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Cacique de Ramos faz 63 anos e fortalece história no carnaval do Rio

 

Um dos marcos do carnaval carioca completou 63 anos no dia 20 de janeiro: o Bloco Carnavalesco Cacique de Ramos, declarado Patrimônio Imaterial da Cidade do Rio de Janeiro.

No início dos anos 60, jovens de Ramos, na zona norte do Rio de Janeiro, se juntaram para brincar no carnaval, desfilaram pelas ruas do bairro e, no dia 20 de janeiro de 1961, criaram formalmente o bloco. Depois de dois anos desfilando, a partir de 1963 começaram a conquistar espaços no centro da cidade, que na época reunia o maior número de foliões.

Com o passar do tempo, o Cacique de Ramos se transformou em um bloco de embalo e se tornou, nos anos 60 e 70, um fenômeno de multidão formada por amantes da instituição, que saíam de várias regiões do Rio para desfilar. Para Bira Presidente, de 86 anos, que juntou a seu nome a função que exerce, do bloco tradicional já saíram tantos nomes importantes que ele tem que continuar. “Não vamos parar”, garantiu à Agência Brasil.

““Nesses 63 anos de história e de levar essa mensagem de alegria, o Cacique não parou de desfilar. Tenho, dentro do meu conceito e do meu trabalho, uma responsabilidade muito grande”, destacou.

Para manter nossa organização, temos que fazer movimentos sociais e culturais que levam alegria e descontração às pessoas. Isso é uma identificação muito nobre, na qual o Cacique, todo domingo, está sempre cheio, o movimento é impressionante. A gente faz reuniões para  botar o carnaval na rua. O Cacique de Ramos é um bloco tão tradicional que, nesses anos todos, tem sido sucesso na avenida principal, desfilando nos três dias de carnaval [domingo, segunda e terça].”

“Me sinto agraciado por Deus por ter me dado essa missão, que hoje em dia, é conceituada e respeitada por todos aqueles que gostam do samba, de alegria e do carnaval”, concluiu Bira.

Chopp

Sidney Machado, conhecido como Chopp, lembrou que, inicialmente, os desfiles contavam com poucas pessoas, sem formato de agremiação e sem nome. Ele contou que a ideia evoluiu ao longo dos anos, com a chegada de mais pessoas e, então, o bloco foi criado. Foi aí que ele passou a participar do Cacique. “O Cacique é tudo para mim. Ali, eu dou minha vida pela união que temos.”

Segundo o músico, percussionista e ex-chefe de harmonia de escolas de samba do Rio que exerceu durante 12 anos, o nome do grupo foi dado por Tia Conceição, mãe do Bira, que era “feita no santo pela Mãe Menininha do Gantois, da Bahia”.

“O bloco foi crescendo e surgiu o nome do Cacique de Ramos, que praticamente foi dado pela Tia Conceição, mãe do Bira. Ela tinha um candomblé, e isso vem mais ou menos por aí. Tanto que, no Cacique, a tamarineira [árvore plantada na quadra reverenciada por quem visita o local] fica onde está o axé do Cacique, desde o início, com a Tia Conceição.”

Com alegria, o sambista conta que o maior sucesso do bloco foi o samba Água na Boca, lançado em 1964. De lá para cá é cantado nos desfiles do bloco e de outros, além de bailes de carnaval. “Foi o primeiro sucesso do Cacique”, disse.

Símbolos

A marca do bloco, a figura de um indígena estilizado, é referência do carnaval de rua carioca. Como também é a fantasia usada no começo da sua trajetória. A identidade visual carnavalesca do bloco foi criada pelo artista plástico Romeu Vasconcelos. Na época em que as fantasias, sobretudo de indígenas, eram feitas em algodão ou cetim, o modelo era confeccionado com napa.

“A fantasia de napa marca o imaginário do folião do Cacique de Ramos. Ela vestiu gerações de pessoas que relatam com muito prazer e muita emoção o que era vestir essa fantasia tão emblemática, tão livre, que cobria qualquer tipo, tamanho, formato de corpo, masculino ou feminino”, destacou o historiador, membro da diretoria e coordenador do Centro de Memória Domingos Félix do Nascimento do Grêmio Recreativo Cacique de Ramos, Walter Pereira Júnior.

