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Mudanças climáticas do passado impactaram genética de ave na Amazônia

Os efeitos das mudanças climáticas naturais ocorridas ao longo de milhares de anos na Amazônia estão registrados no genoma de pássaros do gênero Willisornis. Também conhecidas como rendadinhos ou formigueiros, estas aves tiveram uma redução da sua diversidade genética ao longo do tempo, sobretudo devido às transformações ambientais ocorridas no período de glaciação. É o que aponta um estudo brasileiro que vinha sendo desenvolvido desde 2016 através da colaboração de diferentes instituições científicas.

Os resultados foram descritos em um artigo publicado nessa quarta-feira (24) na revista científica Ecology and Evolution, publicação internacional voltada para a divulgação de pesquisas em ecologia, evolução e ciências da conservação. Apesar de tratar de eventos passados, os achados podem contribuir para a análise de possíveis efeitos do aquecimento global, fenômeno atualmente em curso impulsionado pela ação do homem no planeta.

O estudo foi coordenado pelo Instituto Tecnológico Vale – Desenvolvimento Sustentável (ITV-DS). Criado em 2010 com sede em Belém, trata-se de um braço da mineradora Vale dedicada ao fomento da pesquisa científica. Houve ainda envolvimento da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), da Universidade Federal do Pará (UFPA) e da Universidade de Toronto, no Canadá.

Mudanças climáticas do passado impactaram genética de ave na Amazônia. Foto: Bruno Rennó / WikiAves

Segundo o biólogo Alexandre Aleixo, pesquisador do ITV-DS que liderou o estudo, os pássaros do gênero Willisornis são considerados bioindicadores naturais da Amazônia. Significa que são seres vivos que podem ser utilizados para avaliar a qualidade ambiental do bioma onde vivem.

“Os pássaros do gênero Willisornis só vivem próximos ao solo de floresta úmida. Eles não conseguem habitar em nenhum outro ambiente. Então eu posso dizer que a distribuição dele indica a presença de floresta úmida. Pode parecer redundante. Mas quando a gente olha para o contexto histórico e prova, através da pesquisa científica, que os Willisornis estavam presentes nessa região da Amazônia há 400 mil anos, temos um indicativo muito seguro de que a floresta também estava presente nesse lugar, naquele período”, explica Aleixo.

O estudo envolveu o sequenciamento do genoma completo de nove pássaros, oito deles realizados pelos pesquisadores brasileiros e um por cientistas canadenses. As informações contidas no DNA das aves passaram por uma análise. Modelos computacionais foram usados para compreender questões como a dinâmica do tamanho das populações e as relações de parentesco entre os indivíduos.

Aleixo explica que foi realizada uma análise coalescente, que permite obter um retrato retrospectivo da genética populacional. É a mesma técnica usada nos testes de ancestralidade, que se popularizaram nos últimos anos na Europa e nos Estados Unidos e que também já existe no Brasil. Por meio deles, é possível obter, a partir de uma amostra de saliva, informações do genoma de qualquer pessoa.

O teste irá mostrar as origens geográficas do DNA, indicando as regiões de onde vieram seus ancestrais, e pode revelar outras informações como o risco de desenvolver determinadas doenças. No Brasil, já existem empresas ofertando o serviço que prometem revelar o passado com base em dados de até oito gerações.

“No caso dos Willisornis, a gente também buscou essa cápsula do tempo que está registrada no DNA e ela nos permitiu que a gente chegasse numa resolução de 400 mil anos para cá, para o genoma de cada indivíduo. A datação é amparada por vários estudos”, explicou Aleixo.

O biólogo acentuou também que as mudanças climáticas influenciam processos de expansão e retração da cobertura vegetal da Floresta Amazônica. Dessa forma, essas aves enfrentaram um cenário crítico no interstício que vai de 80 mil até 20 mil anos atrás, quando houve uma redução da área de mata fechada em decorrência da glaciação. De acordo com o pesquisador, já há estudos que apontam para mudanças drásticas no regime de chuvas nessa época, com estimativas que indicam uma queda de 40% a 60% no volume de precipitações. Passado esse período, a Floresta Amazônica voltou a se expandir para atingir o formato como a conhecemos atualmente.

“Com menos cobertura vegetal, as populações de Willisornis acabam se reduzindo e, consequentemente, apresentam taxas mais elevadas de cruzamentos entre parentes. Isso resulta em menor diversidade genética”, explica Aleixo. O que surpreendeu os pesquisadores, no entanto, foi a resiliência dessas aves, que demostraram capacidade de sobrevivência mesmo em uma situação adversa.

Os pássaros do gênero Willisornis só vivem próximos ao solo de floresta úmida.  – Valter Campanato/Agência Brasil

“O que vemos é que a floresta úmida se comporta como uma sanfona ao longo do tempo. Ela aumenta em períodos interglaciais e diminui em períodos glaciais. E isso deixa um impacto no genoma das espécies. Conforme a teoria genética de populações, quando você tem populações que são muito homogêneas, que não são tão diversas do ponto de vista genético, elas tendem à extinção. Chama atenção que os Willisornis são pássaros que não migram, não se deslocam muito. Eles têm um raio de ação muito pequeno. E mesmo essas drásticas reduções populacionais não foram suficientes para extinguir a espécie.”

A pesquisa mostrou que esse processo ocorreu em toda a extensão florestal, mas não na mesma intensidade. Os nove pássaros que tiveram seus genomas sequenciados são de diferentes localidades e foi observada uma variação genética bem mais limitada no sul e no sudeste da Amazônia. De acordo com os pesquisadores, os resultados corroboram a tese de que essas regiões experimentam transformações mais significativas durante períodos secos, quando a floresta úmida se converte em ambientes abertos, como cerrados.

“Chamou atenção esse declínio maior no sul e sudeste. A gente sabe que mudanças climáticas impactaram Amazônia, isso está consolidado na literatura científica. Mas não existe ainda uma ideia muito clara de como cada setor se comportou. A gente consegue ver na nossa pesquisa que essa retração florestal não foi homogênea em toda a extensão do bioma. Essa parte que fica bem na transição entre a Amazônia e o Cerrado foi muito mais impactada do que as outras áreas”, revela Aleixo.

Aquecimento global

Embora seja esperado que o planeta enfrente mudanças climáticas ao longo do tempo, as alterações atualmente em curso geram preocupações de cientistas. Nas últimas décadas, vem sendo registrado um aumento anormal da temperatura média do planeta, influenciado pela ação humana. A comunidade científica vem chamando atenção para as consequências alarmantes caso se mantenha o ritmo desse aquecimento global.

De acordo com Aleixo, embora não forneça dados específicos do período presente, o estudo com os Willisornis pode contribuir para um planejamento de ações voltadas para mitigar os efeitos das alterações climáticas em curso. “De certa forma, a gente já consegue inferir o que pode acontecer”, diz ele, mencionando a existência de estudos que já fazem projeções sobre a Amazônia.

O estudo foi coordenado pelo Instituto Tecnológico Vale – Desenvolvimento Sustentável (ITV-DS). Criado em 2010 com sede em Belém, trata-se de um braço da mineradora Vale Foto: ITV-DS / Divulgação

Ele chama atenção para desafios envolvendo as unidades de conservação. “Muitas vezes, adota-se a premissa de que, uma vez demarcada, a única coisa que precisaria ter é um trabalho ali de vigilância para evitar o desmatamento. Ou seja, a unidade está lá conservada e ponto final. Mas, na verdade, ela está totalmente despreparada para lidar com as mudanças climáticas. Mesmo em uma área conservada e cercada, você vai ter uma degradação em função do clima e da mudança na distribuição de chuvas”, diz.

