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Governo do Espírito Santo decreta situação de emergência após temporal

O governo do Espírito Santo decretou neste sábado (23) situação de emergência em decorrência das fortes chuvas que atingiram a região sul capixaba desde a noite de sexta-feira.O governador Renato Casagrande fez um sobrevoo na região e visitou o município de Mimoso do Sul, uma das cidades mais atingidas pela enxurrada.

O Decreto nº 501-S foi publicado em edição extra do Diário Oficial do Estado e abrange os municípios de Alegre, Alfredo Chaves, Apiacá, Atílio Vivacqua, Bom Jesus do Norte, Guaçuí, Jerônimo Monteiro, Mimoso do Sul, Muniz Freire, Muqui, Rio Novo do Sul, São José do Calçado e Vargem Alta.

Ainda no sábado, Casagrande e o presidente da Assembleia Legislativa, Marcelo Santos, sobrevoaram as áreas mais afetadas e estiveram em Mimoso do Sul.

“Vimos em Mimoso do Sul uma situação caótica, porque a cidade está sem comunicação devido à falta de energia que precisou ser cortada. Infelizmente, já temos quatro óbitos confirmados e ainda pessoas desaparecidas. Nosso esforço é para que a gente possa retomar os serviços essenciais, além de resgatar as pessoas nas áreas alagadas e dar alimentação aos atingidos em todas as cidades. Toda a equipe de governo está envolvida neste trabalho de assistência”, afirmou o governador.

Exposição mostra os impactos das grandes obras durante a ditadura

A exposição Paisagem e Poder: construções do Brasil na ditadura, aberta na noite de terça-feira (19), no histórico Centro MariAntonia da Universidade de São Paulo (USP), procura refletir sobre as transformações ocorridas no Brasil nos anos da ditadura civil-militar. Com uma vasta documentação de época e material audiovisual, exposição mostra as contradições das grandes obras no período e seus impactos sociais e ambientais. A curadoria é dos arquitetos Paula Dedecca, Victor Próspero, João Fiammenghi, Magaly Pulhez e José Lira. Mostra fica em cartaz até o dia 30 de junho.

Nos 21 anos de ditadura civil-militar, o Brasil se transformou profundamente com a construção de conjuntos residenciais, estradas, barragens, viadutos, grandes hidrelétricas e avenidas. Mas foi também nesse período que os recursos naturais foram amplamente explorados, prédios e lugares históricos foram removidos ou destruídos, e em que as desigualdades sociais foram expandidas.

Em entrevista à Agência Brasil, o curador Victor Próspero, que acabou de defender seu doutorado na Faculdade de Arquitetura da USP, explica que essas obras, embora tenham sido projeto de desenvolvimento do país, guardam uma face contraditória, porque também retratam uma modernização conservadora e autoritária. 

Exposição Paisagem e Poder: construções do Brasil na ditadura, no Centro Maria Antonia da Universidade de São Paulo – Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

“Essa modernização conservadora foi diretamente ligada com a repressão. Não existe milagre econômico sem o rebaixamento dos salários e sem a intervenção dos sindicatos. Várias reformas estruturais deixaram os trabalhadores um pouco mais controlados, como a repressão e a lei de greves, por exemplo, que viabilizaram uma certa forma de modernização sem freios, sem oposição”, disse.

“Esse milagre [econômico] é baseado em números, como em um crescimento do PIB [Produto Interno Bruto, a soma de riquezas do país] sempre acima de 11%, por exemplo, mas que, na verdade, pressupõe um congelamento do salário mínimo e o controle dos sindicatos e da oposição. É um tipo de desenvolvimento econômico sem rebatimento no desenvolvimento social. É claro que tem um aumento do emprego, mas geralmente esse emprego está relacionado à exploração da mão de obra na construção civil”, avalia Próspero.

Um dos exemplos dessa contradição do período, segundo o curador, é a construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu. Duas fotos apresentadas na exposição, colocadas lado a lado, ilustram essa contradição. Uma foto mostra a população visitando a usina durante a sua inauguração e a outra apresenta a usina vista de longe, em construção. “Essa representação do momento de inauguração mostra como essas grandes obras eram uma peça de propaganda importante para a ditadura. Já a outra imagem mostra Itaipu em obras e o grau de violência de transformação do espaço daquela paisagem. Ao lado dessa imagem, colocamos uma reportagem que destaca o Salto das Sete Quedas, que era um ponto turístico, uma paisagem reconhecida, e que dava certa identidade para a população daquela região, e que foi inundada para fazer a represa”.

Eixos

A exposição conta com diversos registros audiovisuais da época, como reportagens, fotografias, filmes, desenhos e diapositivos, além de documentos e cadernos técnicos. Também mostra que críticas já existiam naquele período, apresentando livros que contestavam o desenvolvimento exploratório e não igualitário desse modelo desenvolvimentista.

