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Ato na Cinelândia lembra seis anos da morte de Marielle Franco

Um ato em frente à Câmara dos Vereadores, na Cinelândia, no centro da cidade do Rio de Janeiro, lembrou os seis anos dos assassinatos da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes. Os manifestantes, liderados pela viúva de Marielle, atualmente vereadora, Mônica Benício (PSOL), pediram Justiça.

Marielle e seu motorista foram assassinados na noite de 14 de março de 2018, quando o carro onde estavam foi fuzilado, no bairro do Estácio, na região central da cidade. Dois acusados dos homicídios, os ex-policiais Ronnie Lessa e Élcio Queiroz, foram presos em março de 2019, um ano depois do crime. Lessa é suspeito de ter efetuado os disparos e Queiroz, de conduzir o carro usado no assassinato.

Um terceiro homem, o ex-bombeiro Maxwell Simões Correia, foi preso no ano passado, depois de uma delação premiada de Queiroz, que o apontou como responsável por monitorar as movimentações de Marielle. Em janeiro deste ano, Edilson Barbosa dos Santos foi preso, suspeito de ajudar a se desfazer do carro usado no crime.

Outros suspeitos foram mortos no decorrer do inquérito policial. Os manifestantes, no entanto, exigem as conclusões das investigações, que poderiam apontar para as motivações do crime e possíveis mandantes.

“Além da tristeza, ainda permanece a indignação de chegar ao marco de seis anos de um assassinato como esse sem essa resposta, é dizer que esse tipo de violência ainda é aceito na nossa sociedade com outras Marielles”, afirmou Mônica. “Hoje é um dia de dor. Eu preferia estar na minha cama, chorando, com a minha saudade, mas a gente precisa levantar para produzir atos que não só lembrem a sociedade, mas que reivindiquem às autoridades a Justiça”.

Rio de Janeiro – A vereadora Monica Benicio, durante ato simbólico que marca os seis anos do assassinato de Marielle Franco – Foto Tomaz Silva/Agência Brasil

O caso é investigado pela Delegacia de Homicídios da Polícia Civil fluminense. Em fevereiro do ano passado, a Polícia Federal (PF) abriu sua própria frente de investigação.

Presente ao ato, o deputado federal Henrique Vieira (PSOL-RJ) afirmou que a bancada de seu partido quer se reunir, em breve, com o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, para receber atualizações sobre as investigações.

“Desde o ano passado, com o [então ministro da Justiça] Flávio Dino, sentimos mais confiança no processo de investigação. Nos últimos meses, percebemos alguns avanços importantes, o que aumenta nossa confiança de que vamos saber quem e por quê”, disse Vieira.

A viúva, no entanto, apesar de esperar a conclusão da investigação, não tem muita esperança de que isso ocorrerá. “Vou me reservar o direito de não ter mais expectativas neste momento. Houve avanços significativos desde o ano passado, especialmente com a delação do Élcio Queiroz, que hoje é um réu confesso, mas a minha expectativa era de que a gente não chegasse ao marco de seis anos sem essas respostas”.

A PF respondeu que não comenta ou divulga informações sobre investigações em andamento. O Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), que criou uma força-tarefa para acompanhar as investigações em 2021, informou que “avanços foram obtidos no último ano das investigações”. A Polícia Civil não respondeu à Agência Brasil até o fechamento desta reportagem.

Teatro da Vertigem pode perder sede em Bela Vista por falta de verba

Uma das principais companhias teatrais do Brasil, o Teatro da Vertigem, que, este ano, completa 32 anos, corre o risco de perder seu endereço no bairro Bela Vista, onde fica também seu acervo. O grupo lida com o acúmulo de dívidas com aluguéis, que se ampliaram com a dificuldade de ser aprovado em editais de cultura que poderiam garantir recursos para suas atividades. 

Diante das cobranças de quitação dos débitos em aberto, a companhia já teve de se desfazer de equipamentos importantes. Foram vendidos projetores, uma mesa de som e dois computadores de alto valor, sendo um fundamental para a elaboração e transmissão de trilhas e outro para a projeção de imagens. 

O endividamento já se arrasta por sete anos. A única trégua que existiu desde 2017 foi um edital aberto com base na Lei Aldir Blanc, com caráter emergencial.

Na sede, estão guardados atualmente diversos itens relevantes para a história da companhia, como figurinos e cenários das peças. Segundo a diretora Eliana Monteiro, a campanha de doações que o grupo iniciou há alguns dias e foi divulgada por atores como Matheus Nachtergaele já conseguiu 60% do valor necessário para liquidar as dívidas e garantir seis meses de aluguel no atual endereço.  

