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Itamaraty lança pacote de ações afirmativas para grupos discriminados

O Ministério das Relações Exteriores (MRE) apresentou nesta quarta-feira (4), em Brasília, o primeiro plano de ação que integra o Programa Federal de Ações Afirmativas (PFAA), instituído pelo governo federal em março de 2023.

O plano setorial é composto por 34 ações e tem o objetivo de promover, no Itamaraty, direitos e a equiparação de oportunidades a grupos sociais historicamente discriminados: populações negra, quilombola, indígena, mulheres, pessoas com deficiência (PCD) e LGBTQIA+, sigla que representa pessoas lésbicas, gays, bissexuais, trans (transgêneros e travestis), queer, intersexuais, assexuais e demais orientações sexuais e identidades de gênero.

No lançamento do plano, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, afirmou que o Itamaraty enfrenta o desafio de renovação e de implementação das políticas públicas mais representativas para a população brasileira.

Brasília (DF), 04/12/2024 – A ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, o ministro de Relações Exteriores, Mauro Vieira, e a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, participam do lançamento do plano de ação do Itamaraty – Marcelo Camargo/Agência Brasil

“As 34 ações representam o nosso melhor esforço, mas seguirão em construção permanente por meio do diálogo e da possibilidade de alterações futuras. As metas, prazos e objetivos concretos são fundamentais e tão relevantes quanto é a mudança de mentalidade”, destacou o chanceler.

Políticas afirmativas

O PFAA foi criado pelo grupo de trabalho interministerial, ao longo de 2023 e 2024, que contou com a participação de 16 órgãos do governo federal, entre eles o Ministério das Relações Exteriores (MRE), pioneiro na entrega do plano de ações. 

O grupo é coordenado pelo Ministério da Igualdade Racial (MIR). No Palácio do Itamaraty, a titular da pasta, a ministra Anielle Franco, comentou sobre a importância da igualdade de oportunidades, por meio de ações afirmativas, e citou a cota racial que reserva vagas a pessoas negras e indígenas em universidades públicas, desde 2012.

“Esta ação afirmativa não só é uma das maiores políticas reparatórias deste país, como ela dá oportunidades e abre portas”, avalia Anielle.

Brasília (DF), 04/12/2024 – Para a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, medidas abrem portas – Marcelo Camargo/Agência Brasil

Também presente no lançamento do plano, a ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, reconheceu que há algumas décadas a diplomacia brasileira não era inclusiva, mas que movimentos internos do MRE têm alterado essa realidade. Para a ministra do MGI, com o primeiro plano sobre o tema do governo federal, o MRE precisa acelerar ainda mais a implementação de ações afirmativas. “Temos a preocupação gigantesca com que o Estado brasileiro seja representativo da sociedade. E nosso objetivo é a valorização da diversidade brasileira reduzindo as desigualdades.”

“A gente pode dar o exemplo de criar um Estado que precisa atuar justamente nos fundamentos contrários à opressão e exclusão. Não é algo simples porque falamos de mecanismos e estruturas históricas.”  Esther Dweck. 

Brasília (DF), 04/12/2024 – A ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, e o ministro de Relações Exteriores, Mauro Vieira, durante o lançamento do plano de ação do Itamaraty.- Marcelo Camargo/Agência Brasil

Plano de ação do MRE

A secretária-geral do Ministério das Relações Exteriores, Maria Laura da Rocha, apresentou o plano de ação como resultado do processo de consulta interna que envolveu todas as secretarias do MRE, os comitês de gênero, étnico-racial, de pessoas com deficiência e de pessoas LGBTQIA+, que compõe o sistema de promoção da diversidade e da inclusão do Ministério das Relações Exteriores, criado em abril. “As medidas afirmativas têm como objetivo contribuir dentro da esfera de competência do Ministério das Relações Exteriores para a redução das desigualdades históricas e estruturais que afetam determinados grupos no Brasil”, explicou a secretária-geral do MRE.

Das 34 ações afirmativas, 18 estão sendo implementadas na área de gestão de pessoas e na contratação de serviços e produtos. As demais 16 ações afirmativas estão relacionadas a atividades finalísticas do Itamaraty.

No campo da gestão de pessoas, estão ações para a ampliação do acesso à carreira diplomática, como a oferta de bolsas destinadas ao custeio de estudos de preparação para o concurso de admissão à carreira de diplomata de grupos específicos. Os beneficiários serão mulheres de baixa renda, pessoas com deficiência, indígenas e negras. A meta para os primeiros 24 meses é ampliar o número de candidatos destes públicos na última fase do processo seletivo.

Além das bolsas, entre outras medidas, o plano irá:

·       –  priorizar pessoas negras e mulheres na ascensão funcional das carreiras;

·        – melhorar a acessibilidade e as condições de trabalho do servidor com deficiência;

·        – promover a diversidade na composição de órgãos colegiados do Itamaraty;

·        – apoiar brasileiros vítimas de racismo no exterior;

·        – ampliar de serviços consulares, no exterior, voltados a mulheres brasileiras e para atender às necessidades de pessoas com deficiência e LGBTQIA+;  

·        – capacitar lideranças indígenas e de comunidades tradicionais para negociações sobre meio ambiente e mudança do clima.

Evento na Uerj debate educação e ações afirmativas no país

Conhecida pelo pioneirismo na adoção de cotas raciais no país, a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) promoveu nesta terça-feira (22) um debate sobre ações afirmativas no campo da educação. Pesquisadores de diferentes áreas apresentaram reflexões e iniciativas de combate às discriminações contra grupos étnico-raciais, idosos e refugiados.