Todos esses registros foram agrupados em cinco eixos principais. O primeiro trata sobre a urbanização e o planejamento do território. Esse núcleo mostra que o incentivo ao desenvolvimento nos chamados “vazios demográficos”, com a criação da Rodovia Transamazônica e do Banco da Amazônia, por exemplo, também teve uma outra face, marcada pela violência e assimilação dos povos originários e pela devastação ambiental.

“Muitas populações originárias foram removidas e seus modos de vida foram transformados. Foi um tipo de produção do espaço muito violenta”, destacou o curador João Fiammenghi. 

“Essa exploração da Amazônia teve desenho, teve projeto e teve pesquisa. Ou seja, não foi uma destruição caótica, como a gente pensa. Era tudo parte de um plano, de um projeto de país, de uma ideologia do regime militar, de segurança nacional e de ocupação dos vazios demográficos, que não eram vazios, tinham pessoas, tinham pequenos agricultores e indígenas vivendo lá. Quisemos mostrar nesse eixo como que essa produção do espaço violenta foi muito planejada”, explicou.

O segundo núcleo trata sobre o extrativismo e sua relação com a produção de componentes para a indústria da construção civil. “E, com isso, a gente não pode deixar de falar do trabalho, da industrialização e do sindicalismo. Então, esse é um núcleo mais ligado com trabalho e produção”, destaca Fiammenghi. 

Em relação à questão trabalhista, por exemplo, a exposição destaca que o projeto desenvolvimentista da ditadura envolveu um alto número de acidentes e mortes trabalhistas.

O terceiro eixo, por sua vez, destaca o território e a integração nacional, tratando sobre a circulação entre as cidades, onde são apresentadas as rodovias, as grandes avenidas e as obras de construção de metrô. Há também um eixo todo dedicado à construção da cidade de São Paulo, que apresenta obras como o Minhocão e o Anhembi.

O último núcleo discute a questão da moradia e conta um pouco sobre a verticalização dos espaços urbanos e a criação do Banco Nacional de Habitação (BNH). “Quando a gente adentra os anos 60 e, sobretudo, após o golpe civil-militar, a gente tem o desenho e a promoção de um grande plano habitacional naquele momento, que está ligado à implementação de um Sistema Financeiro de Habitação e ao Banco Nacional de Habitação. O banco se estrutura justamente nessa perspectiva de enfrentamento do déficit habitacional, mas com um discurso, já desde então, ligado a essa espécie de controle das massas e das populações moradoras desses territórios”, explicou a arquiteta, urbanista e também curadora da mostra Magaly Pulhez.

Criado com a proposta de reduzir o déficit habitacional, o BNH acaba, no entanto, se transformando em um “motor de arranque” da economia. “Fomentando a construção habitacional, fomenta-se a construção civil e, portanto, se agencia uma série de agentes privados, empresas, construtoras e incorporadoras. E o que a gente vai ver, a partir dessa movimentação toda, não é propriamente uma produção habitacional voltada para as massas populares necessitadas de fato, mas o banco funcionando nessa cadeia produtiva da construção civil”, disse Magaly Pulhez. 

“Apenas 15% da produção do banco nesse período foi voltada para atendimento das populações de baixa renda”, destacou.

A exposição também mostra outro grande paradoxo do período. O trabalhador responsável pela construção dessas grandes obras desenvolvimentistas era o mesmo que, aos finais de semana, precisava construir a sua moradia, quase sempre sem recursos suficientes. “Os trabalhadores que estão na própria indústria da construção civil construindo essas grandes obras não têm casa”, ressalta Magaly.

Centro

No ano passado, o Centro MariAntonia, espaço importante de luta e de resistência contra a ditadura brasileira, completou 30 anos.

O espaço é conhecido, principalmente, por ter sido palco, em outubro de 1968, de uma das mais importantes batalhas pela democracia na ditadura militar. Esse episódio ficou conhecido como a Batalha da Maria Antonia e envolveu estudantes de posições ideológicas opostas – os estudantes da USP e os estudantes do Mackenzie – e a polícia.

Nessa batalha, o prédio foi parcialmente incendiado e, em seguida, tomado pelo governo de São Paulo. Somente em 1993, a USP recebeu o prédio de volta e decidiu criar no local um espaço cultural, com exposições regulares e dedicadas à memória e à arte.

“Neste ano, nós achamos que seria muito bom olhar para esse período da ditadura pelo ângulo da arquitetura, do urbanismo, do planejamento, da geografia e do meio ambiente, ou seja, da paisagem e do espaço físico brasileiro”, explica José Lira, professor e diretor do Centro Maria Antônia.

