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Mundo tem de fazer transição energética, dizem especialistas

O mundo terá que fazer a transição energética para uma economia de baixo carbono para evitar os desastres climáticos provocados pelo aquecimento global, dizem especialistas ouvidos pela Agência Brasil. Ontem (9),  o Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus, da União Europeia, confirmou que o ano passado foi o mais quente registrado no planeta e provavelmente o mais quente do mundo nos últimos 100 mil anos.

Em média, em 2023, o planeta esteve 1,48º grau Celsius mais quente que no período pré-industrial de 1850-1900, quando os homens começaram a queimar combustíveis fósseis em escala industrial, emitindo dióxido de carbono para a atmosfera.

Os países acertaram, no Acordo de Paris de 2015, em tentar impedir que o aquecimento global ultrapasse 1,5ºC par evitar consequências mais graves.

Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), o ano de 2023 no Brasil é o mais quente da série histórica, com a média das temperaturas do ano ficando em 24,92ºC, sendo 0,69°C acima da média histórica de 1991/2020, que é 24,23°C.

Claudio Angelo, coordenador de Comunicação e Política Climática do Observatório do Clima, pondera que o mundo precisa ter um plano de ação imediato para fazer a transição energética com os países ricos abandonando os combustíveis fósseis e depois os países em desenvolvimento.

“Do ponto de vista de mitigação, o mundo inteiro, mas principalmente os grandes produtores de petróleo, isso inclui o Brasil, precisa seguir o que foi definido em Dubai [COP-28] de fazer a transição para longe dos combustíveis fósseis. O declínio das emissões globais precisa ser radical, mais drástico do que qualquer coisa que a gente tenha visto na história da humanidade”, disse Angelo.

Segundo o ambientalista, depois que o El Niño (aquecimento acima da média das águas do Oceano Pacífico Equatorial) for embora, a temperatura deve cair um pouco.

“Só que esse 1,5°C vai voltar para assombrar a gente e quando atingir novamente esse limite vai ser praticamente para sempre. No final dessa década, se nada for feito para cortar radicalmente as emissões de gases do efeito estufa, especialmente de queima de combustíveis fósseis e de desmatamento, a gente vai ter uma ultrapassagem permanente desse limite e é aí que mora o perigo.”

Claudio Angelo sustenta que essa ultrapassagem do 1,5ºC vai significar muitas mortes e muito prejuízo material e lembra que o Brasil é uma região especialmente vulnerável. “A gente teve nove ondas de calor, gente morrendo por causa de sensação térmica de 60ºC no Rio de Janeiro, a gente já tem todo problema de deslizamento e alagamento que ocorre especialmente no verão, em grandes cidades onde tem muita gente morando em áreas de risco. A tendência é que isso acabe colocando mais pressão ainda sobre os sistemas públicos de saúde, de segurança, moradia, defesa civil. Aumenta a urgência do Brasil fazer um plano de adaptação para alertar a população cada vez mais precocemente sobre eventos meteorológicos extremos. O Brasil precisa tirar as pessoas das áreas de risco.”

A especialista sênior do Instituto Talanoa, Branca Americano, pondera que os países e as empresas têm que cortar o mal pela raiz pois a maior parte do que causa o efeito estufa é a queima de combustíveis fósseis.

“O mundo tem quer fazer a transição energética. Nós, aqui no Brasil, pelo menos nossa eletricidade vem de fontes renováveis principalmente, mas tem países que precisam fazer uma mudança radical na forma de produzir e consumir. No Brasil, a principal fonte dos gases do efeito estufa vem do desmatamento. Nossa primeira tarefa é acabar com o desmatamento e fazer a transformação para a agricultura de baixo carbono”, disse Branca.

Ela destaca que outro componente urgente é a adaptação. “A gente vai ter que enfrentar os eventos extremos como as enxurradas e secas. A gente vai ter que aprender a planejar e a viver um cotidiano levando em consideração a mudança do clima.”

Rio: Plano Diretor pode piorar questão habitacional, dizem urbanistas

Especialistas em planejamento urbano manifestam preocupação com o novo Plano Diretor do Rio de Janeiro, aprovado pela Câmara Municipal na madrugada da última terça-feira (12). O projeto recebeu 1.236 emendas e 473 foram acolhidas. A redação final ainda vai ser encaminhada para sanção ou veto do prefeito Eduardo Paes.

Para Tarcyla Fidalgo, advogada e doutora em planejamento urbano pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o novo plano privilegia a ideia de cidade como mercadoria e coloca questões sociais em segundo plano. 