Dessa forma, pesquisas como a desenvolvida com os Willisornis podem contribuir para se pensar ações de conservação da biodiversidade. “A gente tem que ter indicativos, por exemplo, de quais são as populações que têm maior chance de sobreviver nesses locais diante da mudança climática. Isso permite estabelecer, por exemplo, estratégias de reintrodução ou de criação corredores de conexão. Mas eu preciso saber exatamente o que esse corredor vai estar conectando. Vai fazer diferença para essa espécie?”, questiona Aleixo.

Os pesquisadores já trabalham com derivações do estudo. Eles querem encontrar, no genoma, explicações para a resiliência dos Willisornis. “Eles têm algumas características que permitiram a essas aves se adaptarem a uma Amazônia mais seca, a uma Amazônia bastante perturbada. A gente sabe que a fauna se adapta e que existe uma resiliência para lidar com as mudanças climáticas. Mas esses estudos também nos ajudam a entender qual o limite dessa resiliência”, diz Aleixo. Já está em andamento também uma avaliação do genoma de outras espécies da fauna e da flora da Amazônia, entre elas a palmeira de açaí, a castanheiras e alguns lagartos.

Nova técnica pode produzir embriões com genes de dois homens a partir de óvulo feminino

19 de abril de 2024

 

Cientistas da Universidade de Saúde e Ciência do Oregon, nos Estados Unidos, estão trabalhando para desenvolver uma técnica capaz de produzir embriões viáveis a partir de células da pele masculina e a pesquisa pode contribuir com casais compostos de dois homens para a geração de bebês com características genéticas de ambos os pais. Lygia da Veiga Pereira, professora do Instituto de Biociências (IB) da Universidade de São Paulo, explica o processo de formação de um embrião e a técnica empregada na pesquisa.

Segundo a especialista, as células humanas têm duas cópias de cada um dos cromossomos, um herdado da mãe e outro herdado do pai e, por ter uma dupla de cada cromossomo, são chamadas de células diploides. “Quando a gente vai produzir os nossos gametas, a gente tem que fazer um tipo de divisão celular de forma a gerar células que possuam só uma cópia de cada cromossomo, porque o gameta feminino vai se juntar com gameta masculino para formar um novo indivíduo com duas cópias”, explica.

De acordo com a docente, o grupo norte-americano conseguiu pegar um óvulo feminino e introduzir nele o núcleo de uma célula de pele de um camundongo masculino. A partir desse processo, a célula de pele reduziu o seu número de cromossomos e, por fim, a estrutura passou a ser um óvulo, mas composto de um cromossomo masculino em seu interior. “Então isso seria uma maneira de você fazer um indivíduo masculino produzir um óvulo. Mas é importante ressaltar que, mesmo podendo surgir um embrião com as características de dois indivíduos masculinos, ainda é necessário o óvulo de uma mulher, o que conseguiram fazer foi colocar dentro desse óvulo um material genético masculino”, esclarece.

Aplicação em humanos

Lygia conta que a pesquisa ainda está nos estágios iniciais de com camundongos e ainda está muito longe da possibilidade de iniciar a aplicação na espécie humana. Ela explica que os testes em humanos só começam a ser realizados após serem esgotadas todas as possibilidades de estudos e possíveis novas descobertas com a manipulação entre os camundongos. “Eles ainda estão no camundongo e ainda nem demonstraram que esse óvulo que produziram é funcional e capaz de produzir um camundongo normal. Então, esse trabalho é o começo de uma possibilidade de alternativa reprodutiva, mas está muito longe ainda”, analisa.

Conforme a especialista, essa técnica pode permitir, daqui a muito tempo e assim que os estudos em animais se mostrarem plausíveis, contribuir para tratamentos de infertilidade e auxiliar casais compostos de dois homens a terem um filho com características genéticas de ambos. Ela explica, no entanto, que a fecundação do óvulo com o material genético masculino precisa ser realizada com espermatozoide de um homem diferente. “Se você transforma o óvulo de uma mulher em um óvulo com material genético masculino e insere ali o espermatozoide do mesmo homem, isso pode acabar gerando um clone dele. Portanto, o que deve ser feito é pegar esse óvulo masculino, colocar o material genético de outro homem e então teremos uma criança que possui dois pais”, discorre.

De acordo com Lygia, as pesquisas feitas a partir das células-tronco pluripotentes estão mais avançadas e já apresentaram resultados promissores, inclusive conseguindo gerar embriões saudáveis de camundongos a partir de óvulos e espermatozoides oriundos dessas substâncias. “Recentemente os cientistas puderam mostrar que conseguiam produzir, em camundongos, óvulos e espermatozoides viáveis, que foram capazes até de dar origem a um novo indivíduo a partir das células-tronco. Então, eu acho que está muito mais avançado do que essa pesquisa que foi feita agora com os óvulos com material masculino”, finaliza.

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Esta notícia é uma transcrição parcial ou total do Jornal da Universidade de São Paulo. Este texto pode ser utilizado desde que seja atribuído corretamente aos autores e ao sítio oficial.
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IICA quer debater criação de selo de agricultura familiar das Américas

O Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) quer discutir a criação de um selo comum de agricultura familiar das Américas. A proposta foi uma das apresentadas pelo diretor-geral do IICA, Manuel Otero, ao final das reuniões plenárias, a 42 lideranças rurais que participaram do primeiro Encontro de Líderes Rurais, promovido pela organização, na Costa Rica.

“Obviamente há países, e o Brasil é um claro exemplo, que têm avançado nisso. Mas, temos o direito de sonhar com um selo da agricultura familiar. Não é algo simples, mas temos o direito de sonhar”, disse Otero em entrevista à Agência Brasil.

No Brasil, o Selo Nacional da Agricultura Familiar (Senaf) identifica os produtos da agricultura familiar e é uma espécie de garantia aos consumidores de como aqueles produtos foram produzidos e da qualidade deles. Com o selo, os produtos passam a integrar um catálogo, que busca dar mais visibilidade a essa produção. A ideia é que haja um selo único para todos os países americanos, dando também visibilidade e facilitando o comércio. Isso esbarra, no entanto, nas legislações de cada país.

Além de discutir a criação desse selo comum, o IICA comprometeu-se a debater a formação de uma rede de bancos de sementes e de materiais genéticos de espécies de plantas nativas dos países americanos. Segundo Otero, aos bancos atuais estão mais dedicados a cultivos tradicionais como milho e trigo, mais deixam de fora espécies que crescem apenas nas Américas e que podem ser importantes para o futuro da humanidade.

Outro compromisso é a criação de um banco de experiências e soluções dadas principalmente por pequenos agricultores a desafios no campo como a falta de água, a seca, o desequilíbrio do solo e o combate a pragas. Cada um dos líderes foi escolhido justamente por ter experiências exitosas, que podem ser replicadas. “Acredito que o IICA pode fazer uma contribuição significativa sistematizando essas experiências”, disse Otero.