Censura, conservadorismo e desmonte

Para a diretora, fatores da conjuntura política do país contribuíram para a situação em que a companhia se encontra, algo que também atingiu a classe artística como um todo, como a forma que os governos dos ex-presidentes Michel Temer e Jair Bolsonaro conduziram as políticas de incentivo. Segundo ela, o atual governo federal tem buscado reverter o cenário de desmonte na área, mas ainda é cedo para conseguir atingir totalmente esse objetivo. 

“Se pensar no que aconteceu nos últimos seis anos [de golpe com o impeachment de Dilma Rousseff em diante], foi terra arrasada. Viramos, tanto imprensa como artistas, inimigos [do governo]. A minha percepção é a de que teve uma destruição muito grande”, afirmou Eliana em entrevista concedida à Agência Brasil. “Qualquer coisa que fosse colaborativa, aglomerasse mentes pensantes, nos tornaria personas non gratas mesmo”, acrescenta. 

“A dívida se acumulou no ano passado porque, desde 2017, a gente acabou perdendo o patrocínio da Petrobras, que iria até 2018, mas, com essa perspectiva de Bolsonaro, já cortaram o patrocínio de todos os grupos de teatro e outras áreas, como cinema. Foi terra arrasada mesmo”, adicionou. 

A diretora ainda sugere que muitas pessoas podem pensar que a companhia jamais passaria por uma crise financeira, por já ter consolidado seu nome. “Talvez por conta de ser um grupo longevo, as pessoas talvez pensem que a gente tem mais recursos. Mas, no Brasil, a gente nunca conseguiu viver só de teatro, a gente dá aula, faz milhares de coisas para conseguir manter a própria vida”, assinala ela. 

Origem 

O Teatro da Vertigem foi idealizado por pessoas vinculadas à Universidade de São Paulo (USP), como o encenador Antônio Araújo e os atores Daniela Nefussi, Johana Albuquerque, Lúcia Romano e Vanderlei Bernardino. Depois de ventilar ideias por cerca de um ano, se apresentou, pela primeira vez, em 1992, com o espetáculo O paraíso perdido, baseado no poema de John Milton, tendo como palco a Igreja Santa Ifigênia. Em 1995 estreou O Livro de Jó, no Hospital Humberto Primo, em São Paulo, consolidando, assim, uma de suas características, que consiste em ocupar espaços cênicos não convencionais, como igrejas, prisões e rios, e que chegou a causar rebuliço.

A companhia incorporou influências como de Antonin Artoud e Jerzy Grotowski, já que entende que o teatro é capaz de oferecer uma vivência pedagógica. Entre as obras mais recentes, estão a performance-filme Marcha à ré, gravada por Eryk Rocha, filho de Glauber Rocha, em 2020, comissionada pela 11ª Bienal de Berlim.  

Outros traços que marcam a trajetória e o método de trabalho da companhia são o intercâmbio entre áreas e o trabalho colaborativo e aprofundado, que abrange pesquisas de campo. Uma delas ocorreu a partir de 2004, na comunidade de Brasilândia, na periferia da capital paulista, onde desenvolveram oficinas gratuitas e formaram multiplicadores. 

Eliana aponta isso como partes essenciais do processo criativo. No caso da pesquisa, serve para “perder o olhar turístico sobre os lugares”. Assim como a permanência no Carandiru, a de Brasilândia, que foi pensada dentro do processo de criação do Projeto BR-3, durou um ano e envolveu a passagem por 14 espaços.

“O Teatro da Vertigem já nasce com uma perspectiva de um trabalho de pesquisa teórica. A gente se debruça muito tempo sobre um assunto, para tentar desvendar o que está nas entrelinhas do problema, para não ficar na borda. Então, a pesquisa demora uns dois anos, às vezes, para a gente começar. Aí, passa para a pesquisa de campo”, explica a diretora. 

Polícia prende homem com 452 cartões no Sambódromo em SP

A polícia de São Paulo prendeu um homem de 38 anos de idade que aplicava o golpe da maquininha e estava em posse de 452 cartões bancários no Sambódromo do Anhembi, na capital paulista. O homem tentou fugir no momento em que foi abordado pelos policiais, na noite deste sábado (10).

Por volta das 23h, os policiais avistaram dois homens em atitude suspeita em meio aos populares no Sambódromo. De acordo com a SSP, assim que os suspeitos perceberam a aproximação dos agentes, correram em direção à multidão, mas os investigadores conseguiram abordar um deles, que tentou se desfazer de uma bolsa que carregava. No interior havia 452 cartões bancários de diferentes instituições, além de uma máquina de cartão. 

