do PL, classificou a operação de “perseguição” a Bolsonaro.

Em nota, o senador Flávio Bolsonaro negou ter sido favorecido de alguma forma pela Abin.  “Isso é um completo absurdo e mais uma tentativa de criar falsas narrativas para atacar o sobrenome Bolsonaro”, afirmou.

Alexandre Ramagem ainda não se manifestou sobre a operação.

Brumadinho: “Acordo foi o melhor caminho”, diz procurador

Passados três anos da assinatura do acordo de reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG), a avaliação do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) é positiva. A instituição considera que passos importantes foram dados no último período.

Segundo o procurador-geral Jarbas Soares Júnior, sem o acordo a Justiça iria demorar anos para julgar o caso e dar respostas. Ele avalia que a questão se arrastaria até a última instância, no Supremo Tribunal Federal (STF).

“Nós tínhamos uma responsabilidade histórica, porque esse acordo ficará na história do país. E havia apenas dois caminhos: assinar ou não assinar. Sabíamos que seríamos criticados, sobretudo pelos engenheiros da obra pronta. Mas o outro caminho era a judicialização. E um ponto fundamental: nós não conseguiríamos na Justiça de forma alguma o que foi estabelecido no acordo”, afirma.

O procurador fez suas considerações na última sexta-feira (19), durante evento organizado pelo MPMG onde foi apresentado um balanço da execução do acordo até o momento. A avaliação do procurador-geral, no entanto, não é a mesma das entidades representativas das vítimas. Elas compartilham da visão de que as comunidades atingidas foram alijadas do processo decisório, já que não foram chamadas para as tratativas que levaram ao acordo. A participação era uma das principais reivindicações das vítimas, que cobravam mais voz.

A engenheira civil Josiane Melo, que integra a diretoria da Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos do Rompimento da Barragem em Brumadinho (Avabrum), faz duras críticas ao acordo. Ela perdeu sua irmã Eliane Melo, que estava grávida de cinco meses. Josiane também é uma sobrevivente, uma vez que na época era funcionária da Vale, mas estava desfrutando de seu último dia de férias. Por essa razão, ela também vive um luto pela morte de amigos e colegas de trabalho.

“Quando a gente recebeu a notícia sobre esse acordo, ele já estava assinado. Então é um acordo que não nos representa, não fala dos familiares das vítimas. Inclusive no último dia 16, nós dissemos exatamente isso em evento de inauguração de uma Academia do Corpo de Bombeiros que foi adquirida com recursos oriundos do acordo”, diz.

Josiane Melo é engenheira civil e funcionária da Vale. Ela perdeu a irmã Eliane na tragédia de Brumadinho – Divulgação/TV Brasil

Segundo Jarbas Soares Júnior, o MPMG não tinha como atender a essa demanda. “Há essa crítica de que o acordo foi feito entre quatro paredes, mas foi uma decisão judicial que nós, enquanto instituições de Justiça, temos que cumprir”, alega. Ele sustenta, de outro lado, que foram criados mecanismos de participação no processo de implementação do acordo.

A tragédia completará cinco anos nesta quinta-feira (25). Na ocasião, a avalanche de rejeitos liberada pelo rompimento da barragem soterrou 270 pessoas, gerou destruição ambiental e devastou comunidades. Considerando ainda que duas mulheres morreram grávidas, a Avabrum contabiliza 272 vidas perdidas. O acordo para a reparação foi firmado dois anos depois, em 4 de fevereiro de 2021. Ele trata dos danos coletivos. Optou-se por manter as discussões das indenizações individuais a parte, em negociações judiciais e extrajudiciais que já estavam em curso.

O acordo fixou a destinação do valor de R$ 37,68 bilhões. Foram previstos investimentos socioeconômicos, ações de recuperação socioambiental, ações voltadas para garantir a segurança hídrica, melhorias dos serviços públicos, obras de mobilidade urbana, entre outras.