Rio de Janeiro (RJ) 22/10/2024 – O professor Luiz Augusto Campos apresentou dados sobre a desigualdade racial na ciência. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

No evento, o professor Luiz Augusto Campos, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp) da Uerj e do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (Gemaa), apresentou dados sobre a desigualdade racial na ciência e o papel desempenhado pelas cotas raciais na diminuição desse problema.

Segundo a pesquisa de Luiz Augusto, entre 2002 e 2021, o número de matriculados no ensino superior público que pertenciam ao grupo pretos, pardos e indígenas subiu de 31% para 52%. O grupo formado por brancos e amarelos foi de 69% para 47% no mesmo intervalo de tempo. A Lei de Cotas foi sancionada em 2012.

“As cotas refundam o ensino superior público no Brasil, fazendo com que ele encontre suas prerrogativas constitucionais”, reflete o pesquisador. “Esses dados ajudam a entender como as cotas estão para além de uma política de beneficiamento de grupos específicos. Na verdade, o que a cota faz é minimamente mitigar as desigualdades que o ensino superior público promovia antes delas. Ou seja, elas justificam a existência do próprio ensino superior público”.

A professora Maria Teresa Tedesco, do Instituto de Letras da Uerj, trouxe detalhes do Programa Varia-Idade. A pesquisa, que começou em 2015, analisa relatos de idosos de diferentes bairros do Rio de Janeiro e reúne material sobre o ordenamento urbano e o modo de ocupar a cidade. O objetivo é que os dados ajudem a pautar políticas públicas. A pesquisa ainda está em andamento.

“Como consequência do aumento da expectativa de vida e da longevidade, é preciso ter políticas públicas e sociais que garantam e assegurem o bom atendimento às pessoas idosas. Atendimento de saúde, de educação e do bem-estar no geral. Da inclusão na sociedade. Porque sabemos que essas pessoas ficam muitas vezes à margem”, disse a pesquisadora.

Rio de Janeiro (RJ) 22/10/2024 – A professora Érica Sarmiento, do Departamento de História e da Cátedra Sérgio Vieira de Mello da Uerj. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

A pesquisadora Érica Sarmiento, do Departamento de História e da Cátedra Sérgio Vieira de Mello da Uerj, trabalha em algumas ações voltadas especificamente para refugiados no Brasil. Ela citou como umas iniciativas mais bem-sucedidas a articulação de uma lei estadual que garantiu uma forma específica de ingresso de refugiados, apátridas e imigrantes com visto humanitário em universidades públicas. O primeiro vestibular do tipo foi feito pela Uerj em 2023.

Segundo Sarmiento, a comunidade acadêmica e toda a sociedade ganham com a troca de saberes e aprendizados de diferentes culturas.

“A responsabilidade com o outro implica proporcionar acolhimento. E aí vem a importância da universidade como espaço de recepção, de ruptura com estruturas mentais em relação à seleção migratória. Implica também a defesa dos direitos humanos para além dos muros da universidade. E acolher o outro não apenas de forma unilateral, mas com expectativas de aprendizado e de troca de saberes”, disse a pesquisadora.

Cartilha facilita acesso a políticas de ações afirmativas para alunos

O Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (Gemaa) lançou, gratuitamente, a cartilha Universidade para Todos: Ações Afirmativas e Inclusão nas Universidades Brasileiras. A meta é tornar informações sobre acesso às políticas de ações afirmativas mais fáceis e reunidas em um só documento de comunicação também fácil, disse nesta quinta-feira (1º) à Agência Brasil o coordenador do grupo, João Feres. A cartilha pode ser acessada neste endereço.

Em palestras em colégios de ensino médio no Rio de Janeiro e outras cidades do país, Feres tem se surpreendido em ver como os alunos, que são os potenciais beneficiários das ações afirmativas, estão mal informados sobre o assunto.

“Os alunos de colégio público são, naturalmente, candidatos, mas não sabem, não têm realmente informações sobre como funciona, como se inscrever, quais são as categorias de beneficiados”, explicou.

Na avaliação do coordenador, essa é uma oportunidade ímpar de vida que é a pessoa entrar em uma universidade pública, que geralmente é uma educação de qualidade. “A pessoa tem uma oportunidade ímpar de mobilidade social. Com um diploma de universidade pública você se sente mais qualificado para arrumar um emprego melhor”, justificou.

O coordenador afirmou, ainda, que o grupo de estudos está em busca de realizar convênios com organizações que se interessem em disseminar a cartilha. Quanto mais ela for divulgada, maior número de estudantes a obra vai abranger.

Ação afirmativa

O guia orienta sobre quais são as políticas de ação afirmativa disponíveis e como os alunos podem se beneficiar dos programas governamentais. Há informações sobre as principais políticas, como os tipos de cotas existentes, como são distribuídas vagas, o Programa Universidade Para Todos (Prouni), o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), o Programa de Bolsa Permanência e a importância do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) como critério para acesso a diversas oportunidades.

A cartilha esclarece ainda como funciona o Sistema de Seleção Unificada (Sisu), que reúne as vagas ofertadas por instituições públicas de ensino superior de todo o Brasil.

“A gente tentou fazer o mais completo possível”, disse João Feres, que há 20 anos pesquisa o tema das ações afirmativas. A cartilha aborda também os avanços significativos em relação à inclusão de pessoas trans e com deficiência no ensino superior ao longo do tempo.

O Grupo de Estudos Multidisciplinar da Ação Afirmativa é um núcleo de pesquisa baseado no Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Ele foi criado em 2008 tendo como meta produzir estudos sobre ação afirmativa a partir de uma variedade de abordagens metodológicas.

O grupo ampliou sua área de atuação e, atualmente, desenvolve investigações sobre a representação de raça e gênero na educação, na mídia, na política e em diversas outras esferas da vida social.