“Entre os cartões apreendidos, os policiais localizaram dois que tinham boletim de ocorrência anterior, um por roubo em junho do ano passado, e o outro por furto, em setembro. O restante do material foi apreendido e encaminhado à perícia para dar prosseguimento à pesquisa”, informou a SSP, em nota.

O golpe da maquininha ocorre quando as vítimas dão o cartão bancário ao criminoso para efetuar uma compra, e digitam a senha no equipamento. O aparelho, com um software malicioso, memoriza a senha. O falso comerciante, então, devolve à vítima um cartão trocado e fica com o original. Dessa forma, o criminoso obtém o cartão e a senha.

A polícia prendeu também sete pessoas que estavam praticando crimes nos blocos de rua, na tarde de sábado (10). Em um dos casos, os policiais identificaram uma mulher que estava escondendo celulares furtados em uma bolsa. Foram localizados 22 aparelhos com a suspeita. 

Ao todo, os agentes conseguiram recuperar 55 aparelhos furtados, até o início da noite deste sábado. As ocorrências foram registradas nas delegacias das regiões onde os blocos estavam concentrados. 

Aplicativo

O governo federal, em parceria com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), apresentou em dezembro o aplicativo Celular Seguro para impedir o acesso dos criminosos a aplicativos financeiros e dados pessoais em caso de roubo ou furto de celulares.

O aplicativo e o site Celular Seguro permitem bloquear o aparelho, a linha telefônica e os aplicativos bancários em poucos cliques.

Após baixar o aplicativo ou acessar o site, é preciso fazer o login por meio da conta Gov.br. O usuário deverá cadastrar seu aparelho informando o número, marca e modelo. Pode ser registrado mais de um dispositivo, mas a linha deve estar cadastrada no CPF do usuário.

O sistema permite o cadastro de uma ou mais pessoas de confiança, que poderão auxiliar criando ocorrências em nome do usuário. Em caso de perda ou roubo, o usuário ou a pessoa de confiança poderá registrar uma ocorrência por meio do site ou do aplicativo.

Preto Téo extravasa identidade trans por meio da poesia

 

Foi no Cursinho Popular Transformação, curso preparatório para o vestibular voltado para pessoas trans, que Teodoro Martins, mais conhecido como Preto Téo, descobriu que os textos que ele chamava apenas de desabafos eram poesia, eram arte. Em 2016, junto com outros escritores, publica em Antologia Trans: 30 Poetas Trans, Travestis e Não Binários. “A partir da publicação dos meus textos nesse livro, eu compreendi que eu tinha muito a contribuir com a poesia e com a arte no geral. E, a partir daí, não parei mais.”

Para Preto Téo, a arte é um chamado diário. “Todos os dias eu penso em uma melodia, todos os dias eu penso em um verso, todos os dias eu penso ou o meu corpo se move de uma maneira que me evoca a algum acontecimento, ou algum acontecimento reverbera no meu corpo, na minha pele, na minha memória e me faz querer transfigurar isso para alguma outra coisa”, diz e acrescenta:

“Eu consigo entender a arte como um sentimento que eu tenho, que eu preciso trabalhá-lo, preciso mantê-lo em movimento, preciso fazer ele acontecer, senão é como se eu sentisse um sufocamento, como se eu me sentisse diminuído, sabe?”

Para Preto Téo, a arte é um chamado diário – Paulo Pinto/Agência Brasil

Preto Téo, 29 anos, é artista e produtor cultural. Além do Antologia Trans, que é a primeira antologia trans de poemas impressa no Brasil, ele participou também do livro Textos para Ler em Voz Alta, publicado em francês. Ele também publicou o próprio livro, EP, pela Padê Editorial.

Enquanto performer, ele estreou, em 2023, o solo Como se (Des)fiz, performance solo acompanhada por beats e por percussão ao vivo. Entre poesias, cantorias e toadas, Preto Teo fala sobre como eu desconstruiu a própria masculinidade.

“No processo de transição de gênero, algumas coisas que já estão engessadas naquilo que se compreende como ser homem acabaram se incutindo em mim. Eu passei por um processo de me permitir me sensibilizar comigo mesmo, retomar as minhas referências de feminilidade que sempre foram as minhas fortalezas, os meus portos seguros, para desfazer um pouco, desmontar essa rigidez, e me permitir ser um pouco mais sensível, dialogar um pouco mais, falar sobre os meus sentimentos, que são coisas que a gente não acessa tão facilmente na masculinidade, sobretudo a negra”, diz o artista.