A estrutura de governança previu que R$ 11,06 bilhões seriam destinados a projetos que foram aprovados pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) e que ficaram sob gestão do Executivo mineiro. Alguns deles são de grande envergadura, como as reformas ou conclusões de seis hospitais regionais – Conselheiro Lafaiete, Divinópolis, Governador Valadares, Juiz de Fora, Sete Lagoas e Teófilo Otoni – e a construção de um Rodoanel, que contornará a região metropolitana de Belo Horizonte e poderá desafogar o atual Anel Rodoviário, onde muitos acidentes têm sido registrados.

Esses projetos geram divergências. “Nós tivemos uma longa luta com o pessoal do Seplag [Secretaria de Planejamento e Gestão do Governo de Minas Gerais] para que todas as obras que receberem recursos tenham uma placa com o nome das 272 vítimas e tenha lá o motivo porque esse dinheiro está chegando. Esse dinheiro só existe porque houve um crime que matou 272 pessoas”, afirma Josiane.

O Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB), organização que luta contra os impactos causados pela atividade minerária em todo o país, chegou a cobrar que os recursos fossem destinados para o enfrentamento de problemas sociais decorrentes do modelo de exploração econômica adotado pelos governos e pela mineração. A entidade defendia mais políticas públicas e medidas que contornassem os dificuldades relacionadas com moradia, enchentes, escolas, saúde e outras questões que afetam os atingidos por esses empreendimentos.

Uma ação chegou a ser movida com o objetivo de suspender a licitação do Rodoanel. O MAB alegou à Justiça que novas violações de comunidades estavam sendo cometidas para levar adiante uma obra de interesse das grandes mineradoras e que estava sendo garantida com dinheiro que deveria ser destinado à reparação integral dos danos causados pelo rompimento da barragem em Brumadinho.

Representantes do MPMG consideram que a crítica não faz sentido pois a tragédia também teria causado perda de receitas que abasteciam os cofres do estado e que poderiam ser destinados a projetos estruturais. Eles veem de forma positiva a destinação de R$ 3 bilhões para incrementar o orçamento da obra do Rodoanel. A expectativa é de que as obras comecem ainda em 2024. Atualmente, o projeto encontra-se em fase de licenciamento ambiental.

“Eu acho que todo mundo que mora em Belo Horizonte sofre com o trânsito no Anel Rodoviário. As mortes no Anel Rodoviário são frequentes. O problema é gravíssimo. Toda metrópole do mundo tem anéis rodoviários para escoar o trânsito de dentro da cidade. São Paulo tem, o Rio de Janeiro tem um Arco Metropolitano. Certo, é uma obra profundamente necessária, e a região metropolitana de Belo Horizonte nunca recebeu recurso para construção de anéis rodoviários”, observa o procurador-geral adjunto do MPMG, Carlos André Mariani Bittencourt.

Em nota, a Vale também faz balanço positivo do acordo e afirma que já executou 68% dos R$ 37,7 bilhões previstos. Ainda de acordo com a mineradora, 298 iniciativas foram aprovadas com o objetivo de melhorar a qualidade de vida da população em Brumadinho e nos demais municípios da Bacia do Rio Paraopeba. “São ações de fortalecimento de serviços de assistência social e de educação, obras em creches, escolas, hospitais, unidades básicas de Saúde (UBS) e moradias populares. O fortalecimento da agropecuária e serviços rurais também estão contemplados”, diz o texto.

Auditoria e estudos

Durante o balanço do acordo, o MPMG anunciou a assinatura de dois novos contratos, envolvendo a auditoria de processo reparatório. A Ernst & Young assumirá os trabalhos de avaliação financeira. A Aecom fará a auditoria ambiental. São contratações que atrasaram em função de divergências no escopo de atuação.

Barragem, Brumadinho, rompimento – Corpo de Bombeiros/Divulgação

“São empresas de nível mundial, que têm respeitabilidade nas suas áreas de atuação. Havia uma série de outras questões para serem tratadas. E essa foi judicializada porque houve divergência com a Vale. Finalmente nós conseguimos superá-la no último semestre”, explicou o promotor Leonardo Castro Maia.