“A exposição é principalmente uma mostra documental. Durante a seleção desses documentos, nós procuramos focalizar questões que são muito presentes no nosso território ainda hoje, como a questão do desrespeito às populações tradicionais e a questão envolvendo a exploração do meio ambiente. Hoje, o mundo inteiro está sensibilizado pelas questões da crise ambiental e climática. E nós vemos que, naquele momento [da ditadura], essa era uma das coisas menos observadas. A natureza era pensada como fonte inesgotável de riquezas e de recursos e explorada como se fosse substituível. Hoje a gente vê que é bem o contrário. Se a gente não construir de maneira a permitir que a natureza se reconstrua ou se conserve, a gente não tem futuro”, disse o diretor do centro à Agência Brasil.

Sua expectativa é de que a mostra possa enriquecer o debate sobre a ditadura e sobre o modelo de construção do país. “Nós esperamos que a exposição possa ser vista por esse cidadão comum, esse habitante do Brasil, principalmente interessado no seu espaço, interessado no ambiente em que ele vive, interessado nas suas cidades, no seu bairro, na sua qualidade de vida, nas suas liberdades, nos seus espaços públicos, para que nesse ano de 60 anos do golpe possa ajudar na autoanálise do país”.

Programação

Paralelo à exposição, o centro preparou uma programação gratuita e aberta ao público, com mesas de debates e exibições de filmes. 

Outras informações sobre a exposição e a programação paralela podem ser obtidas no site do Centro MariAntonia.

Gilmar Mendes: “Lava Jato terminou como uma organização criminosa”

Em seu gabinete, na cobertura do prédio anexo do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Gilmar Mendes despacha cercado de fotos com jogadores e personalidades do futebol brasileiro. Os livros jurídicos dividem espaço nas paredes com bolas, troféus, medalhas e dezenas de camisetas de times autografadas. “Pelezista” declarado, o ministro também ostenta diversos quadros com fotos tiradas ao lado do eterno Camisa 10 da seleção brasileira.

Decano do STF, com 22 anos de toga, Mendes recebeu as equipes da Agência Brasil e da TV Brasil nesse espaço depois das 20h de uma terça-feira. Ainda terminava seu jantar, na mesma mesa de reuniões usada para o trabalho, mas não se perturbou ao perceber a entrada de jornalistas e da equipe de imagem. “Tudo bem, como vai?”, cumprimentou, antes de retomar a refeição.

O ministro Gilmar Mendes durante entrevista exclusiva em seu gabinete – Valter Campanato/Agência Brasil

Pouco avesso a sorrisos, como de costume, retirou-se para uma sala anexa após o jantar para, minutos depois, retornar para a entrevista. Sentou-se calmamente na cadeira de seu gabinete, já sabedor do tema da conversa.

A história acabou por lhe dar razão, após ser criticado nos primeiros anos de Operação Lava Jato. E foi assim que discorreu sobre o tema, com a tranquilidade de quem não se perturbou diante dos mitos e heróis sem capa surgidos durante esse período. Essas mesmas figuras seriam destronadas com o passar do tempo.

O início da operação completa dez anos neste domingo, dia 17 de março e, para o ministro, o balanço é “marcadamente negativo”. Em sua opinião, a única lição aprendida pelo país foi a de não combater o crime praticando outros crimes. Gilmar Mendes afirma ter sido ele a primeira voz a se levantar contra os abusos da operação, como as prisões alongadas em Curitiba e as delações inconsistentes.

O ministro estabelece uma relação contraditória entre a Lava Jato e as atividades que a operação buscava combater.

“Na verdade, a Lava Jato terminou como uma verdadeira organização criminosa, ela envolveu-se em uma série de abusos de autoridades, desvio de dinheiro, violação de uma série de princípios e tudo isso é de todo lamentável”.

Durante a operação, Gilmar Mendes foi figura central em decisões importantes para os rumos da Lava Jato. Entre elas, a que declarou a incompetência da 13ª Vara da Justiça Federal de Curitiba e anulou as ações penais contra Luiz Inácio Lula da Silva. O magistrado também votou para considerar o ex-juiz Sergio Moro parcial em processos da operação.

Confira os principais trechos da entrevista:  

Agência Brasil: Ministro, a Operação Lava Jato completa dez anos no dia 17 de março, o senhor acha que a Lava Jato foi boa ou ruim para o Brasil? Qual é o saldo?
Gilmar Mendes: Eu acho que a Lava Jato fez um mal enorme às instituições. Bem inspirada talvez, no início, ela acabou produzindo uma série de distorções no sistema jurídico político. Por isso, o meu balanço é marcadamente negativo. Mas é claro que nós aprendemos da história, inclusive dos fatos negativos na vida dos povos, na vida das nações. Então, alguém sempre poderá dizer algo positivo. Nós aprendemos como não fazer determinadas coisas. E, nesse sentido, se pode até extrair aspectos positivos. O que a gente aprendeu? Eu diria em uma frase: não se combate o crime cometendo crimes. Na verdade, a Lava Jato terminou como uma verdadeira organização criminosa, ela envolveu-se em uma série de abusos de autoridades, desvio de dinheiro, violação de uma série de princípios e tudo isso é de todo lamentável.