A partir da fantasia, o artista plástico passou a criar um conjunto de símbolos e de imagens, que a tornaram muito notória. “Eram representações muito bonitas nas cores preto e branco, inicialmente, porque até meados dos anos 70, o bloco tinha exclusivamente essas duas cores. Depois é que a efígie do índio, que sempre foi vermelha, começa a aparecer mais na fantasia e a partir daí o vermelho entra também na fantasia”, ressaltou.

Referência musical

A tradição do Cacique não se restringe ao carnaval. É também uma referência no cenário musical. Dos encontros de pagode, que reuniam muitas pessoas ao redor do samba com comida e bebida, nasceram grupos e artistas de destaque como o próprio grupo Fundo de Quintal, que tem na sua formação o presidente do bloco, conhecido como Bira Presidente. A presença da cantora Beth Carvalho também era frequente. As rodas de samba viram surgir sambistas importantes como Zeca Pagodinho, Arlindo Cruz e Xande de Pilares.

Xande de Pilares espera que o grupo continue agregando pessoas que amam o samba.” Foto: Mariana Oliver / Divulgação

A aproximação de Xande com o Cacique tem relação com a rivalidade que ocorria entre os seus amantes e os do também tradicional bloco do carnaval carioca Bafo da Onça. Quando ele tinha de 13 para 14 anos, a mãe chegou machucada em casa por causa de uma briga entre os foliões das duas instituições. Para defender a mãe, como coisas de criança, ele quis tirar satisfações com o “Tal de Cacique” e foi para a quadra em Ramos achando que chegaria lá e encontraria uma pessoa. Desse momento em diante construiu a sua história no lugar e na música.

“O Cacique é um movimento cultural maravilhoso que eu conheci. Por causa dele, eu estou até hoje no samba, onde pude ver Zeca, Marquinho China, Baiano, Luiz Carlos da Vila, Nelson Cavaquinho, que eu nunca tinha visto pessoalmente, Mussum e aquela mesa maravilhosa que tinha embaixo da Tamarineira. Muitas vezes eu ia para lá e a molecada jogava bola. Tinha uma quadrinha de asfalto. Tenho muitas passagens boas no Cacique”, revelou Xande de Pilares à Agência Brasil.

Para expandir as amizades com os artistas, o cantor se aproximou do percussionista Ubirany Félix do Nascimento, um dos fundadores do Fundo de Quintal, morto em 2020 vítima de covid-19. “Um dia eu peguei intimidade com o Ubirany e, através dele, me aproximei de todos. Tenho muito orgulho de ter tido a paciência para conhecer os personagens do Cacique de Ramos”, completou o cantor.

“Parabéns ao Cacique de Ramos, que ele continue revelando talentos e que continue agregando pessoas que amam o samba.”

Essa junção do carnaval com o samba deu frutos ao bloco que desfilava ao som de músicas próprias, que conquistavam o público e garantiam a empolgação da instituição no centro do Rio.

“O desfile do Cacique, quando se transforma em bloco de multidão, falava muito da horizontalidade. Todos estavam iguais dentro daquela massa compacta de foliões cantando, sambando, extravasando sua alegria, vestindo as cores e a fantasia da instituição, no caso do Cacique a napa carnavalesca, cantando sambas próprios e desfilando dentro do seu cortejo”, disse o coordenador do Centro de Memória.

No compromisso de manter o projeto cultural, o bloco transmite informações sobre a sua história em exposições, palestras e shows. Na parte social, fez convênio com a 4ª Coordenadoria Regional de Ensino do Município do Rio para aulas de música para os alunos do ensino fundamental. Além disso, realiza aulas de percussão aos sábados na sede e aulas de samba aos domingos sem pagar para entrar, relatou Márcio Nascimento administrador-geral do Cacique à reportagem.

Rio de Janeiro – Blocos de rua tradicionais, como Cacique de Ramos e Bafo da Onça, entre outros, desfilam pelo centro do Rio (Vladimir Platonow/Agência Brasil) – Vladimir Platonow/Agência Brasil

Segundo o administrador do Cacique, Márcio Nascimento, a instituição se consagrou como um dos principais destinos turísticos do Rio de Janeiro e aproveitou essa motivação para garantir a sustentabilidade financeira, para manter saudável, esse patrimônio cultural. “O Cacique planeja continuar a promover os seus eventos culturais e buscar novas fontes de financiamento. Abrimos hoje espaços para parcerias, o que vem ajudando na nossa engrenagem a se adaptar às mudanças do mundo moderno”, indicou.