Também foram relatados avanços no documento Estudos de Risco à Saúde Humana e Risco Ecológico (ERSHRE), feito pelo Grupo EPA e custeado pela Vale conforme decisão judicial. Ele trará conclusões sobre a saúde humana, a fauna e a flora e embasará o julgamento dessas questões. Medidas estabelecidas com base em achados da pesquisa deverão ser custeados pela Vale com recursos adicionais, não sendo descontado dos R$ 37,68 bilhões fixados pelo acordo.

Os resultados do documento deverão também ser analisados pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que entregará um relatório final ao juízo. A instituição foi nomeada perita judicial em 2019. Inicialmente, a UFMG coordenaria 67 chamadas que envolveriam uma série de estudos e receberiam ao todo aporte de R$ 22,46 milhões. O acordo firmado em 2021, no entanto, reduziu sua atuação. Apenas seis chamadas foram mantidas sem modificação, outras 23 foram extintas e as demais foram aglutinadas em um único estudo.

Participação

Parte do montante total do acordo foi reservado para uso, conforme definição da população direta e indiretamente atingida. Foi fixada a necessidade de apreciação popular para o aporte de um total de R$ 3,4 bilhões em projetos para Brumadinho e para os outros 25 municípios da bacia do Rio Paraopeba.

Em outubro de 2021, o governo de Minas Gerais e o Ministério Público do estado lançaram consulta popular com esse objetivo. A população foi convocada a votar entre 3.114 propostas de projetos apresentados pelas assessorias técnicas que dão suporte aos atingidos e pelas prefeituras. O processo se deu por meio da internet e de um aplicativo para celulares. Estavam aptos a participar, os 734 mil eleitores dos 26 municípios atingidos. A consulta mobilizou pouco mais de 10 mil participantes.

O número de participantes é considerado baixo por entidades que representam as vítimas. “A gente ficou sabendo que teria uma escuta da comunidade, mas de forma eletrônica, e acredito que muitas pessoas não tiveram acesso. Eu não acho que foi uma questão muito participativa. E muitos projetos incluídos na consulta foram os prefeitos que definiram. E fizeram propaganda como se fosse o governo deles injetando esse dinheiro que é oriundo de um crime. Então fazemos esse balanço de que é preciso melhorar a transparência e a fiscalização”, diz Josiane Melo.

O MAB chegou a apontar limites da consulta pública. “Não exige um processo de construção de propostas e pleno diálogo com a população para identificar quais os projetos que são necessários para atender à demanda da vida do povo. Os atingidos têm espaço apenas de ser consultados e as propostas são construídas, implementadas e avaliadas sem a participação direta”, disse Santiago Matos, integrante do MAB, em entrevista à Agência Brasil em 2022.

Segundo o secretário adjunto de Planejamento e Gestão do governo mineiro, Luiz Otávio Milagres de Assis, 110 projetos escolhidos já tiveram a ordem de início emitida. Entre eles, há pavimentação de rodovias, reformas e construções de unidades de saúde, aquisições de veículos para transporte escolar, compra de equipamentos agrícolas, canalização de córregos, criação de aterro sanitário, estruturação de centros esportivos, entre outros. Assis destaca a criação do distrito industrial de Brumadinho.

“Talvez a maior demanda da população de Brumadinho e da própria prefeitura seja a criação de mais oportunidades de emprego e renda. Na história de Brumadinho, a mineração ocupou um papel muito central. O distrito industrial tem o objetivo de atrair emprego e renda em outras áreas. Estamos falando de um distrito muito grande, que vai ocupar o equivalente a 120 campos de futebol. A ordem de início já foi emitida. Os projetos de engenharia estão em fase final e a expectativa é iniciar a obra agora no primeiro semestre de 2024”, disse Assis.

Outro volume de recursos previstos no acordo também será destinado conforme o desejo popular. Nesse caso, porém, a decisão será tomada não por todos os moradores das cidades da bacia do Rio Paraopeba, mas apenas por aqueles que vivem nas comunidades diretamente afetadas. São R$ 3 bilhões, e o processo de definição dos projetos são conduzidos com o suporte do MPMG, do Ministério Público Federal (MPF) e da Defensoria Pública de Minas Gerais.