A organização comprometeu-se também a prestar apoio às lideranças rurais, a fortalecer a rede formada ao longo dos dias de encontro, assim como conectar esses produtores e suas comunidades a entidades e com financiamentos que possam ajudá-los a desenvolver a região. Outro compromisso é a atenção ao cooperativismo, que segundo Otero, necessita de ajustes, capacitação e melhoras normativas nos países.

“As reuniões são importantíssimas como ponto de encontro para nos energizarmos. Agora, vem o dia seguinte e temos que avançar com passos concretos, senão muitos desses esforços não dão em nada e, como diretor do IICA, não devo permitir isso”, acrescentou o diretor-geral.

Agricultura nas Américas

Na entrevista à Agência Brasil, Otero comemorou o encontro inédito. O IICA é uma organização chefiada pelos ministros e secretários de Agricultura dos 34 países das Américas que o compõem. “O IICA se relaciona com empresários e com acadêmicos de alto nível, com diretores de organizações não governamentais mas, às vezes, falta nos relacionarmos com as bases, com o campo. Para reparar essa falta, decidimos, há três anos, instituir o prêmio Alma da Ruralidade e começamos o trabalho de identificar esses líderes que hoje nos acompanham”, ressaltou.

Até o momento, 43 lideranças receberam esse título em quase todos os países americanos. Dessas, 36 participaram do primeiro Encontro de Líderes Rurais de forma presencial e seis, remotamente. “Essa reunião mostra a força do nosso continente à nível das comunidades rurais e a diversidade de realidades dessas comunidades”, destacou Otero. O encontro, que começou na terça-feira (16), tem como objetivo promover a troca de experiências e conta, além das reuniões plenárias, com visitas técnicas a empreendimentos sustentáveis na Costa Rica. A agenda termina no sábado (20).

Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) promove o primeiro Encontro de Líderes Rurais, na Costa Rica – IICA/Divulgação

Para Otero, os governos precisam dar atenção à agricultura familiar e viabilizar formas de tornar a vida no campo atrativa para as comunidades. “Nossos governos têm que entender que as comunidades rurais, os pequenos agricultores são peça fundamental em qualquer estratégia de desenvolvimento”, enfatizou.

Segundo dados apresentados pelo vencedor do Prêmio Mundial de Alimentação de 2020, Rattan Lal, que participou do evento por meio de gravação, a América Latina e o Caribe têm uma área florestal de 1 bilhão de hectares, que representa 28% do total mundial, e uma biodiversidade que representa 36% das espécies alimentares e industriais do mundo. Nessa região, 38% do uso da terra é agrícola.

Na América Latina, existem quase 15 milhões de pequenas propriedades agrícolas, dos quais 10 milhões são voltadas para a subsistência. A área voltada para a agricultura familiar é de 400 milhões de hectares.

De acordo com Otero, a América é o continente que está passando pelo maior processo de urbanização do mundo e a projeção é que, em 2050, 86% da população esteja vivendo nas cidades. No entendimento dele, isso é “uma péssima notícia para o mundo, porque as pessoas deixam de ser produtoras e passam a ser consumidoras”.

Os produtores, para ele, “São atores centrais, que nós dizemos que dão a vida para a ruralidade”. “Aí está a nossa preocupação. Em meio a um contexto de cenários turbulentos, marcados por guerra, por pandemia, pela mudança climática, eles são a variável de ajuste. Temos que defender a viabilidade dos agricultores familiares”, defendeu

*A repórter viajou a convite do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA).

UFF presta homenagem a aluno desaparecido durante a ditadura militar

Ivan Mota Dias é um dos mais de 200 desaparecidos políticos durante a ditadura militar no Brasil, entre 1964 e 1985. Ele cursava história na Universidade Federal Fluminense (UFF) e lutou contra a ditadura na Vanguarda Popular Revolucionária (VPR).

Ivan tinha 28 anos quando foi preso, no dia 15 de maio de 1971, no Rio de Janeiro. Para quem o conhecia de perto, ele era sinônimo de doçura, era amigo de todos, gostava muito de estudar e, acima de tudo, lutava por justiça. A morte nunca chegou a ser confirmada e a família nunca pôde se despedir de Ivan.

Esta semana, 53 anos após o desaparecimento, o estudante foi homenageado pela UFF, universidade onde quase se formou. Faltavam apenas dois meses para receber o diploma quando ele teve a prisão decretada e precisou entrar na clandestinidade.

Edda Mastrangelo Dias, 83 anos, saiu de Brasília e foi ao campus Gragoatá, da UFF, em Niterói, para receber junto a outros membros da família, a homenagem a Ivan. Pouco antes de entrar no auditório onde a cerimônia aconteceria, ela conversou com a Agência Brasil. “Fui cunhada e amiga. Principalmente amiga do Ivan”, ressalta.

Edda Mastrangelo Dias, ex-cunhada e amiga de Ivan Mota Dias, desaparecido político da ditadura militar de 1964. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Ela foi a primeira esposa do irmão de Ivan, Zwinglio Mota Dias, que faleceu em 2021. “A gente não pode esquecer. Nem perdão nem esquecimento. Eu sou uruguaia, [e lá nós] dizemos: ‘Ni perdón, ni olvido’. Todo o tempo. Não dá para esquecer. Quando a gente esquece, a gente perde a história”, afirma Edda.

Além de ter sido amiga de Ivan, ela e o marido abriram a casa aos militantes, ajudaram como puderam e chegaram a viver anos no exílio. Quando Zwinglio foi preso, foi ela que, grávida, o buscou de quartel em quartel no Rio de Janeiro.

“Era muito difícil, a gente tinha que estar se policiando o tempo inteiro. Cuidado, não fala, não, aqui não. A gente, para falar dentro de casa, ligava o rádio, ligava a televisão bem alto, porque as paredes tinham ouvidos. A gente ficava meio neurótico também, né?”, diz. “Eu estava com 24 anos. A gente estava… tinha muito mais pique, né? Hoje eu não teria esse pique”.

Edda cursava teologia em Buenos Aires quando conheceu Zwinglio. Na época, ele também estudava teologia em Campinas, mas teve que deixar os estudos porque, segundo Edda, a igreja presbiteriana havia desligado os alunos considerados comunistas. Ele foi, então, continuar os estudos na capital argentina. Eles se apaixonaram e Edda acabou vindo com ele para o Brasil. Um mês depois do golpe militar, em 1964, Edda conheceu Ivan.

Clandestinidade

“Ivan era uma pessoa maravilhosa. Ivan era uma pessoa suave, tremendamente pacífica, a não ser quando se tratava de injustiça ou ditadura. Aí virava uma fera. Ele era muito amigo de todo mundo. Todo mundo gostava dele. A gente sempre fala isso de quem morreu, mas é verdade. Todo mundo gostava dele”, descreve.

Edda conta que Ivan entrou na militância ainda adolescente, em Passa Quatro (MG), cidade onde nasceu e onde teve contato com o padeiro José Orlando, pai de Osvaldo Orlando da Costa, conhecido como Osvaldão, um dos principais integrantes da guerrilha do Araguaia, e um padre argentino chamado Domingos.

Ivan começou a estudar e a ler muito nessa época. Na ditadura, ele passou a integrar a VPR, grupo armado que lutou contra o regime militar. Entre os principais integrantes estava Carlos Lamarca. O grupo foi responsável, em 1970, pelo sequestro do embaixador suíço Giovanni Enrico Bucher, no Rio de Janeiro, que foi solto em troca da libertação de 70 presos políticos.  