Agência Brasil: Hipoteticamente: temos uma suspeita de corrupção no Brasil. Como agir corretamente, como proceder?
Mendes: A primeira coisa é não inventar a roda, é fazer aquilo que se tem que fazer, deixar que as autoridades policiais façam as investigações, que o Ministério Público faça o seu acompanhamento. Hoje, o país dispõe de uma série de instrumentos para isso. E não imaginar que nós vamos ter heróis voadores, que vamos ter pessoas que resolvem com um milagre a questão da corrupção no país. E fazer as coisas com o devido processo legal. Acho que isso é extremamente importante. Investigações espetaculares, tonitruantes, a gente tem aí aos montões e depois nós temos apenas um resto de lixo em anulações, em não há aproveitamento de provas, como acabou ocorrendo aqui na Lava Jato. Acho que o que a Lava Jato vai ensinar ao sistema jurídico processual brasileiro é como não se fazer determinadas coisas e ensinar que nós devemos ser extremamente cautelosos em relação a essas questões, aos procedimentos jurídicos, para não produzirmos situações estapafúrdias.

Agência Brasil: A punição às empresas e às pessoas foi além da conta?
Mendes: Tudo o que é excessivo e tudo que é indevido, certamente, é além da conta. Nós vamos ter que discutir isso agora. Certamente, muitos vão dizer: ‘ah, tem réus confessos que estão sendo isentados de culpa por conta de falhas processuais’, mas é assim no Estado de Direito em qualquer lugar. Então, não há nenhuma surpresa em relação a isso e vamos ter que fazer também um exame caso a caso, isso não se resolve em um juízo completo, direto. E é isso que nós estamos fazendo e temos feito, tivemos o processo do Lula e outros. Então, me parece que nós fomos de uma euforia quase alcoólica a uma depressão, e os dois estados não são bons. É importante que nós estejamos atentos para fazermos o trabalho de maneira correta e acho que é isso que nós temos que inculcar nos agentes policiais, nos agentes de Receita, nos agentes investigadores todos, do Ministério Público e os próprios juízes.

Agência Brasil: Muito antes da Vaza Jato, o senhor já dizia que o STF teria um encontro marcado com a Operação Lava Jato, o que que havia? O que o senhor ouvia nas audiências com os advogados, qual era a percepção na época?
Mendes: Já se disse que o problema do diabo não é que ele seja o diabo, né? É que ele é velho, ele é experiente. Então, a gente aprende a fazer essas leituras e colhe também experiências. A primeira coisa que eu vi, acho que foi em 2015, foram as prisões alongadas de Curitiba. E, claro, os advogados passaram a dizer que as prisões alongadas eram utilizadas como uma forma de tortura para obter delações. E delações que muitas vezes se mostraram inconsistentes. Delações que muitas vezes se transformaram em acordos de leniência, por isso os questionamentos de agora. Então, nós tivemos toda a essa situação e eu fui talvez a primeira voz a levantar contra essa situação.

E depois ganhei a convicção de que não se tratava apenas de uma irregularidade procedimental ou processual e que na verdade nós estávamos diante de um movimento político, como depois se revelou no contexto geral: [Sergio] Moro [virou] o ministro da Justiça de Bolsonaro, Deltan Dallagnol, um ativista político. E a gente também descobriu, isso é uma coisa bastante peculiar, que o volume de dinheiro com o qual eles se envolviam também os estimulou a ter suas próprias empresas ou participar disso. Aí surge a tal Fundação Dallagnol lá em Curitiba. Aqui em Brasília surge também algo semelhante com a tal Operação Greenfield. A gente descobre que esses nossos ‘combatentes da corrupção’ gostavam muito de dinheiro, o que é uma contradição nos próprios termos. O ministro Salomão [Luis Felipe Salomão, corregedor Nacional de Justiça] está encerrando um trabalho sobre essa questão e diz que há uma quantia perto de R$ 1 bilhão que não se sabe para onde foi, do dinheiro que estava depositado na vara em Curitiba. Então, isso precisa ser esclarecido.