Desabamento de barragem em Brumadinho – Foto Reuters/Washington Alves/Direitos Reservados

De acordo com o MPMG, em 2023, foi finalizada a fase de identificação do que a população considera fator de preocupação. Essa etapa teve a participação de mais de 5 mil pessoas em 416 comunidades. Também no ano passado, foi lançado um edital público para definir o responsável pela gestão dos recursos relacionados a esses projetos. Saiu vencedora a parceria formada por quatro entidades: a Cáritas, a Associação Nacional dos Atingidos por Barragens (Anab), o Instituto Conexões Sustentáveis (Conexsus) e o Instituto E-Dinheiro Brasil.

Influência

Segundo representantes do Ministério Público de Minas, o acordo de Brumadinho tornou-se referência para uma série de outros acordos envolvendo problemas com barragens de mineração. Eles citaram, por exemplo, as tratativas para reparação dos danos causados no município de Barão de Cocais (MG) e na comunidade de Macacos, distrito de Nova Lima (MG). Nessas duas localidades, o risco de rompimento de barragens da Vale demandou a evacuação de áreas que poderiam ser atingidas. Acordos foram firmados garantindo uma série de direitos aos afetados e estabelecendo medidas reparatórias.

O procurador-geral adjunto, Carlos André Mariani Bittencourt, sustenta que esse acordo se tornou referência por ser o primeiro do tipo. “Talvez no mundo não exista parâmetro. No Brasil, não existe o que tomar como exemplo. Pois é um acordo e um instrumento de autocomposição inédito no país. Nós estamos, portanto, abrindo espaços e executando algo novo”, avalia.

A experiência em Brumadinho também influencia as negociações para a repactuação do processo reparatório na bacia do Rio Doce. Dezenas de cidades mineiras e capixabas foram atingidas após o rompimento de uma barragem em Mariana (MG). A estrutura pertencia à Samarco, uma joint-venture das mineradoras Vale e da BHP Billiton. O episódio, que ocorreu em novembro de 2015, causou 19 mortes e gerou devastação ambiental de grandes proporções.

No caso da tragédia em Mariana, o MPMG e o MPF não concordaram com o teor do acordo negociado entre as três mineradoras, a União e os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo. Um Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) foi selado em março de 2016 sem a participação das instituições de Justiça. Com base nele, foi criada a Fundação Renova, para gerir mais de 40 programas de reparação.

Passados mais de oito anos, negociações estão em andamento para repactuar o processo reparatório, dessa vez com a participação do MPMG, do MPF e da Defensoria Pública de Minas Gerais e da Defensoria Pública da União. O objetivo é selar um novo acordo que solucione mais de 80 mil processos judiciais acumulados. Há questionamentos sobre a falta de autonomia da Fundação Renova perante as mineradoras, os atrasos na reconstrução das comunidades destruídas, os valores indenizatórios, o não reconhecimentos de parcela dos atingidos, entre outros tópicos.

“O MPMG não aderiu ao TTAC porque considerava que aquele acordo era incompleto. Quando veio a tragédia em Brumadinho, houve a oportunidade de fazer um acordo mais completo. Hoje a população do Vale do Rio Doce até o Espírito Santo sonha com acordo como o de Brumadinho”, diz o procurador-geral.

As negociações para a repactuação do processo reparatório na bacia do Rio Doce são conduzida pelo Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6) e estão paralisadas no momento. A principal barreira para a conclusão do acordo é financeira: a Samarco, a Vale e a BHP Billiton ofereceram R$ 42 bilhões, bem aquém do esperado. As instituições de Justiça pleiteiam um valor de R$ 126 bilhões.

“Quem sabe neste semestre, em março ou um pouco mais à frente no máximo, podemos fechar novo acordo. Chegamos em um ponto que o acordo, com as suas cláusulas, ficou pronto. A discussão agora se dá sobre valores e prazos”, diz Jarbas Soares Júnior.

Infográfico do Rompimento da Barragem de Brumadinho. Justiça já reconheceu atingidos em 25 cidades. Foto Arte/EBC