Embora Edda não tenha participado da luta armada porque, segundo ela, tinha muito medo de ser torturada, ela e o marido sempre ajudaram aqueles que estavam na linha de frente pelo fim da ditadura. Eles abriram a casa para os militantes.

Na época, eles moravam na Penha, bairro na zona norte do Rio e, posteriormente, em Santa Teresa, no centro da cidade. Pela casa, passaram nomes muito conhecidos da resistência, como Inês Etienne. Edda dizia que eles não falavam quem eram, para não correrem nenhum tipo de risco, caso o local fosse descoberto. “Eu conheci muita gente, mas não posso dizer nomes, porque não sei”.

Foi para a casa do irmão e da cunhada, que Ivan fugiu depois da perseguição no congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), em Ibiúna, em 1968. Foi após este episódio que ele teve a prisão preventiva decretada e precisou entrar na clandestinidade.

“Ivan chegou em casa, eram três, quatro horas da manhã. Tinha conseguido [fugir]. Fizeram o cerco de Ibiúna, um monte de gente foi presa e ele conseguiu fugir, porque estavam procurando ele. Ele conseguiu fugir e chegou em casa.” 

Mesmo na clandestinidade, ele nunca deixava de ver os pais e de mandar notícias para a família. Segundo Edda, os sogros recebiam telefonemas anônimos com instruções do horário em que aconteceria o encontro. O local era combinado presencialmente, cada vez que se reuniam. Em um desses encontros, ele conheceu o primeiro sobrinho, que ainda era bebê.  

Um dos codinomes adotados nessa época foi Comandante Cabanas. “Sabe por que? Era um carroceiro. Em Passa Quatro não tinha praticamente carro. Só tinha carroça e charrete. E tinha um carroceiro velhinho, muito amigo dele, que ele gostava muito, que era o Cabana. Então, foi uma homenagem ao Cabana”, conta Edda.

Quando entrou para a clandestinidade, ele destruiu todas as fotos e todos os vestígios dele. Foi ao dentista e a médicos, buscando destruir qualquer registro e placas que contivessem o próprio material genético. Segundo Edda, isso dificultou também o reconhecimento de restos mortais. Hoje resta apenas uma foto, que é usada em arquivos e publicações referentes a Ivan.

“Inclusive a mãe e o pai ficaram sem nenhuma foto dele, diz. E essa foto que ficou… E essa foto que ficou, foi algo tremendo. Foi depois que o Ivan desapareceu. Em Passa Quatro, uma pessoa, subindo a escadaria da igreja viu uma fotinha no chão. Uma foto pequenininha assim, de um grupo. Toda feia. E olhou bem no grupo, aí estava o Ivan. A gente levou para um fotógrafo amigo que conseguiu limpar e arrumar. E essa é a única foto que a gente tem”, diz, Edda.  

Prisão de Zwinglio

Edda conta que, um dia antes da prisão de Ivan, quando ele já estava sendo procurado, ela estava em casa quando bateram à porta, às 6h. Era a polícia que estava em busca de Zwinglio. Ela conta que Inês Etienne havia dormido na casa três dias antes e que deixara um par de sapatos.

“Dois ou três dias antes, ainda estava o colchão no escritório e ela deixou um par de sapatos. Eram sandálias de salto. Perguntaram se eram minhas. E eu não podia dizer que eram minhas porque eram tão pequenas. Disse que eram da minha sogra. Era da Inês”, diz.

Naquele momento, na casa, estava outro militante, Cacá. Edda não se lembra do sobrenome dele. “O Cacá, coitado, não sabia o que fazer. Ele se meteu no banheiro e abriu o chuveiro. Aí o policial entrou, viu chuveiro aberto, outro policial entrou: ‘O senhor toma banho de cueca?’ e o fizeram sair de cueca molhada. Aí telefonaram para o quartel e disseram: ‘Tem outro sujeito aqui, um tal de Cacá. Então traz’.  Ele disse: ‘Mas no carro não cabe’. Aí o próprio Cacá disse: ‘Não tem problema, meu carro está aí fora’. Era para rir. Depois ele me disse, que animal que eu fui”. Os policiais aceitaram a oferta e o levaram no próprio carro.

A prisão do marido ocorreu durante a Copa do Mundo de 1970. “Ele foi preso depois do primeiro jogo do Brasil e foi solto uma semana depois da vitória”, diz. Os militares queriam que ele falasse sobre o paradeiro do irmão. Durante esse período, tanto Zwinglio quando Edda sofreram tortura psicológica. Ela estava grávida de cinco meses, depois de já ter perdido um bebê.

Segundo Edda, os militares ameaçavam Zwinglio, dizendo que matariam o filho, que nem mesmo tinha nascido, e que o deixariam preso na solitária. A ela, eles nunca diziam o paradeiro do marido, sempre que ela tentava visitar, diziam que ele tinha sido transferido. Certa vez mostraram uma calça cheia de sangue e disseram que ele tinha deixado ali.

Nesse período, Edda precisou contar com uma rede de apoio e com a igreja porque a própria casa ficou lacrada pelo regime e ela tinha ficado apenas com a roupa do corpo.

Desaparecimento

No dia 15 de maio de 1971, Ivan foi preso. Logo depois, Edda e Zwinglio receberam os passaportes, que tinham ficado retidos pela polícia. Eles receberam instruções para deixar o país. Eles foram, então, para o Uruguai. Em 1973, houve um golpe militar no Uruguai e o casal, então, foi para a Alemanha, onde Zwinglio conseguiu uma bolsa de doutorado. Eles voltariam para o Brasil apenas em 1978.

Nesse tempo começou uma busca incansável por Ivan. O pai dele, Lucas de Souza Dias faleceu em 1974. “Quando se convenceu de que o Ivan realmente não voltava, ele entrou em pânico, entrou em depressão”, conta Edda.

Quem seguiu com as buscas até o dia da própria morte, aos 90 anos, foi a mãe de Ivan, Nair Mota Dias. Ela chegou até mesmo a procurar a esposa do então presidente, Emílio Garrastazu Médici, por meio de uma carta, enviada em 1971.

Elizandra Dias foi a segunda esposa de Zwinglio, ela também participou da homenagem a Ivan na UFF. Ela acompanhou parte das buscas de Nair. “Ela procurou esse filho incansavelmente. Ela chegou a dizer para mim que, mesmo depois que a gente já sabia que ele tinha morrido, em muitas manhãs de domingo eu me pegava imaginando que ele ia abrir a porta e falar assim: ‘Mãe, eu vim almoçar’. A mente sempre recorrendo a armadilhas de sentimento”, diz Elizandra.

Com o passar dos anos, a busca foi se tornando solitária. “Ela ficou um pouco só, nessa dor”, diz Elizandra.

“Porque o restante da família não compreendia o que tinha havido. Se aconteceu alguma coisa foi porque ela não criou direito. A culpa era dela, que não tinha criado direito. Ela não foi a mãe que deveria ter sido e não criou ele dentro da igreja. Se tivesse feito isso, ele não teria sumido”.

Outros presos políticos disseram que ouviram notícias sobre o paradeiro de Ivan enquanto estavam presos. Segundo Edda, foi Inês Etienne quem trouxe a ela a informação de que Ivan tinha sido morto, o que nunca foi confirmado oficialmente.