“Temos mais um Plano Diretor que não está comprometido com os instrumentos de política urbana, que deixa tudo para a legislação posterior. E essa legislação só é estabelecida se for do interesse do mercado imobiliário. Estamos falando de regulamentação feita para empreendedores ou para construções de média e alta renda. É um plano que, mais uma vez, afasta e fecha os olhos para a realidade dos subúrbios e das favelas”, disse Tarcyla, que também é pesquisadora do Observatório das Metrópoles. 

A pesquisadora mostra preocupação específica com a nova possibilidade de regularização fundiária e remembramento de lotes, procedimento pelo qual agora dois ou mais terrenos podem ser unificados. Grupos sociais de menor renda correm o risco de ficar mais vulneráveis em transações imobiliárias. 

“A questão é que você pode regularizar, entregar a escritura para os moradores, e chegar um incorporador imobiliário, por exemplo, no Vidigal, e começar a comprar as casas por um valor bem abaixo do que elas valem. Mas para os moradores vai ser muito dinheiro. O comprador junta todos os terrenos e faz um resort. Isso é muito perigoso para as nossas favelas, principalmente as da zona sul, que despertam maior interesse do mercado”, diz Tarcyla. 

Todo município no Brasil conta com um Plano Diretor para orientar políticas de desenvolvimento e ordenamento urbano. A previsão legal é que ele se estenda por no máximo dez anos. No Rio de Janeiro, o último tinha sido estabelecido em 2011 e, desde 2021, havia muita expectativa por uma revisão. 

O arquiteto e urbanista Filipe Marino, professor da Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), alerta para o item do plano que trata de mudanças no adensamento da cidade. Ou seja, a forma como se pensa a quantidade de pessoas que vivem em determinado local. O caso da zona oeste é considerado o mais crítico, pelas características da região. 

“Aumento da densidade sem um respaldo de infraestrutura, principalmente a de transporte, é ponto preocupante. Precisamos ver o que vai acontecer na zona oeste, porque a distância dos bairros em relação ao centro é grande. Há uma massa expressiva de pessoas que fazem esse movimento diário em duas ou três horas. Com bairros mais densos, precisamos de grande capacidade de transporte, melhorar a qualidade dos trens, ampliar o BRT [ônibus que circulam em corredores expressos] e chegar com o metrô na região”, diz Marino. 

Outro ponto que precisa ser monitorado, segundo o urbanista, é como vão ser administradas as Áreas de Especial Interesse Social (AEIS). São caracterizadas assim as partes do território demarcadas para assentamentos habitacionais de famílias de baixa renda. 

“O Plano Diretor sinaliza o aumento das AEIS, o que é uma coisa boa, mas os mecanismos de financiamento ainda não estão tão claros. E se não tiver esses mecanismos para habitação de interesse social, não vamos sair muito do panorama em que nos encontramos”, diz Filipe. “Esse é um problema urgente do Rio de Janeiro. Existem leituras de que o novo plano pode aprofundar problemas habitacionais que já existem na cidade”. 

Pontos positivos 

Apesar das preocupações com as mudanças no Plano Diretor, os especialistas destacam que existem avanços em alguns pontos, como a inserção de um capítulo que trata especificamente das favelas no município. 

“Um dos pontos mais importantes é o reconhecimento da favela como uma unidade de planejamento. Você lançar luz e focar nesse planejamento é muito importante. É um reconhecimento tardio. Mas, considerando essa modalidade de moradia, que é muito expressiva no Rio de Janeiro, quase metade da população mora em assentamento com algum nível de precariedade. A cidade só tem a ganhar ao trazer esse ponto para discussão e formalização”, diz Filipe Marino. 

“Esse capítulo foi fruto de um esforço coletivo de várias entidades da sociedade civil, vários profissionais, técnicos da área, que trabalharam em conjunto no texto. Na sua versão original, era um texto bastante amplo, bastante completo, tentando dar conta dos desafios do direito à terra, da questão fundiária, da regularização das casas. Mas também apontando para alguns desafios urgentes como a justiça climática e o risco dos desastres ambientais. A gente sabe que ele perdeu um pouco da densidade e vários dispositivos que eram mais enfáticos sobre as obrigações do Poder Público foram vetados. Mas mesmo ele tendo sido mutilado, o fato de ter entrado no Plano Diretor é, por si só, muito simbólico”, explica Tarcyla Fidalgo.