Agência Brasil: O senhor já disse anteriormente que todo o sistema político e o governo na época da Lava Jato foram ingênuos. Como o senhor avalia o comportamento do STF nesse período?
Mendes: A Operação Lava Jato não era uma operação puramente judicial, policial ou de investigação administrativa, eles fizeram uma força-tarefa e lograram um apoio público muito grande, um apoio de mídia. E eu tenho a impressão que esse apoio de mídia teve também um efeito inibitório sobre o Supremo Tribunal Federal. Eu acompanhei os primeiros habeas corpus desde 2014, que começaram a chegar, o ministro Teori  [ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no STF] era o ministro relator e havia já essa força não só de Moro e de sua equipe, mas também da Procuradoria-Geral, Janot [Rodrigo Janot, então PGR]. E é capaz que o Tribunal naquele momento não tenha tido a leitura devida de todas as questões envolvidas do ponto de vista político, e isso demorou a se consolidar. Tanto é que quando eu mesmo assumo um papel de mais crítico do sistema fico também um pouco isolado e a mídia toda dizia: “essa decisão parece contrariar a Lava Jato”, como se a gente estivesse contrariando Roma ou falando mal do papa. Então, havia um domínio em relação a isso. E houve até operações que foram feitas nesse espírito, ainda que não conduzidas pela Lava Jato, por exemplo, aquela operação do Joesley [Batista, ex-presidente da JBS] vis-à-vis ao presidente da República Michel Temer em que, obviamente, o que o presidente disse foi uma coisa, o que foi divulgado foi outra. E isso foi divulgado pela Globo, portanto em uma combinação certamente do procurador-geral Janot com a direção da Globo ou setores de mando na instituição. Depois se viu que aquilo era falso.

Agência Brasil: Ministro, se a Vaza Jato não tivesse acontecido, qual teria sido desfecho da Operação Lava Jato, na sua avaliação?
Mendes: Eu tenho impressão, por exemplo, que no meu processo, que foi talvez um turning point nessa questão, que foi o processo do presidente Lula sobre a suspeição, eu até disse isso no voto: nós tínhamos uma perspectiva já de afirmação da suspeição com os elementos existentes nos autos. Acho que teríamos chegado ao mesmo resultado, mas é inegável que a Vaza Jato mostrou que o rei estava nu. Mostrou como eram feitos os pastéis e como eles eram malfeitos. Então, tudo aquilo que nós supúnhamos ou intuíamos foi confirmado.

Agência Brasil: Houve desvio, mas também houve muito prejuízo para dezenas de empresas que foram prejudicadas. Como combater a corrupção sem a derrocada da economia?
Mendes: Eu acho que esse também é um aprendizado. Naquele momento, me parece que o Brasil estava vivendo uma fase muito peculiar: o governo Dilma débil, fraco, vem o governo Temer também acusado, envolto naquelas mesmas circunstâncias. O sistema político estava no chão, e os procuradores e o próprio Moro eram como se déspotas esclarecidos, ou nem tanto, podiam fazer o que quisessem. Acho que é um modelo de difícil reaplicação hoje. Então, dificilmente todas essas circunstâncias históricas vão se consolidar para uma tal situação. Mas eu me pergunto se não é o caso de, de fato, nós mudarmos a legislação e eventualmente separarmos a empresa e pensarmos inclusive em modelos de direito comparado para eventualmente punirmos os agentes empresariais e separamos a empresa. Há empresas que empregavam 150 mil pessoas hoje empregam 14, empresas que foram destruídas. E há também todo um discurso de que isso também se fez atendendo a interesses internacionais. E nem isso a gente pode negar peremptoriamente.

*Colaborou Marcelo Brandão

Profissionais de saúde se mobilizam para atender casos de dengue no DF

Em meio ao avanço da dengue no Distrito Federal – uma das unidades federativas mais afetadas pela doença –, profissionais da saúde se veem novamente mobilizados para, a exemplo do ocorrido durante a pandemia, unir esforços e enfrentar mais um desafio. Desta vez, tendo na bagagem aprendizados obtidos durante o período pandêmico, principalmente em termos de organização de equipe e cuidados com os pacientes.

“Se dá para a gente tirar algo de bom do que aconteceu durante a pandemia foi a nossa capacidade de organização. Tivemos de nos unir e nos organizar ainda mais. Caso contrário, teríamos ficado loucos”, disse a supervisora da Unidade Básica da Saúde (UBS) 7, Suzayne Diniz.

A movimentação na unidade localizada na Ceilândia, região administrativa de Brasília, tem ficado maior durante os momentos considerados de pico de dengue, geralmente em dias de sol, após períodos de chuva.

Larvas do mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue, em residência no Distrito Federal – Marcelo Camargo/Agência Brasil

A supervisora estima que, atualmente, dos cerca de 350 atendimentos diários, entre 100 e 150 têm sido de pacientes com suspeitas de dengue. Destes, cerca de 70 casos são confirmados.

“A verdade é que a situação é sempre caótica, mas em maior ou menor intensidade”, disse a supervisora à Agência Brasil.