“A Inês contou para a gente que chegaram lá e disseram: ‘Hoje pegaremos teu amigo’. E depois chegaram com uma garrafa de champanhe e disseram: ‘Vamos brindar a morte do Cabana’. Isso ela contou para mim e para o Zwinglio”.

Sobre o que o cunhado representa para ela, Edda sintetiza emocionada: “Para mim Ivan representa a doçura que luta pela justiça como um leão”.

Depois de encerrar a entrevista, Edda conversou um pouco mais com a reportagem e finalizou o encontro com uma citação de um conterrâneo, o jornalista e escritor uruguaio Eduardo Galeano: “Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar”. E complementa: “’A vitória é certa e a luta continua’. Era algo que a gente sempre dizia”.

Grupo Tortura Nunca Mais homenageia vítimas de violência do Estado

O Grupo Tortura Nunca Mais, do Rio de Janeiro, entregou nesta segunda-feira (1) a Medalha Chico Mendes de Resistência para pessoas e grupos que defendem direitos humanos. O movimento, criado em 1985 para lutar contra a violência do Estado, realizou o evento na Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (FND/UFRJ).

Os organizadores reforçam que a edição é emblemática por conta dos 60 anos de implantação da ditadura militar, quando o Estado brasileiro promoveu perseguições, torturas e assassinatos contra opositores.

“Importante sempre denunciar. A memória precisa ser preservada nesse país. O povo brasileiro tem que saber o que aconteceu há 60 anos. A ditadura matou e torturou muita gente”, disse Victória Grabois, diretora do Grupo Tortura Nunca Mais/RJ. “O meu irmão tinha 17 anos quando o golpe aconteceu. E nove anos e meio depois disso, ele deu o bem maior dele, a própria vida, para que hoje a gente tivesse democracia. Essa história tem que continuar viva, para a gente compreender o que aconteceu. Porque a violência contra os opositores do regime naquela época, hoje é direcionada para os pobres, negros e favelados”.

Um dos homenageados desse ano foi Norberto Nehring, militante da Ação Libertadora Nacional (ALN). Ele foi preso, torturado e assassinado em 1970, no Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) de São Paulo. A filha, Marta Nehring, recebeu a medalha em nome da família.

“A versão oficial da morte do meu pai foi suicídio, estava no atestado de óbito. E eu passei a minha infância toda lidando com isso. Depois, houve reconhecimento de que foi uma farsa policial, conseguimos atestado de óbito que falava em ‘mortes não naturais em dependências policiais’. Mas nossa família ainda quer saber quem matou e como matou. Buscamos pela verdade e pela justiça”, afirmou Marta.

Rose Michele Rodrigues, advogada e militante de direitos humanos, veio receber a homenagem em nome da tia Ranúsia Alves Rodrigues. Estudante universitária e militante do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR), Ranúsia foi assassinada por agentes da ditadura, mas o corpo nunca foi encontrado.

“Provavelmente ela foi presa e torturada, e inventaram um teatro para encobrir o corpo. Ela saiu perseguida de Pernambuco para o Rio de Janeiro. E aqui, foi pega junto com um grupo do PCBR. Meu pai tentou recuperar o corpo. E eles disseram que se ele viesse, seria preso. Ela foi enterrada em uma vala comum, como indigente, mesmo tendo sido reconhecida. Foi achada a vala, mas nunca se recuperou o material genético. Até hoje é considerada desaparecida política. E eu estou muito orgulhosa de lembrarem da minha tia, que lutava por uma sociedade mais justa e de continuar a luta dela por meio da militância”, ressaltou Rose Michele.

Para os quilombolas de Sapê do Norte, no Espírito Santo, ser homenageado é uma forma de dar mais visibilidade à luta pela terra e pela manutenção de tradições ancestrais. Um problema que foi aprofundado depois do golpe de 1964.

“A nossa luta é pela demarcação e titulação dos nossos territórios no Sapê do Norte. Todos nós somos nascidos e criados lá. E a partir do momento em que papeleiras e empresas de cana de açúcar se instalam no território, começaram o processo de expulsão das nossas famílias e do nosso modo de vida. Na época da ditadura, nos anos 1960, nós éramos mais de 13 mil famílias. E hoje fomos reduzidos a menos de 4 mil famílias. O território vem sendo invadido pelas grandes empresas e pelo grande capital”, explica Olindina Serafim, professora da educação escolar quilombola.

Também foi lembrado na noite dessa segunda-feira o grupo argentino Historias Desobedientes. Ele é formado originalmente por familiares de militares e civis que foram responsáveis pela ditadura militar na Argentina. Em vez de defender os antepassados ou adotar um silêncio cômodo, se mobilizam para expor e denunciar os crimes cometidos no período.

“Somos familiares que repudiam os atos de nossos pais, avôs e tios. Saímos em defesa das vítimas, dos sobreviventes e parentes. Crescemos com uma grande vergonha do lugar de onde viemos. E repudiamos nossos familiares, independentemente do vínculo afetivo que temos com eles. É uma posição que parte de uma decisão ética e humana”, disse Bibiana Reibaldi, psicopedagoga e membro do coletivo Historias Desobedientes.

Os demais homenageados pelo Grupo Tortura Nunca Mais foram:

Maria Criseide da Silva e Wellington Marcelino Romana: casal que, por se envolver na luta por terra e moradia em Minas Gerais, foi preso e torturado.

Boycott, Divestment, Sanctions (BDS) e Stop the Wall: movimentos sociais que buscam apoio internacional para condenar as ações de Israel contra palestinos.

Gonzaguinha (in memoriam): cantor e compositor, morto em 1991, conhecido por ser crítico à ditadura militar e, por isso, ter muitas de suas músicas censuradas.

Leonel Moura Brizola (in memoriam): político trabalhista, governador do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro, que se opôs à ditadura no Brasil.

Pastor Mozart Noronha: era membro da Ação Popular (AP), organização cristã de resistência à ditadura. Teve de exilar-se na Suíça e em Portugal na década de 1970.

A Medalha Chico Mendes de Resistência está na 36ª edição e acontece todos os anos no dia 1º de abril, data que para o Grupo Tortura Nunca Mais é o dia correto do golpe de 1964. Vale reforçar que esse é um debate político. Militares e alguns pesquisadores defendem o 31 de março, quando começou o movimento de tropas golpistas em Minas Gerais. Outros pesquisadores e ativistas apontam o 1º de abril, quando o presidente João Goulart deixa Brasília, a capital federal, e vai para Porto Alegre. Já o 2 de abril é quando o Congresso Nacional declara vaga a presidência da República.

 

Entenda o que é o transtorno do espectro autista

A infância e a adolescência, em Volta Redonda, no sul fluminense, foram difíceis para Ricardo. Ele não conseguia conversar com outras pessoas da sua idade e evitava ambientes muito cheios. Era incompreendido pelos colegas e, por não conseguir se enturmar, foi vítima de bullying.

“Eu sempre tive a compreensão de que eu era diferente. Que eu não conseguia fazer as mesmas coisas que as pessoas faziam. Falavam que eu era chato, enjoado, antissocial”, relembra ele. “Eu achava que era só isso. Não imaginava que tivesse um diagnóstico para isso”.