Em um dos trechos da performance, ele apresenta uma encanteria, que ele explica ser uma “música bem curta que se repete várias vezes”, em homenagem a Demétrio Campos, que foi, nas palavras de Preto Téo, “um homem trans suicidado em 2020”. “Muito se fala sobre a memória de Demétrio e em algum momento eu quis que a gente ressignificasse a memória dele e pensasse não só na tristeza desse acontecimento, mas na transmutação que ele está passando e que todos nós passamos juntos com essa passagem”, diz.

Slam Marginália

Preto Téo é parte também da organização do Slam Marginália, batalha de poesias de pessoas trans em São Paulo. Até 2019, antes da pandemia, o slam acontecia toda primeira quinta-feira do mês. Atualmente, ocorre quando há algum patrocínio que possibilite a estrutura no centro da cidade para que o evento seja realizado e o pagamento dos artistas.

“Um espaço de representatividade para poetas e poetas trans, porque geralmente, nos outros slams da cidade, as pessoas trans não se sentem tão contempladas, porque geralmente são minorias”, diz Téo.

No espaço, é possível entrar em contato com uma poesia que muitas vezes não está nos meios de comunicação de destaque, nos grandes eventos ou na escola. “O que a gente acessou inicialmente, enquanto o que era poesia lá na escola, era a poesia cânone, de poetas que já estão mortos, em sua maioria. Então, no Slam Marginalia, a gente te propõe a escutar poesias de gente que está viva, gente que não é branca, gente que não é cisgênera. E isso tudo afeta nas temáticas e nos conteúdos das poesias. Ali a gente trabalha muito as nossas vulnerabilidades e, para além disso, os nossos sucessos, os nossos desejos, as nossas distopias, as nossas ficções”, explica o artista.

Trans nas artes

Segundo Preto Téo, o cenário brasileiro tem melhorado, e mais pessoas trans têm ganhado projeção, mas ainda faltam políticas públicas direcionadas para pessoas trans que garantam os direitos de sobrevivência e subsistência dessas pessoas por meio de seus trabalhos.

Ele conta que já ouviu pessoas dizerem que não há artistas trans em determinadas áreas. Então, esclarece: “É diferente você não conhecer os artistas trans que fazem as coisas, que produzem essas coisas, de eles não existirem. Eles existem, nós existimos em todos os lugares, estamos em todas as vertentes artísticas. Estamos na poesia, estamos na literatura, estamos nas artes cênicas, nas artes visuais, na direção de arte, estamos na produção, estamos na graça, somos técnicos, somos iluminadores, somos tudo, fotógrafos, diretores, estamos muito, cada vez mais crescendo nos nossos campos, mas o que a gente precisa hoje é de oportunidade, assim, para mostrar a que a gente veio, para que a gente veio, a qualidade e excelência do nosso trabalho.”

Para marcar a visibilidade trans, cuja data é 29 de janeiro, a Agência Brasil publica histórias de cinco artistas trans na série Transformando a Arte, que segue até o dia 31 de janeiro.

Disputa sobre Marco Temporal colocou Congresso e STF em lados opostos l

Em um ano de seca na Amazônia, temperaturas extremas, fome e desnutrição de populações indígenas, o Brasil discute a redução das demarcações das terras indígenas. A tese do marco temporal foi declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF), ainda assim, deputados e senadores a aprovaram no Congresso Nacional.  

“Todo dia é dia de luta, é todo dia, não tem um dia que a gente está tranquilo, que a gente está bem. Todo dia a gente tem violações de direitos. É trabalhoso sim, é cansativo, sim, mas a gente continua na resistência. Nós já fomos resistentes por mais de 500 anos, vamos continuar na resistência”, diz a advogada indígena e assessora jurídica da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) Cristiane Baré. Ela foi uma das juristas a fazer a sustentação oral contra o marco temporal no Supremo Tribunal Federal, em 2021.  

Pela tese do Marco Temporal, os indígenas só terão direito ao território em que estavam na promulgação da Constituição, em outubro de 1988. “Não faz sentido, porque nós somos os habitantes desse país, somos os primeiros habitantes originários dessa terra. Quando houve a invasão do Brasil, nós estávamos aqui. Trazer um marco é querer se desfazer de tudo que aconteceu, com violações de direitos que ocorreram desde a invasão, as retiradas forçadas dos povos indígenas, o processo de violências que foram sofridas”, afirma a advogada.  