Márcio reconhece que é “uma dificuldade” manter estável um bloco como o Cacique. “Uma das maiores empreitadas que eu enfrentei foi a gestão financeira e a necessidade de modernização da infraestrutura. No entanto, junto com a diretoria de ouro e nós familiares do presidente conseguimos superar esses desafios buscando novas formas de nos mantermos relevantes e financeiramente viáveis”, afirmou Nascimento.

Carnavalesco

André Cezari adiantou para a Agência Brasil, que em 2024 o tema comemorativo celebra as histórias de amor que tiveram origem no bloco sob as mais diversas formas com o título Coração caciqueano uma história de amor. Outro destaque em 2024, de acordo com Cezari é a alegoria que vem a corte com a rainha e as princesas do bloco decorado com corações.

“Esses corações simbolizam os nossos corações caciqueanos que estarão lá desfilando que ao mesmo tempo saltarão aos olhos e esse amor envolvente tocará também todos que estarão na arquibancada na Avenida Chile para que no ano seguinte esse amor cresça e faça com que eles também venham conosco em nossos desfiles e na nossa quadra”, disse, acrescentando que a expectativa é muito grande.

Cacique do Pará recebe prêmio por empreender e conservar na Amazônia

O Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) vai premiar a indígena Katia Silene Tonkyre, cacique da aldeia Akratikatejé (PA), por suas iniciativas de organização e empenho para empreender, coletar e produzir e, ao mesmo tempo, educar e conscientizar sobre a importância da conservação e da proteção do meio ambiente na Amazônia. O prêmio deverá ser entregue em abril, em evento na Costa Rica, sede do IICA.

Líder de uma aldeia na qual vivem 85 indígenas de 23 famílias da etnia Gavião da Montanha, dedicadas principalmente à coleta, produção e venda de castanhas e de pescado, mel e frutas, Katia receberá o prêmio A Alma da Ruralidade, além de ser convidada pelo IICA a participar de diversas instâncias consultivas do organismo especializado em desenvolvimento agropecuário e rural.

“Trata-se de um reconhecimento aos que cumprem um duplo papel insubstituível: ser avalistas da segurança alimentar e nutricional e, ao mesmo tempo, guardiões da biodiversidade do planeta pela produção em qualquer circunstância. O reconhecimento também tem a função de destacar a capacidade de promover exemplos positivos para as zonas rurais”, disse o diretor-geral do IICA, Manuel Otero.

No âmbito do programa Líderes da Ruralidade, o IICA trabalha para que o reconhecimento facilite a criação de vínculos com organismos oficiais, da sociedade civil e do setor privado para obter apoio para suas causas.

Katia Silene Tonkyre é a primeira mulher cacique da aldeia Akratikatejé, situada no Pará, na região norte do Brasil. É filha do respeitado cacique Payaré, um lutador pelos direitos dos indígenas já falecido, que implantou na aldeia o conceito de empreendedorismo e de produzir sem agredir a natureza, beneficiando a comunidade com a organização, a coleta e a produção de castanhas, maracujá, açaí, cacau, cupuaçu e outras frutas amazônicas, além de mel, animais e criação de peixes, o que gera empregos e receitas.

Katia continuou e aperfeiçoou esse legado, ampliando-o para a realização de parcerias e de ações que contribuíram para o bem-estar da comunidade.

“Eu não concordo quando alguém diz que é necessário destruir a floresta para criar gado ou investir em soja. Nós queremos alcançar um projeto sustentável e queremos crescer, mas não destruindo a natureza. Nós valorizamos os nossos produtos. Não é necessário destruir. É possível conciliar as duas coisas, fazer o projeto e manter a floresta em pé, utilizá-la. A floresta nos dá uma farmácia verde e rica, temos os nossos animais e temos a nossa floresta”, diz Katia.

“A natureza, a floresta, somos nós. Nós somos a Amazônia, nós somos a floresta. Quando uma árvore morre, morre uma parte de nós, pois somos as raízes dessa floresta. E a castanha é o nosso ouro; também temos açaí, cacau e peixes, e agregamos valor à nossa produção sem agredir a natureza”, contou a cacique.