Segundo ela, apesar de “caótica”, a dedicação da equipe e “a expertise adquirida durante a covid-19” têm ajudado a encarar novos desafios profissionais.

Se comparados com a época da pandemia, os atuais desafios podem até parecer pequenos.

Mas não são, uma vez que, no caso da dengue, os procedimentos tendem a ser mais complicados do que os adotados nas rotinas das unidades de saúde. Além disso, os sintomas – e os acompanhamentos – tendem a durar mais dias.

“Notamos que este ano a dengue está mais exacerbada [prolongada], com os pacientes apresentando sintomas mais arrastados. Antes, eles apresentavam melhoras em três ou quatro dias. Agora levam de sete a dez dias. Além do número maior de pacientes, observamos a necessidade maior de retorno deles à unidade, o que acaba por nos deixar sobrecarregados”, acrescentou.

 

Colapso

No final de janeiro, diante do aumento do número de casos de dengue, o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, decretou emergência na saúde do DF. Mais recentemente, disse que a rede de saúde entrou em colapso.

Para a diretora do Sindicato dos Enfermeiros do Distrito Federal (SindEnfermeiro-DF), Nayara Jéssica, não é de hoje que a situação das unidades de atendimento de saúde é de colapso. “O colapso apenas está maior”, avalia a enfermeira ao afirmar que, por tratar-se de uma epidemia “mais do que prevista”, muitos problemas poderiam ter sido evitados pelo governo do DF.

“O GDF poderia ter se programado porque foi uma epidemia anunciada. A começar pelo déficit que temos em termos de pessoal na rede pública. Isso está impactando significativamente”, disse a diretora.

A forma como as autoridades locais têm organizado seus recursos humanos foi criticada pela diretora do SindEnfermeiro. “Após todo o aprendizado que tivemos com o acúmulo de demandas ocorrido durante a pandemia, estávamos nos reorganizando, quando fomos assolados por essa epidemia de dengue e pela forma meio atropelada como o governo está conduzindo a questão”, disse Nayara.

Segundo a representante dos enfermeiros, as tendas montadas deveriam prestar um primeiro atendimento, enquanto o acompanhamento ficaria a cargo das UBS.

“O problema é que não há funcionários suficientes nas tendas. Então estão retirando profissionais das UBS para fazerem esse atendimento. Ou seja, estão basicamente trocando a problemática de lugar. E, ao fazerem esse deslocamento, estão comprometendo outros serviços nas unidades em um período no qual aumentam as incidências de doenças respiratórias.”

A associação de dengue com doenças respiratórias pode, inclusive, atingir a mesma pessoa. Foi o caso de Isabella Cardoso, de 9 anos, filha da servidora Glaucilene Cardoso, de 44. “Por sorte, o caso da minha filha não foi grave, nem para a dengue nem para a covid. Mas, claro, a gente fica sempre preocupada.”

Isabella foi levada à tenda de atendimento montada na Ceilândia e, na sequência, foi diagnosticada e encaminhada para a UBS 7.

“Foram seis dias de tosse, febre e dores nos olhos e no corpo”, descreveu Glaucilene ao citar a mistura de sintomas das duas doenças, observada na filha, em meio a elogios à dedicação das equipes de saúde. “Sempre prestam bom serviço por aqui”, acrescentou.

Chuva e sol

Isabella e sua mãe deram sorte. Não é todo dia que é possível prestar o atendimento de excelência citado por Glaucilene. O técnico em enfermagem Gustavo Lopes explica o motivo: “Os casos de dengue variam de acordo com o clima. Hoje a movimentação está menor porque chovia até ontem. Geralmente o número de casos aumenta significativamente após dois ou três dias de sol”, disse ele, na última segunda-feira (25), enquanto atendia a advogada Juliana Oliveira, 41, moradora de Taguatinga.

“Há duas semanas a situação era outra, com uma movimentação muito maior. Agora está até tranquilo, mas sabemos que isso é momentâneo e que, de uma hora para outra, vão aparecer, de uma vez, muitas pessoas com suspeitas de estarem com dengue”, acrescentou a enfermeira Kelma Louzeiro, gerente de uma UBS, deslocada para ajudar no atendimento aos pacientes em uma das tendas voltadas ao atendimento de pessoas com suspeitas de dengue.

Bastante abatida, após passar a noite sem conseguir dormir em meio a náuseas, vômitos e muita dor nos olhos e na cabeça, Juliana Oliveira não estava com dengue, apesar de apresentar os mesmos sintomas. “O exame deu negativo. A suspeita é que eu esteja com zika”, disse a advogada.

 

“Por via das dúvidas já estamos fazendo o tratamento, uma vez que o protocolo das duas doenças é praticamente o mesmo”, complementou o técnico Gustavo Lopes.