Em 21 de setembro deste ano, o Supremo Tribunal Federal invalidou a tese, que entendeu ir contra o que prevê a Constituição brasileira. Mas a Câmara e o Senado aprovaram um projeto de lei 8 dias após para incluir a tese do marco temporal em lei federal. Em outubro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou parcialmente o projeto aprovado no Legislativo, argumentando que a tese já havia sido considerada inconstitucional. O Congresso, no entanto, derrubou os vetos do presidente

Após a derrubada de vetos, tanto organizações indígenas, como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) quanto o próprio governo, começaram a elaborar recursos para serem analisados pelo STF

Para grupos favoráveis ao marco temporal, como a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), sem o marco temporal cria-se uma insegurança jurídica com a possibilidade de “expropriar milhares de famílias no campo, que há séculos ocupam suas terras, passando por várias gerações, que estão na rotina diária para garantir o alimento que chega à mesa da população brasileira e mundial”, argumenta a entidade em nota após a decisão do STF.

Próximos passos  

Segundo o professor adjunto de Direito Constitucional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Wallace Corbo, agora o Brasil tem uma lei que contraria o que diz a Constituição, e que tenta atingir fatos que são anteriores à lei, ou seja, hoje os povos indígenas têm direito às suas terras independentemente do momento em que ocuparam. 

“A gente tem, ao mesmo tempo, uma lei que diz o contrário do que diz a Constituição em matéria de terras indígenas e a gente tem uma lei que tenta retroagir para tentar atingir atos jurídicos que já são perfeitos. Quais são esses atos? O direito adquirido dos povos indígenas às suas terras”, explica.  

Diante dessa situação, de acordo com Corbo, haverá a necessidade de que, mais uma vez, haja uma declaração de inconstitucionalidade dessa lei que pode vir do STF ou pode vir de qualquer juiz que venha a averiguar um processo demarcatório. 

“Tanto nos processos demarcatórios que tenham sido judicializados, nas ações que já estão em curso, qualquer juiz e qualquer tribunal pode declarar que essa lei é inconstitucional para defender os direitos dos povos indígenas naqueles processos”, avalia.  

O professor diz que a lei já nasce inconstitucional, no entanto, legalmente, o STF pode chegar a uma posição diferente. “Sempre pode haver agentes políticos, econômicos, sociais, que podem buscar pressionar o tribunal a chegar a uma conclusão contrária. Agora, não é esperado que o STF chegue a uma posição diferente da que ele chegou há poucos meses. Então, é esperado que não haja percalços, que haja uma reafirmação do STF do que ele já decidiu recentemente”.  

Indenização  

O STF definiu também a indenização para proprietários que receberam dos governos federal e estadual títulos de terras que deveriam ser consideradas como áreas indígenas. O tribunal autorizou a indenização prévia paga em dinheiro ou em títulos de dívida agrária. No entanto, o processo deverá ocorrer em processo separado, não condicionando a saída dos posseiros de terras indígenas ao pagamento da indenização. 

A indenização é também preocupação das organizações indígenas, segundo a advogada Cristiane Baré. “Nossa preocupação é quem invade território indígena de boa-fé? Até onde vai essa boa-fé? Como se comprova essa boa-fé? E essa questão paralisa o processo demarcatório. Mas até então, a princípio, serão processos separados, mas isso ainda é preocupante porque os direitos originários não têm preço, ninguém pode vender esse direito. Essa é uma preocupação muito grande do movimento. E a gente sabe, na prática, como isso vai ocorrer”, explica a advogada.  

Já o professor Wallace Corbo ressalta que a Constituição diz que não caberia indenização, mas o STF entendeu que cabe, e a decisão deve ser cumprida. “Presumindo que existam ocupantes de boa fé, o que o STF disse é que essa indenização não é uma indenização que condiciona a demarcação, ou seja, o ocupante de boa fé vai ter que buscar, ele mesmo, em um processo administrativo ou processo judicial o reconhecimento da sua ocupação de boa fé e o pagamento da sua indenização”, explica. 

“É uma indenização que não trava o processo demarcatório, e cada uma dessas pessoas que alegue que estaria de boa fé vai ter que buscar no seu próprio processo”, diz.  

De acordo com o professor, o Poder Executivo pode editar uma portaria ou um decreto que crie parâmetros sobre essa boa fé, mas esse é um conceito que presume que uma pessoa não pode ter conhecimento de que está ocupando a terra de terceiros.  

Segundo a Fundação Nacional do Povos Indígenas (Funai), as 736 terras indígenas registradas representam 13% do território brasileiro, o que totaliza aproximadamente 117 milhões de hectares. De acordo com o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem quase 900 mil indígenas, distribuídos em 305 etnias.