Ricardo Fulgoni hoje é juiz de direito e atua na Justiça estadual do Paraná, onde tomou posse em 2022, pouco depois de descobrir o motivo de ter tanta dificuldade para se relacionar com outras pessoas.

“Os anos foram passando. Na vida adulta, eu, com a compreensão de que era diferente, fui seguindo minha vida. Sabia que não conseguia fazer algumas coisas, mas fui seguindo, criando estratégias para superar as minhas dificuldades”.

Quando chegou a pandemia de covid-19, ele ainda era oficial de Justiça e se preparava para o concurso da magistratura. A mudança de rotinas, provocada pelo isolamento social, prejudicou seu cronograma de estudos e isso o afetou muito.

“Eu tinha provas já marcadas e eu estava com um cronograma de estudos muito bem desenhado. Eu sempre fui muito apegado ao planejamento, ao cronograma, à programação. Preciso disso para me sentir confortável. Imprevistos sempre foram muito difíceis para mim. E a pandemia foi uma quebra de rotina gigantesca. Eu tinha o roteiro todo traçado, com as datas das provas que eu ia fazer e aquilo me derrubou”.

Afetado pelas grandes mudanças e sem vontade de sair da cama, Ricardo pensou que estava com depressão, procurou ajuda profissional e começou a se tratar com antidepressivos. Mas isso não resolveu o problema.

“Depois de vários meses, nessas idas e vindas, tentando entender o que estava acontecendo comigo, veio a sugestão de que essas minhas crises de ficar de cama o dia inteiro poderiam não ser decorrentes da depressão, mas ser algo típico do autismo. Tem até um nome para isso: shutdown, que é o desligamento. Quando você está num nível de sobrecarga sensorial muito forte, seu corpo simplesmente desliga”.

O diagnóstico foi um choque, inicialmente, para Ricardo. Ele tinha a visão de que o autista era uma pessoa incapaz, que não conseguia trabalhar e que dependia da família. Não era o seu caso, ele trabalhava desde os 18 anos, quando se tornou servidor público do INSS.

“Então passei por uma avaliação neuropsicológica e veio a confirmação. Nesse processo, eu passei a estudar o tema e, quando eu comecei a ler sobre o que era o autismo, os sintomas, as características, estava ali um manual de instruções da minha vida. Estavam explicadas todas as dificuldades que eu tive ao longo da vida. O diagnóstico foi libertador porque tirou de mim toda a carga de culpa que eu carregava, de ser antissocial, ser chato, ser enjoado”, explicou.

Mesmo com dúvidas sobre se conseguiria tornar-se juiz depois do diagnóstico, ele seguiu em frente e foi aprovado no concurso. “Muita gente me questiona. Para que você quer saber esse diagnóstico agora na vida adulta, colocar esse rótulo de autista. Bem, rótulos eu tive a vida inteira. Fui sempre rotulado de chato, enjoado, antissocial, rótulos errados que eu tive a vida inteira. Se eu falar abertamente que sou autista, pelo menos vão me colocar o rótulo correto”.

Nesta terça-feira (2), celebra-se o Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo, criado em 2007 pela Organização das Nações Unidas (ONU), com o objetivo de levar informação à população e reduzir o preconceito contra indivíduos que apresentam o transtorno do espectro autista (TEA).

“O transtorno do espectro do autismo é uma condição do desenvolvimento neurológico atípico, que se manifesta nos anos iniciais do desenvolvimento e que acarreta atipicidade nas áreas de interação social e de comunicação social”, explica o neuropsicólogo Mayck Hartwig, que trabalha com o atendimento clínico de adultos autistas.

O juiz Ricardo Fulgoni é uma das pessoas que tiveram um diagnóstico tardio de TEA, mas é possível saber se a pessoa tem essa condição logo no início da infância. Segundo Hartwig, os primeiros sinais do autismo já podem ser percebidos a partir dos 18 meses de idade.

“O diagnóstico do autismo é feito de forma multidisciplinar. Envolve tanto um médico especialista, que é geralmente um psiquiatra ou um neurologista; o neuropsicólogo, que vai fazer também uma avaliação do comportamento; e pode incluir também outros profissionais da área de saúde que têm uma capacitação para identificação do autismo”, explica. “Em alguns casos, já é possível haver uma indicação diagnóstica e o encaminhamento para terapia. Em outros casos é mais difícil conseguir fazer um diagnóstico precoce”.

Lucinete Andrade descobriu que sua filha, Mayara, era autista quando a menina tinha cerca de dois anos de idade.

“Quando você recebe esse diagnóstico, primeiramente você tem muita insegurança em relação ao futuro do seu filho. Depois, você passa a ter insegurança em relação ao desenvolvimento dele, se ele vai conseguir acessar um serviço, uma escola, uma profissionalização. Então é uma constante insegurança”, conta. “Aquela primeira expectativa que você tinha na maternidade não existe mais. Então é preciso aceitar a situação do seu filho e entender que você pode ajudá-lo muito mais se entender e aceitar essas diferenças”.

Depois de receber o diagnóstico e aceitar a situação da filha, Lucinete Andrade passou a tentar ajudar não só a filha como também outras pessoas que não têm condições de pagar por tratamentos e terapias.

Hoje Mayara tem 20 anos e Lucinete preside a Associação Brasileira de Autismo, Comportamento e Intervenção (Abraci-DF), que oferece terapia ABA (Análise do Comportamento Aplicada) para 130 crianças e adolescentes do Distrito Federal.

Há, segundo o neuropsicólogo Mayck Hartwig, três níveis de autismo, que definem a necessidade de suporte que o autista necessitará ao longo da vida. Uma pessoa com nível 1, por exemplo, só precisa de um leve suporte. Já uma diagnosticada com o nível 3 precisa de suporte substancial.

“O autismo hoje é compreendido como um espectro de manifestação fenotípica bastante heterogênea, ou seja, existem várias manifestações diferentes do autismo. E essas manifestações ocorrem também com sinais mais ou menos evidentes em algumas pessoas”, pontua Hartwig.

Além da dificuldade para se comunicar e interagir com outras pessoas, que é comum a todos os autistas, o TEA também pode ter outras manifestações, como comportamentos repetitivos, interesses restritos, problemas em lidar com estímulos sensoriais excessivos (som alto, cheiro forte, multidões), dificuldade de aprendizagem e adoção de rotinas muito específicas.

“É um transtorno que tem um impacto muito grande, porque ele afeta principalmente a cognição social, os pilares da linguagem. Esse espectro tem diversas nuances que compõem o quadro. E é um quadro heterogêneo. De um lado você tem autistas com altas habilidades e outros com deficiência intelectual. Alguns com hiperatividade e outros mais calmos”, afirma Luciana Brites, especialista em Distúrbios do Desenvolvimento e coautora do livro Mentes Únicas.

Luciana, que também é diretora do Instituto Neurosaber, voltado para a disseminação de conhecimento sobre neurodesenvolvimento na infância e adolescência, afirma que o dia 2 de abril é uma data importante para se combater o preconceito e informar a população sobre questões como o diagnóstico precoce. “Quando a gente consegue fazer a detecção antes dos três anos de vida, a gente consegue, muitas vezes, mudar a realidade dessa criança, desse adolescente, desse adulto”.

Segundo ela, a data é importante também para ressaltar a importância da inclusão das crianças com autismo nas escolas e do acesso delas ao tratamento. “As políticas públicas de educação e saúde precisam ser muito bem sustentadas para que a gente consiga avançar no desenvolvimento dessas crianças, que vão virar adolescentes e adultos”.