Da triagem, na chegada, até o início do tratamento, passando pelos 20 minutos necessários para se obter o resultado do teste rápido, foi necessário pouco mais de uma hora para Juliana começar a ser hidratada. “Foi bem rápido”, disse a advogada.

“Rápido e eficiente” foram os termos usados pelo publicitário Mauro Júnior Medeiros, de 23 anos, para se referir ao atendimento que recebeu tanto na tenda quanto na UBS da Ceilândia. “Fiz o exame e até recebi remédios. Agora, aguardo os resultados para ver se será necessário fazer um ajuste na dosagem”, disse.

Se tivesse buscado atendimento outro dia na unidade, Mauro correria o risco de não ter à disposição soro para hidratação.

“A demanda por soro para hidratação tem sido muito grande, e a quantidade, às vezes, é insuficiente, chegando a faltar em algumas UBS. Mas a expectativa, em geral, é que não se leve mais do que 48 horas para recebermos mais”, disse a supervisora Kelma Louzeiro.

De acordo com a diretora do SindEnfermeiro-DF, o restabelecimento de estoques de hidratação oral e de soro fisiológico ficou mais fácil após o governo do DF ter decretado emergência em saúde. “As compras foram facilitadas e, em geral, é até rápido o envio às unidades”, disse Nayara Jéssica ao reiterar que as dificuldades maiores decorrem do déficit de pessoal.

Paranoá

Do outro lado de Brasília, na UBS 1, do Paranoá – outra região administrativa da capital federal –, a dona de casa Isabel Martins, de 66 anos, aguardava o resultado do exame para saber se a diarreia, a tontura e as dores que sentia na cabeça e no corpo eram sintomas de dengue.

Isabel disse que conhece bem a situação das unidades de saúde do Paranoá, e que, entre elas, a que oferece atendimento mais rápido para os pacientes é a UBS 1, motivo pelo qual ela foi direto para lá.

“Assim que cheguei, informei que minha situação estava ruim e fui imediatamente atendida. A equipe aqui é sempre muito boa, mas nem todas as unidades são assim. Se for para ir para a UPA [Unidade de Pronto Atendimento] ou para o hospital, a coisa é mais complicada”, disse a dona de casa referindo-se às unidades para onde os casos mais graves são enviados.

A poucos quilômetros dali, cerca de 60 pessoas aguardavam, por horas, atendimento na UPA do Paranoá. Entre elas, Januário da Cruz Silva, de 61 anos. Ele trabalha com um caminhão de mudanças, mas há quase uma semana teve de parar com os serviços por conta da dengue.

“Fui sábado ao posto de saúde, fiz hemograma e constatei estar com dengue. Fui então encaminhado para o Hospital do Paranoá. Fiquei quase cinco horas lá, mas acabei não sendo atendido porque, como praticamente não havia médicos, eles só atendiam quem tinha pulseira vermelha de emergência”, disse Januário à Agência Brasil.

Desde então, ele está intercalando paracetamol e dipirona, na tentativa de amenizar as dores. “Estou há três noites sem dormir por causa dessa dor. Vim então para cá na expectativa de receber hidratação na veia.”

O sofrimento do cozinheiro José Souza Araújo, de 67 anos, já durava oito dias. Ele também estava na UPA do Paranoá para tentar entender o motivo de tamanha demora para se recuperar. “Vim aqui na segunda-feira passada [dia 19], fiquei quase seis horas e não consegui ser atendido. Quem sabe agora eu consiga.”

Secretaria de Saúde

Procurada pela Agência Brasil, a Secretaria de Saúde do Distrito Federal garantiu estar preparada para atender os casos de dengue em todo o território e que, para tanto, conta com 176 UBS – algumas delas funcionando em horários especiais à noite e nos finais de semana.

O governo do DF ampliou também o atendimento nas tendas montadas em nove sedes de administrações regionais e, desde 5 de fevereiro, está em funcionamento o Hospital de Campanha da Aeronáutica, estrutura provisória montada ao lado da UPA da Ceilândia.

Hospital de Campanha da Aeronáutica, montado na Ceilândia – Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

A expectativa é a de instalar mais 11 novas tendas de hidratação. Segundo a secretaria, as instalações provisórias podem oferecer tratamento para casos leves, o que inclui hidratação dos pacientes, testagem e orientações sobre como lidar com os sintomas da dengue.

Em caso de agravamento, os pacientes devem ser transferidos para uma das 13 UPAs ou para os hospitais regionais. Para tanto, novos leitos foram disponibilizados: 15 deles, de observação, no Hospital Regional de Asa Norte; 20 em unidades de terapia intensiva da rede privada; e 55 leitos de internação no Hospital da Cidade do Sol.