Mayck Hartwig destaca que, no Brasil, as pessoas com autismo ainda encontram desafios importantes, não só em relação ao acesso a tratamento e terapias, como também à sua inserção nas universidades e no mercado de trabalho, quando adultas.

“Ainda existe um desafio importante em relação ao acesso a terapias e tratamentos em equipamentos públicos. Então boa parte das pessoas vai recorrer a tratamentos clínicos particulares. Aqueles que estão em situação de vulnerabilidade social e financeira não conseguem acessar esse tratamento. Tão importante quanto o diagnóstico é o acesso ao suporte clínico, social, de inserção e permanência nas universidades, de inserção e permanência no mercado de trabalho”.

Ainda não se sabe o que causa o autismo. Pesquisas mostram, no entanto, que essa condição do neurodesenvolvimento atípico é multifatorial e ocorre pela interação de componentes genéticos e ambientais.

Receita libera programa para atualizar valor de bens no exterior

A Receita Federal liberou nesta segunda-feira (18) o Programa de Atualização de Bens e Direitos no Exterior (Abex) aos contribuintes que quiserem atualizar o valor de bens e de investimentos fora do Brasil e pagar menos Imposto de Renda (IR). O programa pode ser baixado na página da Receita na internet.

A lei que taxou as offshores, aprovada no fim do ano passado deu duas opções para quem mantém cotas ou a totalidade de empresas de investimento no exterior. O contribuinte pode atualizar o quanto o investimento rendeu até agora e pagar 8% de IR sobre o ganho de capital (lucro) até 31 de maio, ou não atualizar o valor e pagar 15% depois de maio.

Cálculo

Para calcular o ganho de capital, o contribuinte deve informar o valor do bem na data de compra e o valor de mercado em 31 de dezembro de 2023. A conta deve ser feita por uma instituição de avaliação especializada, no caso de imóveis e bens móveis, como carro, avião, helicóptero e navio) ou por uma instituição financeira, no caso de aplicações financeiras.

A Receita Federal permitirá somente a atualização dos bens informados pelo proprietário na Declaração do Imposto de Renda 2023 (ano-base 2022). O programa permite a importação dos bens e direitos da declaração do ano passado.

A exceção será para quem não era obrigado a declarar e passou a declarar neste ano. Bens comprados em 2023 ou não declarados no ano passado não poderão ser atualizados porque não incidiu ganho de capital sobre eles.

Segundo instrução normativa editada pelo Fisco na semana passada, não poderão ter o valor atualizado os seguintes bens: moeda estrangeira em espécie, joias, pedras e metais preciosos, obras de arte, antiguidades de valor histórico ou arqueológico, animais de estimação ou esportivos e material genético de reprodução animal.

Offshores e trusts

Em relação às offshores (empresas de investimentos no exterior) e às trusts (instrumento de terceirização de bens no exterior), os valores também podem ser atualizados com pagamento de Imposto de Renda mais baixo. No entanto, para fazer a atualização, o investidor terá de aderir ao regime de transparência total, em que todos os bens da offshore precisam estar detalhados na declaração. Para as trusts, o preenchimento dos dados na declaração de IR passa a ser obrigatório.

A Receita Federal deixou um canal de atendimento para que os contribuintes tirem dúvidas sobre a atualização de bens no exterior. Basta entrar nesta página na internet e digitar a pergunta. A ferramenta também permite o envio de documentos.

Capital paulista está perto de atingir índice epidêmico de dengue

A cidade de São Paulo está muito próxima de atingir o índice epidêmico de dengue. De acordo com dados oficiais da Coordenadoria de Vigilância em Saúde da Secretaria Municipal da Saúde hoje são 295 casos para cada 100 mil habitantes. A Organização Mundial de Saúde (OMS) considera que taxas cima de 300 casos por 100 mil habitantes indicam uma situação de epidemia da doença.

A vigilância epidemiológica municipal aponta crescimento de 1.668% nos casos de dengue na capital. Passou de 2003 casos em dez semanas no início de 2023 para 35.417 casos nas dez primeiras semanas de 2024. Os casos confirmados de dengue no município de São Paulo mostram que mulheres nas faixas etárias entre 20 e 49 anos estão entre os grupos mais vulneráveis para a doença.

Em todo estado são 558.475 casos notificados de dengue, sendo 224.945 casos confirmados e 106.190 em investigação. Há registro de 72 óbitos e outros 186 em investigação.

O governo do estado de São Paulo já decretou estado de emergência no dia 5 de março. Ao todo, 44 municípios paulistas estão em estado de emergência.

“Temos como principal motivo [da expansão da dengue] a mudança climática. Juntamente com a chegada do fenômeno El Nino, constatou-se uma onda muito forte de calor e também muita umidade. Essas duas condições já são suficientes para a progressão dos ovos na forma de larva e enfim o mosquito. Outro fator é a falta de imunidade de uma geração de pessoas. A população vai se sucedendo e muitas crianças e jovens não tiveram contato com o vírus enquanto pessoas mais velhas já tiveram dengue, de surtos anteriores, e assim possuem uma vacina natural de imunidade contra a doença. E, por fim, o próprio ciclo da dengue que de tempos em tempos passa por um crescimento natural” explica o médico infectologista Evaldo Stanislau.

Vacina

Apenas duas em cada dez vacinas entregues pelo Sistema Único de Saúde (SUS) foram aplicadas. De um total de 1,2 milhão de doses distribuídas pelo governo federal para 521 municípios, somente 250 mil vacinas contra a dengue foram aplicadas até o momento.

O Ministério da Saúde selecionou um total de 521 municípios de 16 estados brasileiros, além do Distrito Federal, para realizar a vacinação contra a dengue via SUS. A aplicação vem ocorrendo desde fevereiro. As cidades compõem um total de 37 regiões de saúde que, segundo a pasta, são consideradas endêmicas para a doença.

Crianças e adolescentes de 10 a 14 anos, faixa etária que concentra maior número de hospitalizações por dengue, compõem o público-alvo da imunização.

Vacinação em SP

Em São Paulo 11 municípios da região do Alto Tietês têm a vacina contra dengue disponível nos postos de saúde (SUS) gratuitamente: Arujá, Biritiba-Mirim, Ferraz de Vasconcelos, Guararema, Guarulhos, Itaquaquecetuba, Mogi das Cruzes, Poá, Santa Izabel, Salesópolis e Suzano. O imunizante também é encontrado em hospitais e clínicas de vacinação particulares em todo estado.

Como saber se está infectado

Há vários tipos de testes para a identificação da dengue – RT-PCR, antígeno NS1 e sorologia –, que devem ser realizados de acordo com o estágio da doença e dos sintomas no momento da realização do exame. “É essencial empregar adequadamente cada tipo de teste disponível, como antígeno e sorologia, para as diferentes fases da infecção”, observa a médica infectologista da Afip Medicina Diagnóstica, Soraya Sgambatti de Andrade.

O teste NS1 pesquisa o antígeno viral e os testes RT-PCR detectam o material genético do vírus. Enquanto o NS1 deve ser feito até cinco dias após o surgimento dos sintomas, o RT-PCR pode ser realizado até sete dias depois do começo da infecção.