Com relação aos recursos humanos, a secretaria informou que 715 técnicos de enfermagem, trabalhadores de sete regiões de saúde do DF, tiveram a carga horária ampliada de 20 para 40 horas semanais, e que nomeou 180 técnicos de enfermagem, 156 enfermeiros, 115 agentes comunitários de saúde e 90 médicos especialistas. Foi também aberto um chamamento público para contratar mais 200 médicos temporários.

Adicionalmente, 38 caminhonetes equipadas com fumacê estão rodando as ruas do DF para aplicação de inseticidas nas áreas de maior incidência do Aedes aegypti, vetor responsável pela transmissão da dengue, chikungunya e zika.

Iniciada no DF em 9 de fevereiro, a campanha de vacinação contra a dengue imunizou até a última terça-feira (27 de fevereiro) 23.502 crianças de 10 anos e 11 anos, apenas 32% do público-alvo. 

A população pode acompanhar a disponibilidade de leitos por meio do site da Secretaria de Saúde do DF. Foi também disponibilizada uma página informando os horários de funcionamento das unidades básicas de saúde.

Mudanças climáticas e sociais são tema de bloco em Copacabana

O bloco carnavalesco Virtual, integrante da Associação Independente dos Blocos de Carnaval de Rua da Zona Sul, Santa Teresa e Centro da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro (Sebastiana), concentra às 8h dessa segunda-feira (12) na Avenida Atlântica número 1, no Leme, e segue até a Praça Almirante Júlio Noronha.

O tema deste ano é Insanidade Virtual, baseado na música Virtual Insanity, da banda britânica de funk e acid jazz Jamiroquai, formada em 1992 e liderada pelo cantor Jay Kay. A música fala sobre o mundo na era digital e as mudanças da natureza, as mudanças climáticas. “As transformações na forma de se relacionar, os efeitos das novas condições climáticas e sociais são o tema deste ano”, disse à Agência Brasil o atual diretor do bloco, Lula Jardim. Destacou que “o calor dos últimos tempos tem tornado até mesmo brincar carnaval um ato de insanidade.”

O bloco é constituído por 80 integrantes. Foi criado pelo pai de Lula Jardim, Jorge Wanderley, e um coletivo de amigos em 2000 que, naquela época, queriam fazer um bloco via internet. “Naquele momento, o máximo que havia eram e-mails. O bloco não conseguiu se realizar do ponto de vista virtual, mas foi se consolidando ao longo do tempo, enquanto o grupo de amigos que produzia anualmente o bloco ia tentando criar temas ligados às transformações sociais e da contemporaneidade”, explicou Lula Jardim. Ele assumiu a direção do bloco em 2011, com amigos.

Foliões

 

Bloco Virtual desfila no Leme a história da criação do mundo – Fernando Frazão/Agência Brasil

O Virtual atrai grande número de foliões. “Chegamos a atrair 20 mil pessoas em alguns anos. Mas isso é variado. Hoje, deve estar girando em torno de 7 mil a 8 mil pessoas”. Esse não é um bloco de samba enredo. Sua tradição é tocar ritmos de carnaval brasileiros. “A gente toca frevo, maracatu, olodum, Música Popular Brasileira (MPB), samba, marchinhas. É uma diversidade. A gente tenta passar por todos os carnavais possíveis do Brasil”.

A banda tem sopros e percussão “e tem também uma bela Comissão de Frente, integrada por meninas e meninos”, além de dançarinos e pernas de pau, destacou Lula Jardim. Como se trata de um espaço de inovação, a agremiação incorpora canções autorais de seus colaboradores, ao mesmo tempo que adapta ritmos excêntricos ao clima carnavalesco, como música clássica, ‘reggae’ e forró. No repertório irreverente figuram compositores como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Luiz Gonzaga, Capiba, Moacir Santos, Timbalada, Brahms, entre outros nomes.

O bloco já desfilou por diferentes partes da cidade do Rio de Janeiro, como praia de Ipanema, Lagoa e, agora, está no Leme. O Virtual continua aberto a sugestões e contribuições vindas da internet, como defendia a ideia original.

Arte

Bloco Virtual desfila no Leme a história da criação do mundo – Fernando Frazão/Agência Brasil

A arte usada na camiseta 2024 do bloco Virtual foi feita por inteligência artificial (IA), com ajuda do designer Zeh Fernandes (@_zehfernandes). A orientação foi criar uma ilustração para a camiseta do bloco que mesclasse o espírito da música Virtual Insanity do Jamiroquai com um toque do estilo de arte abstrata de Wassily Kandinsky, artista plástico russo, introdutor da abstração no campo das artes visuais. A imagem transmite um mundo futurista, onde a tecnologia domina sobre os elementos naturais, utilizando cores vivas e brilhantes. O fundo dinâmico simboliza a mistura contínua, porém caótica, de realidade e virtualidade.