Os exames de sorologia pesquisam os anticorpos IgM e IgG, que são produzidos pelo indivíduo em decorrência da infecção, e devem ser realizados a partir do sexto dia da infecção. Os exames para a detecção de chikungunya são RT-PCR e os de sorologia.

O Centro de Operações de Emergências (COE), do governo de São Paulo, pretende distribuir 300 mil unidades de repelentes específicos para a população gestante, que atenderá cerca de 50 mil mulheres no estado. A distribuição será feita durante o período de emergência para todas as grávidas atendidas nos municípios pelo SUS ou não. Mas o processo de compra emergencial desse produto ainda será aberto nos próximos dias.

Sintomas e recomendações

Os sintomas da dengue são os seguintes:

•        Febre alta

•        Dor atrás dos olhos

•        Dor no corpo

•        Manchas avermelhadas na pele

•        Coceira

•        Náuseas

•        Dores musculares e articulares

As principais recomendações para eliminação de criadouros do Aedes aegypti são:

• Eliminar pratos de plantas ou usar um prato justo ao vaso, que não permita acúmulo de água

• Descartar pneus usados em postos de coleta da prefeitura

• Retirar objetos que acumulem água nos quintais, como potes e garrafas

• Verificar possíveis vazamentos em qualquer fonte de água

• Tampar ralos

• Manter o vaso sanitário sempre fechado

• Identificar sinais de umidade em calhas e lajes

• Verificar a presença de organismos vivos em águas de piscinas ou fontes ornamentais

 

Saúde anuncia R$ 30 milhões para ampliação do teste do pezinho

O Ministério da Saúde anunciou nesta quarta-feira (13) um incremento de mais de R$ 30 milhões por ano para ampliar o Programa Nacional da Triagem Neonatal (PNTN), conhecido popularmente como teste do pezinho. O objetivo, segundo a pasta, é garantir acesso ao diagnóstico precoce e, consequentemente, à assistência adequada e de qualidade.

A pasta destacou que, a partir do resultado do teste do pezinho, é possível evitar mortes e deficiências, além de proporcionar melhor qualidade de vida a pacientes que são acometidos por condições como fenilcetonúria, hipotireoidismo congênito, doença falciforme, fibrose cística, hiperplasia adrenal congênita, deficiência de biotinidase e toxoplasmose congênita.

Apesar de não existir um número exato de doenças que se classificam como raras, a estimativa de autoridades sanitárias é que sejam mais de 5 mil tipos, associados a fatores genéticos, ambientais, infecciosos e imunológicos. Atualmente, estão disponíveis na rede pública 31 serviços de referência e mais de 60 protocolos clínicos para condições específicas.

A expectativa do ministério é que, por meio do investimento anunciado, a rede passe a contar com mais 29 serviços de referência em triagem neonatal, com distribuição em todos os estados e no Distrito Federal por meio de unidades de saúde pública, filantrópicas, universitárias e privadas. O cronograma prevê também a habilitação de 28 laboratórios para triagem neonatal.

“Com o acréscimo imediato de R$ 30 milhões, o programa também investirá na logística – por meio dos Correios –, na atualização dos valores de procedimentos relacionados ao teste do pezinho, inserção e capacitação do uso da tecnologia de espectrometria de massas e a formação das câmaras técnicas assessoras em doenças raras e de triagem neonatal”, informou o ministério.

Ainda de acordo com a pasta, com a ampliação das ações, o teste do pezinho passa a ser incluído no escopo dos serviços de referência em triagem neonatal, o que torna necessária uma equipe mínima, composta por um pediatra, um enfermeiro, um nutricionista, um psicólogo e um assistente social.

“Também fazem parte dos critérios de incentivo o monitoramento dos indicadores do teste do pezinho, o matriciamento da rede de coleta [quando duas ou mais equipes trabalham de forma compartilhada], a capacitação dos profissionais de saúde quanto às doenças raras, a atenção ao paciente diagnosticado e aos casos complexos, além da operacionalização da triagem”, informou o ministério.

CNPq lança edital para apoiar formação de mulheres em ciências exatas

O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) lançou nesta quarta-feira (6) edital ofertando R$ 100 milhões para apoiar a formação de meninas e mulheres em cursos das ciências exatas, engenharias e computação. O objetivo da medida é estimular a diversidade na pesquisa científica

A medida é voltada para meninas e mulheres matriculadas no 8º e no 9º ano do ensino fundamental e no ensino médio em escolas públicas, além daquelas matriculadas na graduação de exatas, engenharias e computação.

A cientista Hildete Pereira de Melo ressalta que em todos os campos científicos homens brancos são presença predominante, mas que as mulheres sempre estão nos bastidores. “Você vai remexendo os baús da história, e você vai achando mulheres, só que elas estão escondidas”.

A história da ciência é marcada pela ação de pioneiras no cenário internacional, como Marie Curie, nascida na Polônia em 1867, que foi a primeira mulher a ganhar um Prêmio Nobel e a primeira pessoa a ser premiada em duas categorias, química e física com pesquisas sobre radioatividade; quanto no nacional, onde se destacou Bertha Lutz, bióloga e diplomata tida como responsável por incluir a igualdade de gênero na Carta da Organização das Nações Unidas.

“A maior cientista brasileira, eu vou ousar dizê-lo, Johanna Döbereiner é a mulher que permitiu, pelas descobertas dela, que o cerrado brasileiro pudesse produzir soja, açúcar”, defende Hildete.

Professora de economia e políticas sociais da Universidade Federal Fluminense, Hildete é uma das autoras do livro Pioneiras da CIência no Brasil, A economista se dedicou ao longo da carreira os estudos de gênero. ”Casar não estava nas minhas cogitações (…) Eu queria ser um objeto de significado social”. 

A luta dos movimentos sociais busca representatividade e direito a ocupar todos os espaços na sociedade. 

Dados da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) apontam que 58% dos 100 mil bolsistas de mestrado, doutorado e pós doutorado no país são mulheres, mas esse número não representa a realidade dos cargos de chefia. “A gente continua massivamente nas escolas, mas eu diria que as lideranças ainda são masculinas”, aponta Hildete.

Para uma das maiores cientistas do país no campo do estudo genético, Lygia da Veiga Pereira,  há um fundo cultural que limita a mulher. “O que precisamos é que tirar essa coisa cultural subliminar de que isso não é coisa feminina, de que isso não é coisa para mulher, que você para ser cientista, você vai abrir mão de uma parte do feminino”, opina. “ O que pega é na hora de ter filhos”, ressalta.

Chefe do Laboratório de Células Tronco Embrionárias da Universidade de São Paulo, Lygia conta que também enfrentou os desafios de conciliar maternidade e produção científica.

“É uma loucura e é uma revolução maravilhosa, foi maravilhosa para mim em vários aspectos. Mas foi muito penosa em outros”, conta. “Por mais que você possa abrir espaços na sua cabeça, abrir espaços no seu coração, o tempo não abre espaço, tempo é aquele, é finito, né? Então até eu atingir um equilíbrio entre a divisão dos meus tempos e da minha disponibilidade, foi bem penoso”, relembra. 

A cientista ressalta que a maternidade é uma função importantíssima e fundamental para a sociedade e que recai predominantemente sobre a mulher. ”Isso não pode penalizar a mulher em outras ambições que ela tenha profissionais”, defende.

Veja matéria da TV Brasil